A Gotinha De Amor Que Faltava escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 21
Capítulo 21 – Ajuda Psicológica


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoinhas!
Capítulo novo na área o/
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Muito obrigada a Lory dos Reis por ter recomendado a fic. Fiquei muito feliz e lisonjeada com suas palavras :)). Esse é especialmente pra você querida.
**
Boa leitura a todos e divirtam-se com a gotinha e o seu papai ♥
Ah, e no final tem um recadinho.



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Naquela noite, Emmett jantou mais uma vez com a família. Hábito que estava sendo frequente desde a chegada de Julia à sua vida. Pouco antes da filha dá sinais de sonolência, ele decidiu voltar para o apartamento. Como ela havia tomado banho na casa dos avós, ele apenas lhe vestiu o pijaminha e foi preparar a mamadeira. Depois que Julia mamou, Emmett lhe contou uma historinha, ela adormeceu antes mesmo de chegar à metade da narrativa.

Pouco tempo depois, ele conversou com Rosalie via Skype. Essa era à noite em que ela dormiria em casa e Ryan no hospital, fazendo companhia a Grace. O assunto foi focado basicamente na saúde da mãe de Rosalie. Muito pouco, cada um falou sobre seu dia. No geral, Rosalie fora quem mais fez perguntas. Emmett se viu obrigado a limitar as respostas falando apenas do trabalho, da falta que sentia dela, e, sobre o novo projeto da empresa da família; um Resort de Luxo na costa brasileira. Como não podia ser diferente, Rosalie ficou contente com o novo projeto do qual o marido fazia parte. Ele era bom nos negócios, sempre fora, isso ela tinha que admitir.

Já bem cansados, ambos se despediram e foram dormir pensando um no outro. No quanto sentiam falta de estar junto. Do toque, do perfume...

A madrugada de Emmett e Julia foi à mesma agonia de sempre. Muito choro e gritos, medo e terror.

A manhã chegou nublada e a temperatura caíra um pouco, soprando uma brisa refrescante e suave.

Julia teria sua primeira sessão de terapia com a psicóloga infantil. Contudo, Emmett precisou sair de casa mais cedo para levá-la a consulta médica com a Dra. Kate, onde seria examinado o bracinho que Julia alegou doer no dia anterior.

A Dra. Kate examinou, solicitou uma radiografia para tirar qualquer dúvida. Explicou para o pai, preocupado, que não havia sinais de fratura recente. No entanto, havia, sim, ossos calcificados. O que indicava que, em algum momento da vida de Julia, Savannah havia puxado seu bracinho com agressividade e deslocado o cotovelo.

No subconsciente a pequena Julia ainda podia sentir a mesma dor, que sentira tempos atrás, sempre que alguém mexia em seu bracinho de maneira diferente, assim como a tia, Alice, havia feito ao lhe explicar a postura básica e obrigatória do ballet. Por desencargo de consciência, e também para desenvolver a confiança de Julia, a Dra. Kate sugeriu cinco sessões de fisioterapia infantil.

Julia saiu do consultório médico levando um pirulito entre as mãozinhas. Embora o doce ainda estivesse embrulhado ela parecia satisfeita apenas em tê-lo consigo. Emmett havia lhe explicado que somente poderia chupar o pirulito depois de uma visita que fariam a outra doutora que era muito amiga da Dra. Kate e que também era amiga das crianças.

Mesmo receosa, Julia ficou curiosa para conhecer essa tal Dra. que, segundo seu papai, também era amiga das crianças. Confiando nas palavras dele, ela não fez reclamações, tampouco carinha triste.

Emmett a levou até lá, segurando-a pela mãozinha. Um sorriso satisfeito surgiu em seus lábios enquanto caminhava com a filha ao seu lado. Na outra mão, Julia segurava o pônei de pelúcia e o pirulito.

Na sala de espera, eles aguardaram alguns minutos. Quando o nome de Julia foi anunciado Emmett entrou com ela na sala; um ambiente repleto de brinquedos e paredes decoradas assim como o da pediatra. O chão era todo forrado com tapetinho colorido, havia duas mesinhas com apenas duas cadeiras cada. Sobre elas, muitos papéis para desenhar, canetinhas e giz de cera.

No instante em que entrou na sala, Julia agarrou-se as pernas do pai, olhando receosa a Dra. Abigail – uma mulher que beirava os quarenta anos, de cabelos negros como a noite. Usava óculos e tinha um rosto bondoso.

Notando o receio da filha, Emmett a pegou no colo enquanto cumprimentava a Dra. Abigail, que indicou a cadeira a sua frente. Emmett sentou com Julia no colo. Eles conversaram um pouco enquanto ela anotava algumas coisas no prontuário.

Emmett não se enganou, Abigail se mostrara tão bondosa e calma quanto o seu rosto revelava. Ela se apresentou para Julia, foi amável com ela, arrancando até mesmo uma ameaça de sorriso, tímido, mas, ainda assim, conseguiu. O que era um grande feito considerando que a garotinha tinha pavor a pessoas desconhecidas.

Como geralmente acontecia, o responsável pela criança se retirava e ficava à espera na sala ao lado, observando tudo através de uma parede de espelho dupla face. Dessa forma ficavam a par do que acontecia durante a terapia sem interferir no processo.

Bastou que Julia capturasse na conversa, entre o pai e a Dra. Abigail, que elas ficariam sozinhas, para a pequena se agarrar ao pescoço do pai e não querer soltá-lo por nada. O choro foi algo inevitável. Tudo isso se devia aos maus tratos que sofrera. Julia tinha muito medo de ficar sozinha com pessoas estranhas.

Não houve acordo com a garotinha apavorada. Emmett teve que ficar na sala durante toda a sessão, sentado no tapetinho colorido, ao lado da cadeirinha cor de rosa que sua filha escolheu para sentar.

A Dra. Abigail sentou no tapetinho, em uma tentativa de deixar a criança mais confortável com sua presença. Havia apenas a mesinha entre ambas.

O atendimento propriamente dito constitui-se em sessões de ludoterapia, “hora de jogo diagnóstica”, como também podemos chamar. A hora de jogo diagnóstica constitui um recurso ou instrumento técnico que o psicólogo utiliza dentro do processo psicodiagnóstico com a finalidade de conhecer a realidade da criança trazida em consulta.

Por meio de brincadeiras, histórias, desenhos, colagens, pinturas e jogos, sempre de acordo com a idade da criança, o terapeuta constrói um ambiente acolhedor, conseguindo adentrar no universo dela para conhecer melhor seus medos, suas queixas e seus sentimentos.

Cada hora de jogo diagnóstica significa uma experiência nova, tanto para o entrevistador como para o entrevistado, ou seja, psicólogo e paciente. Implica o estabelecimento de um vínculo transferencial breve, cujo objetivo é o conhecimento e a compreensão da criança. Nela serão observados e analisados os seguintes indicadores: escolha de brinquedos e de brincadeiras, modalidades de brincadeiras, personificação, motricidade, criatividade, capacidade simbólica, tolerância à frustração e adequação à realidade.

Durante a primeira sessão de ludoterapia algumas perguntas foram incluídas. Algumas foram respondidas no ato, já outras, Julia se demorou bastante. Demostrando medo em falar. Outras, ela simplesmente não respondia.

A Dra. Abigail ia desvendando o passado sofrido de Julia pouco a pouco. Houve mais de uma ocasião em que Julia, lembrando-se das deliberadas sessões de tortura, chorou muito e buscou abrigo no colo do pai.

No final daquela primeira sessão a Dra. Abigail perguntou para Julia se ela gostava de morar na casa do papai. E ela respondeu com uma certeza latente:

“Julinha ama molá com o papai. Ele já foi malvado pô caso que não quelia sê um papai, mas só que agola ele é bonzinho. Ele conta histólinha, dá comidinha gotosa plá Julinha comê. Dá bainho plá ficá chelosa. Ele não faz um dodói, nem tlanca Julinha no cato.”

Visivelmente emocionado, segurando a filha no colo, Emmett lhe beijou o rostinho com ternura. Julia passou os bracinhos em volta do pescoço dele, encostando a cabecinha no ombro largo. Tendo a certeza que estando ao lado dele, sempre estaria segura.

Emmett voltou para o apartamento com a filha. Sabia que o dia de hoje tinha sido muito importante na vida, e no desenvolvimento, de sua gotinha de amor. Satisfeito consigo mesmo, ele serviu o almoço para ela, depois a levou para brincar no playground. O finalzinho da tarde foi regado a desenho animado. Pai e filha juntinhos em frente à TV da sala, o porta-retratos que levava a fotografia de Rosalie estava sempre ao lado. Julia chupava sua chupeta enquanto Emmett lhe fazia cafuné nos cabelos finos, deixando-a um tanto sonolenta.

[...]

A semana passou tão rápido que Emmett mal pode acreditar. Julia passou pelas cinco sessões de fisioterapia sugerida pela Dra. Kate. Teve mais três sessões com a psicóloga infantil. Fora somente na terceira sessão que Emmett, enfim, consegui sair da sala sem que ela chorasse. Ele passou a observar o progresso das sessões através da sala de espelho dupla face.

Foram muitos os momentos em que se viu emocionado. Sua garganta chegava a doer de tão seca que ficava em alguns momentos. Era inaceitável o quanto Julia havia sofrido nas mãos da própria mãe. Era inadmissível que uma criança, praticamente ainda um bebê, fosse submetida a tantas deliberadas sessões de torturas, psicológica e física.

Emmett também seguia firme com as reuniões no grupo de pais solteiros. Já havia ido a três reuniões. Havia se apresentado e dado seu relato inicial. Já conversava com todos e recebia os primeiros conselhos.

O laço entre pai e filha estava cada vez mais forte. Emmett estava mais seguro de sua paternidade e sentia-se cada dia mais preparado para educar uma criança. Educar sua gotinha de amor da melhor forma que um bom pai poderia fazê-lo. Educar o ser mais importante de toda sua vida.

Skyler continuava tentando uma aproximação, embora não declarada. Com a dedicação de Emmett em se tornar um bom pai, e o fato de ser um homem bastante atraente, fazia Skyler sonhar acordada. Mas ela não era tola, sabia que era algo distante.

As conversas com Rosalie via Skype ocorriam sempre em dias intercalados. Sempre depois de colocar Julia para dormir, e verificar alguns documentos da empresa da família.

Grace havia recebido alta hospitalar fazia apenas um dia. Agora recebia o tratamento adequado na própria casa. Se recuperava bem, e, novamente dava palpites na relação da filha com o genro.

Com a saúde de Grace cada dia melhor, Rosalie ficaria apenas mais uma semana por lá, enquanto Emmett seguia com sua nova rotina. A rotina de um pai dedicado e atencioso.

[...]

Era mais um início de noite, Emmett acabava de deixar o grupo de apoio para ir buscar a filha na casa dos avós. Desde que ele decidira frequentar o grupo, Julia vinha ficando com eles.

Quando Emmett chegou a encontrou na sala de TV, sentadinha no carpete montando um quebra-cabeça da moranguinho – uma de suas personagens infantis favoritas –, com ajuda da tia, Alice.

Parado na passagem da porta, ele chamou a atenção da filha com apenas uma frase.

– Cadê a gotinha do papai?

Ainda de costas pra porta, Julia sorriu reconhecendo o som daquela voz, largando o quebra-cabeça de lado. Ela ficou de pé num rompante, de pés descalços, correu ao encontro do pai.

– Papai – ela gritou feliz, esbanjando o sorriso de covinhas encantadoras que herdara dele. – O papai chegô. O papai já chegô, titia – repetia animada.

Emmett esbanjou um sorriso largo, expondo as mesmas covinhas, enquanto se abaixava para pegá-la no colo.

Sentada no carpete, segurando uma peça do quebra-cabeça que outrora fora alvo da atenção de Julia, Alice observava os dois, pensando no quanto o amor incondicional de um pai é capaz de mudar um homem; para melhor.

O pai cheio de saudades beijou todo o rostinho de sua gotinha de amor antes de lhe perguntar:

– Sentiu saudades do papai, hoje?

Julia espalmou ambas as mãozinhas no rosto dele, seu rostinho feliz, escancarando seu amor incondicional.

– Muita, muita, muita – ela esclareceu. Seus olhinhos brilhando. – Muita sodade Julinha sentiu do papai.

– Tem certeza? – perguntou Emmett, disfarçando um sorriso brincalhão.

– Julinha tem ceteza – ela piscou os olhinhos como que não acreditasse na pergunta.

– Certeza absoluta? – ele continuou questionando, somente para se divertir com a expressão no rostinho dela.

– Ceteza bisoluta. Bisoluta, bicho que luta – ela repetiu para si mesma, achando graça. – É um bicho que luta papai? – a expressão no rostinho dela se tornou curiosa ao mesmo tempo, achando tudo aquilo muito estranho.

Emmett gargalhou, beijando a mãozinha dela.

– Não é um bicho que luta não, filha. É quando você realmente acredita em algo ou alguém – Julia o encarou, seu rostinho denunciando sua confusão. – Tudo bem – Emmett beijou o rostinho dela. – Vamos deixar isso de lado.

Ela sorriu, e, por fim, perguntou.

– E o papai sentiu sodade da Julinha?

– Papai sentiu muita saudade. Muita, mas muita mesmo – ele a chacoalhou, enquanto beijava sua barriguinha sobre o tecido da roupa. Julia gargalhou gostosamente, chegando até mesmo soltar alguns gritinhos.

– Isso faz coquinha, papai – anunciou entre o riso fácil.

– Emmett, não a faz rir desse jeito – sibilou Alice, rolando os olhos.

Emmett maneou a cabeça, com indiferença. – Não seja chata Alice. A gente só está se divertindo, não é gotinha? – sorrindo, Julia afirmou com a cabeça.

Alice rolou os olhos novamente, erguendo as mãos dando-se por vencida.

– Ok. Eu não digo mais nada. Algum dia se você a fizer fazer xixi de tanto rir, e ela associar a felicidade a algo ruim, não venha dizer que foi por falta de aviso...

Julia deu uma gargalhada, suspirou e então acrescentou:

– Titia, pô favô, não biga com o papai. Não biga.

Emmett beiju o rostinho de Julia, antes de voltar sua atenção para Alice, que ainda estava sentada no carpete.

– É. Não brigue comigo – ele olhou novamente para Julia em seus braços. – Isso filha, defende o papai, dessa titia ousada e malvada.

– Titia não é isso, não, papai. Titia não é malvada. É boazinha.

– Ahá! – gritou Alice. – Toma essa, Emmett, seu chato. Chupa essa manga.

Emmett maneou a cabeça, com certo desdém. – Não fica se achando não, porque a filha aqui é minha. Ela defende o papai dela também. Então corta essa, baixinha.

– Mais essa agora – zombou Alice em tom de brincadeira.

Emmett cochichou algo ao ouvido de Julia, enquanto os olhinhos dela brilhavam demonstrando o quanto estava feliz.

– Diz para a sua titia o quanto o papai te ama? – pediu, já sabendo a resposta que ela daria.

– O papai ama Julinha com a mesma tantidade de etelas no céu somado a todos os peixinhos do oceano – ela falava sem em momento algum deixar de olhá-lo.

Um sorriso surgiu no rosto de Alice ao ouvi-la falar.

– A titia também te ama, com mesma intensidade, sabia?! E, sim, minha jujuba, o seu papai te ama mesmo.

Julia se contorceu nos braços do pai se sentindo dengosa.

– Julinha também ama essa titia – Julia revelou.

– Minha jujuba linda – disse Alice, lhe soprando um beijo. – Te amo. Gostosa da titia.

Emmett olhou em volta, antes de mudar de assunto.

– A mãe está em casa, Alice? – aguardando pela resposta da irmã, ele passou a mão no rostinho da filha, afastando alguns fios de cabelos que caiam sobre os olhos.

– Está sim. Ela foi à cozinha conversar com a Dora sobre o jantar de hoje. Vai ficar para jantar com a gente?

– Talvez... – murmurou ele, se inclinando para colocar Julia de volta no chão. – Eu preciso falar uma coisa antes. Fica aí com a titia terminando de montar o seu quebra-cabeça, gotinha, que o papai vai lá falar com a vovó.

– Tá bom papai – Julia assentiu, com cabeça erguida para poder olhá-lo.

– Dá um beijinho no papai – ele pediu, se inclinando para ficar mais pertinho dela. Julia ficou nas pontinhas dos pés para poder beijar a bochecha dele. Depois correu para perto da tia, animada, para finalizar a montagem do quebra-cabeça.

[...]

Na cozinha, Emmett chegou de mansinho, como se fosse uma criança, sabendo que levaria uma bronca ao começar a falar o que tinha em mente.

– Oi, filho – saudou Esme, virando o rosto para olhá-lo. – Julia viu você chegar?

– Viu, sim. Eu estava com ela lá na sala agora a pouco.

Esme sorriu consigo, satisfeita. – Por isso ela estava gargalhando. Eu deveria ter imaginado que era por sua causa. Não que ela não sorria quando está somente com a gente. É que você a faz feliz apenas com sua presença. Não precisa mais nada, basta estar junto. E quando brinca com ela, lhe faz sentir-se amada como nunca fora.

Andando devagar, Emmett se aproximou do banco, em frente ao balcão, e sentou-se nele.

Dora saiu da dispensa, trazendo consigo alguns potes de enlatados.

– Oi, Dora – Emmett a cumprimentou.

– Olá, Emmett – respondeu Dora, alegre, porém, sem parar o seu serviço.

– Está com fome, filho – Esme perguntou, indo até a geladeira. – Não quer comer alguma coisa antes do jantar ficar pronto. Deve demorar um pouco ainda.

– Não, eu estou bem. Ainda não estou com fome. Eu posso esperar... – Emmett pareceu receoso, Esme notou isso, mesmo estando de costas para ele. – Na verdade eu queria falar com a senhora sobre uma decisão que tomei há pouco tempo.

Esme se virou para olhá-lo, segurando um pote de azeitonas. Com uma expressão curiosa no rosto, ela se aproximou do balcão, ficando do outro lado, se posicionando de frente para Emmett. Dispensou o pote de azeitonas sobre a bancada e perguntou olhando diretamente nos olhos dele.

– Que decisão é essa?

Buscando as palavras certas para falar, Emmett deslizou os dedos sobre a superfície lisa do balcão.

– Eu estava pensando... – começou ele. Esme observou, notando preocupação, talvez medo, no filho mais velho.

– Você estava pensando...? – ela incentivou, gesticulando com a mão para que ele prosseguisse.

– Eu estive pensando em matricular a Julia em uma escola de educação infantil... –Emmett deixou a informação no ar, esperando pela reação da mãe.

Incialmente Esme não disse nada, no entanto, a expressão de seu rosto revelava sua opinião. Ela puxou o pote de azeitonas para perto novamente e retirou a tampa, evitando olhar para o filho.

– Mãe... – insistiu Emmett, esperando que ela dissesse algo, mesmo que fosse o que não queria ouvir. Qualquer coisa era melhor do que o silêncio.

Incomodada, Esme deixou o pote de azeitonas de lado mais uma vez. Espalmou ambas as mãos sobre a bancada e prosseguiu:

– Não pode se livrar de sua filha colocando-a em uma creche o dia inteiro, Emmett – ela protestou. – Se você acredita que está sendo difícil conciliar tudo. A paternidade recente e o trabalho, peça licença paternidade e fique em casa com ela.

Institivamente, Emmett ficou de pé se mostrando irritado.

– Só pode ser castigo mesmo essa falta de fé que a senhora tem em mim, mãe – ele passou a mão na cabeça, e então prosseguiu. – Não estou me livrando de minha filha, mas também não posso ficar sem trabalhar para sempre. E não é apenas uma creche – ele esbravejou. – É uma escola especializada em educação infantil.

– É quase a mesma coisa... – sibilou Esme, sem esconder sua insatisfação com relação à decisão tomada pelo filho.

Emmett bateu a mão no balcão, depois passou a mão na cabeça enquanto andava de um lado para o outro.

– Sabe – disse ele, olhando para Esme. – Eu converso com as mães e os pais do grupo. As crianças da idade de Julia sabem nomear as cores, os animais, algumas letras, dias da semana. Cantam músicas, sabem várias histórias e nomes de princesas. Sabem utilizar celulares e computadores. Algumas já usam garfos, conseguem fechar seus próprios sapatos. Contam os números na ordem correta para se esconder. Pintam dentro das linhas e não a folha toda como a Julinha faz. Sabia que existe técnica para pegar um lápis e que esse giz de cera que compramos está errado? – seu tom de voz mudando, beirando o desespero, à medida que as palavras saíam de sua boca. Ele parecia cansado. Fracassado, quase pedindo por socorro. Implorando o reconhecimento e um voto de confiança da parte da mãe.

Do outro lado do balcão, Esme se viu consternada com o desabafo do filho mais velho.

– Filho... – murmurou ela.

Emmett voltou a passar a mão na cabeça. Até mesmo Dora parou o que estava fazendo para prestar atenção ao desabafo dele.

– Eu não sei como foi à educação dela até agora, mãe – prosseguiu ele. – Avaliando pela alimentação... Se Savannah jamais deu a filha algo que não fosse fast food, acha mesmo que se deu ao trabalho de ensinar os nomes do dia da semana? Minha filha só sabe dizer quantos aninhos tem porque a moça que a trouxe para mim, lhe ensinou nos poucos dias em que ficou com ela. Duas ou três musiquinhas, ela aprendeu assistindo desenho, sozinha, depois que veio morar comigo, porque nem isso a mãe lhe proporcionava.

Esme estendeu a mão sobre o balcão, alcançando o antebraço do filho, apertando como que dissesse que estava ali para ajudá-lo.

– Filho... – repetiu ela. Vendo nos olhos do filho a necessidade de fazer algo melhor por sua gotinha de amor.

– Ela vai para a escolinha nem que seja período semi-integral. Para conhecer outras crianças, brincar com elas. Mãe – ele sibilou angustiado –, minha filha só convive com adultos. E eu não sei ensiná-la a ser criança. Minha gotinha precisa disso, mãe – sussurrou, com os olhos marejados, sentindo-os arder.

Esme deu a volta em torno do balcão e o abraçou, apertado. Disfarçadamente, Dora limpou uma lágrima no rosto antes de voltar para seu serviço.

– Meu amor – sussurrou Esme, com o rosto apoiado no ombro largo do filho. – Pode fazer como achar melhor. Não irei interferir... Se é o que você quer, então faça isso – ela se afastou novamente –, mas período semi-integral. Ela também precisa passar um tempo com você. A convivência com a mãe biológica foi torturante, ela precisa de amor e carinho, e, nesse momento, você é a pessoa que ela mais precisa por perto. Você lhe transmite conforto e segurança.

Parecendo extremamente cansado, ele respondeu:

– Eu sei mãe... Eu ouvi praticamente as mesmas palavras da psicóloga dela. E, acredite, mesmo que nenhuma das duas tivesse me falo isso, eu já sabia que minha filha se sente segura quando está comigo, e que me ama. Eu vejo nos olhinhos dela toda vez que olha pra mim. Por isso o remorso me consome...

Esme suspirou. – Minha netinha já sofreu tanto nessa vida que dói em mim só de pensar. E ainda assim é a criaturinha mais adorável que já tive o prazer de conhecer. Aqueles olhinhos idênticos aos seus. O sorriso de covinhas, e o jeitinho que ela mexe as sobrancelhas quando está confusa só me faz pensar no quanto Deus é perfeito, e escreve certo por linhas tortas. Ela podia, sendo menina, ter nascido à cara da mãe biológica, mas, no entanto, Deus não quis assim. Já estava escrito que seu orgulho cairia por terra quando a conhecesse.

O rosto de Emmett, antes angustiado, se iluminou com um sorriso orgulhoso ao imaginar Julia sorrindo, esbanjando as mesmas covinhas, uma verdadeira copia sua, em tamanho miniatura, versão feminina.

Ainda com a imagem da filha na mente, ele murmurou.

– É. Minha gotinha de amor se parece mesmo comigo. Isso eu não posso negar.

Esme, que novamente estava atrás do balcão, segurou a mão dele.

– Muito – afirmou ela, com certo orgulho.

Emmett ficou em silêncio, quando Esme se virou para entregar o pote de azeitonas para Dora.

As duas falaram entre si, algo relacionado ao preparo do jantar. O som dos utensílios de cozinha juntando-se ao som das vozes. O aroma delicioso do jantar começava a se espalhar pelo ambiente, alcançando o olfato de Emmett, despertando a sensação de fome quase que de imediato.

Ainda em silêncio ele mexia nos utensílios que estavam sobre o balcão, quando enfim confessou um de seus maiores remorsos, que havia se tornado um desejo forte, embora já não mais possível.

– Olhando para minha filha hoje, eu gostaria de tê-la visto nascer... – ele deixou a frase no ar, enquanto Esme e Dora notava toda tristeza por trás do tom de sua voz.

Esme, mais uma vez, se virou para olhá-lo, orgulhosa, mas, também com sentimento de pesar pelas decisões erradas que o filho tomara no passado.

– Filho – sibilou Esme, pausadamente –, não imagina o quanto suas palavras me fazem orgulhosa nesse instante. Você errou. Errou sim. Errou feio, e quem pagou por isso foi minha netinha, que antes mesmo de vir ao mundo sua mãe já a rejeitava. Um pai que fugiu da responsabilidade deixando seu destino nas mãos de uma desequilibrada.

Emmett suspirou com pesar.

– Estou arrependido de ter feito tudo o que fiz mãe. Se pudesse eu voltaria no tempo e modificaria essa parte de minha vida. Eu juro que faria tudo diferente... Teria acompanhado a gravidez de Savannah e ficado com minha filha desde sempre. Não teria me casado com a Savannah, mas teria sido um bom pai para minha gotinha. Se fosse o caso, teria tirado minha filha dela e criado com a Rose. E hoje minha gotinha de amor não teria tantos traumas.

– Entendo que isso tenha te magoado, filho. Mas Deus se encarregou de resgatá-la de todo sofrimento em que vivia antes, enviando-a para viver com você. Mesmo sendo bruto no começo, ainda assim, eu tive esperança de que se renderia ao amor por sua filha. E veja só, eu não me enganei. Você a ama. Ela também te ama, tanto que é impossível não perceber isso em seus olhinhos quando te olha. Pode não tê-la visto nascer, mas o mesmo sangue corre em suas veias. Ela carrega a herança genética que Deus trabalhou com mãos divinas. Há um futuro inteiro pela frente para corrigir alguns de seus erros. Você não poderá mudar o passado, mas, veja bem, poderá lhe dar um futuro cheio de amor e esperança.

– Eu farei isso – afirmou ele, com imediata certeza.

– E eu estarei por perto, sempre que precisar.

Emmett apertou a mão da mãe, murmurando um “obrigado”, quando notou que Julia entrava na cozinha, levando o pônei de pelúcia embaixo do braço, andando a passinhos curtos.

– Papai... – murmurou ela, dengosa, abraçando uma das pernas dele, seus olhinhos brilhando ao olhar para cima e encontrar com os do pai.

Emmett se inclinou e a pegou no colo.

– O que foi minha gotinha? A titia te deixou sozinha na sala foi? Fala para papai – pediu.

Julia negou com um maneio de cabeça. – Não. A titia já teminô de ajudá Julinha com o quebla-cabeça e agola eu quelia mostlá ao papai.

Emmett beijou o rostinho dela. – Foi mesmo?! – disse ele, prolongando a frase.

Julia afirmou com um maneio de cabeça ao mesmo tempo em que falava.

– Foi mesmo, papai.

– E ele ficou lá na sala com a titia?

– Titia disse que não podia tlazê plá cá pô caso que ia bagunçá tudo otla vez – ela sacudiu o dedinho indicador, em sinal de negação. – Titia não deixô tlazê, papai. Não deixô.

– Para trazer para o papai vê, você teria que montar ele dentro da caixa, filha – explicou ele.

– Na caixa – ela repetiu como que lamentasse por não ter feito isso. – Mas Julinha montô lá no tapete da sala de assisti da vovó – suas mãozinhas estendidas, com a palma para cima enquanto seu rostinho ficava pensativo.

Emmett, Esme e Dora sorriram, prestando atenção na expressão facial dela.

– Por isso a titia não deixou você trazer pra cá. Iria desfazer todo o trabalho que vocês tiveram em montar.

– Pô isso titia não deixô – repetiu, sorrindo. Ela estendeu a mãozinha direita e tocou o rosto de Emmett. – Vem vê papai. Ficô muito bonito.

Emmett sorriu, expondo suas covinhas. – O papai vai, sim – ele beijou a mãozinha dela repetidas vezes. Julia sorriu, e seus olhinhos contentes buscaram pela presença da avó na cozinha.

De onde estava Esme lhe soprou um beijo.

– Vovó eu quelo aga.

– Quer água, meu amor. Espera só um pouquinho que a vovó já vai pegar – Esme se movimentou na cozinha, pegou um copinho cor de rosa, com tampa, e colocou água até a metade antes de entregar para ela. – Aqui, meu amor. Pega sua água gostosinha.

Julia afastou a mãozinha do rosto de Emmett, e colocou Carinho sobre o balcão.

– Obligada vovó – seus olhinhos piscaram com força, quando segurou o copo. Ela parecia um pouco sonolenta, mas lutava para não dormir.

Esme lhe sorriu. – De nada, meu pedacinho do céu.

Emmett a colocou de pé sobre suas pernas e se manteve segurando-a pela cintura. Depois de tomar um longo gole ela afastou o copinho da boca, oferecendo para ele.

– Qué aga, papai?

– Não, obrigado, filha. Pode tomar sua água toda, o papai não quer, não.

– Qué suquinho?

– Não – ele negou novamente, seu rosto se iluminando em um sorriso fácil.

– Qué efigelante?

Dessa vez, ele gargalhou. – Também não.

Julia encostou novamente a mãozinha no rosto dele.

– Papaizinho, não qué nada? – seu rostinho se inclinou para o lado ao fazer a pergunta.

– Papai quer um beijinho – comentou Emmett.

– Um beijinho da Julinha?

– Um beijinho da gotinha de amor do papai – ele reafirmou.

– Julinha é a gotinha de amô do papai – ela afirmou ciente de seu significado na vida do pai.

– Isso mesmo – afirmou Emmett. – Julinha é a gotinha de amor do papai. A gotinha que faltava em minha vida. Uma gotinha que significa tanto na vida do papai. Mais tanto.

Com a mãozinha ainda encostada no rosto dele, Julia lhe deu um beijo estalado na bochecha oposta. Em troca recebeu vários beijos, no rostinho e nos bracinhos.

– Papai tem epinho – ela comentou, se encolhendo.

– Aonde tem espinho? – perguntou ele, confuso, sua sobrancelha se curvando ao olhar para ela.

– Acredito que seja sua barba por fazer que esteja incomodando ela, filho – comentou Esme.

– Ah – sibilou ele, se dando conta do que estava acontecendo. – É a barba do papai que esta começando nascer outra vez, gotinha. É assim mesmo, filha. Incomoda um pouco.

Julia contorceu o rostinho em uma careta. – Tila isso, papai. Tila.

Emmett tocou na pontinha do nariz dela. – O papai vai tirar quando a gente voltar para casa.

– A gente já vai embola?

– Você que ir agora? – ele perguntou, atento as reações dela.

– Não – Julia negou maneando a cabeça.

– Porque não? – ele questionou apenas para ver o que ela diria em resposta.

– Julinha qué epelá o vovô e o titio chegá da ua.

– E quando o vovô e o titio chegar da rua, Julinha vai embora com o papai?

– Vai. Julinha vai. E Calinho também.

– Sim, claro, e Carinho também. Não podemos esquecê-lo – afirmou Emmett.

Do outro lado do balcão, Esme suspirou, enquanto Dora continuava no preparo do jantar.

– Ah, Julinha, vai deixar a vovó – comentou Esme.

– Não vovó, não fica tliste. Julinha vai plá casa do papai. Só que a titia, o titio e o vovô vai ficá aqui com você, vovozinha. Não vai ficá sozinha. E a Dola também – completou.

Esme deu uma piscadela para Emmett.

– Está bem, meu pedacinho do céu. A vovó não vai ficar triste. Afinal vai ficar um monte de gente aqui comigo, não é mesmo?

– É mesmo, não fica tliste. Tá bom?!

– Você quer ficar e dormir novamente com a vovó? – perguntou Emmett, já imaginando a resposta.

Julia passou os dois bracinhos em volta do pescoço dele e respondeu:

– Quelo ficá com o papai.

– Você quer ficar com o papai aqui na casa da vovó, ou lá na nossa casa?

– Com o papai nessa casa da vovó – repetiu sem largar o pescoço dele.

Emmett e Esme sorriram ao mesmo tempo. Dora havia acabado de sair para pôr a mesa do jantar.

– E se chegar alguém procurando pela Julinha e o papai?

Julia afastou os bracinhos do pescoço dele, e estendeu as mãozinhas na frente do corpo com a palma para cima.

– Não sei... – murmurou ela. E, de repente, se lembrou de alguém que tanto desejava conhecer pessoalmente – É a mamãe Ose?

– Não, ainda não.

– Não chega nunca palece... – ela fez beicinho enquanto lamentava a ausência de sua mamãe.

Nesse instante Carlisle e Edward acabavam de entrar na cozinha, um logo atrás do outro, conversando entre si.

Julia reconheceu o som das vozes, e, imediatamente virou o rostinho para vê-los.

– Já chegô esse titio e o vovô – ela comentou.

– Essa princesinha linda do vovô vai dormir aqui hoje novamente, vai? Vai dormir na cama do vovô e ouvir historinhas? – brincou Carlisle, chegando mais perto, beijando a cabeça de Julia.

– Papai vai embola. Ele disse que vai embola pô caso que vai chegá pessoa poculando a gente. Só que não é a mamãe Ose. Julinha quelia a mamãe. Pô caso que não tem Ose... – ela lamentou. – Ose foi embola.

– Mamãe Rose vai voltar quando a mamãe dela estiver melhor do dodói. Fica triste não, Julinha – comentou Carlisle antes de cumprimentar o filho, e logo depois foi cumprimentar a esposa do outro lado do balcão.

– Cadê a bonequinha linda do titio? – brincou Edward, estendo os braços para pegá-la no colo. – Julinha não pode ficar triste – ele avisou –, combinado?

– Cobinado – ela concordou, enquanto sua mãozinha cutucava na gola da camisa de Edward. – Titio você qué blincá de fazê catelo?

– Depois do jantar o titio brinca com você – ele beijou o rostinho dela, repetidas vezes, enquanto Julia se encolhia de dengo.

– Ah – comentou Emmett –, então foi por isso que você queria esperar o titio chegar. Para brincar de fazer castelos. O papai também sabe fazer castelos, filha.

– Titio sabe – disse ela, como que apoiando o tio.

Todos acabaram sorrindo. Edward deu mais um beijinho nela e a entregou para o pai.

– O papai sabe fazer castelos também filha – Emmett tornou a comentar.

O sorriso inocente, de covinhas encantadoras, iluminou o rostinho de Julia, enquanto ela passava os bracinhos em volta do pescoço do pai indo para o colo dele novamente.


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Notas finais do capítulo

Bem, nossa gotinha deu início ao acompanhamento psicológico. Passo muito importante na recuperação de seus traumas.
Emmett desabafou com a mãe algumas questões relacionadas à filha. Questões que o entristece e o preocupa. A necessidade de dar algo melhor para a filha. O desejo que Esme confie nele, que ele é capaz.

**
*Recadinho para quem está ansiosa pela volta da Rose.
Então pessoal, eu já escrevi a cena onde ele conta para ela sobre a Julinha o/, comemoremos - agora só preciso digitar. Isso deve acontecer entre o capítulo 23 e 24. Falta pouco, não se desesperem.
Espero vocês nos reviews, combinado?
Beijo, beijo
Sill