– O QUE?!?

– Você entendeu, bocchan! – O mordomo sorriu.

– Não é hora para sorrir, estúpido!

– Desculpe-me, não sabia que você era assim tão... Sensível...

Ambos já haviam se acostumado com a ignorância de cada um, além do mais, eram demônios! Que demônio em sã consciência cometeria o erro de agir com compaixão ou algo parecido? Continuando...

– Mas diga-me, Sebastian... Há alguma forma de salvá-la? Não que eu queira, claro...

– Então você está mesmo interessado. Certo, é o seguinte...

****

Grace se sentia perdida. Olhava ao redor, mas via apenas um espaço negro. Não tinha opção. Como sair dali? Talvez não houvesse forma. Talvez fosse o fim. Mas com o pouco otimismo que ainda lhe sobrara, talvez fosse possível encontrar uma saída.

Abriu seus olhos outra vez. Estava esperançosa. Memórias percorriam sua mente como um relâmpago.

–- Flashback on--

Virou-se mais uma vez para ter certeza de que ele estava ali. E estava. Aquele garoto passava todos os dias ali. Porém, desta vez ele chorava. A garota se aproximou.

– Está tudo bem?

– Sim, não é nada... – Enxugou os olhos.

Grace sentou-se ao lado dele, intrigada. Observou-o. Não era diferente dos demais. Porém algo lhe chamava a atenção.

– Tem certeza que não quer me contar?

O garoto a ignorou, olhando em uma direção qualquer, pensativo. Não, não era uma direção qualquer. Ele olhava para uma mansão que ardia em chamas.

– Você mora ali? – Ela insistiu.

– Não sei mais...

Interrompendo a conversa melancólica das crianças, uma empregada chamou por Grace, que atendeu prontamente.

– Tenho que ir agora. Você voltará algum dia?

– Creio que sim.

Desde então, ele nunca voltou...

–- Flashback off--

Grace esboçou um sorriso em sua face ingênua.

– Nos veremos em outra vida... Não é?

Lágrimas percorriam seu rosto. Por quê? Por motivo algum! Se Grace não resistisse, ficaria naquela cena monótona para sempre...

****

– Tem certeza de que isso a salvará?

– É arriscado. Porém, creio eu que seja a única maneira.

– Não hesitarei. Comece o mais rápido possível! Isso é uma ordem!

– Yes, my lord!

"Se tudo der errado, sentirei falta dele..." Ciel pensou.

Não demorou nem cerca de uma hora e ambos, servo, mestre e "Grace", estavam juntos outra vez. Ela não demonstrava nada. Raramente olhava ao redor ou retirava algumas mechas de seu cabelo rosado da frente dos olhos.

– Estão prontos? - Sebastian disse, sério.

– Prontos para que?

O vermelho dos olhos de Grace estava muito intenso. Acima do normal de um demônio.

– Você verá, querida.

Ela não quis rebater. Apenas esperou calmamente que lhe chamassem a atenção, o que não demoraria a acontecer.

Sebastian cochichou algo no ouvido do conde, que assentia a cada palavra do servo.

– Mas me diga. Onde está a alma dela? –Indagou Ciel.

– Bem... Desculpe-me, faziam alguns bons anos que eu não comia uma...

– Você é mesmo um demônio inútil! Desta vez deixarei passar, senhor Michaelis.

– Quer se juntar a ela? – O mordomo disse, sério.

Ciel não respondeu, apenas abaixou a cabeça e resmungou algumas palavras. Ele estava realmente afundado em devaneios. Era como se sua vida dependesse dessa escolha.

– Ei, bocchan! Melhor irmos logo, se der meia-noite, é capaz de Grace nunca mais voltar.

"... Meia-noite?" Ciel indagou a si mesmo "Esse período me faz relembrar algo...".

Eram aproximadamente seis horas da tarde.

– Sebby! – Grell berrou vendo o amado.

– Ah, é você? Oi...

– O que está fazendo, querido? Pensei em te levar a algum lugar onde possamos ter mais privacidade...

– Estou ocupado, senhor Sutcliff!

– Posso ajudá-lo, mordomo atraente?

Empurrando Grell, que se encontrava com a cabeça apoiada no seu peito, Sebastian pegou uma espada do conde e disse:

– Isso não deve me matar, porém, vocês devem agir rapidamente, ouviram?!?

– Se... Bas... Tian?

O shinigami assustou-se, os olhos rasos de água e o corpo inteiro tremendo.

Ninguém quis dizer algo. Estavam todos com medo de perdê-lo. Por que despedidas são tão tristes? Mas isso poderia não ser uma despedida. Devemos ser otimistas quanto a isto.

Sem hesitar, o mordomo atravessou seu abdômen com a espada e, disfarçando a dor, caiu de joelhos no chão. Sangue. Muito sangue.

– Sebastian! – Ciel gritou.

– Não se importe comigo, bocchan... Salve Grace... – O servo disse em um fio de voz, antes de cair duro no chão.

O corpo de Sebastian sumira, apenas algumas almas jaziam no solo. Ciel estava gélido. Pasmo.

– Adeus... Você foi realmente um mordomo e tanto...

O nobre recolheu a única alma rosa que se encontrava ali e a empurrou contra o corpo de Grace, que se contorcia.

A alma penetrou a garota, que caiu, sendo segurada pelo jovem.

... Sem reação...

Ciel já se encontrava demasiadamente preocupado.

– Grace! – Ele gritou repetidas vezes.

Ele estapeava a princesa com força bruta. Tentou abrir-lhe o olho forçadamente.

...Novamente, sem reação...

Grell rolava no piso, ainda chorando.

– Ei, seu inútil! Ajude-me! – O conde tentou manter a calma.

– Eu não sei o que fazer! Tente beijá-la, que nem nos filmes!

Isso era realmente uma idiotice, mas não havia mais esperança. Ciel a beijou, de forma contínua.

Ele sabia com certeza de que nada aconteceria.

– Ei...! Saia daqui, seu pervertido!

– Eh? – Ciel levantou-se em um salto- Eh?!?

A princesa chorava de tanto rir.

– Você precisava ver sua expressão! "Grace! Grace!" – Ela plagiou a voz do garoto.

Ciel, exageradamente enrubescido, virou-se para outro lado.

– Está viva desde quando...?

– Desde que recuperei minha alma. Onde está Sebastian?

"Eu havia me esquecido! Onde ele pode estar?".

****

Aquele era realmente o inferno? Não havia do que suspeitar. Seres repugnantes, se divertiam como humanos.

– Ele voltou! Bem-vindo! Sentimos saudades, irmão! –Alguns diziam.

– Sebastian-san! Seja bem-vindo à nossa casa! – Outros aplaudiam.

– Muito obrigado, irmãos. Me sinto honrado.

– Te levaremos ao chefe!

****

– Não posso dizer com certeza, mas penso eu que ele voltou para casa.

– Compreendo...

– Aliás, bem-vinda à família, Grace!

Ele envolveu a cintura da garota com os braços e sussurrou em seu ouvido:

– Eu te amo, e desta vez não é mentira.

A princesa roborizou-se por completo e tentou empurrá-lo, porém foi surpreendida por um beijo do garoto.

– Espero que se divirta vivendo como nós, demônios!

Sim, ela se divertiria. Uma diversão um tanto que atraente... Ainda mais ao lado deste conde sedutor... Há diversão melhor que essa? Certamente não. Principalmente quando se está ao lado do demônio que ama.

– Também te amo, Ciel-kun...

Mas um amor demoníaco, pode mesmo dar certo?