O Reino De Callergan escrita por Cigarette Daydream


Capítulo 1
O Reino De Callergan.


Notas iniciais do capítulo

E assim começa minha história. Fugindo. Meu rumo? O total desconhecido.



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Abri a janela que dava para os fundos e pulei, ainda tinha alguns metros de terreno liso antes à orla da floresta e logo eles voltariam com o resto do povoado, decidi correr tanto o quanto eu podia, para tomar uma boa dianteira. Ouvi-os gritando ao longe (bem longe, pelo que parecia) algumas vezes, mas mesmo quando meu pulmão parecia que ia explodir eu não parava.

Só parei quando notei que já estava escurecendo, então subi numa árvore que tinha uma copa não muito grande, mas que era bastante folhuda. O que deveria me esconder. Eu vou morrer do meu jeito. Como eu quero. Não queimada por um bando de idiotas que acham que sou uma bruxa.

Estendi a manta verde que trouxe comigo sentei na copa, bebendo um pouco d’água no meu cantil de madeira. Tentei escutar barulhos, mas não ouvi nada. Ou eles estavam tomando muitos cuidados quanto ao barulho, ou não haviam se arriscado a ir tão longe em plena floresta, coisa que eu não duvidava que eles tivessem feito.

Tentei relaxar e dormir, mas eu simplesmente não consigo parar de pensar em quantas supostas bruxas o povo já queimou. Gritos, fumaça, fogo e cheiro de carne queimada. Era tudo que eu conseguia pensar. Morrerei do meu jeito. Não do jeito deles.

Eu havia mesmo realizado bruxaria? Aquele grupo de pessoas não poderia ter sido simplesmente arrastado pelo vento, poderiam? E aquela conversa sobre assassinato...

De repente me veio à mente um alquimista que morava nos cantos obscuros da floresta, há rumores de que ele havia protegido várias pessoas acusadas de bruxaria, no entanto as lendas daqueles cantos da floresta Callergan não eram nada boas. Bom, é minha única chance, e de qualquer modo, nem os mais bravos homens irão me seguir até tão nos confins da floresta.

Eu não tenho nada a perder. E morrer na floresta me parece um belo modo de morrer. Do meu jeito.

Assim que amanheceu comecei a caminhar em direção ao lago negro, apesar das lendas, eu preciso de água.

Mergulhei meu cantil no lago, mas nunca vi tal coisa! Por mais que eu tentasse diversas vezes o cantil não enchia! Cheguei inclusive a tentar tirar água com as mãos, mas era inútil. O lago se recusa a me dar água!

– Ah, então vai ser desse jeito? – Esbravejei colocando os pés na água na tentativa de entrar no lago.

Arregalei olhos só de choque, o lago não permitiu que meus pés entrassem! Eu estava em pé sobre a água!

– Fique tempo o suficiente e o lago a prenderá dentro dele moça – Ouvi um grito de homem.

Virei-me em choque por ter mais alguém ali! Eu não havia ouvido os passos. Podia muito bem ser um soldado!

Saí do lago com dificuldade, pois meus pés estavam de certo modo grudados no mesmo. Assim que terminei encarei o tal homem que tinha cabelo castanho escuro, traços retos, pele corada lisa e olhos mel.

– Como o lago podia ter me prendido? – Perguntei sobressaltada, primeiro com o fato de ele saber sobre o lago, e depois com sua beleza.

– Ora, eu esperaria que antes apresentasse a si mesma – Ele disse sorrindo – Sou Thomas e a senhorita?

Esse homem não me passou confiança, mesmo sendo lindo, mas mesmo assim respondi:

– Meu nome é Diana – Eu disse séria – Sabes muito da floresta cavalheiro?

– O bastante para não entrar em um lago negro, eu espero – Ele respondeu debochando de minha cara – Para onde quer ir?

– Quero ir para torre do alquimista, sabes o caminho? – Perguntei, pois eu só sabia que a torre se encontrava nos confins da floresta, não exatamente onde.

Ele deu uma grande risada, ali com toda certeza está um homem sem modos! Só que infelizmente parece que esse mesmo homem sem modos é o único que pode me ajudar a alcançar a torre do alquimista.

– Pretende ir à torre do alquimista? Desista moça. Mesmo que eu lhe indique o caminho você não sobreviveria! Só pessoas experientes conseguem e pelo que vi no lago, você não é experiente – Ele terminou com uma risadinha irritante.

– Bom, de um modo ou outro eu vou morrer – Eu respondi friamente – Só me indique o caminho.

– Morrer? – Ele perguntou franzindo a testa. – Por que alguém faria mal a senhorita? Pareces tão delicada.

– Sim, fui acusada de bruxaria, serei queimada se voltar e a minha única esperança é a torre do alquimista! Precisa me ajudar! – Implorei.

– E você é uma feiticeira? – Ele perguntou.

– Não, ou talvez sim, eu não sei! Nunca acreditei em magia, mas talvez eu tenha feito pessoas se afastarem com o vento e talvez... Talvez eu tenha matado pessoas só por desejar... Como isso é possível? Eu não sei! Mas não quero morrer em uma fogueira – Tentei soar calma, bom, sem sucesso. Por que eu havia contado a verdade?

– Então és uma bruxa! – Ele exclamou, ignorando todo o resto. – Eu te guiarei em segurança bela moça, mas devemos nos apressar, a floresta é amigável até a noite chegar.

Ele pegou uma grande folha curvada como uma tigela de sopa e encheu de água, falando:

– O toque humano não pode retirar água do lago.

– Por que eu devo confiar em você? – Perguntei sem rodeios.

– Por que é sua única opção agora – Ele respondeu olhando-me intensamente.

Depois de abastecermos nossos cantis com água, começamos a andar mais para o sul, para os confins da floresta. Os confins floresta de Callergan são realmente impressionantes, milhões de cheiros diferentes e perfumados, flores de todas as cores, milhões de borboletas coloridas por toda parte.

O tempo todo Thomas me contou suas histórias na floresta, e eu atentamente escutei, sem ter certeza se eu precisava comentar algo sobre mim ou minhas aventuras; cujo número, contando com essa é um.

Thomas parece à vontade na floresta, ou pelo menos pareceu. De dia a floresta é amigável e de noite bem...

– O que foi isso? – Perguntei assustada, quase passando minha tocha acesa na cara de Thomas.

– Cuidado com isso! – Ele murmurou aborrecido – Devem ter sido os lobos, mas não se preocupe, eles não se aproximarão de nós enquanto o fogo estiver aceso.

As árvores farfalhavam como se quisessem dizer algo com urgência, o tempo todo parecia haver unhas arranhando pedras, olhos vermelhos por vezes circulavam na escuridão e constantemente havia um bater de asas próximo demais. Andamos por um longo tempo atentos e com medo, até que chegamos a uma pequena casinha de madeira.

– Eu construí esse abrigo há alguns anos, pernoitaremos aqui. É seguro. – Ele decretou.

Eu assenti com a cabeça, mas insegura. Eu vou passar a noite em uma casinha do tamanho de uma cabana com um homem que mal conheço? O que minha mãe diria se estivesse viva? Ao notar minha expressão ele acrescentou com as sobrancelhas erguidas:

– Preferes continuar andando noite adentro? Aqui ainda não é tão ruim... Mais adentro de Callergan é ainda pior.

– Não, mas... O que... O que iriam pensar se... – Minha voz foi morrendo.

Ele soltou uma grande risada.

– Preocupada com a sociedade? Tenho uma novidade para você: Não és mais parte dela! – Ele disse.

Abriu a porta da cabana acendendo os archotes que se encontravam ali dentro e voltou para acender uma fogueira ao lado de fora. Entrei enquanto isso e estendi minha manta em cima de um dos colchões de palha me perguntando como os animais não invadiam o abrigo enquanto estava vazio. Ele entrou já notando a pergunta em meus olhos, pois falou:

– Frederick me deu uma poção para jogar no terreno, isso mantêm os seres não humanos longe daqui.

– Esse é o nome do alquimista? Frederick? – Perguntei – Você trabalha para ele?

Ele me olhou como se estivesse admirado que alguém pudesse fazer tantas perguntas ao mesmo tempo.

– Correto, esse é o nome dele. E sim, pode-se dizer que eu trabalho para ele. – Ele deu de ombros tirando o colete de couro, o que me fez corar.

– Como é o nome dessa poção? Tem outros feiticeiros na torre? – Eu tenho mais milhões de perguntas em mente.

– O nome é proteum e sim, há vários deles. Uns vinte, eu presumo – Ele falou.

– Existem muitos? – Perguntei roucamente.

– Não tantos, presumo – Ele falou e acrescentou em voz baixa: – E certamente não tão atraentes...

Fingi não ter o ouvido. Não pareceu que era para eu ouvir.

– Claro – Murmurei e me deitei em meu colchão de palha.

– Boa noite Diana – Ele disse.

Eu emudeci, aproveitei o efeito que aquelas palavras causaram, eu nunca ouvi a voz de alguém com tanto prazer exceto de meu marido, que há tempos estava morto. Balancei a cabeça em negativa. É apenas um guia.

Acordei com o sol em meu rosto e pássaros cantavam em perfeita sintonia. A floresta é tão maravilhosa de dia, e tão horrorosa à noite. Como um lugar pode ser assim desse modo?

Thomas que já estava vestindo seu colete me jogou uma calça de couro de boi e um corpete branco, apontando botas.

– O que... ? – Tentei falar

– Vista-se – Ele me cortou a fala – Estarei esperando lá fora.

– Não espera que eu use isso certo? – Perguntei descrente – Mulheres não usam calça! E não vou andar por aí só de corpete!

– Se acha que poderia fugir ou lutar com seu vestido e sapatilha, fique à vontade – Ele deu de ombros. – Mais adentro é pior, eu te avisei.

– Eu não acho que poderia, mas... – Tentei falar novamente

– Então vista-se – Ele disse, mas ao notar que eu continuava inflexível completou: – Se precisarmos fugir e você ficar para trás, eu não vou hesitar em continuar fugindo.

Ele saiu e fechou a porta. Sim, ele me convenceu. Troquei as roupas e rasguei um pedaço do vestido para prender meu cabelo. Apesar de vergonhoso, é muito confortável ficar nesses trajes. No entanto eu estava ridícula neles.

Eu saí muito vermelha da cabana, falando:

– Eu estou ridícula! – Exclamei e ele riu – De quê precisaríamos fugir?

– Não posso listar tudo, se não, nunca chegaremos até a torre – Ele falou com simplicidade, como se, ora, fosse algo normal ter milhões de coisas do que ter medo e fugir. – E a propósito te achei encantadora.

– Desse jeito? – Perguntei com as sobrancelhas arqueadas.

– Desde que a vi – Ele falou sem saber da minha satisfação secreta por ouvir aquilo.

Começamos a andar e ele respondeu a cada uma de minhas perguntas. O alquimista protegia os bruxos e os ensinava o que eles precisavam saber.

– Então ele também é bruxo? O alquimista? – Perguntei

– Na verdade não, o sangue mágico é uma coisa muito seletiva e muitas vezes bruxos não descobrem seu poder – Ele falou e ao notar meu olhar interrogativo completou: – É que em algumas pessoas é preciso um trauma, choque, alegria, consternação e outros sentimentos fortes. Imagino que isso que aconteceu com você, não é?

– Trauma, choque, alegria, consternação e outros sentimentos fortes? Acho que não posso sentir tanto ao mesmo tempo. – Eu ri tentando evitar o assunto.

– Entendo que não queira falar – Ele disse.

– Quem disse que não quero? – Perguntei.

– Não precisa falar, posso entender sua expressão, mesmo que fique calada – Ele explicou de modo amável.

Pela primeira vez desde que começamos a caminhar desviamos o olhar um do outro. Eu comecei a olhar em volta e notei que as árvores estavam ficando cada vez maiores. Por isso falei:

– É minha impressão, ou as árvores estão...

– Ficando maiores? – Ele completou – Você ainda não viu nada.

– Vão aumentar? – Perguntei descrente.

– Ah se vão – Ele respondeu com um sorriso de lado. Tão lindo...

– Mas como... Como elas não são vistas no vilarejo? Ou elas não aumentam tanto? – Perguntei rápido, ansiosa para ouvi-lo explicar.

– Você vai ver – Ele sorriu. – És muito curiosa. Alguém já lhe disse?

– Acho que já ouvi – Eu ri.

Continuamos andando em direção ao sul por muito tempo e começamos a avistar um grande morro, sério enorme, perguntei por que não havia visto antes se era tão grande e ele apenas respondeu:

– Nenhum palpite? – Ele olhou irônico para mim.

– Magia? Sério? Um morro inteiro? Aliás, isso é... Só muito enorme! – Falei empolgada

– Bom isso é para o caso de algum humano que não saiba da existência da magia consiga chegar tão longe, mas isso é praticamente impossível, eles não iriam sobreviver á noite na floresta, nós podemos ficar quase sem descansar por ter uma taxa maior de energia. Eu não sou feiticeiro, mas tomei uma poção que me dá tal poder – Ele explicou.

– E há humanos que saibam da magia real? Não aquela que os faz queimarem os suspeitos de bruxaria? – Perguntei maravilhada.

– Não, eu sou um macaco, já te contei? – Ele brincou, mas logo depois explicou: – Eu e meu irmão Frederick achamos que somos os únicos por essa área, mas não sabemos quanto ao resto do mundo.

– Isso é... Puxa – Falei sem palavras.

– Esse é o ultimo adjetivo que esperei que usasse! – Ele riu, acompanhado por mim.

– Não sou muito previsível sou? – Falei sorrindo.

– Não, mas penso que gosto disso em você – Ele me respondeu com um leve sorriso

Chegamos até a frente do tal morro, já estava escurecendo, e deviam levar anos para subir aquilo, mas ele só indicou um alçapão.

– Para onde esse alçapão leva? – Perguntei curiosa

– Em linha reta é muito mais rápido, porém passaremos a noite no túnel, no terreno ao redor e acima tem a mesma poção que na cabana – Ele decretou.

Acendemos os archotes pregados nas paredes e estendemos nossas mantas ao chão. Eu tentei, mas eu não conseguia dormir com a sensação que aquele lugar poderia despencar a qualquer momento. Sentei-me apoiando minha cabeça em meus joelhos e abraçando minhas pernas.

– Não consegue dormir? – Thomas perguntou

– Medo de desmoronar – Dei um sorriso de lado – E você?

– Estava esperando você dormir primeiro – Ele falou.

– Ah, posso perguntar por quê? – Indaguei

– Creio que já esteja perguntando – Ele deu um sorriso para mim – Enquanto eu estiver a guiando é minha responsabilidade te proteger, somente isso.

– Então você está basicamente admitindo que há algo do que me proteger aqui embaixo? – Eu ri.

– Na verdade não há, mas é sempre bom saber se você já pegou no sono e não vai tentar subir sozinha para floresta, além disso, essa floresta te tira o sono quando você já viu muitas coisas nela.

– Conte-me sobre a floresta – Pedi

– Bom o que quer saber? – Ele perguntou cauteloso

– A história, o porquê de essa floresta ser tão mágica e ser o quartel-general de vocês... – Eu enumerei temas para ele começar

– Bem se você quer ouvir... Mas é uma história bem entediante em minha opinião – Ele deu de ombros, mas fez pose de contador de histórias em seguida e começou: – Há muito tempo, perto do povoado não mágico de Grayland, se ergueu um reino, mas não um reino qualquer! Era um reino mágico! Havia criaturas misteriosas por todos os lugares! Havia unicórnios, dragões e duendes. O rei Edward Callergan o governava, ele era um grande mago que se casou com uma humana alquimista. O reino era um lugar cheio de paz e alegria até que rei Callergan traiu sua esposa grávida, que o envenenou, mas em seu leito de morte ele se arrependeu e decidiu compartilhar o sangue mágico de suas veias com os seres não mágicos e realizou um encantamento que concedeu mágica a sua esposa e aos outros não mágicos merecedores em todo o mundo...

– Merecedores? – Eu perguntei sem entender

– Destinados a fazer algum bem com magia. Deixe-me continuar – Ele falou e retomou a pose, acrescentando: – Mas, no entanto o encantamento que o rei fez tirou parte da magia de todo o reino, e a rainha inexperiente teve sua criança, abandonou-a no reino e fugiu. O reino entrou em caos sem proteção. Os humanos invadiam a qualquer hora e a criança estava sendo criada por centauros, que viravam criaturas da noite quando o sol ia embora, sem mágica alguma. O menino cresceu e viu o reino cair aos poucos na escuridão, á noite os seres que de dia eram tão mágicos e tão belos se tornaram ameaçadores. O castelo entrou em ruína com os ataques noturnos, mas a família Callergan até hoje cuida das terras de Callergan.

Ele terminou com expressão sugestiva, como se eu devesse adivinhar algo, então eu acrescentei:

– E Frederick é o atual rei. Mas tu dissesses que ele não era mago! – Falei esperando mais explicações.

– E Frederick não é. O sangue real perdeu tua magia quando a compartilhou com o resto do mundo – Ele disse – Eu falei que era uma história entediante, ora não há final! – Ele disse como se aquilo o deixasse perplexo.

– Eu achei uma história memorável, se queres saber – Eu disse – E como ele se livrou das criaturas?

– Ele não se livrou, eu e Frederick colocamos a poção proteum nos terrenos da torre.

– E como começou a trabalhar para o Frederick? – Perguntei

– Ah, quanto a isto, és simples na verdade – Ele deu de ombros de modo desleixado. – Sou o irmão dele.

– Isso... Isso faz de você... – Falei entoando a pergunta em minha voz.

– Sim, herdeiro do reino de Callergan – Ele falou com desdém. – Não é grande coisa, quando não se tem sangue mágico.

– Isso não faz de você pior, olhe só para mim, eu nem tinha conhecimento de que era uma bruxa, e certamente não sou uma bruxa talentosa – Falei para encorajá-lo.

– E você ainda não me contou... O que influenciou seus poderes? – Ele perguntou. – Você sabe raiva e dentre essas coisas.

– Imagino que tenha sido medo e raiva – Me peguei contando a verdade. – Desde que meu marido morreu, as pessoas tem sido... Desagradáveis e eu só... Não consigo suportar a falta que ele faz.

Terminei com lágrimas nos olhos, falar dele sempre me deixava desse jeito. Senti o choque ao ver que Thomas me abraçava enquanto eu chorava, eu correspondi ao abraço, chorando cada vez mais, era como se cada lágrima que eu guardei todo esse tempo estivesse saindo.

– Vai ficar tudo bem, acredite – Ele disse. – Uma hora isso passa.

– Como você sabe? – Perguntei entre soluços.

– Meus pais morreram quando eu era pequeno, demorou, mas eu superei, irás superar também – Ele falou beijando o topo de minha cabeça.

Olhei para ele confusa, ele não havia mencionado os pais e minha confusão se misturou ao espanto pelo beijo em minha cabeça.

– Desculpe-me por isso – Ele murmurou e voltou para sua manta.

– Não se desculpe – Murmurei.

– Eu penso que sou um tanto quanto... Descontrolado...

– Não és – Respondi-o.

Ele se aproximou e afagou meu rosto. Então suspirou.

– Não entendo... És bela, tens cabelos loiros e esses lindos olhos nublados – Ele falou. – Por que não se casou novamente?

– Perdi a vontade de viver, depois que meu marido morreu – Esclareci.

– E agora? – Ele perguntou.

– Nunca senti que precisava estar viva, até agora – Falei.

– Devia dormir agora – Ele suspirou. – Amanhã será um longo dia.

Thomas voltou para sua manta e adormeceu deveras rápido, dormi em seguida.

Acordei aos poucos e ainda estava tudo escuro. Levantei assustada e olhei em volta, vi Thomas sentado rindo da minha reação.

– Ainda é madrugada? – Perguntei confusa.

– Não, é cedo da matina – Ele respondeu-me. – Estamos num túnel, esperava que fosse claro?

Ele se adiantou para saída

– Certo! Temos que ir – Falei com um súbito desejo de não estar tão bagunçada e mal cheirosa como eu pensava.

– Você não vem? – Perguntou ele por sobre o ombro. – Nossa você se arruma rápido!

Passei a mão por meus cabelos, de repente arrumados em uma trança e olhei meus trajes; que estavam limpos e cheirosos.

Dei de ombros e o segui. Para o lugar mais lindo eu já havia visto. Tudo explodia em milhões de cores, havia uma música animada em algum lugar ao longe, flores de milhões de tipos e em milhões de cores, fragrâncias diferentes percorriam o ar, borboletas circulavam no local e havia maçãs de aparência suculenta em arvores de flores brancas que pareciam tocar o céu.

Surpreendi-me ao ver fadas de todas as cores voando alvoroçadas para receber Thomas, ao que parece elas gostam muito da presença dele. Sorri para o lugar ao meu redor, cada vez mais empolgada.

Thomas disse para uma fada chamada Annabelle me mostrar seus dons com o que eu estava vestindo. A fada tocou em minhas roupas, que viraram um vestido de um delicado tom de azul. Olhei surpresa.

– Ela pode transfigurar o que quiser – Thomas explicou. – Cada fada tem seu dom.

– E por que minhas roupas? – Perguntei delicadamente.

– Vamos chegar ao castelo logo e imaginei que fosse querer estar apresentável – Ele explicou sorrindo. – Mas... Em minha opinião estava bem de todo jeito. Temos muito tempo antes do anoitecer! O que quer conhecer primeiro?

Eu sorri e apontei para uma ponte de pedras que parece estar flutuando ao invés de fixa, como deveria ser, e envolta por borboletas azuis.

Começamos andar para aquele lado e ele me contou sobre como as criaturas se transformavam a noite. Quanto mais mágicos, mais monstruosos e cruéis.

As borboletas começaram a posar em mim, coisa que me deixou paralisada. Que tipo de bicho aquelas lindas borboletas se transformavam a noite? Elas de repente se dissolveram e notei Thomas sorrindo.

– Sabe o que é interessante nessas borboletas espectrais? – Ele começou. – Elas concedem um dom a pessoas de quem elas gostam. Elas simplesmente passam a viver em nós, nesse nosso dom. Por isso elas somem desse modo em nossa pele.

– E como eu sei que dom é esse? – Perguntei.

– És simples. Essas mesmas borboletas aparecem espectralmente ao seu redor, enquanto usa seu dom – Ele explicou.

Chegamos a um rio, onde as arvores ao redor eram tão grandes que nós, as pontes, as luzes mágicas que flutuavam em alguns lugares, tudo isso parecia pequeno. Havia fadas cantando uma bela canção em um ninho perto da primeira ponte, puxei Thomas até lá para que pudéssemos assisti-las. Era uma musica animada e simples até que elas nos viram e nos lançando risadinhas começaram uma canção lenta e linda.

Fechei os olhos absorvendo a música, até que, muito delicadamente Thomas me puxou e perguntou se eu gostaria de dançar com ele. Dei um grande sorriso para ele e fiz que sim com a cabeça.

Começamos a valsear olhando um para o outro com intensidade, até que a música acabou e as fadas foram embora às risadinhas. Continuamos parados em posição de valsa nos encarando sorrindo.

– Você dança bem – Ele me elogiou.

– Você também não é nada mal – Sorri para ele.

– Nada mal? – Ele perguntou rindo e se aproximando falou: – És a parceira que estive procurando.

Em resposta eu apenas ri com ele. Ele me puxou de modo delicado até uma escada ali perto e me ajudou a subir, havia vários andares na construção de madeira. Sentamos na borda e olhamos para as arvores altas, fazem você sentir-se tão pequeno.

Continuei olhando para cima, até que senti Thomas me encarando.

– O que foi? – Perguntei corando.

– Você parece mais calma aqui, quase como se estivesse em sintonia – Ele respondeu com um leve sorriso nos lábios.

Olhei para ele e constatei:

– Já você só parece... Em casa – Sorri.

– E isso é bom? – Ele perguntou rindo.

– É ótimo – Respondi-o alegremente. – É você... É só... Maravilhoso.

Ele se levantou e me ofereceu a mão como suporte. Levantei-me com a ajuda dele corei, pois ao tropeçar na barra do vestido eu quase caí e tive que me agarrar nele para que isso não acontecesse.

– Desculpe-me! Perdoe meus modos desastrados – Pedi.

– Não tem problema – Ele deu de ombros. – Essas coisas de modos nunca funcionaram para mim.

Ele me ajudou a descer e conforme andávamos, vi grandes olhos azuis faiscarem dentro do lago. Aproximei-me lentamente e estendi a mão, que a ninfa tocou levemente com graça. Olhei para minha mão, havia uma marca onde ela tocou. Era um desenho de uma lua e um sol se fundindo.

Deixei que a ninfa tocasse meus cabelos como ela pediu, ela pareceu gostar dos meus cachos loiros. Olhei para Thomas, que me olhava com intensidade.

– Isso tudo é tão... Perfeito – Exclamei maravilhada.

– Acho que ela gostou de teus cachos... São lindos – Ele disse colocando uma mecha no lugar.

– E eu gostei de tudo aqui – Falei sorrindo. – É magnífico!

– Até que a noite chegue – Ele disse olhando para o céu. – E pelos meus cálculos é hora de irmos.

Ele estalou a língua e um unicórnio negro, veio ao nosso encontro. Soltei uma exclamação de surpresa, e ele me olhou com uma expressão um tanto quanto divertida.

– Achei que só havia unicórnios brancos – Falei.

– Bom não é assim aqui – Ele respondeu-me. – Nada aqui é igual, é tudo especial, assim como tu és.

Ele montou e estendeu sua mão para mim, montei atrás dele e me segurei no mesmo corando. A sensação de tocar nele é maravilhosa e tenho medo do por que disso. O amor não funciona para mim...

– Então me conte uma coisa, como um reino tão magnifico pode ficar sombrio à noite? Não me parece... Correto. – Falei franzindo a minha expressão.

– Todo lugar tem seus defeitos, o defeito de Callergan é esse. As maravilhas caem à noite, isso é verdade, porém o reino é nosso lar. Mesmo as criaturas se tornando sombrias e por vezes maldosas, nunca matariam nenhuma delas. Lembre-se, os erros da família, não saem da família – Ele discursou informalmente. – E você é da família agora.

– Me considera da família? – Sorri encantada.

– Com minhas vantagens, imagino – Ele respondeu.

Notei que já havia começado a escurecer, e devíamos ir. Falei isso a ele, e começamos a cavalgar em uma velocidade incrível. Era como se voássemos. Mas de repente, simplesmente paramos. Havia uma arvore caída no caminho, uma daquelas gigantes.

O céu estava ficando cada vez mais escuro, e Thomas olhou para mim desesperado, havia suplica em seus olhos.

– Você pode fazer! Tente por favor! – Ele pediu-me.

– O que eu devo fazer? – Perguntei, sem saber o que ele desejava.

Eu farei tudo por ele. Eu o amo. Nada estava mais claro para mim.

– Somente precisa desejar que a árvore saia do caminho, ou desejar nós estivéssemos na torre do alquimista – Ele suplicou a mim.

Olhei para árvore com toda a força que eu podia e desejei o caminho livre, mas foi em vão nada aconteceu. Desejei que estivéssemos na torre do alquimista como o Thomas suplicou, mas continuamos ali. E de repente a noite apenas chegou.

Um brilho intenso saiu da floresta e só virou uma poeira grossa transformando as criaturas ao nosso redor, as fadas ficaram cada vez mais vermelhas até parecerem estar em chamas, mas sem se queimar.

Olhei para o lago, e mesmo daqui eu podia ver grandes criaturas se movendo de dentro para fora da água. Criaturas cada vez mais agourentas se alongavam em torno de nós. Olhei para Thomas perguntando o que fazer, eles vinham por todos os lados.

A resposta estava clara nos olhos dele. Nada, não havia nada o que se fazer. Encolhi-me cada vez mais contra o tronco e fechei os olhos. Não pode acabar desse jeito.

Caí de costas no chão arregalando os olhos. O tronco havia simplesmente desaparecido. Thomas me ajudou a levantar e começou a correr ao meu lado. Senti Thomas sumir do meu lado. Uma criatura de porte grande com aparência réptil e feroz estava atacando ele. Ouvi um grito de não escapar de meus lábios e corri até ele. E de algum modo a criatura recuou ao meu olhar.

Varias criaturas chegavam mais perto e Thomas não conseguia ficar de pé.

– Vá! – Ele gritou. – Por favor, corra!

– Eu não vou deixa-lo aqui – Falei, finalmente o erguendo, apoiado em meus ombros.

Tentei continuar correndo, mas o peso de Thomas não permitia. Cada vez mais próximos de nós. Senti Thomas tentar correr, mas sem sucesso.

– Não há nenhum abrigo? – Gritei ainda tentando correr com Thomas apoiado em meus ombros.

– Não! – Ele falou me alertando que deveria me calar, com o olhar.

– Como sugere que escapemos então? – Gritei enraivecida.

– Se me largar e seguir nessa direção... Você vai encontrar a torre! Ouça-me! Eu vou ficar bem! – Ele falou para mim.

– Eu não posso te largar! Eu sei que você não vai ficar bem! – As lágrimas começaram a descer cada vez mais grossas pelo meu rosto. – Não posso deixar-te.

– E eu não posso pedir para você morrer por mim – Ele falou fracamente. – Somente... Vá...

Ele largou meu pescoço ficando para trás. Virei-me sem acreditar. As criaturas avançaram nele.

– Não! Afastem-se! Por favor! – Gritei entre lágrimas.

– Vai! – Ouvi ele gritar.

– Eu não posso – Gritei entre lágrimas. – És meu sonho agora.

Notei uma criatura atacar o coração dele.

– Por favor! – Gritei. – Por favor!

As criaturas estavam distraídas demais com ele para atacar-me.

– Me matem! Por favor! – Gritei impotente. – Não o matem!

Minhas lágrimas continuavam a rolar e nada mudou. As criaturas somente avançavam.

– Por favor – Sussurrei. – Eu o amo.

Notei um grito de dor de Thomas.

– Não! – O grito que eu dei ecoou.

Foi como se todo o mundo parasse de repente, uma grande onda espectral perpassou ao redor de tudo. Um brilho ofuscante e roxo, quase me cegou e caí ao chão para proteger-me do que quer que esteja havendo. Aquilo me deu esperança. Não sei por quê.

Virei-me para onde estava Thomas ainda chorando. Ele estava cercado por várias criaturas do dia. As criaturas noturnas haviam simplesmente... Desaparecido. Eu consegui! Fiz as coisas voltarem ao normal!

Corri ao encontro de Thomas com lágrimas nos olhos. Ele está tão ferido!

– Eu o amo – Sussurrei.

– Tu és minha vida agora – Ouvi-o sussurrar de volta. – E eu a amo.

– Como posso ter sido capaz de... De tudo isso? – Perguntei-o.

– Foi o seu amor... E somente isto – Ele me respondeu e em seguida gemeu de dor.

Coloquei minhas mãos nos ferimentos dele. Se meus poderes funcionaram antes eles tem que funcionar agora. Por favor! Ele vai morrer se eu não o curar. Eu o amo. Por favor.

Abri meus olhos para um brilho dourado, que circundava Thomas. Thomas sorria para mim.

– Você conseguiu! – Ele exclamou. – Realmente conseguiu!

– Eu tinha uma razão para conseguir – Falei sorrindo para ele.

Notei os olhos dele se abrirem cada vez mais e então um beijo.

Doce e perfeito. Simples e maravilhoso. Thomas e eu.

– Case-se comigo – Ele disse ao se afastar.

– Felizes para sempre? – Falei entre lágrimas.

– Para todo o sempre.


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Notas finais do capítulo

When you're with me

The skies will be blue

For all my life

— Simple Plan

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Reviews? Comentem sobre o que acharam vai haha XD

xoxo

PS: lembrem, esse é o único capítulo dessa FIC!



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