[Mikoto]

Não era preciso muito esforço para perceber que Sakura Haruno estava subindo as escadas. Os seus gritos ecoavam pelos corredores, alcançando até mesmo a sala do Hokage, onde Mikoto se encontrava sentada em silêncio. Se sentia ansiosa, incapaz de imaginar exatamente como aquela cena se desenvolveria. 

Por quatro anos ficou longe daquelas pessoas, e agora elas estavam aqui. Teria de voltar a viver com elas, acordar todos os dias e olhá-los, mesmo depois de tudo.

"Sua mãe é definitivamente uma peça rara." Naruto comenta, e o que realmente quis dizer é ela é desequilibrada. Quando Sakura abre a porta, sem nem mesmo ser anunciada, só o que Mikoto pode fazer é virar o rosto para olhá-la. 

"Mikoto."

Não havia uma expressão definida para fazer. Mikoto permaneceu calada, apenas olhando para a mãe, e foi apenas quando Sasuke surgiu atrás da mulher que ela se levantou. O impulso era de raiva, embora ela tenha disfarçado bem. Continuou parada, esperando que eles tomassem a iniciativa, e Sakura logo o fez. Atravessou a sala na sua direção, abraçando-a. O corpo de Mikoto não retribuiu o gesto, embora ela tenha deixado uma ou duas lágrimas caírem. 

"Minha filha, meu bebê" Ela repetia, chorando contra o seu ombro. Mikoto olhou por cima dela na direção de Sasuke, ainda posicionado ao batente da porta. O rosto dele carregava uma expressão indecifrável. 

"Me desculpe, meu amor, me desculpe. Eu sinto tanto por não ter ficado com você, querida... tanto..."

É um pouco tarde para arrependimentos, Mikoto pensou, sem externar o comentário. 

"Senti sua falta." Mikoto conseguiu dizer. A frase lhe foi um golpe no orgulho. Estava com raiva daquelas pessoas, mais raiva do que imaginou que sentiria quando os reencontrasse. Se aquela mulher a amasse de verdade, se sentisse muito, teria feito mais no passado. Só o que ela tinha agora era culpa, uma culpa enorme. 

Sakura se afastou dela depois de algum tempo, depois de receber um toque de Sasuke no ombro. Era um pedido mudo de que ela desse espaço à filha, espaço aos dois. O olhar que trocaram foi frio, muito pouco familiar. Havia muita mágoa entre os dois ainda. 

"Ela não está linda, Sasuke?" Sakura incentivou a interação. Seus olhos ainda estavam cheios de lágrimas. "Tão linda."

Sasuke não a abraçou, e tampouco tentou iniciar alguma conversa. Ela não sabia dizer o que estava passando na cabeça dele, e, quando formulou um palpite, ele a puxou para perto, a abraçando também. Por isso ela não esperava. O estômago dela se revirou, as lembranças voltando como flashes. Poucos dias antes da sua partida e ele havia dito que ela não mais poderia chamá-lo de pai. 

Ela não o faria nunca mais. 

"Onde você esteve todo esse tempo?" Foi o que ele perguntou. 

Mikoto já sabia o que tinha de dizer, o que Itachi pediu que ela dissesse. Estava preparada para contar a sua história, e ela teria de soar verdadeira. Antes que ela pudesse iniciá-la, uma segunda voz interrompeu a conversa. A porta se abriu outra vez com violência, causando um estrondo, e Minato Uzumaki entrou na sala esbaforido, apoiando as mãos nas coxas para se recuperar. 

"Você" Ele disse, respirando com dificuldade. "Você voltou."

"Chegou numa hora ótima." Mikoto respondeu, virando-se para o Hokage em seguida. "Vou explicar o que aconteceu."

[Minato]

"Eu fugi." Ela disse simplesmente. "Tinha que sair desse lugar."

"E ficou quatro anos por ai?" Naruto perguntou, soando muito pouco convencido da informação. "Sozinha?"

"Fui muito pouco compreensiva com meus pais, acho. Tive a impressão de que não me queriam, eles estavam brigando entre eles, brigando comigo, e quando a Sakura... quer dizer, a okaa-san foi embora, achei que era algum tipo de rejeição. Então teve a graduação, e nenhum dos dois foi me ver."

"Ai você foi embora." Naruto murmurou. "Como escapou das equipes de busca? Nem ao menos havia algum rastro seu."

"Durante certo tempo fui cuidadosa. Em determinado momento me arrependi, quis voltar. Nunca tinha ficado sozinha daquele jeito, sozinha de verdade. 

Minato analisou os outros presentes na sala. Sakura e Sasuke se entreolhavam com frequência, provavelmente cientes do erro deles como pais, e Naruto mantinha a expressão neutra, quase avaliativa. Era esquisito ver seu pai tão focado, mas ele gostava disso. O fazia parecer admirável aos seus olhos. 

"Ai conheci pessoas. Dois, para ser mais precisa. Um homem e uma mulher. Eles me ensinaram o que sabiam, e até o que não sabiam. Eu sabia que não devia confiar tão cegamente em desconhecidos, mas eles eram um casal mais ou menos da idade dos meus pais e bom, eu não achei que ninguém me receberia se eu retornasse."

"Um casal." Naruto repetiu, trocando um olhar significativo com Sasuke. "Os vigias disseram que chegou afobada, como se estivesse fugindo de alguém. Estava fugindo deles, por acaso?"

"As coisas começaram a ficar estranhas. Eles me pediam para fazer coisas, entregar mensagens, pacotes. Não achei que fosse nada demais, mas também não podia perguntar a respeito. Eles me deram comida, casa, achei que me manter surda e cega seria razoável diante disso. Só que numa dessas idas... alguém acabou morrendo."

"Morrendo ou sendo morto?" Naruto especificou. 

Mikoto fez uma cara de choro, abraçando o próprio corpo. Vendo a sua aflição Sakura se aproximou dela, afagando seus cabelos longos. 

"Eles o mataram. Não entendi o motivo, não era ele o alvo inicial deles. O grupo era grande, e alguém importante estava sendo protegido ali. Mas não foi o homem importante quem morreu."

"Mais alguém morreu, Mikoto?" Sasuke quis saber, e o seu interesse repentino fez com que Minato se lembrasse do dia em que retornara da missão, quando o Uchiha afirmou que duas pessoas haviam sido mortas recentemente. A descrição claramente batia com esse casal. 

"Um outro. Não era importante, mas tinha um negócio. Acho que faziam contrabando com ele."

"São os que estamos procurando." Naruto expõe, suspirando pesadamente. "Você estava fugindo deles, é isso?"

"Estava. Eles perceberam que estavam sendo rastreados, e se distraíram um com o outro. Estavam discutindo muito sobre para onde iríamos agora. Aproveitei a oportunidade para fugir."

"E ai decidiu voltar para casa." Naruto pontuou. "Mesmo não tendo considerado isso durante quatro anos."

"Para onde mais eu iria?" Ela perguntou a ele. Seu tom era irritado, quase feroz. Sakura dirigiu um olhar repreendedor à Naruto, e ele logo tratou de se desculpar: 

"Não quis dizer que não poderia, só achei estranho. Você soou muito magoada quando contou tudo isso."

"Esse assunto não cabe à você, Naruto."

O corte partiu de Sakura. Esse era de fato um assunto pessoal, algo a ser discutido dentro de casa e não na frente de todos. Seria humilhante para a família, e nós não tínhamos o direito de julgá-los por nada disso. 

"Agora que ela já esclareceu o que houve, nada mais justo do que voltar para casa. A menos que você tenha alguma objeção a respeito do retorno dela, e espero sinceramente que não tenha. Vivi todo esse tempo para vê-la aqui outra vez, e nem mesmo você vai tirar esse momento de mim."

A Haruno era corajosa, Minato tinha de admitir. Ela guiou a filha para fora do escritório, e Minato as assistiu se afastarem com os olhos, imaginando se teria alguma chance no futuro de conversar com aquela garota. Seria ela do mesmo jeito que ele se lembrava? 

Deixaram a sala, mas Sasuke Uchiha ali permaneceu. A expressão era séria, quase vazia. Sua presença indicava que ele ainda tinha algo a resolver ali, e Minato se perguntou o que era. 

"Pensar na hipótese de que ela está mentindo não me agrada." Naruto disse, levantando-se da cadeira pela primeira vez. "Você é o pai dela, então peço que fique de olho no comportamento. Se notar algo estranho, relate."

"O que ela disse... as pessoas com quem ela esteve esses anos são assassinos." Sasuke comentou, mais para si mesmo do que para qualquer outro na sala. Nem mesmo aguardou uma resposta. "Isso não te faz pensar que tipo de pessoa ela é agora?"

Naruto observa o amigo; o semblante preocupado. "Qualquer um que não aparece por anos se torna um desconhecido, Sasuke. Não a rejeite como fez anos atrás, isso só vai piorar as coisas. Devia mantê-la bem perto, e tirar você mesmo essas dúvidas."

"Ela me odeia." Ele afirmou, embora todo mundo naquela sala já soubesse disso. Estava nos olhos dela, e estava nas memórias dos dois. 

"Ainda dá tempo de reverter isso."

Sasuke deixou o escritório um tempo depois, e pai e filho ficaram a sós, em silêncio por alguns minutos. 

"Ele está desconfiado demais. É a filha dele."

"Ele já foi como ela, e é por isso que tem medo. Mas sempre é possível que ela esteja sendo sincera, e tenha passado por muitas coisas ruins. Nesse caso, ele precisa ainda mais ficar perto."