The Library escrita por themuggleriddle


Capítulo 2
o fantasma da ópera




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***

Quem conhecesse Septimus Malfoy dentro do Ministério da Magia conheceria um bruxo sério e elegante que estava sempre presente nas reuniões do Wizengamot, sempre quieto, observando tudo de seu lugar perto do Ministro Daileigh com um rosto impassível. Caso estivesse nas graças de meu pai, conheceria um bruxo generoso que lhe concederia inúmeros favores para que você subisse nos rankings dos Ministérios, caso contrário... Bom, conheceria apenas o rosto sem expressão e as decisões não tão justas que ele tomava como parte da corte. Mas, independentemente de ser querido ou não por ele, ninguém do Ministério conhecia o Septimus Malfoy que se escondia nos quartos e corredores da Mansão Malfoy.

Diferente do que muitos acreditavam, o casamento de meus pais não fora fruto de um arranjo entre famílias. É claro que os Rosier e os Malfoy ficaram muito felizes quando seus herdeiros decidiram unir as duas famílias, mas essa junção fora feita por livre e espontânea vontade dos jovens Septimus e Ophelia, o que, para a nossa sociedade tradicional, é algo raro.

Mas o que juntou duas pessoas de famílias tradicionais se não o desejo de perpetuar a pureza do sangue? Acredito que foi o amor por coisas bonitas. Sim, papai e mamãe sempre tiveram um grande apreço por coisas belas. Não é a toa que nossa casa está entre as mais belas das famílias puras. Os Black podem muito bem ter a sua residência em um local estratégico no meio de Londres, mas a casa dessa nobre e antiga família nunca poderá ultrapassar o esplendor de nossa mansão. Os Black usam sua elegância e pureza de uma maneira sutil, escondendo-se no meio de um local trouxa, tudo pequeno e tímido, por mais extravagantes que os Black pudessem ser. Os Malfoy, por outro lado, tinham um certo gosto pela extravagância: se nós tínhamos o poder e o dinheiro para tal, por que não poderíamos nos rodear de coisas bonitas que refletissem a nossa família?

Mas, como estava explicando, meu pai e seu gosto por coisas bonitas foi o que o levou à se casar com minha mãe. E vice versa. Até quando nasci, essa fascinação por coisas rebuscadas estava presente, afinal, não é todo mundo que arrisca nomear o filho de Abraxas. Demorei anos para entender a razão de ter aquele nome e, apesar de seus inúmeros significados – o demônio, o a mariposa e o Deus maior -, acabei descobrindo que a única razão de ter ganhado esse nome fora a sua sonoridade e peculiaridade. Você não vai encontrar outro Abraxas em qualquer lugar do mundo. Pura beleza e extravagância por parte de meus pais.

Ainda assim, entre o Sr. e a Sra. Malfoy, meu pai ainda era o que ganhava no quesito de apreciação de coisas belas. Desde que me lembro por gente, a associação entre a imagem de meu pai e belas pinturas imóveis é algo que me vem naturalmente à cabeça. Mamãe ainda reclamava de tais pinturas... Coisas sem graça e estáticas, olhares fixos e vazios que nunca nos retribuíam algum sentimento, como ela diria. Mas acredito que entenda o ponto de vista de papai. Aqueles quadros com os quais ele enchera a nossa casa eram únicos à sua maneira. Eles não se mexiam, não falavam e seus olhares eram, de certa forma, fixos. Mas eles não eram sem graça e, muito menos, vazios.

Papai dizia que toda obra de arte que trazia para casa tinha o seu valor. Fosse o retrato de algum bruxo que vivera séculos antes e que agora resmungava com todos os que passavam na sua frente ou uma pintura com uma mulher trouxa desconhecida com sorriso misterioso e olhos calmos. Talvez isso fosse levemente hipócrita vindo de alguém que desdenhava daqueles cujo sangue não era inteiramente puro, mas, ainda assim, fora como eu aprendi a ver a vida.

De certa forma, o amor de meu pai por pinturas, fossem elas mágicas ou não, foi o que me instigou a apreciar a arte trouxa. Septimus Malfoy nunca admitiria isso, mas era óbvio que ele tinha um carinho quase maior por arte trouxa do que pela bruxa. E esse carinho – que, aliás, era muito bem escondido dos olhos de seus colegas do Ministério – acabou por me fazer perceber o quanto os trouxas tinham a mais quando se tratava de arte, apesar de que tal realização ficou por muito tempo confinada dentro de mim mesmo, esperando alguma coisa que a acordasse, tornasse-a visível. Isso só veio alguns anos mais tarde.

Com o passar dos anos, papai escondera tal amor ainda mais. A medida que subia no Ministério, as visitas à nossa casa aumentavam e os quadros trouxas iam sendo colocados de lado, escondidos dos olhos dos bruxos e bruxas tradicionalistas que apenas ririam e comentariam sobre como tais obras não se comparavam com à de nossa gente. Com o passar dos anos, seu rosto foi se tornando cada vez mais impassível ao ponto de se permitir ser ele mesmo quando tivesse certeza de que estava apenas na companhia de minha mãe. Essa mudança em meu pai sempre me fizera prometer a mim mesmo não fazer tal coisa: eu era um dos herdeiros mais ricos da sociedade bruxa e a última coisa que poderia me incomodar seriam as opiniões intrometidas daqueles que me rodeavam.

Mas papai não era assim. Papai era todo trabalho e responsabilidades. Papai era todo favores à outros bruxos. Papai era o Ministério, mesmo não sendo o Ministro. Sendo assim, Septimus Weasley envelheceu para ser mais um dos bruxos seniores do Ministério da Magia, tão focado em sua pureza de sangue e na imagem que sua família passava que todo seu apreço pela vida e beleza pareceu se esvanecer. Os pequenos fiapos de tais traços, que eu sempre tanto admirara, remanesceram nos quadros que ele ainda guardava em casa: a moça de sorriso misterioso; a corte do deus Pan; o quadro de um  bebê em uma manjedoura, cercado de anjos e pessoas; as moças se trocando em um celeiro... Em algum canto dessas obras estava o que restara do Septimus Malfoy que eu tivera o prazer de conhecer e a felicidade de chamar de pai.

Esses quadros permaneceram em nossa casa, encarando tudo e todos pelos cantos da Mansão Malfoy, como fantasmas que se esgueiram pelas sombras, ouvindo todos os sussurros e vendo todas as ações. E ter os quadros nos olhando era como ter meu pai fazendo tal coisa, afinal, eles eram Septimus e Septimus era eles. Colecionar aquelas obras de arte fora um trabalho de uma vida inteira e cada pintura tinha um pouco dele em si. Logo, quando aqueles olhos fixos nos encaravam, eram os olhos de meu pai misturado com os do artista.

Ainda me lembro de uma das últimas obras que papai comprou. Fora vendida por um senhor trouxa de Londres que acreditava que o Sr. Malfoy era apenas mais um colecionador excêntrico e que cobrara um preço absurdo... Bom, absurdo para qualquer um que não fosse um Malfoy. De acordo com o vendedor, a artista havia sido uma jovem trouxa que o havia pintado ainda no início do século. Não era famosa, mas com uma mão extraordinariamente delicada para detalhes, e ficara desgostosa com o resultado final do quadro, por isso, o vendeu. De fato, tal delicadeza era evidente nos detalhes mínimos daquele palácio enorme que era exposto na pintura. Todas as estátuas e janelas bem definidas, todos os relevos das colunas, as sombras nas paredes esverdeadas, o reflexo nos detalhes em dourado... O vendedor nos dissera que aquela era uma imagem complicada, detalhada demais, de algum palácio russo ou algo parecido. Uma imagem que, naquela época, já não existia mais, não com aquela beleza, desde que os comunistas tomaram conta do país. Eu não sabia o que eram comunistas, mas não pude deixar de odiá-los um pouco por terem acabado com algo tão belo. Ao menos as mãos delicadas de alguma artista inglesa conseguiram capturá-la com extrema perfeição e, agora, ela estava em nossa casa, eternizada em uma parede.

Quando Septimus Malfoy morreu, minha mãe quis se livrar de todas as obras que ele colecionara por tanto tempo, argumentando que elas a lembravam de seu falecido marido e que aquilo a matava por dentro. Até a morte de mamãe, a maioria dos quadros ficaram guardados, ficando apenas um ou outro em meu escritório na mansão – a moça do sorriso sutil e o palácio detalhado entre eles. Quando herdei por completo a propriedade de nossa família, deixei-os ver a luz do dia novamente, contra a vontade de minha esposa, que compartilhava da opinião de minha mãe sobre a falta de vida dos quadros.

Meu pai fora, sem dúvida, quem me ensinou a apreciar a beleza e, por isso, lhe sou eternamente grato. No início, esse ensinamento era aberto, exposto, cada vez que ele chegava, radiante, em casa, com um quadro debaixo do braço, falando sobre o que ele significava e quem o pintara... Como Christine, a parcela exposta da beleza e poder da música na Ópera Garnier de Paris. Mais tarde, no entanto, ele se tornara quieto e recluso, escondido nos cantos escuros de nossa casa, prendendo-se nos quadros antigos e nos olhares lentos e nostálgicos que meu pai lançava para sua coleção, assim como o Fantasma que se esgueirava pelos corredores da Ópera em silêncio e envolto pela escuridão, mas que, ainda assim, dera vida à música exposta e bela de sua pupila.

Independente de se tratar da cantora ou do Fantasma, meu pai tivera esse papel em minha vida, o papel de me mostrar o quão interessante e saudável é apreciar essas coisas belas. O papel de me ensinar a olhar para algo relativamente simples e ver algo bonito. O papel de me ensinar a reconhecer um potencial em tudo e todos, mesmo que isso fosse, de certa forma, contra as crenças não só de nossa família, mas de toda a nossa sociedade tradicionalista.


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Notas finais do capítulo

1- OS QUADROS DO SR. MALFOY: a maioria dos que eu descrevi ai são quadros que foram considerados "perdidos" ao longo da história. Infelizmente eu esqueci de anotar o nome deles, é, agora não me lembro os artistas e o nome dos quadros ): Só o quadro da "mulher trouxa desconhecida com um sorriso misterioso e olhos calmos" seria aquela réplica da Mona Lisa que fora restaurada ano passado/retrasado, não me lembro bem ( http://blog.icuonlineweb.tv/wp-content/uploads/2012/02/monaLisaDouble.jpg ).
2- O QUADRO DO PALÁCIO RUSSO: isso é meio que uma intertextualidade com outra fic minha, "Zimniy Dvorets", que mostra como o Sr. e a Sra. Riddle (avós do Voldemort) se conheceram. Esse encontro dos dois envolve um quadro do Palácio de Inverno de São Petesburgo, que teria sido pintado pela Sra. Riddle, e desdenhado pelo Sr. Riddle. Eles se detestaram por meio segundo antes de se apaixonarem -Q :33
3- ABRAXAS: o nome Abraxas pode ter tido diversas origens, como o Brax falou... Ele é o nome de um demônio, o nome de uma mariposa (Abraxas pantaria, uma mariposa branca) e também signifca algo tipo "o Deus maior"/"o Deus supremo".
4- OPERA GARNIER, CHRISTINE, FANTASMA: obviamente referência ao "Fantasma da Ópera" do Gaston Leroux.
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Então, aqui temos a história propriamente dita, narrado pelo querido Abraxas Malfoy. No prólogo ele explica para o Lucius que cada livro o lembrava de alguém, aqui ele vai mostrando isso. Esse aqui foi com "O Fantasma da Ópera" do Gaston Leroux, cuja leitura eu recomendo muito, principalmente se vocês já viram o filme/musical, porque é beeeem diferente. A base é a mesma, mas a atmosfera é diferente, não sei explicar. Para começar, o Fantasma não tem nariz e parece um esqueleto (Voldemort? Nope, o Erik é pior que o Voldemort na aparência)... Então, é.
De novo, digam o que acharam :33



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