O Mapa Cor-de-Rosa escrita por Melanie Blair


Capítulo 18
China


Notas iniciais do capítulo

Desculpem a demora e não andar a responder aos comentários. Tratarei disso assim que puder.
Música do capítulo:http://www.youtube.com/watch?v=ORz6cOa-Lfs



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Cuspi, de novo, o conteúdo nojento derivado da misturada de água e sangue que continuava a formar-se na minha boca.

Já incapaz de aguentar mais uma tontura, deitei-me no chão da suja, mas fresca, casa de banho. Nem me importei com a quantidade anormal de bactérias debaixo do meu traseiro.

A frescura do azulejo era realmente agradável contra o meu corpo ainda quente devido à adrenalina. Mas, infelizmente, não curava todos os meus males. O meu corte labial não parecia querer estancar, sujando o “uniforme” branco da prisão. Inesperadamente, não me doía. Porém, acho que preferia sentir dor.

Mesmo pronta a desmaiar como estava, conseguia sentir…ou bem…nem sentia nada. Era como se me estivesse sido injectada uma anestesia na cara. Não conseguia mexer nenhum músculo facial a não ser os olhos (acho que não são músculos, por isso não contam). Sem dor, era apenas o toque que me fazia perceber que o lábio estava, continuamente e sem desejo de parar, a inchar.

“Quem me dera sentir dor!”, pensei. Se houvesse algum tipo de dor, eu sairia do irreal, deste pesadelo e acordaria na minha cama, ao lado de um sonolento Christian.

Com este pensamento, fechei os olhos.

Assim que a minha consciência voltou, e antes de abrir os olhos, cruzei os dedos, esperando que desta vez resultasse. Rezei uma rápida prece e, sem mais demoras, abri os olhos.

“Poças!”, protestei, quando me dei conta que o cruzar os dedos, mais uma vez, não tinha dado resultado. Pois… Nem cama, nem sono, nem Christian em lado algum. Apenas um lavatório ferrugento, um sanita usada e um azulejo branco, com uma espécie de cadáver por cima, à espera que o tecto se abatesse em cima dele. Mas o tecto permanecia no mesmo lugar… E eu ainda ali estava, com um lábio ensanguentado, a inchar.

Com a coragem que nem sabia que tinha, levantei-me e, sem entusiasmo, olhei o espelho. Estava pálida. Acho que esse era o que mais sobressaía do reflexo. Os cabelos longos negros perderam o brilho. Os lábios antes encarnados estavam agora hipotérmicos, saídos de uma câmara de gelo. O corte localizado no lábio inferior parecia trazer todo o calor do meu calor para fora, tornando-se inútil. A cena lembrava-me um vulcão em erupção.

Convencida a parar a erupção, envolvi a única toalha presente nas mãos.

- Se eu fosse a ti, não faria isso.- ouvi uma voz recomendar-me, quando ia usar a toalha para sarar a ferida.

Fitei a moça, que se apoiava à ombreira da porta. Assim que a reconheci, arrumei a toalha e perguntei-lhe:

- O que farias tu então?

A moça desencostou-se e aproximou-se.

- Por aqui não há muitas opções.- começou ela.- Mas suponho que utilizar a manga da t-shirt seja mais seguro que limpares a uma toalha que já tocou em vários genitais.

“Que nojo!”, pensei, enquanto lavava as mãos. Jurei a mim mesma que continuaria a lavá-las até ter feridas na palma, derivadas do sabão. Até ter a certeza que não apanharia nenhuma doença. Assim que o sabão começou a magoar-me, a rapariga estendeu a mão e apresentou-se:

- Eu sou a Lynn.

Lynn era asiática. Aspecto óbvio quando observávamos, com atenção, os seus olhos. Tinha cabelos pretos lisos que não ultrapassavam, por muito, os ombros. Os olhos competiam com o negro do cabelo e, certamente, não perdiam.

Apertei-lhe a mão, que já se começava a cansar.

- Obrigada pelo conselho, Lynn.- agradeci e comecei a sair do compartimento.

- Normalmente quando alguém se apresenta, a outra pessoa faz o mesmo.- comentou ela, insatisfeita e indignada.

Fitei-a, chateada.

- Normalmente,- comecei.- só me apresento às pessoas que merecem conhecer-me.

Lynn, ao ouvir-me, espantou-se. As suas sobrancelhas finas uniram-se, como se se questionassem acerca do significado das minhas palavras. Decidi ajudá-la e esclareci-a:

- Não fizeste nada.

** Esmeralda’s Flashback**

Era intervalo. De novo. Estava farta. Estava farta de intervalos.

Não andava propriamente a contar as horas que passavam. Nem os minutos. Isso daria demasiado trabalho. Passava maior parte do tempo a ritmar tempos, através de cada dedo, de cada unha. Cada um no seu ritmo e preciso lugar. A seguir, farta de ouvir apenas aquele som já irritante, comecei a melodiar a canção de embalar escrita pela minha mãe. Assim esperava, tal como acontecia com Christian, conseguir acalmar os meus nervos irritadiços.

Os intervalos eram aqueles pequenos espaços de tempo em que, em certa ordem, os guardas abriam as celas e deixavam cada prisioneira espairecer. Desde aquela manhã já tinham saído cerca de quatro vezes. Não me queixava, pelo menos até agora. Eram os únicos momentos em que havia silêncio. As restantes horas eram preenchidas por questões das minhas “vizinhas” desejosas de perceber qual fora o crime que me encerrara ali. Algumas eram cordiais e calavam-se, ao perceberem que eu não lhes iria responder. Outras tantas, talvez por irritação, continuavam o questionário. Este por vezes tornava-se absurdo:

- Quanto queres, novata?- perguntava-me uma.- Anda lá, diz-me.

Referia-se a um fio de ouro com um pendente pequeno azul em forma de chave que tilintava no meu pescoço. Tinha pertencido à minha mãe. E, já que o meu irmãozinho sempre se afeiçoara a ele, eu tinha-o roubado, antes do banco reaver todo o resto dos nossos pertences. Era, além da melodia de embalar, a única recordação que tínhamos da nossa mãe. Christian, que sempre guardara o colar, tinha-mo dado esta manhã prometendo-me que o objecto iria proteger-me.

Ignorei a mulher que continuava a tentar comprar o fio com as suas últimas doses de pão. Continuei o meu raciocínio anterior.

E sempre que voltavam dos intervalos, sempre que voltavam às celas, havia alguém que não o fazia- não voltava- alguém que desaparecia. Em princípio pensei que as pessoas estavam a ser libertadas. Mas este pensamento nunca durava muito: as “desaparecidas” regressavam às celas, cobertas de gesso e ligaduras. Tinham estado na enfermaria.

Resumindo… Era essa a razão de ainda não ter saído da minha “jaula”. Tinha uma certa sensação que, assim que saísse, alguém iria dar-me um murro no nariz, partindo-mo. E não me apetecia muito ter esse tipo de dores neste local: acho que, mesmo se estivesse a passar para o outro mundo, os guardas não iriam querer saber. Além disso, pressinto que aparecer diante do meu irmãozinho cheia de cicatrizes não lhe faria bem à saúde. Nem à saúde, nem às suas crenças acerca do colar da mãe.

Mas desta vez foi diferente. Bastante diferente. Os guardas, por muito inercies que sejam na maioria das vezes (nas situações em que são mais necessários), decidiram obrigar-me a sair da cela. Sem conseguir discutir, decidi permanecer num canto sombrio, escondida. Não queria que ninguém me incomodasse. E tenho que admitir que o meu plano estava a ter bastante sucesso, até que um grito ressoou pelo pátio.

Esperava que apenas fosse uma vez sem exemplo e que não se ouvisse mais. Talvez alguma rapariga tivesse visto um rato (eu faria o mesmo se visse um). Mas estava errada. Os gritos aumentavam de intensidade e de ritmo. Aparentemente não é um rato.

Tirei a minha capa de invisibilidade e fui ao encontro de quem estava a gritar. A situação a que assisti não foi agradável em qualquer ponto de vista e duvido que alguma vez se torne esquecível.

Um grupo de prisioneiras rodeava uma pequena rapariga, que se sentara no chão frio. Espancavam-na. Brutamente. Parecia que a acusavam de andar a roubar as refeições das outras. E enquanto a vítima se tentava defender de tais acusações, uma perna elevava-se e pontapeava a já magoada rapariga. Não avistei qualquer milímetro da pele dela que não estivesse manchado de sangue.

Por mais incrível que vos possa parecer, eram poucas as atacantes (talvez cinco ou seis). Seriam fáceis de parar: 1- se os guardas se importassem um pouco, 2- se as restantes espectadoras parassem de assistir e fizessem algo para parar esta atrocidade. Porque, sim, maior parte das prisioneiras apenas se deliciavam com a cena: nem ajudavam a magoar a garota nem a ajudavam. Grandes covardes!

Fitei as atacantes. Estas pareciam cansadas, com a sua missão quase terminada. O que faltava era simples: um punho certeiro. Uma delas levantou o braço e preparou-se para embater na pobre. “Fogo!”, pensei. Se aquele punho acertasse em qualquer parte da face dela, a rapariga desmaiaria.

Sem pensar, abri caminho entre a multidão de gente parva e coloquei-me à frente da vítima, mesmo a tempo de apanhar com o murro que lhe era destinado. Este acertou-me nos lábios, cortando-mos.

Espantadas, as atacantes recuaram. Abriram a boca, como se preparadas para me meterem na minha vida. Mas, inesperadamente, os guardas agiram (surpreendente, não é?) e obrigaram-nas a entrar, de novo, nas suas celas.

- O intervalo terminou!- anunciavam, enquanto levavam a rapariga para a enfermaria.

Enquanto a multidão se afastava, uma face, mais espantada que as próprias atacantes, fitava-me. Só recordei os olhos negros em bico.

**Esmeralda’s Flashback Off**

- Não fizeste nada!- exclamei.- Não ajudaste aquela pobre rapariga!

Lynn, com os olhos mais lacrimosos que já vi, sussurrou:

- Cada uma tem as suas razões.


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