O Mapa Cor-de-Rosa escrita por Melanie Blair


Capítulo 11
Liberdade


Notas iniciais do capítulo

Como prometido aqui está o novo capítulo.
Desculpem a demora.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/315305/chapter/11

A minha cama enchia-se de roupa contrastante com a falta dela no armário.

– Raios! Que vou eu vestir?- perguntava a mim mesma.

Maior parte do vestuário que possuía era destinado ao espectáculo, logo demasiado desinibido para a ocasião.

– Mana, que estás a fazer?- perguntou Christian, encostado à ombreira da porta do quarto.- Que bagunça!- acrescentou, assim que olhou para o colchão.

– Não sei o que hei-de vestir!- expliquei-lhe.

Ele percebeu rapidamente o meu objectivo supremo.

– Para o encontro?- inquiriu.

Acenei, corando.

Aquele seria o meu primeiro encontro, logo o entusiasmo tinha colocado, indeterminadamente, a minha racionalidade KO. Queria estar no meu melhor na tarde de hoje para, assim, aproveitar o melhor daquela estreia. Christian, ao olhar-me, chegou a essa mesma conclusão.

– Posso ajudar?- perguntou-me. A ideia do meu irmãozinho do “ajudar” era simples e, tenho que admitir, eficaz. Ele decidiu que eu vestiria as minhas melhores roupas enquanto ele avaliava o quão apropriadas eram.

Depois de pronta, desfilei pelo meu quarto.

– Saia demasiado curta!- exclamou Christian.

– O quê?- inquiri, confusa. Os rapazes não gostavam de ver o corpo das mulheres?

Ele fitou-me como se eu fosse a maior idiota do mundo.

– Não é que eu perceba muito disto…- começou.- Mas se eu convidasse alguém para sair não iria gostar que ela andasse a mostrar as pernas aos outros homens.

Fazia sentido. Mas duvido que Lysandre se sinta assim. Aquele encontro não era romântico nem nada do género…pois não?

Troquei de roupa e, mais uma vez, desfilei pelo quarto. Christian não hesitou:

– Muito decote!

– Ah!- suspirei. Estava pronta para lhe ripostar um “O que é bom é para se ver”, mas mudei logo de ideias- não queria testar em demasia a paciência do meu irmão.

Voltei a entrar e a sair do vestuário. Volte a vestir e a despir, quase aleatoriamente, roupas. Christian, por sua vez, repetia as frases “Demasiado curto” e “Consigo ver-te o rabo/as maminhas”.

Cansada de tanto desfile, mergulhei na cama, ao seu lado.

– Desisto!- exclamei.- És um júri difícil de agradar!

Ele não me respondeu. Espetou o polegar no queixo e os restantes dedos nos lábios: a sua postura enquanto pensava. De rompante, levantou-se deixando-me cair da cama, atirando-me para o chão.

– Auch!- gritei enquanto massajava o meu rabo.- Porque fizeste isso?

Chris ignorou-me.

– Tive uma ideia!- exclamou ao sorrir-me. – Já venho!

Saiu do quarto. Enquanto o esperava, pensei se todo aquele esforço valeria a pena. Será que Lysandre é a boa pessoa que aparenta ser? Será que este encontro não é mais que uma mentira? Será que, no final do dia, chegarei a casa desiludida e magoada?

Não sabia o que pensar. Sempre que tentara confiar em alguém, sempre que tentara dar uma segunda oportunidade, sempre que tentara algo novo…acabava sempre em desastre: as minhas espectativas nunca eram cumpridas.

Finalmente (e para bem do meu cérebro), Christian voltou. Trazia consigo um vestido vermelho, florido, que me taparia os seios e me chegaria aos joelhos. Amei-o assim que o vi.

– Onde o encontraste?- perguntei ao meu irmão, enquanto analisava, apaixonada, todo o pormenor do tecido.

– Não o mereces, já que ainda não me contaste quem é o teu par para o encontro…- começou ele.- Arrisquei a minha vida para te trazer esta roupa.

Olhei novamente para o vestido e reconheci de onde já o tinha visto.

– Não o posso usar, Chris.- disse-lhe. Aquele tecido já tinha tentado esconder os pneus do corpo da minha tia (missão impossível).

– Esmeralda depois de todo o esforço que fiz, não podes dizer que não!

– Mas se a tia descobre estás…frito!- escolhi as palavras. Christian não podia ouvir asneiras.

O meu irmão empurrou-me até ao vestuário e entregou-me o vestido, não me dando qualquer escolha. Enquanto eu me despia e vestia numa correria (esperava pela última vez), Christian murmurou:

– Tens de te deixar de preocupar comigo e mais contigo. Já sou um homem crescido.

Suspirei. Abri a porta e encarei o meu júri, que me fitava boquiaberto.

– Não me fica bem.- confessei.- É-me demasiado grande.

Chris interrompeu-me.

– Fica-te muito bem, Esmeralda. Estás linda!


Corei.

***********************************************************************


Corri. Faltavam dois minutos para as três da tarde e, por percorrer, ainda tinha três quarteirões pela frente. Sorri a pensar em Lysandre à minha espera.

Ao retirar os sapatos de salto alto, a fim de correr mais depressa, senti-me normal. Normal, pela primeira vez na minha vida! Era assim que devia ser. Um rapaz devia conhecer uma rapariga, devia interessar-se por ela, convidá-la a sair, apaixonar-se, casar-se, ter filhos (e tudo o que esse processo envolve). Nunca noutra ordem. Nunca como me tinha acontecido. Nunca de maneira tão rude e tão feroz como me tinha acontecido.

Ao avistar o grande carvalho, parei por segundos. Debaixo deste encontrava-se uma silhueta de cabelos brancos que se movimentava de um lado para o outro, baixando o olhar, por vezes, para o seu relógio. Aproximei-me dele. Ao aperceber-se da movimentação de alguém, levantou o olhar até se encontrar com o meu.

– Bom dia…- comecei até ele me interromper.

– Não me chamo Leandro!- sorriu.

–…Lysandre.- concluí a minha saudação.- Desculpa o atraso.

Ele colocou o braço à minha frente e esboçou um agradável “Vamos?”. Estiquei a minha mão até chegar ao seu cotovelo, agarrei-o e começámos a caminhar.

– Para onde vamos?- inquiri, curiosa.

– É uma surpresa.- sussurrou-me.

Passámos por inúmeras ruas enquanto as pessoas nos olhavam, estranhamente. Os olhares eram indecifráveis, mas percebi que os sentimentos por detrás destes não seriam agradáveis.

– És algum criminoso ou gigolô?- perguntei-lhe.

– Porque perguntas isso?- inquiriu no meio de gargalhadas.

– Bem, as pessoas estão a olhar-nos de forma estranha. Eu tenho 99,9% de certeza que nunca lhes fiz mal…só pode ser por tua causa.- esclareci.

– Ainda tens 0,1% de dúvida não é verdade?- perguntou-me, fazendo-me rir.

Ignorámos os olhares de outros e continuámos a caminhar até encontrarmos um lugar que aspirava alegria contagiante por todo o lado. Era o parque nacional de Sweet Amoris. O platinado obrigou-me a entrar e dirigiu-me a um banco.

Parei. Estava absolutamente absorta na beleza dos verdes. As árvores, de diferentes tamanhos e espessuras, percorriam todo o caminho (pelo menos até onde a minha vista alcançava).

Enquanto mirava, apaixonada, todo o pormenor de cada folha caída no chão, Lysandre suspirou:

Olhei-o, surpresa. Estava absorto nos céus azuis que tentavam sobressair dos verdes das altas árvores. Pássaros, como se sincronizados, cantavam uma melodia, como se embalassem as raízes a percorrem, mais fundo, o solo.

– Nunca desejaste ser como uma andorinha?- inquiriu-me, tirando-me da hipnose.- Nunca desejaste ter a liberdade que ela tem?

Eu sabia ao que ele se referia: era algo que eu também sentira e continuava a sentir. Mas, pelos meus lábios, outras palavras saíram.

– Tenho demasiada liberdade.

– Se assim é, então podes considerar-te uma mulher de sorte!- exclamou. Mas consegui avistar uma centelha de tristeza nos olhos.

– Porque querias tu liberdade?- as palavras saíram da minha boca, sem a minha permissão.- É graças a ela que há tantos crimes, tantos insultos, tanta dor neste mundo.

Ele sorriu-me, como se mirasse o pássaro mais raro e interessante alguma vez visto.

– Isso depende de cada pessoa.- explicou-me.- Eu faria bom uso dessa liberdade, se ma fosse dada isto é.

Aquilo abriu-me a curiosidade.

– O que farias com ela?- perguntei.

Lysandre voltou a olhar para o céu, como se sonhasse com a realidade da minha questão.

– Fugiria no inverno e retornava no verão. Encontraria, fora daqui, a razão do meu viver e tentaria protegê-la para toda a minha existência.

Com estas palavras, conclui algo inquestionável: Lysandre não era feliz.

O platinado suspirou e murmurou:

– Falemos de outra coisa!

Vendo uma oportunidade para retirar aquele pensamento da minha mente, dirigi-me na direcção dele e coloquei as minhas mãos nas dele. Com alguma força, consegui erguê-lo do banco e encaminhei-o pelo resto do jardim.

– O que tencionas fazer?- perguntou-me ele, surpreso.

Olhei-o por cima do meu ombro e sorri-lhe:

– Seria uma pena não apreciarmos a beleza que nos rodeia, não achas?

Lysandre sorriu-me de volta.

Enquanto percorríamos todo o parque, aventurando-nos pelos diversos atalhos, sorrindo para os esquilos que procuravam bolotas, acalmando o exaltado veado, percebi que estava, sem esforço necessário, feliz.

Mas, assim que vi uma paisagem que me cortou a inspiração, retirei os meus pulsos ainda presos nos dele.

– Esmeralda?- perguntou-me Lysandre, preocupado. Porém, assim que percorreu o meu olhar, a sua reacção foi parecidíssima com a minha.

O parque era, aparentemente, dividido por um rio. Este rio tinha como nascente uma fantástica cascata, que era o ecossistema de vida para muitos seres vivos, não a mais de quinze metros de distância do local onde nos encontrávamos, babados.

Sem pensar duas vezes, corri, por entres os pinheiros e figueiras, até àquela fonte que me chamava. Ao correr, a água aproximava-se e a terra, tão familiar e aborrecida, ficava para trás, esquecida.

E, como magia que tinha, aquela feiticeira puxou-me e pediu-me que retirasse os meus sapatos (os da minha tia, vá) e que mergulhasse os pés nas suas águas. A sensação não poderia ser melhor. O dia estava fresco, mas húmido. Aquela água fria fez com que todo o meu corpo tremesse de sensações. Uma destas foi a de limpeza, a limpeza do meu corpo há tanto manjado.

Querendo que esta limpeza se prolongasse pelo resto do meu corpo e apagasse, de vez, toda a minha dor e passado, caminhei para mais longe das margens seguras.

– Esmeralda!- chamou-me uma voz, parando o cântico mágico das águas, acordando-me.

Virei-me na direcção desta e sorri.

– O que pensa que está a fazer?- perguntou-me Lysandre, ainda preso à terra.

– Querias liberdade, não querias?- desafiei-o.- Aqui tens a tua liberdade: na água, perto de mim.

A expressão dele mudou de preocupada para provocada.

– Não me convide, Esmeralda!- avisou-me Lysandre.- Já deve ter percebido que eu sou um homem. E a menina aí, com o vestido molhado colado ao corpo, parece uma deusa.

Gargalhei. Dei-lhe um sorriso maroto e pensei “Vamos lá divertirmo-nos um pouco, Esmeralda!”.

– A sério?- abanei a cintura e fiz-lhe olhinhos, tentando enaltecer o quão sensual podia ser.- Que tipo de deusa seria eu?

Ele elevou e baixou o olhar por todo o meu corpo, avaliando-me.

– A Esmeralda é linda e delicada como uma flor. É inteligente como uma coruja. É perigosa como uma serpente. É interessante como uma chita. É pura como um cisne. Uma deusa da floresta.

O meu humor caiu ao ouvir as palavras do platinado. Não pelo facto dos elogios (acho que foram elogios) serem patéticos e hilariantes, mas pelo uso da palavra “pura”. Eu não era pura. Baixei o olhar para a água que me rodeava. E não é a água (mesmo que esta seja belíssima) que me vai fazer esquecer o que se passou.

Senti o olhar dele em mim. Ergui a face e tentei esconder a agonia que sentia. Coloquei um sorriso forçado na cara.

– Isso é uma nova espécie de sedução?- perguntei, tentando mudar de assunto.- Quantas raparigas caíram na sua armadilha, Lysandre?

– Até agora nenhuma.- confessou ele.- Só a tentei consigo, Esmeralda.

Senti a minha face a queimar. Tentei esconder o corar colocando alguma água nas bochechas. Mas, assim que olhei para a água…

– AHH!- gritei, começando a correr para a margem do rio. Assim que cheguei à tão amada terra bati no que parecia um tronco de árvore. Este, com o meu impacto, caiu, levando-me consigo. “Será que sou assim tão pesada?”, pensei enquanto tentava esquecer aquilo que se tinha afeiçoado às minhas pernas.

– Está bem?- perguntou-me o tronco, enquanto rodeava a minha cintura com os seus braços.

Olhei para cima. Estava à espera de encontrar uns ramos com uns olhos e boca (influencia da Branca de Neve que li, demasiadas vezes, para Christrian) mas, na sua vez, esbarrei-me com a face preocupada de Lysandre.

Rapidamente saí do seu colo, sabendo que estava ainda mais corada que antes.

– Desculpa…uhm…err… era uma cobra gigante!- abri os meus braços, mostrando, exageradamente (uns dois metros a mais) o tamanho do bicho.

O platinado sentou-se e fitou-me. Assim que percebeu que eu não estava nada confortável com a situação, não conseguiu aguentar o riso. E eu, ao ouvir o riso contagiante dele, não consegui conter o meu.

************************************************************************


Lysandre teve que se ir embora, dizendo que tinha um convidado à sua espera. Despediu-se de mim e deu-me a conhecer o quanto se tinha divertido e do desejo de querer repetir brevemente.

Depois de o ver a desaparecer pelas névoas, dirigi-me até ao bar. Ao entrar no bar, subi as pequenas escadas que davam acesso ao meu quarto. Ali, encostado à ombreira da minha porta encontrava-se um vulto. Este subiu o olhar até encontrar o meu. Sem palavras, continuou a olhar-me até finalmente abrir a boca num suspiro.

– Lindo vestido! Como foi o encontro?- perguntou-me o ruivo.

“Poças!”, pensei.



Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O Mapa Cor-de-Rosa" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.