Esforço-me ao máximo pra manter o controle. Minhas mãos soam, eu sinto vontade de gritar, de correr, apagar a imagem daquela pequena garotinha caindo sem vida sobre o chão, mas um ruído fora do comum e eu serei o próximo.

Imagino como os telespectadores devem estar se divertindo com a situação, me vendo como um coelho encuralado.

A poucos metros de mim estão alguns dos mais fortes tributos, os favoritos deles. Penso nas pessoas gritando pra suas Tv’s “Olhem pro lado, ele está ali, matem ele, matem ele”. A frieza dos Carreiristas me assombra. Mas não consigo entendê-los será que realmente são vazios de sentimentos sendo guiados por suas ganâncias, ou foram simplesmente treinados para se ver livre de qualquer emoção que possa impedi-los de ser um vitorioso?Aparentemente a ideia de matar alguém é normal pra eles, parece até uma diversão. Mas será que não conseguem enxergar a realidade ? Embora tenham muito mais mordomias que os outros distritos,também não passam de peças descartáveis .

Ainda ouço as vozes deles. Tento me ajeitar o melhor possível atrás da árvore pra que não me vejam. Talvez eu devesse enfrentá-los agora, mas algo me diz que ainda não é o momento, e diante das circunstâncias vou seguir meus instintos.

Minha costela começa a doer intensamente por causa da pancada que levei, minha garganta esta seca, não sei quanto tempo aguento,preciso ao menos sentar e descansar um pouco. Quanto tempo será que eles ficariam ali?

Espio novamente por detrás da árvore. Mas ao fazer isso piso em um galho seco. Aperto-me ao máximo contra a árvore, mas sei que é inútil, eles ouviram. Ouço os passos vindos até mim e sei que vão me cercar assim como fizeram com a garota.

No meio do silêncio que se inicia a única coisa que ouço além dos lentos passos arrastados é o meu acelerado coração desordenado.

É o fim. Penso.

Então ouço um barulho em meio às árvores, e por cima da minha cabeça eu vejo algo pequeno deslizar de galho em galho como se flutuasse por entre as folhas. Rue.

A atenção dos Carreiristas se volta pra ela.

-Ali, ali. Agora ela não nos escapa – ouço uma voz que ainda não tinha ouvido gritar. Deve ser Marvel o garoto do distrito 1.

Rue some em meio aos galhos, os Carreiristas adentram a floresta a seguindo.

Porque ela fez isso? Será que estava me salvando?

Não posso deixar outra vida se esvair assim, preciso fazer alguma coisa. Proteger a pequenina Rue.

Saio detrás da árvore começo a correr em direção aos carreiristas que logo  percebem minha presença.

-Vocês pegam a garota, nós cuidaremos do Conquistador. -Cato diz e os outros continuam a correr sumindo em meio a floresta, apenas Clove fica. Torço pra que não peguem a corajosa Rue.

Clove lança uma faca que passa raspando em minha orelha e antes que ela lance outra eu digo:

- Eu sei como encontrar a Katniss.

-Cato, ele esta blefando. É só uma maneira de se manter vivo, vamos matá-lo logo. -Clove diz já com a próxima faca preparada.

- Não! Vamos deixá-lo falar.

Ela não diz mais nada, então eu continuo.

- Eu sei a direção que ela foi, e em um das nossas conversas ela disse que usaria bastantes armadilhas, ela é realmente boa nisso, mas eu sei reconhecer as armadilhas dela.

Eles ficam em silêncio por um tempo. Clove esta esperando que Cato diga alguma coisa, parece que ele é quem comanda.

-Você vem com a gente – ele diz.

[...]

O acampamento deles é em uma clareira com árvores e algumas rochas, daqui da pra se ter a visão de uma grande parte do lago e da Cornucópia.

Eles têm uma grande quantidade de comida e água. Sacio-me e me permito descansar, a dor em minhas costelas diminuiu.

Logo os outros chegam e estou aliviado. Sei que eles não pegaram Rue porque não houve nem um tiro de canhão sequer.

-O que ele tá fazendo aqui? – Glimmer pergunta.

-Ele vai nos ajudar a encontrar “ela”. -Cato responde, e ninguém se opõe. Como eu pensei Cato realmente está no comando, mas por quê? Será que o consideram mais forte? E até quando ficariam unidos ,até que tivessem que matar uns ao outros? Definitivamente não entendo o mundo dos Carreiristas.

Mais o que me chamou a atenção, foi a maneira como se referem a Katniss,não ouvi o nome dela ainda, eles apenas dizem “ela”, será que a temem tanto assim?Será que ela é um assunto muito comentado entre eles?

As horas se estendem e as coisas na Arena parecem estar sossegadas, acho que todos os tributos devem estar cansados e provavelmente tentando encontrar um lugar pra tentar passar a noite.

Glimmer está encostada, em uma rocha, Marvel em outra, e Jane a garota do Distrito 4 , está um pouco mais distante. Cato e Clove, estão bem próximos. Acredito pela troca de olhares e caricias entre eles, que são muitos mais do que tributos lutando juntos.

Encosto-me em uma árvore um pouco mais afastado deles .Não consigo evitar não pensar em Katniss.

Uma lua grande e brilhante toma conta do céu escuro e o silêncio é quebrado pelo hino da Capital. Os rostos dos tributos mortos passam pelo céu em uma especie de holograma. Os Carreiristas riem e fazem comentários, imitando até algumas das mortes. Entre os rostos está o do garoto do 7 que eu abandonei, realmente alguém tinha terminado o serviço,e pelo comentário havia sido o Marvel.Então passa um tributo do 10, e meu coração esta prestes a sair pela boca, sei que Rue está viva, mais se aparecer mais algum rosto será o da Katniss. O hino termina e eu respiro aliviado. Katniss está viva. Mas o alívio é tomado por preocupação ,os Carreiristas não dizem nada acredito que já esperavam que ela não morresse no primeiro dia, e eu sei que amanhã eles me farão guia-los até ela.Mas não vou fazer ,vou afastá-los o máximo que puder,  se necessário crio armadilhas eu mesmo e coloco cada uma em uma direção pra confundi-los .Mas a questão é , por quanto tempo vou conseguir manter essa mentira, preciso achar uma forma de acabar com eles o quanto antes.

O hino mal acabara e a nossa atenção é tomada por uma luz vindo não muito longe dali. Uma fogueira. Alguém tivera a audácia de acender uma fogueira a noite. Está muito frio, mas acender uma em meio a essa escuridão é suicídio.

- Acho que vamos dar uma voltinha – Jane diz se divertindo com o comentário.

-Quantos são Cato? – Marvel pergunta.

Cato está usando um binóculo estranho, acredito que seja alguma espécie de Visão Noturna.

- Um só, mas por pouco tempo.

Todos se levantam como loucos, e vejo o olhar de uma raposa prestes a abocanhar uma presa. Caminhamos em direção à fogueira.

Embora tenhamos lanternas está muito escuro, Marvel e eu estamos mais atrás do que os outros.

Sinto uma força me empurrando. Bato de costas em uma árvore e caio no chão, sinto murros em meu rosto, sinto o gosto do sangue quente que escorre pelo meu nariz e  passa pela minha boca,não consigo ver o que está acontecendo mais seja o que for que está me atacando não é um tributo.Alguém lança uma faca, ela raspa em meu braço cortando-o e cai perto de mim. Pego a faca e ataco o ser que está sobre mim. Ouço um urro alto. Eu o matei.

Cato e os outros voltam.

- O que aconteceu? –perguntam.

- Um bestante da Capital – Marvel responde.

Agora sobre a luz do archote e das lanternas, eu consigo ver. Um grande urso negro caído sobre o chão.

- As bestantes da Capital, são máquinas mortíferas. Poucos são os que sobrevivem aos ataques delas, você é realmente bom com essa faca Loverboy. - Clove me diz, e os outros se entreolham. Acho que estão com certo medo de mim agora. Isso não é bom.

Amarro uma faixa em meu braço, o corte não foi muito fundo mais ainda sangra. Clove viu os movimentos e lançara a faca, mais como estava muito escuro acabou me acertando. Algo me diz que se ela tivesse me acertado na cabeça ao invés do braço estaria bem mais feliz.

Meu rosto esta todo machucado. E estou mancando. O animal era um urso, mas me acertou com socos como se soubesse o que estava fazendo. Mas um fato que os carreiristas não atentaram,era que a Capital usava seus bestantes para tirar uma peça que ela achava que estragaria seus planos, várias vezes vi como eles tiraram a vida de tributos, para facilitar o encontro de outro,promover lutas mais interessantes, ou ainda pra aqueles que quebravam as regras se recusando a lutar.Tentaram me eliminar.Eu sou uma pedra no caminho deles. Talvez seja porque eu me recusei a matar o garoto no banho de sangue, ou ainda porque chamei atenção dos Carreiristas quando eles perseguiriam Rue , ou pior talvez tenham descoberto que estou tentando proteger Katniss , e vão me eliminar por isso.Então percebo o efeito que Katniss causou, ela não é só um alvo dos Carreiristas é um alvo da Capital também.

Assim que acabo de me recompor continuamos em direção à fogueira, que mesmo depois de todo este barulho ainda está lá.

Aproximamos-nos, cercando o tributo, é a garota de cabelos negros do distrito 8 .

Ela nos vê então grita. Cato a silencia com uma martelada na cabeça. Eles procuram algo bom em seus itens mais não encontram nada.

-Vamos não há mais nada a fazer aqui - Cato diz e saímos por um caminho de volta pro lago. Estão todos em silêncio, acredito que seja por causa do ataque do urso. Até que Marvel diz:

- A gente já não devia ter ouvido um canhão?

- Eu diria que sim. Não há nenhum empecilho para eles não atirarem imediatamente. -Glimmer responde.

- A menos que ela não esteja morta – Clove fala olhando para Cato.

-Ela está morta. Eu mesmo acertei ela.- ele responde.

-Então onde está o canhão?- Jane pergunta pra ele.

- Alguém devia voltar. Pra ter certeza de que o trabalho foi feito. – Marvel fala olhando pra mim.

-É mesmo, ninguém vai querer caçá-la de novo. -Jane completa, também olhando pra mim.

-Eu disse que ela está morta. - Cato grita.

Eles começam a discutir mais os olhares estão todos sobre mim. Talvez eles tenham finalmente se ligado, do porque a Capital manda os bestantes.Eles desconfiam de mim. Sei o que preciso fazer.

- Nós estamos perdendo tempo! Vou lá terminar o serviço e a gente segue caminho. - digo com o máximo de arrogância que consigo, preciso ser convincente.

- Vai lá então Conquistador, veja você mesmo. - Cato diz.

Eu volto até a garota. Ela está viva. Sua respiração esta fraca, seu rosto manchado de sangue por causa da martelada. Ela não tem mais chance. Ajoelho-me ao lado dela. E sei o que preciso fazer.