Finding a Dream escrita por Loren


Capítulo 23
"Eu vou"


Notas iniciais do capítulo

haaai



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–-Então, como se sente?- ele perguntou sentando-se e passando a manga da camiseta na testa suada.

–-Renovada!- ela disse deixando um sorriso escapar e deitou-se na grama, olhando para o céu tingido de laranja e vermelho- morango.

–-Bom saber.- ele disse sorrindo e admirando os traços calmos do rosto dela.

Treinaram os três dias freneticamente. O único intervalo que tiveram foi para descansarem o corpo e a mente durante a noite. Irina havia melhorado em pouco tempo de um modo impressionante. Já sabia defender, atacar e atirar com as armas. Parecia mais calma ao término dos treinos, porém, quando pegava uma das adagas, tornava-se um animal. Chegava até ser perigosa. Era até mesmo estranho para o moreno vê-la mexendo com as adagas com maestria. Mais estranho ainda era o olhar insano que ela tomava. Talvez ela sempre havia tido esse lado. Todos temos um lado um pouco louco. Ela estava com o rosto e o vestido sujos de terra, mas parecia muito satisfeita. Ele aproveitou o momento para falar o que tanto se perguntava nos últimos dias.

–-Irina?

–-Sim?

–-Aquele dia, na floresta, com aquele telmarino...- ele parou, esperando alguma permissão para falar sobre o assunto.

O sorriso dela se desfez.

–-Diga.- ela incentivou, mas não esboçou mais nenhuma reação.

–-Houve um momento que você hesitou em atacar o homem. Mas... pareceu que algo te deu impulso para fazê-lo. E a cada vez que você descia a pedra, era com mais força e mais raiva. Por quê? O que.. fez você continuar?

Ela continuou a observar o céu. Após alguns segundos, sentou-se e jogou os cabelos no ombro direito, cheios de grama e ele viu uma formiga perder-se entre os fios loiros.

–-Naquele momento, não sei porquê, me lembrei de uma tarde que tive com Helena. Não fazia muito que ela tinha voltado de Nárnia... Ela começou a me dar algumas “aulas”. Eu achei bem estranho no começo, mas acabei gostando e me adaptando.

–-Aulas de quê?

–-De defesa. Eu era só uma criança, mas acho que ela pretendia me ensinar cada vez mais a medida que eu fosse crescendo. Quando eu estava em cima daquele homem- ela corou um pouco com as palavras ditas-, me lembrei da voz dela me dando instruções. Ás vezes eu treinava com um espantalho, ás vezes com ela mesma.

–-Mas por que fazia com tanta raiva?

–-Helena sempre foi muito rígida com assuntos de “trabalho”.- ela disse fazendo aspas no ar.- Se irritava fácil também. Quando eu errava alguma coisa, ela sempre me dava um beliscão ou um cascudo na orelha. Não era por mal, pelo menos eu acho.- ela abaixou o olhar. Não sabia mais dizer quem era aquela menina.- Ela sempre estava nervosa e apreensiva nesses dias. Também com muita pressa. Como se tivessemos pouco tempo para treinar. Helena quis me ensinar desde cedo como sobreviver.

–-Helena se importava bastante com você.- ele disse com um tom um pouco desconfiado e um olhar confuso.

–-Eu também achava isso.- ela disse fitando a linha do horizonte com um olhar que tornou-se gélido ao término das palavras do rapaz.- Mas ao final, ela só era uma boa atriz.- dito isso, ela se levantou e direcionou seus pés para a coisa.

>

–-Cansada?- perguntou a pequena, sentada com as costas na parede, enquanto observava mais uma vez o frasco.

Era especial para ela. Lembrava a primeira vez em Nárnia, o Papai Noel, os castores, Sr. Tumnus e Aslam. Era como voltar para o passado. E o passado era tão bom e tão distante. Tinha gosto de sonho. Daqueles que quando nós acordamos e o vivemos o dia, acabamos por lembrá-lo e não sabemos se vivemos ou se sonhamos.

–-Um pouco, mas.. admito que ansiosa!- a loira disse sorrindo e deitou-se na cama improvisada que as faunas haviam feito no chão em um de outros cômodos da coisa.

–-Por que ansiosa?- perguntou Lúcia um pouco estranhada.

–-Nunca participei de algo antes... digo, nunca estive presente em uma guerra. Nunca lutei. Será a primeira vez. Espero que faça tudo certo.- ela disse sorrindo para o teto.

–-Parece que está ansiosa por uma guerra.- disse a ruivinha com um tom reprovador.- Achei que tivesse medo de guerras, como me contou quando estava lá na sua terra.

–-E tenho. Morro de medo. Minha barriga parece que está cheia de pedras de gelo que não param de dançar! Mas... é que a primeira vez que entrarei em combate, Lúcia. Quando Helena me ensinava algumas manhas, não adiantava muito.. eu tinha sete anos.- a pequena percebeu que a loira não parecia ter se incomodado com o nome da irmã.- É a primeira vez que farei algo por mim mesma, para meu próprio bem, com minhas próprias mãos.

–-Não se esqueça que está lutando por Nárnia.- lembrou Lúcia, desviando o olhar do frasco para a loira.

–-Eu sei, eu sei.- ela disse abanando a mão.- Ao menos, se eu morrer amanhã no ataque surpresa, terei tentado algo antes de me cravarem uma espada ou flecha.

–-Irina... não te contaram?- a pequena disse e guardou o frasco.

–-Não me contaram o quê?- ela perguntou, olhando para Lúcia.

–-Você não vai no ataque. Vai ficar aqui.

–-O quê?!- ela sentou-se rapidamente.- Como assim não irei?!

–-Ed te explicou que te ajudaria somente para você se defender, se tivesse que fazer isso. Não para atacar.

As palavras de Lúcia caíram nos ombros de Irina como pedras de chumbo. Havia ficado tão maravilhada com as novas habilidades que desenvolveu que acabou por esquecer do que o moreno havia lhe dito. Levantou-se, sentindo um arrepio quente percorrer por fora e por dentro do seu corpo. Fechou os punhos e apertou os dentes, tentando controlar a veia que pulsava com violência na cabeça.

–-Não.- a pequena olhou para a loira temorosa.- Eu irei.

–-Mas, Irina.. é perigoso! E Ed disse que...

–-Vossa majestade, Rei Edmundo, não é meu dono, não é meu pai e nem mesmo meu irmão, Lúcia.- ela disse com voz agressiva.- Ele não tem porquê se preocupar com uma pebleia como eu e não tem direito em mandar em mim, já que não pertenço a este povo. Eu vou e não importa se tentarem me impedir. Eu vou! E espero que vossa majestade, Rainha Lúcia, não abra a matraca me denunciando para ele.- a pequena assustou-se com as palavras da loira e tapou a boca para evitar um grito de susto.-Caso contrário, farei como Helena fez.- a pequena tinha os olhos embargados em lágrimas.- Sumiu. Sem rastro. Sem cheiro. Sem se importar com os outros.- ela se virou para a saída.

–-Você seria capaz?!- a pequena perguntou com a voz baixinha e um nó na garganta.

–-Ultimamente, não sei mais do que não sou capaz.- antes de ir, pegou o cinto das adagas e o apertou na cintura.

Quando já estava na metade do caminho, pôde ouvir um soluço ecoar no corredor frio e úmido. Por um momento, paralisou-se. Arrependeu-se por ter sido tão grosseira com a pequena. Seus olhos arderam e cogitou a ideia de voltar para abraçar e pedir desculpas, mas logo balançou a cabeça negativamente. Ninguém se importou comigo quando ela se foi, ela pensou rancorosa. Ninguém me perguntou como eu estava, como eu me sentia, ninguém se importou em me contar a verdade no início, ninguém esteve presente para mim nos últimos cinco anos. Seus olhos arderam mais uma vez e ela fungou passando as costas da mão nos olhos. Olhou para trás e pôde ouvir mais um soluço.Não havia tempo. Precisava resolver alguns assuntos antes de se preparar mais um pouco para o ataque. Desta vez, Irina ergueu a cabeça e continuou o caminho com uma das mãos no cabo da adaga direita e com aquela palavrinha martelando em sua mente.

Ninguém.

>

Irina continuou a andar e chegou até a sala principal da coisa, onde ainda havia alguns poucos faunos e minotauros trabalhando em algumas armas. Sorrateiramente, fez a volta na sala e entrou por outra entrada que levava para o cômodo principal. Sabia que ele estaria ali. Antes que entrasse na sala, junto com a luz proveniente das chamas, ouviu vozes entretidas em uma conversa dita em vozes baixas e tensas. Colou-se na parede e aguçou o ouvido para escutar.

–-Iremos por volta das três horas da manhã. A troca de guardas já terá acontecido e como nada passou durante a maior parte da madrugada, talvez estejam desatentos e cansados.- ela reconheceu a voz do príncipe.

–-Perfeito. Todos já sabem quais são seus passos, correto?- a voz de Pedro retumbou na sala. Ela ouviu múrmurios afirmando a pergunta do rei.- Ótimo. Estão dispensados, amanhã nos encontraremos na frente da tumba meia noite.

Irina ouviu cascos e passos pesados. Afastou-se da abertura e escondeu-se atrás de uma deformação da parede que parecia uma pilastra. Espremeu-se ali e permaneceu calada. Centauros, onças, minotauros, faunos, lobos, alguns anões e ratos gigantes passaram conversando, alguns até deixaram gargalhadas escaparem e outros bocejaram deixando a mostra aquelas presas afiadas e amarelas, mas não perceberam a menina. Engraçado pensar que ninguém olha para trás quando está rodeado por muita gente, ela pensou juntando as sobrancelhas.

Quando pareceu que não havia mais outro animal ou ser para passar e ela já estava dando o primeiro passo, ela ouviu um soluço alto e voltou a se espremer contra a parede. Com passos lentos e a cabeça agachada, o urso passou e logo se perdeu na esquina do caminho. Ela abanou a cabeça, descrente que pudesse ter sido ele o responsável pelo soluço. Animais não choram, ela pensou. Muito menos ursos, ocupados demais devorando carne humana para isso, terminou de falar consigo mesma e voltou para mais perto da sala.

–-Bem, o que nos resta agora é voltar para a cama. Susana, já avisou para Lúcia que ela não vai?

–-Não é necessário, ela sabe muito bem que é jovem demais para entrar em uma batalha, mas sim, avisei.- a voz suave da rainha soou.

–-Ótimo. Edmundo?

–-Irina já sabe que não vai. Avisei ela antes de começar a treiná-la.- quando a voz do moreno entrou pelos ouvidos dela, um arrepio percorreu pela sua nuca.

A voz dele era deliciosa.

–-De qualquer forma, duvido que ela tivesse coragem suficiente para isso.- disse o loiro com voz sarcástica e deixando uma risada seca no final.

–-Pedro, por favor!- pediu Susana com voz enjoada.

–-Mas é verdade. Ed diz que ela melhorou, mas não é capaz de matar uma formiga.

–-Você anda terrível nesses últimos dias!- ela reclamou aumentando a voz.

–-Agora, porque digo a verdade, sou culpado? Concorda com isso, Ed?- silêncio.- Ed? Edmundo!

–-Não vou dizer nada, Pedro. Pense o que quiser, mas não vou deixar ela ir. Não vou deixá-la arriscar a vida. Ela tem medo.

–-Todos temos e mesmo assim, nós vamos.

–-Mas por que você a quer na batalha? Não foi você mesmo que disse que ela não é capaz de matar uma formiga?- a irmã do moreno deixou uma risada escapar.

–-E se ela quiser ir?

–-Sei que ela não quer. O que mais teme é uma guerra. Depois de perder a irmã, claro, mas isso você já fez.- com tom acusatório.

–-Eu só disse a verdade.- ele disse com tom seco.

–-A verdade não é ruim, meu caro irmão, mas é perigosa se tratada de mau jeito. Por isso, trate da próxima vez escolher as palavras certas se quer contar a verdade para mais alguém.- terminou de dizer o irmão mais novo com tom duro.

Pedro saiu da sala batendo forte com os pés. Susana se aproximou do irmão menor com um pouco de receio. Nunca foram muito próximos.

–-Mas essa proteção não é somente por uma amizade, não é, Ed?- ele suspirou, deixando um sorriso de lado gravado em seus lábios.

–-Não, Su. Quero ser mais que isso. Quero ser mais que um amigo para Irina.- ele disse com os olhos brilhando, mas ela não chegou a ouvir o desejo do rapaz naquela noite.

Havia saído do túnel logo após quando ele deixou claro que duvidava do potencial dela. Logo após quando disse: Não foi você mesmo que disse que ela não é capaz de matar uma formiga?. Por mais que quisesse e tentasse, Irina nunca se esqueceria destas palavras.

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–-Merda, merda, merda, merda, merda! Mas que inferno!- ela praguejou alto quando saiu para fora da coisa.

Precisava de ar puro. Respirou fundo e expirou nervosamente enquanto passava as mãos pelos cabelos.

–-Será que ninguém acredita em mim?!- ela perguntou em voz alta.

Começou a caminhar ao redor da coisa, a fim de pôr os pensamentos no lugar. Será que Pedro estava certo? Não seria capaz de matar uma formiga? Nunca teve estomâgo para sangue, mas quando se lembra do que fez com o telmarino muda de opinião radicalmente. Mas talvez ela estivesse sendo precipitada. Talvez ela realmente não tivesse potencial para nada. A dor de cabeça aumentou e ela deixou três lágrimas escaparem. Mas Pedro não gostava dela, sempre que tivesse oportunidade iria destroçar a imagem da garota. Porém.. Edmundo concordou com ele. Indiretamente, mas concordou. Ela apertou os dentes com raiva e tirou uma das adagas do cinto. Segurando pelo cabo,viu seu reflexo e viu que estava com mais riscos de lágrimas.

–-Não...- ela disse e limpou o rosto com a outra mão.- Chega de chorar.- ela disse e respirou fundo.- Vou mostrar que posso matar mais que uma formiga.

Crac!

Ela virou-se e rapidamente, pegou a outra adaga e ficou em posição de defesa. O barulho vinha atrás da coisa, na próxima esquina a direita. Respirando fundo e com o coração batendo tão rápido quanta as asas de um beija-flor, ela aproximou-se do barulho de folhas secas quebrando e um grunhir misturado com soluços. Com os nós dos dedos brancos de tanto apertar os cabos, ela pulou ficando de frente para o quer que fosse o animal. Arregalando os olhos, abaixando as armas e com os pelinhos da nuca arrepiados, como se tivesse visto um fantasma, ela só conseguiu formular uma palavra.

–-Você?!

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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado :)
Beijos e abraços apertados da Loren



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