21/12/01

“Querido diário, meu nome é Irina. Tenho seis anos. Aprendi a escrever e ler com cinco anos. Mamãe está desesperada, pediu para eu ficar em casa enquanto ela sai para procurar minha irmã. Helena, ela tem treze anos, mas mamãe diz que ela pensa “como gente grande”. Acho que ela é inteligente sim, mas só perto dos outros. Ninguém conhece minha irmã como eu conheço. Ela lê bastante. Lê muito. E ama isso. Acho que eu peguei o gosto pela leitura com ela. Mamãe e algumas tias dizem que ela lia para mim quando eu era um bebê e não conseguia dormir. Acredito, ela ainda lê para mim. Eu tinha três anos quando ganhei meu primeiro livro, ela sempre lia para mim. Depois ela começou a me ensinar a ler e escrever. Minha irmã estuda, mas muita gente não gosta disso. Dizem que isso “não é coisa para mocinhas”. Eu não entendo, só entendo que quero ir para a escola também. Mamãe diz que papai ia gostar da minha decisão. Nunca vi meu papai. Se vi, não me lembro. Mamãe não fala disso comigo, ninguém, só a Helena. Ela diz que papai tropeçou numa pedra e dormiu. Colocaram ele em uma cama especial e deixaram ele embaixo da terra, para a luz não incomodá-lo. Disse que é um sono muito pesado e ele não vai acordar. Nunca mais vai acordar. Mamãe chegou em casa. Tenho que ir. Tchau querido diário.”

23/12/01

“Querido diário, hoje é Domingo. Mamãe está no quarto. Não sei o que está fazendo. Está preocupada, também estou. Ontem fomos às casas das amigas mais intimas da minha irmã, somente duas. Uma disse que não sabe onde ela pode estar e a outra também sumiu. Ontem não consegui dormir. Geralmente, minha irmã lê para eu dormir. Estou com saudades dela, nunca ficamos muito tempo separadas. Espero que ela esteja bem. Está chovendo e estou com medo dos trovões. Acho que vou tentar dormir, estou muito cansada. Tchau querido diário.”

24/12/01

"Querido diário, estou tão feliz! Minha irmã voltou! Ela está bem! Ela apareceu hoje na hora do almoço. Estava eu e mamãe comendo desanimadas quando alguém abre a porta e vai entrando. Tivemos um grande susto quando vimos alguém encapuzado, mas fora um alívio quando vimos que era Helena. Mamãe soltou a faca da carne que segurava para se defender e foi abraçar Helena imediatamente. Eu pulei em seu colo muito feliz. Mamãe chegou a chorar e eu também. Helena não chorou muito, na verdade, tinha um sorriso gigante no rosto. Almoçamos contando que mamãe e eu ficamos três dias e meio preocupadas com ela. Helena ouvia tudo em silêncio. Foi muito estranho aquele momento. Helena sempre foi uma menina risonha, ao menos estaria sorrindo de canto. Mas ela tinha uma postura séria. Parecia muito mais velha. Depois que terminamos de almoçar, esperamos a explicação da minha irmã. Ela bebeu um gole da água que tinha do copo de barro, após engolir, ela juntou as mãos no colo e endireitou mais as costas. Ela olhou primeiro para a mamãe e depois para mim. Assim que seus olhos azuis pararam em mim, ela sorriu. Eu sorri também. Então, ela disse. " Eu fui para outro mundo." Mamãe riu entendendo alguma coisa. Eu acho que fiz uma careta. Outro mundo? Como assim? "Já chega de ler Helena." Mamãe disse. Helena virou-se séria para mamãe. "Ler? Perdão mamãe, mas acho que a senhora não entendeu. Outro mundo." Mamãe parou de rir, enxugando uma lágrima que escorrera ainda sob o efeito da piada. "Qual mundo desta vez?". Helena sorriu de lado. "Nárnia." Tenho que ir, alguém está batendo na porta. Tchau querido diário."