Ops! - Entre o desespero e a esperança escrita por Fran Carvalho


Capítulo 9
Recepção perfeita?


Notas iniciais do capítulo

Esse é meu capítulo preferido... Aqui é onde fica claro o sentimento dos personagens, inclusive a inexplicável comparação de Camila com a prima-irmã ;)



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Eu abri a porta de manhã, ainda me sentindo um pouco elétrica e uma tontura tomando conta dos meus olhos. Avistei minha tia, meu tio e Inajara sentados no sofá da sala. Revirei os olhos, largando a bolsa em cima da estante, ao lado da porta.

- Eu sabia que você ia vir fazer fofoca, Inajara - resmunguei - O que foi que disse a eles?

Eu havia ficado a noite toda com Marcelo, fazendo coisas das quais não me arrependia. Inajara tinha ido embora logo depois que eu experimentara o baseado.

- Ninguém fez fofoca, Camila - tia Carla falou, calmamente - Inajara falou a verdade, ela é sua amiga, e se preocupa com você.

Revirei os olhos de novo, e fiz menção de ir ao meu quarto. Senti o braço forte do meu tio me impedir, atrás de mim.

- Camila - tio Luis tinha voz bem alterada - Você fez uma promessa a seu pai e a descumpriu hoje - ele me jogou com um empurrão no sofá menor - O que vai dizer a ele?

Eu movia-me rapidamente com braços e pernas para todo lado, como uma criança. Meu coração batia como um tambor dentro do peito. Eu sabia que tinha feito algo errado. Mas era teimosa o suficiente para não admitir.

- Ele não precisa saber - sussurrei alto.

Tio Luis abriu a boca para falar, mas foi interrompido por um gesto da esposa.

- Ele não vai saber - ela ainda falava maternalmente - Mas você nos deve uma explicação. Somos responsáveis por você agora.

Eu não respondi. Inajara debruçou-se sobre o próprio colo, mais próxima de mim. 

- Eu só falei que você usou drogas drogas, Mila - fungou - Você conta o resto, se quiser.

Sentei junto deles com o olhar fixo em Inajara. Tentei olhar para os outros dois, e encontrei o olhar de raiva de tio Luis, e voltei a olhar minha amiga. Meu tio estava com o mesmo olhar ameaçador do meu pai. As lágrimas escorreram pela minha face.

Mas nada me fazia mudar de ideia. Fiz algo errado por curiosidade. Por que todo esse discurso?

- Eu experimentei maconha. Só estava curiosa, e além disso, maconha não é droga, é só uma coisinha natural para gente se divertir. Eu não vou fazer isso de novo, eu prometo.

Me senti fuzilada pelos olhares dos três.

- Chega das suas promessas, Camila - meu tio nem olhava para mim - Sua curiosidade vai estragar sua vida.

Meu coração parou de pular e praticamente parou dentro do meu peito. Eu sabia que tinha descumprido promessas, mas não sabia que meu tio estava tão irritado, a ponto de não mais acreditar em mim. É como estar me chamando de mentirosa.

E agora isso. Essa história de curiosidade estragar minha vida. Eu sabia que minha curiosidade era excedida, mas isso era demais. Eu não ia fazer tanta besteira assim, a ponto de estragar minha vida.

- Sei que não vai fazer isso de novo - encorajou tia Carla, lançando um olhar de repreensão ao marido - Mas você devia ligar para seu namorado, ele está furioso com você.

Dei um pulo do sofá, a irritação transbordando nas veias.

- Ele não precisava saber! - gritei.

- Precisava, sim - disse Carla - Seu pai não vai saber, porque é capaz de morrer do coração ao ouvir a notícia. Mas André já sabe, nós contamos, quando ele perguntou por você.

Gruni, furiosa, meu rosto vermelho de raiva.

- Eu... odeio vocês! - gritei.

Tio Luis ergueu-se, ereto, e levantou a mão na direção do meu rosto, quase num tapa. Desviei o rosto, assustada, e ele olhou para baixo, o olhar vago e triste.

- Não quero uma drogada vagabunda dentro da minha casa!

Aquilo foi cravado no meu peito como uma enorme faca faria. Ser chamada daquele jeito, pelo meu tio era... horrível.

Nunca ia ser ela. Nunca ia ser Daiane. Nunca ia ser como a filhinha perfeita dele. Ela era esforçada, trabalhava, estudava, nunca saía para se divertir à noite. Eu era só uma garota preguiçosa, que gostava de aprontar e só fazia o que realmente tinha vontade. Ela realizava sonhos pequenos, para então sonhar mais alto. Eu sonhava alto demais, e não fazia nada para tentar realizar esses sonhos. Jamais ia poder ser comparada a Daiane Norberguer. Eu era horrível, e ela, era perfeita demais. Para mim.

Meu coração estava explodindo. Eu estava explodindo. Drogada vagabunda. Era como se eu tivesse usando crack, magérrima e abatida e simplesmente morrendo. Era como se eu estivesse me prostituindo para sustentar o vício.

Mas tio era maluco. Nunca ia fazer isso, nunca.

Era o que eu achava na época, pelo menos.

Olhei meu tio nos olhos, percebendo as lágrimas escorrendo pelo rosto dele e no meu.

Sem tempo nenhum de pegar a bolsa que deixara na estante, corri para o banheiro, e ajoelhei na frente do vaso sanitário, tentando vomitar.

Mas não havia nada no meu estômago.

♥♥♥

Eu ainda chorava de bruços na cama, quando ouvi minha prima chegar. 

- Aff - resmungou - É tão chato ter que trabalhar e ser perfeita e não ter as diversões dos catorze anos!

Gruni, sem levantar de onde estava.

Ela está me provocando?

Ela riu. Depois sentou-se num pulo na própria cama e me cutucou até que eu olhasse para ela.

- Só uma  coisa - ela falava sério - A próxima vez que quiser algo meu emprestado, peça, ok?

Ela falava da rasteirinha, é claro. Tinha esquecido de devolver.

- E então? - seus olhos brilhavam olhando meu rosto - O que foi que você fez a noite toda?

Enruguei a testa, confusa.

- Você não sabe?

Ela revirou os olhos, me empurrando, de brincadeira.

- Claro que não, eu sou a garota perfeita, lembra? - sussurrou.

Eu ri, e me sentei na cama, de frente para ela.

- Eu fiquei curiosa, sabe como é - contei - Só queria saber como era.

- E? - ela perguntou.

- Experimentei um baseado - dei de ombros - E dancei.

Ela riu.

- Você é maluca - declarou.

Resmunguei.

- Você que é chata. A garotinha perfeita do papai, que nunca apronta e está sempre certa.

Ela me jogou o travesseiro, rindo.

- Para com isso, eu não sou perfeita!

Dei um sorriso irônico, provocando. Ela balançou a cabeça, brincalhona.

- Eu te odeio, rebeldia.

- Eu te odeio também, perfeição.

♥♥♥

Passei pelo portão verde e pequeno da escola na manhã seguinte, percebendo todos os olhares em cima de mim, aos sussurros uns com os outros. Entrei na sala, e sentei no meu lugar, sem precisar olhar para o lado, para perceber que minha amiga não estava ali.

Procurei-a entre os outros, e a vi sentada com Bruna - a garota que nós duas detestávamos.

Com os olhos lacrimejantes, vi André rindo com os garotos da turma, como se nada tivesse acontecido.

Como se não me conhecesse.

A professora de português, uma loira alta e bonita que eu adorava, me olhava como se eu fosse a pior aluna que ela tinha.

E eu já tinha ouvido da boca dela, que era sua melhor aluna.

Eu era a garota que todos viam como a "nerd" da sala. Todos achavam que eu era comportada e filhinha de papai (ou titio) e que só tinha notas altas. Eu odiava isso, ainda mais quando ouvia esse tipo de comentário de professores, me usando como exemplo. Por isso, eu aprontava.

Eu sabia o porquê de estarem me tratando assim. Mas foi só um deslize. Eu só estava curiosa. 

E foi a aula toda assim. Às vezes, sentia vontade de chorar, gritar ou bater em cada um. Mas o medo e a vergonha me impediam.

Já cansara de olhar meus colegas e todos desviarem o olhar de mim. 

Sabia que merecia tudo isso. Não foi uma simples bebida alcoólica, mas também não era uma viciada em crack. E fala sério, não era a primeira na escola, nem na sala de aula, que experimentara maconha. Havia até pessoas de outras turmas na escola que usavam direto, e mesmo assim eram amigos dos meus colegas. 

Eu fui fraca, sim, sentia-me péssima. Custava dizer que não queria?Eu me senti feliz, mas foi só um momento.

Meu maior sonho era ser feliz. Eu havia encontrado isso quadno estava chapada.

Mas um momento não bastava.

♥♥♥

Ao toque do sinal do intervalo, arrumei os cadernos em baixo da mesa e segurei o livro que estava lendo nas mãos. Caminhei com passos firmes na direção de André e os outros meninos. Estavam rindo das pessoas que passavam, como sempre.

Eu tentei chamar a atenção dele, e ele fingia não me ver. Um encontrão no ombro proposital fez ele soltar um palavrão, mas não olhar para mim.

- André! - gritei, histérica e furiosa - Dá pra agir como homem e olhar pra mim?

Ele levantou as sobrancelhas pretas e grossas, e abriu a boca, fingindo estar assustado.

- Ficou maluca, garota? - ele falava baixo e calmo - Para de gritar, na boa!

Revirei os olhos, irritada.

- Só quero saber se está ou não comigo - expliquei - Seja adulta, e deixe as coisas claras.

- Ah, desculpe, "senhora maturidade" - ironizou - Claro que acabou, não tenho porque estar com você, me prometeu algo e descumpriu, lembra?

Senti meu coração pular no peito e chorar dentro de mim. Meus olhos verdes escuros cheios d'água olhavam fixos nele.

Ops, nas costas dele.

Ele virou-se de frente para mim, observando o livro em minhas mãos. Era Eu, Christane, F. Deu uma risada irônica.

- Bom o livro, acho que combina com você. - e piscou.

Virou-se e riu, sendo acompanhado pelos outros colegas ridículos. Revirei os olhos, chorosos, e lhe dei as costas, frustrada.


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Notas finais do capítulo

Ufa! Capítulo grande, né? Mas eu devia isso para vocês...



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