Dançarina Das Marés escrita por A Garota do Capitão


Capítulo 5
O Som do Destino




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/307297/chapter/5

Hoje, me assombra o fato de eu ter deixado aqueles homens inocentes morrerem. Quando fecho os olhos, ainda posso sentir o sangue quente manchando a maré fria e aquecendo a água salgada ao redor de seus corpos. Era como se eu dançasse ao sabor da maré de sangue deixada por aquele navio, era um espectro de suas maldades não reveladas e atos ediondos. Eu sim, era a prova de que aquilo havia mesmo acontecido, era a testemunha viva de quão cruel a alma humana podia ser. E o pior de tudo, era que aquela crueldade me atraía e varria minha mente como os ventos de uma tempestade, por mais que eu resistisse, era levada por ela.

Enquanto nadava para escapar daquelas imagens, peguntava a mim mesma porquê fora tão covarde quando se tratava de fazer o bem, e exatamente ao contrário quando se tratava de me arriscar apenas espionando-os, para satisfazer minha curiosidade infantil. Talvez eu não fosse tão boa como pensasse, ou apenas, algo em mim não me deixava ser... De uma maneira ou de outra, os marinheiros estávam mortos e não havia nada mais a se fazer a respeito. Atualmente, vejo que naquele momento eu deveria ter feito o oposto do que fiz. Não por estar correndo o risco de ser considerada má ou cruel, mas pelo fato de precisar fugir desta minha natureza bruta e selvagem, que era despertada com a simples presença daqueles homens. Mas algo em mim não pôde fazê-lo. Eu segui o navio deles, como uma rêmora que segue um tubarão para partilhar o sabor da morte que ele inflinge ao oceano, eu o fiz com aquela embarcação. Por mais estranho e confuso que pareça, eu me sentia ligada aqueles homens de certa forma. Importava-me com eles.

O navio se chamava “Libertá” , o que acredito eu, era exatamente o que ele simbolizava para aqueles marujos. Por um momento, eu tive a ilusão de partilhar tambem dessa liberdade. Era algo forte, que eu nunca havia sentido, apesar de ter vivido livre minha vida toda. É curioso como liberdade e o cativeiro andam lado a lado. Mesmo sentindo-me livre, como uma guardiã silênciosa daqueles piratas, ao mesmo tempo, estava presa a eles, como quem partilha um segredo hediondo e precisa consolar-se com os quais também o sabem.

O capitão era um homem sério, moreno, de pele queimada pelo sol. Possuía uma barba rente ao rosto e olhos negros, da mesma cor que seus cabelos desarrumados, que eram cobertos por um chapéu de penas elegante. Trajava roupas típicas de seu ofício e possuía duas pistolas em seu cinto, além de uma espada de lâmina grossa. Sua voz era firme e robusta, dava ordens com autoridade invejável, seus marujos tinham muito respeito por ele e faziam o que ele mandava imediatamente. Em seu pescoço, uma cicatriz que percorria o lado esquerdo, ia descendo até seu peito, onde desaparecia na camisa e não dava para saber ao certo sua extensão. Ele estava quase o tempo todo no convés, pelo que eu havia percebido, não confiava no timoreiro para guiar o navio, e preferia cuidar do leme ele mesmo.

Eu o via do meu local de sempre, escondida em meio as ondas. Quando o dia estava quente demais, nadava embaixo do navio, aproveitando sua sombra. Constantemente saía para pescar, distanciando-me do “Libertá”, porém sempre conseguia alcansá-lo com facilidade depois. Era como se o destino quisece que eu o acompanhasse. E foi isso que fiz, segui o que o destino me dizia.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!