Não conseguia deixar de rir ao ver Jasper prender a respiração para remendar o rombo no casco navio. Ele era extremamente desajeitado embaixo d água, e aquilo me divertia. Eu segurava a tábua no lugar enquanto ele a pregava, ou melhor, tentava pregar, indo de um em um minuto até a superfície para tomar fôlego, parecia mesmo um golfinho morto...

No entanto, apesar de demorar mais do que eu previra, conseguimos remendar o casco do “Libertá” diminuindo considerávelmente a quantidade de água que entrava no porão.

O pirata e eu conversávamos por horas, ele perguntava sobre a vida no mar e eu sobre a vida em terra e a bordo do “Libertá”.

–Eu acho o capitão um homem incrível... -comentei, a certa altura da conversa, quando Jasper o mencionou

–Para quem gosta de alguem cruel e sem coração, ele é -o pirata disse sarcástico

–É bom ser cruel, te mantém longe de problemas

–Acho que no caso dele, o mantém perto dos problemas...

–Minha irmã Lika iria gostar dele, ela sempre amou piratas, vivia seguindo os navios escondida...

–Assim como você ? -Jasper perguntou

–É...assim como eu. Mas acho que ela nunca chegou a falar com um, devo dizer que ela é bem mais esperta que eu...-comentei

–Sabe que eu não vou te entregar, Solara -ele afirmou, fitando-me -Afinal, se fizece isso, não teria mais ninguém para conversar...-ele sorriu

–Tem aquele seu amigo Lucius, aquele que anda de um jeito estranho...afinal, por que ele anda daquele jeito ?-perguntei curiosa. Já havia percebido que Lucius sempre caminhava de forma estranha, pendendo para o lado direito, e não me contive em perguntar.

–Ele levou um tiro na perna uma vez -o pirata explicou-me

–É como eu sempre digo, pernas só servem para atrapalhar...-comentei

–Só diz isso porque não tem uma...-ele revidou, rindo

–E nem queria ter, gosto muito mais da minha cauda. -boiei de costas, olhando minhas escamas, que reluziam ao sol. Meus cabelos eram loiros e ondulados, que iam até minha cintura, caindo sobre meus seios e ombros.

–Posso te pedir uma coisa ? -ele perguntou, fitando minha cauda de dentro do bote, que estava amarrado ao lado do “Libertá”, no qual o pirata fingia estar tirando as cracas do casco da embarcação como desculpa para ficar mais perto da água e falar comigo.

–Não vejo porque não...-respondi, apoiando os braços no bote.

–Não vá me levar a mal, hein. -ele preparou-me, antes de continuar -Eu...posso passar a mão na sua cauda ?

–Jasper...- me aproximei dele, fitando-o com meus olhos azuis- Por que não vai passar a mão em um atum ?

–Esse é um tipo de fora que sereias dão nos homens ? Porque se for, é bem criativo... -ele admite, esboçando um sorriso

–Eu não sei, sereias não dão foras...pelo menos, não em machos da mesma espécie...-ri da expressão dele

–Por que não? Eles nunca passam dos limites ás vezes ?-o pirata perguntou curioso

–Passam, mas uma sereia é considerada sortuda apenas por encontrar um parceiro, não pode ser muito exigente, se for, o risco de terminar sozinha, virando refeição de tubarão é bem grande...-comentei

–Que romântico...-ele disse irônico

–Muito. -concordei sarcástica

–Jasper !-ouvi a voz de Lucius chamá-lo do interior da embarcação

–Tava demorando! -o pirata reclamou, revirando os olhos -Melhor se esconder... -ele disse para mim, que assenti com a cabeça e logo mergulhei novamente, ficando abaixo do bote onde ele estava.

–Já terminou de limpar o casco ? -Lucius perguntou impaciente-O capitão está com pressa...

–Ainda não. -Jasper respondeu -Mas diga a ele que se tem tanta pressa, que venha fazer isso ele mesmo.

–Não vou dizer, afinal não quero assistir você levar um tiro no meio da cara, apesar disso ser bastante divertido ao meu ver...-seu companheiro revidou -Deixe que eu te ajudo com isso... -Lucius desceu do convés até o bote, onde Jasper estava raspando sem muita animação as cracas da madeira.

–Ah, e a história da sereia ? Viu sua amada com rabo de peixe de novo ? -Lucius perguntou em tom de zombaria, enquanto ajudava o outro pirata na tarefa.

–Claro, converso com ela todos os dias...-Jasper respondeu irônico, porém aquela não era nada além da verdade -Falando nisso, ela acha que você anda estranho.

Não pude acreditar que ele havia falado para o homem que eu disse aquilo dele. Ao ver a cara de Lucius, tive de conter o riso.

–Pelo menos eu ando -O homem revidou rindo, levando a conversa na brincadeira. -Sabe o que eu acho ? Que seria bem melhor se sereias tivessem a parte de cima de peixe, e a de baixo de mulher...seriam bem menos irritantes...

–Concordo, e não nos dariam foras... -Jasper acrescenta rindo, o que me fez revirar os olhos embaixo d água- Mas não se engane,- ele continuou- a parte de cima das sereias convencionais tem lá suas qualidades...

–Belos seios, eu espero -o outro comentou, rindo

–Superam muito os de mulheres com pernas, devo dizer. -Jasper afirma -Não que eu estivesse olhando, claro...-ele diz em direção a água, pois sabia que eu escutava.

Fiz uma expressão de surpresa com sua ousadia, porém não estava brava, apenas não queria deixar barato para aqueles piratas abusados.

Então subi próximo a superfície e joguei água com a minha cauda para dentro do bote, molhando ambos.

–O que diabos foi isso? -Lucius indagou, tirando a água do chapéu, após receber o jorro d água em si.

–Uma onda, eu acho -Jasper respondeu falsamente, olhando para o horizonte, como se procurasse as ondas, porém o mar estava calmo no dia, o que deixava sua reação ainda mais cômica.