Rise Again escrita por Fanie_Writer


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Olá tributos rebeldes!!!
Aí vai mais um capítulo para vocês... Leiam com atenção porque as coisas podem começar a confundir a cabeça de muita gente a partir desse ponto. Hehe
Nos vemos nas notas finais.



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– Comandante Hawthorne, você está sendo solicitado na Área de Combate Quatro. Comandante Hawthorne, AC Quatro.

Eu mal tinha pisado na Noz quando ouvi a voz pelo sistema de autofalantes. Apenas deixei minhas malas no meu quarto, no alojamento E120, e me direcionei para o local anunciado.

Depois da avalanche de pedras que soterrou a Noz durante a Grande Revolução - tática de minha autoria -, a fortaleza subterrânea foi quase totalmente reconstruída. Faltava uma restauração apenas na zona leste, onde antes operava o centro de armazenamento de munição, mas que passaria a ser mais um alojamento em caso de ataque no Distrito 2 e fosse necessário evacuar a população.

Um dos centros reconstruídos era a famosa Área de Combate Quatro, um dos mais eficientes centros de treinamento desde antes dos Dias Negros, quando o Distrito 13 se virou contra o Capitol.

Bati continência aos guardas da porta de metal da AC Quatro, posicionei minhas mãos para a leitura de digital e em seguida permiti o laser ler minha retina.

Quando as pesadas portas de titânio abriram, me vi perdido num cenário de selva, com sons de tiros misturados aos de animais selvagens e muita fumaça. Mais uma das geniais criações de nosso ex-Gamemaker Plutarch.

Então meu comunicador ecoou na minha cabeça.

– Comandante Hawthorne, bem-vindo. Siga a oeste e junte-se a nós na demonstração de exercício do novo grupo de recrutas.

Segui os comandos da presidente Paylor e, alguns metros dentro da selva depois, avistei a cúpula brilhante de vidro sendo revelada diante dos meus olhos para que eu entrasse.

Cumprimentei a presidente, Plutarch, Beetee e o secretário de finanças, Garry Collins. Durante a Grande Revolta, Garry foi o braço direito de Paylor no Distrito 8, sempre providenciando mantimentos, remédios e armamento para as tropas rebeldes. E rolava um boato por toda a Panem de que eles possuíam algo a mais.

– Como foi de viagem ao Distrito 12? – perguntou Plutarch.

– Boa. – disse tomando alguns relatórios nas mãos.

– Fiquei sabendo o que aconteceu com Peeta Mellark. Vou fazer um pronunciamento hoje para homenageá-lo.

– Será bom para o distrito e para a nação. – disse simplesmente. Eles entenderam logo que eu não estava disposto a falar sobre o que aconteceu no 12.

Passamos as próximas três horas discutindo a desenvoltura dos grupos de recrutas. Geralmente, esse treinamento era acompanhado apenas por mim e alguns oficiais do 2, mas Paylor insistiu em acompanhar dessa vez, já que havia uma folga em sua agenda. Sinceramente, desnecessário. Mas se ela queria, não seria eu a pessoa a se opor, afinal ela foi combatente um dia também.

Aprendi com meus próprios pesadelos que, quando se trata das marcas deixadas pela Grande Revolta, não se questiona. Apenas respeita... E se for possível, apoia.

Ao término do exercício, Plutarch desativou o sistema ilusório da selva, revelando o grande hangar de treinamento com a cúpula. Os soldados se reuniram em seus pelotões com seus oficiais à frente e eu fui lhes direcionar uma palavra de motivação e parabenização por passarem para o próximo nível de treinamento. Em seguida, a presidente também lhes motivou, destacando a importância de estarmos sempre prontos a defender nossa nação contra ameaças futuras, nos espelhando em exemplos do passado.

Com essas palavras, foi impossível não pensar em Katniss. A imagem dela vestida em sua armadura Mockingjay inundou minha mente.

Quando liberamos os soldados, comecei a discutir com Beetee uma visita ao seu laboratório no Distrito 13 para consertarmos uma falha em um de nossos dispositivos de armadilha instalado nas fronteiras do Distrito Quatro, mas senti uma mão de Paylor em meu ombro.

– Será que podemos conversar? – ela perguntou – Em particular.

– Eu acho que ouvi Cornelius me chamando pelo comunicador. Com licença presidente... Gale, te espero na terça-feira.

– Estarei lá.

Depois que ele saiu pela porta de metal voltei minha atenção para Paylor.

– O que...

– Aqui não. Vem comigo, comandante.

Segui a presidente por um emaranhado de túneis e corredores da Noz até que, finalmente pisamos fora da montanha. Paylor não falou nada até que nos embrenhamos na floresta onde um dia estive com Katniss. Onde nós nos beijamos pela última vez.

– Tire seu comunicador. – ela ordenou e eu removi o aparelho de minha orelha, deixando que pendulasse em meu ombro.

– Pelo visto o assunto é sério. E confidencial.

Paylor apenas respirou fundo, e me entregou a pasta preta que segurava. Abri para ver seu conteúdo e, conforme eu lia os papéis, mais perplexo eu ficava. Ela não tinha vindo aqui meramente para assistir ao treinamento de recrutas.

– Nossa divisão de investigação sobrevoou o oceano durante um exercício de treinamento e encontramos essas áreas das fotografias em suas mãos. Aparentemente são terras desconhecidas a nordeste. Analisamos o material coletado e então enviamos uma equipe de reconhecimento terrestre.

– Me lembro disso. Insisti para ir junto, mas meu pedido foi negado.

– Precisávamos de você aqui. Era arriscado demais enviar um estrategista tão importante para uma área desconhecida.

Continuei analisando as fotografias que, antes, eram de terras amplas e verdes, de pastos e áreas rurais. Até que começaram a aparecer fotografias aéreas de prédios e casas. Cidades imensas.

– O que foi encontrado lá?

– A questão, comandante Hawthorne, não é o que foi encontrado. A questão é quem foi encontrado e por que eles enviaram isso.

A presidente me mostrou a fotografia de um tipo de cápsula de transporte abandonada nas praias do Distrito 4. A data do relatório anexo à fotografia indicava que isso aconteceu há sete anos. Sete anos que essa informação estava em segredo do Comandante Chefe das Forças Armadas.

– Alguém foi capturado? – disfarcei minha raiva analisando com mais atenção a fotografia da porta da cápsula, com o brasão de um animal que eu não conhecia.

– Não. E não obtivemos nenhum contato direto.

– Eles estão infiltrados.

– Exatamente. Na época, pensamos que poderiam ser destroços trazidos do mar, da época que antecede os Dias Negros... Muito antes de nosso tempo. Mas a descoberta dessa nova área nos deu uma nova perspectiva – Algo em mim apitava em nível de alerta para as palavras de Paylor. Ou talvez fosse meu orgulho ferido por não ter sido o primeiro a ser comunicado sobre essas descobertas - Preciso que determine o nível de segurança três para todo o Panem, mas sem criar alarde na população.

Continuei analisando as fotografias do lugar desconhecido.

– O que acha que pode ser? – perguntei.

– Seja quem for, eles não estão dispostos a conversar, ou já teriam entrado em contato. – a presidente tomou os papeis de minhas mãos e então retirou do bolso um tipo de isqueiro. Mas segundos depois, quando ela prendeu o isqueiro à pasta e a lançou colina abaixo, eu soube que era mais letal. – É imprescindível que você mantenha isso em segredo, comandante. Reforce a segurança nos setores de arquivamento de informações e, se for preciso, aumente o número de guardas nos distritos e nas fronteiras para garantir a segurança da população. Mas sempre com discrição.

Ela começou a caminhar de volta à Noz com passos mais calmos daqueles que a trouxe aqui.

– E então, como está Katniss Everdeen? Gostaria de ter ido ao enterro de Peeta, mas sei como isso é muito particular no 12.

Então, era isso? Iríamos dividir confidências depois de eu ter sido deixado de lado em um assunto de segurança nacional?

– Ela está bem... Na medida do possível. – respondi o mais educadamente que consegui.

– E quanto a você? Faz exatamente 15 anos que não voltava ao seu distrito... e não a via.

Olhei para o céu de outono e pensei numa resposta para dar à presidente.

– Foi estranho. Não foi como se eu estivesse “de volta ao lar”. – acenei as aspas.

Pelo menos não até eu vê-la – quis acrescentar, mas me contive. Me lembrei mais uma vez de Katniss no lago e então de nossa despedida.

– Depois que esses... imprevistos... passarem, por que não tira um folga?

Ergui as sobrancelhas e parei. Paylor parou também.

– Você sempre foi um bom soldado Gale. Desde a revolta. Nunca nos decepcionou, mas me preocupo com a maneira mecânica como você age. É mortal e eficiente, claro, mas não é a mesma coisa de quando você está com ela.

– Você está sugerindo que eu tire folga, ou que recrute Katniss? – perguntei irritado.

– Eu vi você em combate com ela no 8 e aqui na Noz. Vi você, literalmente, arriscando o pescoço para mantê-la viva no Capitol. – ela indicou minha cicatriz no pescoço - É diferente do que você tem feito em combate com seus soldados ao longo desses anos. Não estou pedindo para você recrutá-la, embora ter alguém como Katniss na ativa fosse incrível. Mas talvez você precise treinar seu lado humano... Com ela. Dê uma folga para o comandante Hawthorne e volte a ser um pouco do Gale. Isso vai fazer bem para você mesmo e vai refletir na maneira como você comanda as Forças Armadas. Talvez até dê fôlego para que o Mockinjay cante um pouco.

Paylor piscou para mim e recebeu a escolta que a aguardava no portão de entrada da Noz.

Fui para o alojamento E120 e me joguei na minha cama. Cerrei os olhos com força e as palavras da presidente ecoavam em minha cabeça, misturadas com uma profusão de imagens de Katniss. Numa hora estávamos caçando na floresta, e na outra eu encarava seu rosto em pânico no esgoto do Capitol enquanto fugíamos das mutações de Snow. Em seguida, sentia o gosto de sua boca me beijando, mas então me lembrava de como ela beijava Peeta na primeira vez que esteve na arena dos Jogos Vorazes.

Me estiquei ainda de olhos fechados para alcançar o dispositivo telefônico na cabeceira da minha cama e digitei o número que, involuntariamente e mesmo sem nunca ter usado, acabei decorando. Olhei várias vezes, nas noites que perdia o sono, para a carta de Peeta que continha o número deles.

Depois de quatro toques, pensei em desligar, mas a voz do outro lado da linha me deteve.

– Alô? – a voz da pequena menina de cinco anos ecoou.

– Prim? – falei o nome com dificuldade por causa do caroço em minha garganta.

– Sou eu. Quem falando?

– Aqui é o Comandante Hawthorne. – me recriminei ao me lembrar que eu não deveria passar essa imagem aos filhos de Katniss – Aqui é o Gale.

Após minha correção, a garotinha deu um risinho do outro lado da linha e então sua voz soou distante.

– Quer falar com a mamãe?

– Quero sim, querida. Ela está?

sim, passar pra ela. Tchau comandante Gale.

Sorri com o cumprimento dela.

– Tchau Prim. – respondi, mas Katniss já havia pegado o fone.

– Por que ligou? – ela parecia irritada.

– Eu prometi que ligaria, esqueceu?! Como estão as coisas por aí?

– Estamos bem. – disse seca – Espere um minuto.

Ouvi ela dando instruções para seus filhos irem fazer qualquer outra coisa, que eu não entendi bem o que era.

– Que pronunciamento é esse da presidente?

Sem saber do que ela estava falando, abri os olhos e liguei a televisão do meu quarto. Paylor falava à nação sobre os tempos de paz e relembrava os heróis do passado, dando destaque à morte de Peeta, conforme ela havia dito assim que cheguei à Área de Combate Quatro. Para mim não havia nada de errado. Muito pelo contrário. As imagens marcantes dos heróis da revolução, montadas por Plutarch certamente, ficaram emocionantes. No final, ela relembrou as comemorações anuais do dia em que o poder de Snow caiu, mas que ficou publicamente conhecido como Festa das Flores. Uma homenagem direta as duas flores mais afetadas da revolução: Primrose e Katniss.

Mas, claro, rever todas as pessoas mortas durante a caça à cabeça de Snow foi demais para a mente de Katniss.

– Ela soube da morte de Peeta. Quis fazer uma homenagem. Creio que haverá mais na Festa das Flores.

– Isso foi... Isso... – ela lutava com as palavras - Por que vocês simplesmente não podem esquecer? Nos deixar em paz como antes?

– Katniss, isso só...

– Meus filhos não sabiam que o pai tinha morrido Gale! – ela disparou.

Um longo silêncio pairou na linha.

– Você não... Como você...?

– Eu apenas disse que algo ruim tinha acontecido com Peeta e que ele não iria mais voltar. Disse a eles que iria acompanhar o pai até o destino final dele, em um lugar de descanso. Eles não quiseram ir comigo e eu não insisti. Eu tinha tudo sob controle, mas vocês estragaram tudo!

– Katniss, você quer que eu vá...

– Não Gale. Fique onde você está. Foi um erro você pensar que poderia entrar na minha vida novamente.

O sinal de que a linha tinha sido desligada do outro lado me fez ofegar como se ela cortasse algo muito mais profundo do que apenas a conversa. Trinquei meus dentes com raiva.

Que Katniss não estava bem, isso nunca foi mistério para mim. Mas estava nítido que ela não só estava mentalmente frágil como também possuía uma variação de humor monstruosa.

E isso estava acabando com meu sistema nervoso também.

Depois da ligação desastrosa para Katniss me ocupei a semana inteira com o máximo de trabalho que meu corpo podia suportar. Fui do Distrito 13 ao Capitol, parando várias vezes no Distrito 2, pelo menos umas quatro vezes naquela semana. Fiquei vagando entre treinamentos, novas invenções, preparação de uma força especial de segurança confidencial e investigações a respeito do conteúdo das fotos da presidente.

Mas eu precisava parar, caso contrário, não estaria disposto para cumprir minhas obrigações impostas secretamente por Paylor e ainda comparecer sorridente à cerimônia de abertura da Festa das Flores, que aconteceria na próxima sexta-feira.

Fui para meu alojamento, já me livrando da jaqueta de meu uniforme, meu colete blindado, minhas armas e coldres, quando fui surpreendido com um par de mãos que cobriram meus olhos.

Depois de ter minha atenção, uma das mãos continuou tampando meus olhos enquanto a outra deslizava sobre meus ombros.

– Como está tenso comandante... Que tal uma massagem? Depois de um banho?

Um beijo foi depositado em meu pescoço e eu arrepiei, mais pela surpresa do que por excitação. Mas a dona das mãos se empolgou com o sinal de meu corpo.

Senti ela circulando ao meu redor e então seus lábios alcançaram os meus, me devorando com vontade. Abri meus olhos e segurei seu ombro com firmeza.

– Chelsea, eu não estou com cabeça para isso hoje.

A Sargento Chelsea Cliff era responsável pelo pelotão 834, e pertenceu ao Distrito 3 antes de vir para a Noz. Era cinco anos mais nova do que eu e, nas noites solitárias, ela era uma das minhas tentativas de ocupar o lugar vago em minha cama.

– Observei você durante a semana... correndo para lá e para cá... sempre tão sério. Você vai gostar de relaxar um pouco. – ela me empurrou e, como meu corpo estava cansado demais de tantos compromissos e viagens, não ofereceu resistência. Caí em minha cama e ela logo veio por cima de mim, me ajudando a terminar de me despir.

Apesar das carícias provocantes, estava impossível resistir à tentação de deixar minhas pálpebras fecharem entregues ao cansaço.

Chelsea ergueu meus braços acima de minha cabeça enquanto rebolava provocativa em meu colo. Mesmo diante do cansaço, eu começava a sentir meu corpo reagindo lentamente às provocações da tão disposta sargento loira, até que o telefone tocou, estridente no cômodo.

Paramos abruptamente, mas a sargento o ignorou, voltando a tentar alcançar meus lábios. Como minha cabeça permanecia virada na direção do aparelho berrante, ela alcançou apenas meu pescoço, desviando seus beijos da região onde estava minha cicatriz. Típico.

Algo dentro de mim gritava para eu atender o chamado do telefone. E eu segui meus instintos.

– Te acordei? – a voz de Katniss me despertou totalmente, como se eu tivesse levado um forte choque que me obrigou até a me sentar.

Empurrei Chelsea gentilmente para o lado, pedindo para ela fazer silêncio com um breve gesto.

– Não. Sou do clube dos insones. Nosso lema é vagar pela casa tomando licor para curar dores de cabeça, esqueceu? – arrisquei uma abordagem amigável. Pelo riso fraco do outro lado, funcionou.

– Eu... ergh... bem... Como você está?

– Cansado. Tive muitos compromissos essa semana. E você?

– Cansada também. Prim perdeu o primeiro dente de leite... quando brigou com uma amiguinha na escola. – ela bufou. Fechei os olhos e tive a oportunidade de vê-la rolando os olhos em minha memória e isso me fez rir.

– E a garotinha?

– Que garotinha?!

– Que apanhou. Está viva?

– Não brinque com isso, porque é sério. – apesar da repreensão, seu riso foi mais solto.

E então ela suspirou. Fiquei esperando tanto tempo que ela dissesse o que ela pretendia, que pensei, por um instante que ela havia me deixado sozinho no telefone.

E Chelsea aproveitou para voltar à sua atividade favorita: tentar me seduzir.

Ela começou a abrir meu cinto e o zíper de minha calça enquanto beijava meu pescoço e mordia minha orelha, mas eu estava concentrado demais em Katniss para sentir prazer em qualquer investida sua. Tentei gentilmente afastá-la mais uma vez quando mais um suspiro se fez ouvir do outro lado.

– Eu sinto muito pela maneira como falei com você... quando me ligou. Eu deveria ter te agradecido por ser gentil, e se preocupar conosco, mas ao invés disso descontei minha raiva em você. Ultimamente não tenho conseguido controlar... e acabo me fixando em alguma coisa para não me perder. Como Peeta com as algemas, lembra-se?

É claro que eu me lembrava. A visão de Peeta na escuridão dos esgotos do Capitol forçando sua pele contra seus ferrolhos até seus punhos estarem em carne viva era inesquecível. Mas o que ela queria dizer com isso? Que me atacar a estava ferindo? Que ela odiava se ferir daquela maneira? Ou que ela odiava me atacar? Ou ainda, que ela se forçava a me atacar, isso a feria, mas mantinha sua sanidade no lugar?

Comecei a ficar preocupado por ouvi-la admitindo que estava perdendo o controle. Isso era como ler as palavras de Peeta, admitindo que estava morrendo.

– Você quer que eu vá até aí?

Dessa vez Chelsea parou suas carícias. Ela me lançou um olhar azedo, manifestando sua raiva por eu cogitar deixar ela por, seja lá o que fosse mais importante para mim do que momentos prazerosos ao seu lado.

Mais um longo segundo de silêncio do outro lado.

– Você tem suas responsabilidades.

– Isso não responde minha pergunta. – rebati.

– Gale... É melhor não. Não agora. – deixei sua resposta afundar dentro de mim.

– Tudo bem... Quem sabe depois da Festa das Flores? - propus esperançoso.

– Talvez... É que... encontrei as cartas de Peeta. – meu coração falhou uma batida – As cartas que você enviou para ele. Haymitch me convenceu a ligar para você... Eu não queria pressionar, não era essa minha intenção, eu não queria incomodar, eu só... – mais um suspiro. Era como se ela precisasse respirar para não perder o controle de seus pensamentos e se afundasse em emoções e memórias. Sua confusão mental era notável e preocupante.

Mais um momento de silêncio e dessa vez eu suspirei, me negando a segurar tanta coisa dentro de mim. Eu precisava colocar ao menos um pouco para fora.

– Sinto sua falta. – confessei. Não era o bastante, mas foi suficiente para conter o aperto em meu peito. Depois de 15 anos contendo isso, era bom finalmente por para fora.

– Tente dormir um pouco, ok? – ela respondeu.

– Você também. E não tente curar dor de cabeça com licor. Seu vizinho é a prova viva de que isso não funciona muito bem.

Ela riu novamente, mas tinha um tom mais triste.

– Vou tentar. Boa noite, Gale.

– Boa noite, Catnip.

Ouvi um último sorriso seguido de um pesado suspiro antes dela desligar, me deixando em um silêncio gritante com meus pensamentos.

– Quem era ela? – a voz de Chelsea me tirou de meu momento. Meu e de Katniss.

– Você não a conhece.

Desliguei meu telefone e coloquei ele no lugar, voltando a me deitar. A sargento me observava com olhos pequenos. Sua íris verde parecia querer me devorar e eu não sabia mais se era de desejo ou raiva.

– Seja quem for, é uma concorrente muito forte.

– Isso não é um jogo Chelsea. E eu não sou o prêmio.

– De qualquer maneira eu não teria chances mesmo, já que você é louco por essa garota misteriosa.

Chelsea se levantou e saiu rebollativa do meu quarto, me deixando afundar no mar de palavras que rondavam minha mente. Da presidente Paylor, da sargento Cliff, de Katniss Everdeen.

Eu fiquei estirado na cama, procurando por respostas no teto. Minha mente era um turbilhão de palavras, que rodavam e rodavam como se estivessem se misturando. Ou tentando formar uma tempestade dentro de mim.

Algo na voz de Katniss me desesperou. Algo como se fosse seu próprio desespero tentando brotar para fora. Tive vontade de me levantar, pegar um trem e voltar correndo para o Distrito 12.

Mas eu não podia fazer isso.

Eu tinha deveres e responsabilidades. Eu tinha uma Festa das Flores para ir, uma investigação para concluir e um país para proteger.

Mas eu também tinha Katniss. Ela precisava de mim.

Haymitch me convenceu a ligar para você, ela disse. Por que seu mentor, que nitidamente me odiava, a teria convencido a entrar em contato comigo? Provavelmente ele estava bêbado. Mas por que ela acatou seu conselho?

Eu não sabia o quê, mas algo me dizia que existia algo a mais que ela não me contou. Sua voz era contida, mas ansiosa, o que indicava que ela estava se esforçando para se controlar. Mas para quê? Para não perder o controle, ou para não me contar o que a afligia? Teria isso alguma relação com minhas cartas, que ela encontrou? Provavelmente. Mas nada disso ajudou a clarear minha mente.

Quando o marcador em minha parede, onde tatuávamos nossas obrigações diárias em nosso braço, apitou avisando que era hora de acordar, eu continuava perdido tanto nas memórias reais quanto naquelas que foram vividas por mim em meus sonhos. E eu estava ainda mais confuso e cansado.

Mas de uma coisa que tinha certeza: de como a linha cronológica de meu relacionamento com Katniss era confusa e dolorosa.

Começamos como companheiros de caça, que passaram a ser confidentes e amigos. Eu me apaixonei por ela. Até aí tudo bem, porque mesmo se ela não tivesse ido para os Jogos Vorazes, eu ainda estaria disposto a esperar por ela, protegê-la e conquistá-la. Mas então veio Peeta. E com ele, todas as implicações e tragédias dos Jogos. E então a Grande Revolta, a destruição do Distrito 12, nossa estadia no Distrito 13, nossa caça ao presidente Snow... a morte de Prim.

Agora, tudo o que tínhamos eram quinze anos de silêncio.

Era nisso que se resumia nosso relacionamento. Um estranho, com um olhar de culpa e compaixão, como ela mesma disparou na noite em que jantei em sua casa.

Enquanto fazia minha higiene e tomava um rápido banho, fiquei pensando em como poderia um sentimento como o que eu sentia por Katniss se transformar em silêncio e constrangimento.

Talvez nunca fosse para ficarmos juntos. Talvez, se tivéssemos vivido em outras circunstâncias, pudéssemos ter tido uma vida juntos... Talvez, talvez, talvez... Do que me adiantava ficar perguntando o que poderia ter acontecido, diante das memórias vívidas e gritantes de tudo o que aconteceu?

De uma coisa eu tinha certeza quando saí do quarto, já devidamente asseado e uniformizado para mais um dia de responsabilidades: mesmo distantes, mesmo com o silêncio, mesmo com o medo, o constrangimento e as memórias, Katniss ainda estava viva. E, como aos 18 anos, eu precisava fazer o possível para protegê-la nem que isso me custasse minha própria sanidade.


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Notas finais do capítulo

Como vcs viram, tem muitos mistérios no ar e todos eles deixando a cabeça de Gale cada vez mais tumultuada.
Como se não bastasse esse vai e volta da relação dele com Katniss, que eles nem sabem mais definir em que pé está, a presidente ainda jogou sobre ele esse mistério de possíveis espiões em Panem. Mas de onde? Por que?
Bem, só lendo para entender...
Ou não...
=P
E ainda tem mais esse último telefonema de Katniss que acabou com o, digamos, momento de descontração do nosso comandante estressado. =P Hehe...
O que Katniss pensa sobre as cartas de Peeta e Gale? Por que Haymitch convenceu Katniss a ligar para ele, sendo que antes vimos que os dois não andam se bicando muito?
Não me xinguem, mas tudo isso vai ser esclarecido aos poucos... um tantinho em cada capítulo... basta estarem atentos aos detalhes...
Enquanto isso, aguardo os comentários e recomendações, ok?!
Um abraço sempre especial à loba Angel, que está firme e forte aqui! Obrigada diva!!!