Capítulo 20 – Organização

Na manhã seguinte sou acordada por Becky, que está empolgada com os preparativos para a ceia de ano novo. Mando uma mensagem para Thiago avisando que vou sair com ela e que não poderemos nos ver hoje, e ela faz o mesmo em relação a Guto. Descemos as escadas pulando e cantando uma música eletrônica, e eu acabo quase tropeçando num par de sandálias de tia Lourdes, que já havia saído para fazer alguma coisa da qual ela não nos informou. Becky ri de mim e vamos até a cozinha, onde dona Rosa havia deixado torradas prontas para nós. Sirvo-me de suco e dou uma mordida em uma delas, descobrindo que são de queijo com presunto. Retiro as migalhas de minha saia plissada preta e de minha regata, levantando-me e colocando o copo na pia. Olho para Becky e percebo que ela ainda está de pijamas, o que me arranca uma risada. Mando ela se vestir e ela obedece,  largando o copo ao lado do meu e subindo correndo as escadas. Desce uns cinco minutos depois com um shorts e uma blusa de mangas curtas azul. Pegamos as bolsas, abrimos a porta e vamos ao primeiro endereço que minha tia havia nos deixado, o da loja de fogos de artifício, uma pequena banca no centro da cidade, que não era muito longe dali.

Vamos a pé mesmo, conversando. Não demora para que cheguemos até o centro e encontremos a loja, um pequeno estabelecimento com um toldo vermelho e branco e portas de vidro. Entramos, e um simpático vendedor nos atende, levando-nos pelos corredores brancos com piso de madeira antiga, passando por todos os tipos de fogos com todos os tipos de cores. Os olhos de Becky brilham, e eu quase consigo ver as possibilidades passando pelo cérebro dela. Percebo que ela vai demorar um tempo ali dentro e resolvo sair da loja, avisando-a que vou comprar um sorvete. Ela concorda, e é isso o que faço.

Compro um sorvete numa daquelas máquinas de rua, sento-me em um banco antigo de pedra e fico observando a fonte no meio da rua jogar água para cima... Até que alguém senta-se do meu lado e cutuca minha cintura, me dando um enorme susto. Nicholas. Penso em xingá-lo, mas lembro que fizemos as pazes ontem e que não quero estragar essa trégua tão rapidamente. Sorrio para ele.

-Você quase me matou de susto! – Finjo estar indignada.

-Esse era o objetivo. – Ele dá um meio sorriso que, devo admitir, é bem bonitinho e conquistaria uma garota facilmente... Mas não a mim. Já conheço o tipo dele muito bem.  Simplesmente rio, e percebo que ele tenta encontrar uma forma de puxar assunto.

-Então... Que promessas e desejos de ano novo você vai fazer esse ano? – Ele pede, tentando escolher as palavras corretas para puxar um assunto.

-Na verdade, eu estava pensando em desfazer uma promessa que fiz há algum tempo...

-Que promessa? – Ele se mostra interessado.

-Ah... Uma bobagem.

-Ah, vamos lá, tenho certeza de que não é mais bobagem do que o meu desejo.

-Qual o seu desejo? – Peço, perguntando-me internamente se não vou me arrepender de ter pedido.

- Você primeiro. – Ele repete o meio sorriso.

-Ok. Eu prometi que nunca mais deixaria alguém chegar perto de mim o bastante para me machucar... E acho que está na hora de quebrar isso. E meu desejo... Ah, é idiota, mas... – Enrubesço e ele completa a frase por mim.

-O Thi. Saquei. – Ele baixa a cabeça. – Não é idiota e nem bobagem. – Fala, com um tom de voz sério que nunca havia o ouvido usar.

- Obrigada.  – Eu respondo, sorrindo. – Agora é sua vez! – Bato as mãos nas pernas como se estivesse em um jogo, e ele fica todo vermelho.

-Ah, minha promessa e meu desejo são basicamente a mesma coisa. Eu percebi há algum tempo que ficar com várias perdeu a graça. Eu quero alguém para mim, sei lá. – Ele fica ainda mais vermelho, se é que isso é possível.

- Ok, mas a Juli não era sua? Você deu um fora nela...

- Tá, ela era, mas não é o tipo de garota que eu quero.

-Que tipo de garota você quer?

- Quero uma garota que não se importe de fazer o que eu quero de vez em quando, que ria das minhas piadas, que aceite minhas brincadeiras, sei lá, que fique do meu lado, sabe? – Ele pergunta, e percebo que ele já está totalmente à vontade comigo.

- Sim, eu te entendo. Sabe... Não pensava que você fosse assim.

-Assim como?

-Que, sei lá... Que você tivesse sentimentos. – Admito, e ele sorri.

- A maioria das pessoas pensa assim, mas eu só não gosto de mostrar.

- Entendi. – Concordo com a cabeça, e nesse momento Becky sai da loja com uma sacola enorme.

-Viu, não demorou tanto... – Ela interrompe o tom de voz informal quando vê Nick. –Ah, olá! – Ela diz, alegre. – Não vi que você estava aí.

- Ah sim, não tem problema, eu já estou indo... Tchau Lice, a gente se vê. – Ele diz, usando o apelido que não aturo, mas simplesmente ignoro e me despeço dele.

- Lice? O que é isso, hein? – Becky provoca assim que Nicholas sai. Olho para ela com reprovação.

-Nem pense nisso!  Estou com o Thiago.

-Ai, me deixa sonhar! – Ela sempre havia visto eu e Nicholas como o casal perfeito, imagine só. Reviro os olhos.

-Vamos, temos que escolher a decoração e o cardápio.

Ela concorda com a cabeça e pegamos o próximo endereço, que fica mais para o fim da rua principal. Seguimos até lá e percebo que é uma empresa de organização de festas. Sentamo-nos nos sofás de couro branco e aguardamos que alguém nos atenda, enquanto eu observo o local. Diversas mulheres atendem ao telefone, parecendo estressadas devido às festas de fim de ano. Uma grande árvore de natal se encontra no centro do local, e cada bola de enfeite tem o nome de um funcionário da empresa, o que acho uma ideia bem criativa. As paredes são brancas e uma porta no fundo da sala dá para um corredor vermelho, de onde sai uma mulher baixinha, usando um vestido longo de bolinhas e com um daqueles microfones pendurados no ouvido, conversando com alguém. Ela sorri ao nos ver.

- E então, qual de vocês é a afilhada de Lourdes?

-Eu. – Dou um sorriso.

- Ela me falou que vocês viriam, então podem entrar. Lourdes já é cliente.

Seguimo-la até uma sala grande, com uma escrivaninha de madeira antiga, um notebook, catálogos e uma grande janela que dava vista para o centro. Ela senta na cadeira giratória vermelha e cruza as pernas, aguardando o que diríamos.

- Então, minha tia me mandou escolher as decorações e o cardápio da festa de ano novo que ela quer dar.

-Sim, isso eu já sei. Agora, qual o estilo que você prefere? Clássico, romântico, gótico, colorido...

- Romântico. –Eu nem pensaria em escolher outro tema, então falei sem hesitar.

-Ok. Aqui está o catálogo.

Ela me passa um livro com um grande coração em cima, todo cor de rosa. Eu o abro e dou uma olhada. Escolho mesas redondas de metal branco clássico com uma cara um pouco parisiense, cadeiras de ferro branco retorcido em desenhos florais, toalhas brancas com glitter e, mesmo que o píer da casa não fosse o lugar da festa, acho interessante pendurar nele diversas luzinhas de Natal à prova d’água, pendendo da sacada superior como uma cortina. Becky ama a ideia, já que poderia ser visto do jardim e, de acordo com ela, daria um efeito mágico. A mulher, que se apresentou como Teresa, aprova todas as minhas ideias. Em seguida, me passa o cardápio. Escolho lentilhas e uvas, para as clássicas tradições de ano novo, além de massas e carnes variadas e, de sobremesa, uma fonte de chocolate com marshmallows e morangos cortados em forma de coração. Depois de todas as escolhas feitas, saímos e voltamos para casa.

Minha tia já se encontra lá, e empolga-se ao ouvir nossas escolhas. Em seguida, entrega para cada uma de nós um pacote, sorrindo. Abrimos e ficamos boquiabertas. Becky recebe uma blusa branca de ombros caídos, um shorts e um pequeno colar com duas máscaras, representando o teatro, além de um saltinho baixo prateado. Eu recebo um vestido de paetê alternando entre branco e prata, um salto alto também prata e um livro de romances natalinos. Abraço minha tia, agradecendo o presente. Percebemos que já eram sete horas, então subimos para o quarto, tomamos banho e descemos para jantar. Combinamos os últimos detalhes da ceia, dou boa noite por mensagem para Thiago e vou dormir.