Minha tia volta perto do meio dia, com uma pizza em mãos.

-Dei uma folga para a Rosa hoje e decidi buscar comida eu mesma. Escolhi de frango e de chocolate, tudo bem para vocês?

-Tudo ótimo. – Respondo, já que são dois dos meus sabores favoritos.

Sentamo-nos a mesa e comemos com as mãos mesmo, como quando éramos crianças e tudo era muito fácil. Becky e eu cansamos de comer desse jeito nas nossas inúmeras festas do pijama... Sinto gosto de infância. Vou até o banheiro e esforço-me, por minha melhor amiga, para parecer no mínimo apresentável. Domo meus cabelos com uma escova e os prendo em um rabo básico, passo base, gloss transparente e rímel e escovo meus dentes. Becky coloca uma saia jeans e uma blusa simples e caminhamos até a pracinha, onde eles haviam combinado de se encontrar.

-E aí, como estão vocês? – Escuto a voz de Thiago falando, me viro e o vejo parado no meio da praça, encarando-nos com seus olhos verdes e vestindo uma bermuda jeans e blusa azul.

-Tudo bem, e com você? – Becky responde com a voz mais fina, tentando parecer amável.

-Tudo ótimo... E então, vamos para o cinema?

Nesse momento, Nicholas e Juliana aparecem do outro lado da rua, de mãos dadas.

-Chegamos! – Ele grita com aquela voz irritante, e ela dá uma risadinha que mais parece um pombo. – O Joel avisou que não vai poder vir, porque ele e a namorada ganharam uma viagem para Natal até o fim da temporada, estão arrumando as malas. Ele me mandou dar tchau para vocês por ele.

-Como assim?

-A mãe dele resolveu dar de presente para os dois de um ano de namoro, e a viagem sai hoje.

-Ah, tudo bem. E então, o que está em cartaz?

- Opa, nós nos esquecemos de ir olhar... Estávamos distraídos. Sabe como é o amor. – Juliana dá um guinchado de alegria, e eu reviro os olhos. – Becky, você vai conosco dar uma olhada?

-Eu vou junto!  - Me ofereço rápido.

-Não, não, você vai com o Thi comprar as bebidas... No cinema é caro demais. Tem um bar no centro da praça que vende por muito barato!

-Tá, e por que motivo a Becky não vai com ele e eu vou com vocês? – Digo, tentando salvar minha amiga.

-Porque eu não te suporto. – Ele me deixa boquiaberta.

-Nossa, tudo bem. Então porque Becky não vem conosco, ou então o Thiago vai com vocês?

-Porque eu e a Juli vamos acabar nos... Bem, distraindo se alguém não for junto. – E eu realmente achava que ele não podia ficar mais idiota. – E se nós deixarmos vocês duas, não vão nem saber o que fazer.

-Ah, desculpe se você não tem nem um pouco de noção e não sabe levar nada a sério... Nem para ir ver um filme em cartaz. Tudo bem, eu vou com o Thiago. – Becky faz cara de desapontada, e eu murmuro um pedido de desculpas para ela. –Tudo bem Alice, só que agora entendo a raiva que você tem por esse garoto... Insuportável! – Ela dá uma risadinha nervosa e apenas segue o casalzinho para o outro lado da rua, indo em direção ao cinema.

-E então, vamos? –Pergunta Thiago. Resmungo alguma coisa e concordo com ele. –Por que todo esse mau humor?

-Ah, aquele seu amigo me tira do sério, desculpa.

-É, o Nick exagera um pouco às vezes... Aposto que ele não tem nada contra você, mas a Juliana é ciumenta e deve ter falado algo para ele.

-Não acredito... Até parece que eu ia querer algo com alguém que me trata pior do que eu trato um cachorro! Quer dizer, não que cachorros sejam maltratados por mim. Na verdade eu amo eles, mas... Ah, esqueça! Eu estou falando demais, eu sempre falo demais.

-Para mim, você não está falando demais. Eu gosto do seu jeito. –Eu enrubesço. Droga, o que estava acontecendo comigo?

-Obrigada. –Sorrio.

-Você fica muito bonita quando está vermelha. – Ele sorri ironicamente.

-Você também... Quer dizer, obrigada de novo. – Xingo-me internamente por estar ali com ele, pelo que tinha acabado de falar e por estar sentindo meu coração bater mais rápido.

Ao perceber que ele estava me deixando envergonhada, simplesmente anda mais rápido, ao ponto de eu ter de correr para alcançá-lo, e entra no bar. Entro atrás, analisando o ambiente cheio de pequenas placas antigas, as paredes listradas e o velho balcão de madeira com pequenos bancos giratórios na frente. Pedimos cinco refrigerantes a um senhor de bigode usando um macacão cinza que, pelo jeito, era o dono.  Pagamos no caixa, que tinha uma daquelas máquinas antigas de supermercado e saímos, voltando para um banco no centro da praça.

-Você tem alguma rede social, celular, ou algum jeito de eu falar com você em particular? –Ele me pergunta do nada, e eu o olho desconfiada. Ele sorri. – Calma, eu só gostei de conversar com você, me parece uma garota muito legal. – Agradeço e passo meu Facebook e meu celular, apesar de não saber por que diabos eu estava fazendo aquilo. E a Becky? Meu Deus, qual é meu problema?

Ele estava prestes a continuar o que estava falando quando ouvimos vozes do outro lado da rua. Becky, Nicholas e Juliana estavam vindo, o casal abraçado e minha amiga com a cara fechada.

-Ai que droga! –Becky exclama. Além de segurar vela em todo o caminho, descobrimos que o cinema está fechado por causa dos alagamentos, assim como a praia... Algumas salas estão cheias de água e eles têm que limpar.

-Ah, que péssimo, quando volta a abrir? – Thiago pergunta.

-Não sei, não tem previsão exata, mas acho que ainda essa semana...

-Ah, droga... Mas tudo bem, amanhã nós vamos ter a praia.

-E o que a gente faz hoje? – Pergunto.

-Acho que a gente fica por aqui conversando mesmo. –Thiago entrega um refrigerante para cada um, interrompendo a tentativa de desentupidora que Juliana estava aplicando em Nicholas. Posso ser antiquada, mas para mim isso é nojento demais, e fico feliz ao ver que não teria mais de passar por aquela tortura visual. Eu deveria ter nascido alguns séculos atrás... Minha visão das coisas é totalmente diferente do que todos pensam hoje em dia.

Passamos o resto da tarde rindo e contando piadas, e Becky parece cada vez mais irritada com o fato de Thiago prestar atenção em mim, mas eu não tenho culpa... Tenho? Eu não sei responder... Por que tudo é tão complicado?