-Sakura… Eu me lembro.

-Hã? –Não havia entendido. Mesmo.

-Eu me lembro do que aconteceu na festa, na minha casa. –Disse olhando para o nada.

Meus ouvidos captavam muito bem o que ele falava, mas a minha mente não processava. Como ele se lembrava?

-O que disse? –Estava chocada de mais. Precisava ouvir mais uma vez. Só mais uma vez. Talvez assim minha mente se convencesse de que Sasuke realmente sabia do que estava fazendo da noite do Dia das Bruxas.

-Disse que eu me lembro, está surda? –Falou mais alto.

-Como? –Suspirou, impaciente. Bagunçou a parte de trás dos cabelos e me olhou tentando manter a calma.

-Você não era acostumada a beber, né? –Perguntou já afirmando.

-Não. Pelo menos não sucos batizados com MDMA¹! –Respondi brava. Eu era acostumada a beber. Não todos os dias, mas frequentemente. Bebia bebidas quentes que o meu pai armazenava. Gim, de preferência. Cheguei a comentar com vocês, há alguns capítulos atrás, o episódio do banheiro quando bebi uma garrafa de gim e com os cacos dela fiz meu primeiro corte.

A causa?

Amor não correspondido pelo meu primo.

-Percebi, porque você ficou muito louca, sério mesmo… -Disse com uma expressão séria. Não foi sua intenção parecer engraçado, embora sua frase tivesse um tom de gozação.

-Me conte uma novidade! –Falei irônica, mas ele me contou mesmo uma novidade. Fiquei confusa. Não entendi se ele havia notado que eu tinha sido irônica ou se o que ele me disse já estava na ponta da sua língua.

-Neji que cuidou de você. –Revelou, ainda com a expressão séria, os olhos pequenos e escuros apertados. Os lábios em uma linha reta.

-O Neji? –Perguntei incrédula. –Mas ele…

-Eu sei, vocês nem se falam, -Não. Contava nos dedos todas as vezes que falei com o Neji ou vice e versa. Antes, porque não tínhamos assunto e porque ele me olhava de um jeito assustador quando comecei namorar com Naruto, depois da festa do Dia das Bruxas ele deixou até de me responder quando raramente eu me dirigia à ele. No começo eu pensava que era normal, todos estavam putos comigo, mesmo eu não tendo culpa de nada, só que quando todos os outros meninos voltaram a me cumprimentar e ele não, então eu soube que o que Neji tinha comigo era algo mais pessoal. Nossos santos não se batem. Isso não quer dizer que eu dê a mínima para ele. –, mas  Neji tem uma consideração enorme pelo Naruto por causa de umas coisas que aconteceram há um tempinho… -Quando abri a boca para perguntar “que coisas?”, Sasuke parece ter previsto e me cortou. –Enfim. –Me olhou nos olhos. –Ele não fala direito com você porque ele sabe tudo o que aconteceu naquela festa, inclusive que você ficou grávida de mim e onde você está agora. –Okay. Uma surpresa atrás da outra. Eu devo ter realmente dormido no divã e estou tendo pesadelos porque deitei de barriga para cima.

–Isso é impossível. -Disse. –Você só pode estar de brincadeira…

-Não, não estou não. Sakura, você pode pensar que nos conhece bem, mas temos mais do que histórias de ressaca para te contar, mais histórias do que você tem para ouvir… -Já ia abrir a boca para perguntar “que histórias?”, mas novamente me calei. Sasuke não parecia paciente para interrupções, embora eu também estivesse com os hormônios à flor da pele para descer um tapa naquela cara lisinha. –Aconteceram muitas coisas que nos separou e nos uniu antes de você pensar em se mudar para a cidade.

-Isso não vem ao caso. –Me fiz de difícil. –Quero saber como você se lembra e por que não me contou. –Sim. Apesar de eu estar roendo as unhas de curiosidade sobre o passado dos meninos, essa não era a questão. Sasuke havia me enganado quando disse que também havia sido drogado e não se lembrava de nada. Eu sabia que era mentira. No fundo eu sabia, mas queria acreditar no contrário.

-Como disse, você estava louca, nunca tinha experimentado alucinógeno, já eu não. –Ele quis dizer que é o maior drogado? Eu ouvi direito?

Um minuto para explicar minha surpresa:

Que o Sasuke fuma de tudo e bebe igual um mendigo velho, não é novidade, disso todos sabem, mas que ele usa esses negócios pesados, não. Não imaginava. Sério.

-Mas você estava bêbado! –Tentei justificá-lo. Não queria acreditar que ele seria tão canalha ao ponto…

-Sim, mas lúcido. –Não entendia como ele conseguia me confessar aquilo sem nem ao menos ficar vermelho. Então ele estava ciente de que eu estava drogada, que tinha um namorado, por acaso o melhor amigo dele e que não era correto me arrastar para a cama como ele faria com qualquer outra menina caso eu não estivesse ali. Ele estava ciente.

-Isso não faz sentido… -Andei zonza até um poste de luz para me escorar. Eu já estava nervosa, sentia minhas pernas fracas. Maldita gravidez! Meus dedos estava trêmulos.

-Estava bem louco, mas sabia do que estava fazendo. –Acrescentou.

-Como você pôde? –Ergui meu olhar para ele. As lágrimas acumuladas nas minhas córneas não me deixavam ver seu rosto. Sua expressão estava embaçada. Meus dedos tremiam. –Você sabia… -Minha voz rouca.

-Eu…

-Naruto era seu melhor amigo… -Continuei, já segurando o dilúvio com os punhos, me escondendo sob os braços.

-Ainda é! –Ele corrigiu, segurando meus ombros com a voz mansa.

-Não, não é! –Gritei o fazendo largar-se de mim. –Como pôde, Sasuke? –O olhei com sinceridade. Só queria a verdade.

-Sakura! Calma! –A voz mansa. Maldita voz mansa. Por que ele estava apelando! Ele não se preocupava! Ele odiava ver meninas chorarem! Eu sabia que ele queria me bater por isso! Por que da maldita voz mansa? –Quando vi, aconteceu!

-Aconteceu, Sasuke, por isso eu não vou ter calma! –Falei limpando as lágrimas com a manga do moletom. –Não foi “sem querer”, não foi “por acaso”! Você sabia que eu estava drogada, que era namorada do seu melhor amigo e que jamais, em sã consciência, faria isso com você ou com qualquer outro cara! –Pelo meu tom de voz, as pessoas, mesmo que de longe, já nos observavam. Eu estava num estado de nervos tão grande que não tinha mais controle sobre meus braços e pernas. Sabia que se não fosseo poste, eu não estaria mais de pé.

-O fato de eu me lembrar não quer dizer que eu estivesse muito melhor do que você! –Explicava com mais determinação na voz, sem o falso tom de acalanto. –Sakura, você… você estava linda! –Falou sem jeito, baixinho. –Eu quis muito te beijar… -Ele sempre fazia o que queria… -, então, eu te beijei! Juro que não era minha intenção chegar àquele ponto, mas… -Ele jurava que não era aquela sua intenção.

-Eu deixei? –Perguntei mais calma. Os olhos vermelhos, mais secos. A voz limpa, mas pesada. Meus dedos ainda estava trêmulos.

-Hã?

-Eu te beijei de volta? –Reformulei.

-No começo, não, mas depois você começou a me corresponder, por isso não parei… -Confessou um pouco sem graça, olhando para os lados, escondendo as mãos nos bolsos.

-Eu não estou acreditando… -Disse sentindo meu nariz formigas novamente. Olhava fixamente para os sapatos de marca que ele usava. –Como foi? –Perguntei ainda com a cabeça abaixada.

-O sexo? –Ele não esperou minha resposta. –Bom, não me lembro muito, não sei como fomos parar no quarto, disso eu não sei, mas lembro que queria muito e você não me dava motivos para parar…

-Porque eu estava drogada!!! –Vociferei!

-Que seja! –Disse estendendo a mão no poste, bloqueando um dos meus lados. –Transamos e filmaram. Também não me lembro quem foi o filho da puta, ainda é um mistério… Quando o efeito das drogas passou, eu percebi o que tinha feito.

-Não parece nenhum pouco arrependido

-Não estou. –Arregalei os olhos em espanto. –Bom, eu gostei. Do sexo, quero dizer, da gravidez não. –O canalha ainda tinha coragem de dizer.

-Ah meu Deus! Como você é ridículo! –Saí pelo lado onde o braço dele não me barrava.

-Calma, Sakura! Volta! –Foi atrás de mim. Estava voltando para a praça. Não parei quando ele me chamou.

-Você deixou que tudo isso acontecesse! –Dizia enquanto ele trotava atrás de mim. –Eu me culpei por tanto tempo e foi você o irresponsável que provocou tudo isso!

-Hey! Não aja como se só você detestasse essa situação! Era para eu estar em casa transando com alguma garota, mas estou aqui, com você, tentando fazer as coisas direito. –As pessoas passavam e nos olhavam com expressões engraçadas. O que dois jovens faziam na rua até tarde? Por que eu era pequena e tão gorda? Por que ele falava obcenidades em alto e bom tom?

-Dá para falar como um homem  pelo menos uma vez na vida?! –Pedi entre dentes. –Eu não pedi para você estar aqui! –Disse.

-Mas seus pais, sim! –Retrucou.

-Sasuke, sua mãe que se convidou para passar o fim-de-semana aqui com você, lembra?

-Não interessa! O que eu quero dizer é que você não deve me culpar por algo que não foi intencional. Eu sou homem, porra! Aquele negócio de consciência não existe quando bebemos, tanto que acabamos transando, mesmo sendo amigos. –Uma velhinha olhou feio para ele e eu resolvi parar e escutá-lo antes que ele me matasse de vergonha.

-Você não tem o direito de se fazer de vítima! –Vociferei o mais baixo que consegui.

-E você não tem o direito de colocar toda a responsabilidade sobre mim. –Rebateu cruzando os braços.

Eu desisto.

-Sasuke. –Comecei exausta. –Eu estou grávida. Não podemos mudar isso. –Disse. Tentava fazer com que ele entendesse a gravidade da consequência da irresponsabilidade que ele teve.

-Não… -Concordou mais calmo.

-Quero que entenda que tudo isso poderia ser evitado se você tivesse um cérebro para pelo menos encapar seu pau com uma camisinha! –Disse só para ele escutar. –Se estava melhor do que eu, podia ao menos hesitar…

-Homem quando está com o pau duro não pensa! –Isso ele fez questão de falar alto perto de uma garotinha. –Revirei os olhos e voltei a andar. Ele nunca levaria uma conversa a sério ou tentaria considerar o meu lado. –Espera!

-Parece que você não entende! -Explodi.

-O quê? –Perguntou na mesma impaciência que a minha.

-Isso! –Apontei para a minha barriga. –É um filho. É seu filho, o meu filho. É para sempre. -Abaixei a cabeça. –Eu já pensei em ser mãe, mas depois de adulta, morando na minha casa, com o meu emprego, um marido que me amasse… -Ele me escutava em silêncio, sério. –Eu tenho dezesseis anos, estou no ápice da adolescência com sonhos e planos que não serão realizados. Eu queria minha alta, meus cursos, uma boa faculdade, um emprego que eu gostasse… Pensava em casar com o Naruto… -Quando falei do Naruto, observei seu pomo de Adão subir e descer e o maxilar travar. –Hoje tenho que pensar nessa criança antes de tudo. Não é fácil, Sasuke… -Queria voltar a chorar. –Sei que você também terá que abrir mão de muita coisa, mas em comparação comigo…

-Eu sei. –Disse.

-Essa criança. O que representa para você?

-Não sei. –Comprimiu os ombros.

-Não sabe. –Afirmei o que ele disse. –Pois eu sei. –Cruzei os braços. –Para você, ela representa um gasto a mais. –Comecei chorar de novo. Gente, eu juro, era a gravidez. Normalmente eu não teria chorado.

-Claro que não! –Exclamou.

-Você mesmo que disse isso hoje de manhã! Que ia bancar com as despesas!

-Sakura. Para de chorar. –Falou irritado. –Não vai ser assim também. –Se aproximou mais de mim e segurou meu rosto contra seu peito. Eu ainda chorava. –Meu irmão disse que quando ele soube que ia ser pai, também não ficou muito entusiasmado, mas quando segurou minha sobrinha no colo pela primeira vez, soube no mesmo instante que ela era a pessoa mais importante no mundo para ele. –Ao ouvir o que ele havia dito, minhas lágrimas cessaram e eu fui obrigada a fitar seu rosto. Não parecia mentira. –Me dê um tempo. –Afagou meu cabelo. –Minha mãe está apostando tudo nisso, eu também. É só uma questão de tempo. Você vai ver. –Me abraçou sem jeito, dando tapinhas de leve nas minhas costas. –Vai dar tudo certo. Seremos bons pais. –Beijou o topo da minha cabeça e me largou as poucos. –Vamos para casa. Amanhã eu te mostro um lugar…

Naquele momento a minha preocupação era como eu iria conseguir dormir com aquele cheiro de perfume caro do Sasuke?