Eu, Fora De Controle escrita por Lionardo Fonseca Paiva


Capítulo 14
Capítulo 2 - Interlúdio 2




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Interlúdio 2

No aeroporto de São Paulo, um casal de idosos olhavam os passageiros saírem, um por um. Até que apareceu a figura de Raquel Prado com duas malas nas mãos. Ela olhava de um lado para outro como quem procura um rosto conhecido.

O casal se aproximou cheio de sorrisos indagando:

— Raquel?

Ela olhou para eles e sorriu: — Sim.

— Puxa. Quase não a reconhecemos. Você cresceu bastante. Seu pai nos telefonou avisando que viria. Somos seus tipos. Eu sou Barnei e essa é minha esposa, Aurora.

Raquel os abraçou feliz. Sentia agora mais segurança ao ver aqueles rostos conhecidos. Seu pai já tinha lhe dito que viveria com eles por um tempo. Eram pessoas muito carismáticas e ao vê-los já gostou deles o suficiente para ficar a vontade. Barnei era irmão mais velho de seu pai e tinha mas tinha a aparência um avô que ela nunca teve.

— Claro que me lembro de vocês! Faz tantos anos que não nos vemos mas não ia esquecer de meus tios que me enchiam de presente quando nos visitavam no Natal.

— Você cresceu Raquel. Esta uma mulher adulta. Esperávamos uma garotinha. — disse o tio emocionado.

— Você vai passar uns dias em nossa casa, Raquel. Vai nos encher de alegria em tê-la conosco. — disse a tia, que a olhava ternamente.

Foram para fora do aeroporto e pegaram um táxi. Meia hora depois Raquel estava em seu novo lar. Um apartamento longe do centro mas confortável e, principalmente, com espaço. Ela gostava de espaço. Os tios lhe eram atenciosos e preocupados em agradar. Aos poucos ela foi tendo toda a mordomia possível. Depois que o filho do casal casou eles ficaram morando sozinhos e a vinda de Raquel, para eles, era como dar nova vida àquele apartamento, embora ela fosse passar mais tempo no colégio que Nilson havia escolhido. Era do tipo internato.

Duas semanas depois de haver chegado de viagem, Raquel foi-se matricular na escola que seu pai indicou. Os tios insistiram em acompanhá-la.

— São Paulo é uma cidade traiçoeira, minha filha, aprenda isso! — diziam eles a todo instante. — Vai ser bom para você ficar como interna no colégio para terminar esta fase do seu curso e se ambientar na cidade.

As aulas para ela iniciaram pouco depois da matrícula. O colégio era amplo, cheio de escadas e possuía todo tipo de sala de aula montadas de acordo com a disciplina do curso. O prédio era velho. Uma construção antiga, com paredes altas e janelas compridas. Parecia um castelo abandonado que reformaram para montar a escola.

Mostraram para ela seu novo quarto, uma sala enorme e cheia de camas, todas bem arrumadas. Ao lado de cada cama existia um armário para colocar as roupas. Era bem limpo e o piso possuía carpete. A supervisora que mostrava os aposentos de Raquel disse:

— Nesse quarto é proibido entrar com qualquer tipo de calçado. Antes de entrar coloca-se o que estiver usando na porta — e apontou para uma enorme sapateira de ferro onde depositavam os calçados. — A principal obrigação de todas as meninas aqui, além das outras que irei citar, é arrumar sua cama ao levantar...

Raquel jamais arrumara uma cama.

— Aqui todo mundo levanta cedo, sempre às seis da manhã...

Ela não acordava cedo, principalmente às seis. Em Rio Verde, o emprego tinha com seu pai tinha entrada às nove e ainda assim chegava atrasada. Não gostava de obrigações. Só começou a trabalhar porque o pai insistiu bastante.

Mas não ia agora se arrepender de ter ido parar ali. Não pensara que era daquele modo. Mas o importante era que ali estava.

À medida que a supervisora ia falando, ela ia se sentindo diminuída e em pouco tempo foi criando uma raiva daquela senhora a que fazia ranger os dentes. Era uma mulher gorda, pele toda enrugada, estatura baixa e tinha uma papada imensa que escondia seu pescoço. Era pacienciosa e falava lentamente tentando passar uma imagem amigável.

Depois da excursão interna, Raquel voltou para o quarto, tirou as sandálias e foi retirando as roupas da mala para colocá-las no armário. Em seguida foi para o refeitório, onde todas as garotas do colégio já estavam. Seria sua primeira refeição naquele lugar.

As garotas pareciam todas animadas, e riam sem parar de todos os gracejos que contavam umas para as outras. A alegria foi quebrada com a chegada da supervisora juntamente com Raquel. Todas olharam para elas e então a anfitriã começou a falar:

— Prestem atenção, meninas. Esta aqui é Raquel Prado, ela é de Rio Verde, Estado de Goiás, e será a partir de hoje uma aluna nossa, portanto, colega de vocês. — e virou-se para Raquel: — Quer dizer algum a coisa?

— Não! — disse timidamente, se descobrindo envergonhada.

— Então se sente à mesa!

Ela se sentou olhando para todas as meninas, que a fitavam de soslaio, com as cabeças baixas. Não pareciam receptivas, culpando-a pela alegria geral interrompida.

— Oi! — Disse — Espero ser amiga de todas.

Houve um breve silêncio e depois uma onda de “oi” tímidos e sem emoção.

A supervisora continuava de pé e olhava para todas. Depois deu um sorriso e saiu.

O silêncio foi se quebrando aos poucos com alguns grupos voltando a conversar porém num tom mais baixo.

Raquel pegou seu prato, serviu-se, e pôs-se a comer lentamente, mas seu nervosismo era tanto que o estômago parecia querer rejeitar a comida.

Uma das meninas quebrou o silêncio perguntando:

— Você é virgem?

A risada foi geral e Raquel se sentiu envergonhada ainda mais.

— Vamos, responda! — insistiu uma.

“Estão querendo me envergonhar”— pensou ela.

Todas riam e conversavam entre si, baixinho, no ouvido uma da outra, deixando Raquel com mais raiva. Até que uma loira, sentada ao seu lado, disse num tom cordial:

— Bem-vinda ao grupo, Raquel! Não repare nossas brincadeiras, mas é que tudo isso aqui é tão monótono que nós, às vezes, só podemos nos divertir quando aparece algo novo. Você logo se acostumará conosco e se tornará uma de nós. Meu nome é Ana.

Algumas se aproximaram dizendo seu  nome, acompanhado sempre com um sorriso de boas-vindas. Raquel ainda estava visivelmente tímida mas agradecia os cumprimento.

O assunto geral era homens, bandas de musicas, festas e shopping. Sentia que havia uma amizade entre todas e revelavam uma para as outras seus segredos íntimos que nem faziam questão que fosse segredo.

— Quer saber como fazemos para sair daqui? — perguntou uma das colegas que sentava a sua frente na mesa.

— Mas eu mal cheguei... não quero sair. — disse Raquel surpresa com a pergunta.

A garota riu do seu embaraço e completou.

— Não é sair neste sentido. Estou falando de dar uma fugida de vez em quando e ir a uma festa, uma boate e depois voltar. Acha mesmo que conseguimos ficar enjaulada aqui a semana toda?

— Ninguém dá conta dessa monotonia! — Falou Ana, a loira do seu lado.

Raquel gostou da ideia. Começou a achar que estava com as companhias certas.

— A maioria das internas sai nos finais de semana? — perguntou.

— Isso depende também de como seu pai a deixou aqui. Se ele deixou ordens de você não sair, você não sai. Neste caso você foge, entende?

O almoço terminou e todas foram trocar de roupa para em seguida voltarem para as suas salas de aula. Raquel, porém, só conheceria sua turma no dia seguinte. Ela se juntou a outras novatas e a supervisora as levou para conhecer todo o colégio e Raquel ficou espantada com a imensidão do local. Havia aulas complementares de todo tipo: ginástica, natação, esporte, moda, comportamento, estética e dança. Ela não entendia como todas as outras poderiam falar que aquilo era monótono. Estava radiante.


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