Presos escrita por kethycia


Capítulo 6
Capítulo 6 - Falas


Notas iniciais do capítulo

Eu sei, eu sei. Demorou mais de um ano. Mas você não fazem ideia do que aconteceu para eu não poder atualizar "Presos": fiquei sem computador, ganhei um novo, ele veio se word, fiquei sem internet, comecei a escrever no WordPad (se houver erro gramatical, ortográfico e etc, me perdoem e me avisem).

Capítulo dedicado à Alexandre, Anna e Lara.



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Matteo mergulhou o seu pedacinho de pão recém-saído do forno em sua xícara de leite quente, após emergi-lo, pôs com gosto na boca. Sentiu deliciosamente a maciez do pão dissolver-se com o contato com sua língua e saliva, sem contar com o sabor e a sensação do leite morno que invadira todo o seu palato.


Enquanto Matteo deliciava-se com seu café da manhã no Lanche do Pete ele observava as cômicas imitações de Douglas e Louis de Luigi, o coordenador de artes da faculdade que pusera os papéis das inscrições da futura peça de teatro da Universidade no mural exposto, um pouco mais cedo.


– E o mais sensacional era o dedo! - Louis juntou o polegar com o dedo indicador formando um "o" e começou a balançar o pulso. Imitando Luigi, que por mais que tivesse um tom de voz bem afeminado (apesar da voz bastante grave), nele não havia indicio algum de descendência francesa ou de um sotaque francês, que Louis aderiu à sua imitação.


No way*, cara. Estou te falando, nada supera ele arrumando aquela coisa que parece ser o bigode dele. - Dito isto, Douglas, que agora fazia sua imitação, pegou uma caneta preta de seu bolso e colocou sobre o lábio superior, na intenção de imitar o bigode de Luigi. Por um acaso, a caneta começou a escorrer tinta preta e imitou uma lágrima escorrendo pela bochecha do rapaz. O que ocasionou em sujeira e em Matteo se engasgando de rir.


Matteo esticou-se sobre a mesa e puxou alguns guardanapos para que ele pudesse se limpar. Limpou lábios, queixo e parte de sua camiseta. Por breve momento, distraiu-se quando levantou olhar e viu alguém, quem era? Ora, mas é claro: era Lisa. Quem mais pudera ser, afinal. Calçava um par de salto baixo de tiras, uma camiseta branca com estampa de diversos felinos moldando o rosto de um gato, short jeans e um suspensório.


Ele sabia que ela não o viria (e alegrou-se por isso), já que tinha um emaranhado de pessoas por todo seu redor e havia bastante barulho vindo do balcão e dos fregueses.


Ela seguia alegre seu caminho, junto com um par de amigas, segurando meia dúzia de papéis e com um sorriso autêntico no rosto. Segundos depois, Lisa já havia se distanciado.


Matteo virou-se e notou que Luigi, o próprio!, aparecera - e estava com uma carranca inimiga. Ele envergava a mesma vestimenta de momentos antes: uma camisa - justa– de renda masculina, calças pretas ­- super justas– plastificadas, tênis sociais muito bem engraxados e havia tirado a boné que estava usando quando pregou os papéis no mural naquela manhã. Carregava uma bolsona verde, bem envelhecida, com as tiras de apoio gastas e com a cor desmanchando-se. Ele olhou e revirou os olhos para a mesa de Matteo e seus amigos claramente aborrecido, ele obviamente havia visto as fatídicas imitações:


– Hum... Vocês. - Apontou duramente para Douglas e Louis. - Com essa imitação podre e pobre, nunca vão conseguir nem o papel do sapo para essa peça. - Falou com escárnio, seus dentes formavam uma linha dura, como se eles tivessem acabado de morder algo.


Depois de ficar olhando com nojo para os meninos, ele voltou a mascar seu chiclete e tirou diversos blocos de papel da mochila e jogou na barriga de cada menino na mesa, atingindo em cheio no estômago deles, inclusive o de Matteo.


Matteo, após recuperar-se do impacto, viu do que se tratava. Logo pensou, "Já?". Era o roteiro da peça.


Vocês. - Apontou novamente para Douglas e Louis como se ele estivesse olhando para uma poça de vômito. - Não ousem estragar meu roteiro. - Voltou-se para Matteo, com uma careta bem mais relaxada. - E você... - Luigi não falou nada mais, somente piscou para o loiro. E fechando a mochila, ele foi embora.


– Ei... -Matteo deixou escapar, bem baixinho, super perplexo.


Não deu outra: seus amigos explodiram de rir.

***


Manchas dos raios de Sol escapavam pelas nuvens e Matteo já sentia-se aquecido. Já estava menos triste. Sentiu-se reconfortado com a presença de seus amigos e valeu muito a pena rir junto deles, parece como se o bom humor contagiante de seus amigos, que muitas vezes é dispensável, hoje serviu como se fossem o calor do sol dissipando a frieza de como seu dia amanheceu hoje.


Mas, infelizmente, de qualquer modo ele não conseguia tirar da cabeça o olhar indiferente do pai, no dia de sua saída de casa - isso vinha lhe atormentando há tanto, tanto tempo. Ou o tom de voz desesperado da mãe, quando ela atendeu o telefone hoje mais cedo antes de Matteo ir tomar seu banho.


Quando chegaram à sua sala de aula, cerca de vinte minutos depois da entrega dos roteiros, descobriram que a primeira aula seria vaga e Douglas e Louis ficaram brincando com as falas do roteiro, no entanto, por mais que Matteo tentasse se distrair com as palhaçadas dos amigos - como mais cedo, lá na lanchonete - ele não conseguia, não mais.


Era meio cômico: ele não conseguia ser distrair. Ele tentou vasculhar seu roteiro e ver do que se tratava a peça. Em resumo, era uma peça sobre os bastidores de um musical e o mais inacreditável era que nem todo o núcleo teatral teria que ter a virtude de saber cantar. Somente os protagonistas e eles seriam o Orlando e a Keira, no que contava a história deles, ele tinha uma paixão platônica por ela e ele iria se declarar no ápice da peça, quando eles teriam que ensaiar uma canção. Matteo achou isso tudo muito engraçado.


E se ele próprio achou engraçado, o que achariam seus amigos. A mísera leitura que ambos fizeram em torno do roteiro rendera diversos monólogos para as sitcoms** de araque que eles improvisaram, somente os três estavam se entrosando mas Matteo mantinha-se meio distante. Ele achava graça das bobeiras e muito das vezes, ria. Porém, bem no fundo, ele sabia que essas risadas eram falsas.


Parecia que aquela manhã havia sido há tanto tempo, há anos. Mas só fazia algumas poucas horas que ele havia conversado com a mãe. Ele sentia-se muito distante e até estranhou que não estava pensando em Lisa e em sua ágil aparição ainda pouco. E por pensar nisto, sentiu um tremendo remorso por ter mencionado Lisa em seus pensamentos.


Ai, meu Deus. Como alguém pode ter tantas oscilações de humor em tão poucas horas? Algo em Matteo está errado.


É, ele havia se distraído. Da pior forma possível, estressando-se subitamente e ficando melancólico e amargo de uma forma que o deixava mais irritado ainda, mas distraiu-se. Ah, droga. Ele resolveu olhar de volta para a droga daquele roteiro estúpido e folhando-o, se surpreendeu, vendo várias marcações em neon, prestando mais atenção, viu que era o nome Orlando em destaque. E em mais páginas, mais Orlandos em neon apareciam, e somente Orlandos. Fechou o roteiro e viu um rabisco escrito em caneta na capa do roteiro, abaixo do título e nome do autor e diretor.


"O nome em destaque é o personagem por quem você irá concorrer à peça no dia da audição, boa sorte!"


Ok, ok, estes garranchos foram meios complicados de entender, mas... Ei. Matteo não sabe cantar. Ele não sequer fazia ideia de como iria tentar interpretar quaisquer personagens e ele muito menos queria tentar ser o protagonista. Ele só queria fazer isso para poder ter a possibilidade de ficar um pouco perto de Lisa...
"Lisa. Sai. Da. Minha. Cabeça." Era isso que martelava na cabeça de Matteo. Ele agiu por puro e completo impulso ao se inscrever na peça. Quando viu, o lápis em sua mão já havia escrito Matteo Belluno em uma daquelas linhas. Ele próprio admite que agiu por algo além de impulso, agiu por certa influência dos amigos. Douglas havia acabado de se inscrever quando Matteo chegou à Universidade e fora conversar com ele.


Após a mais do que breve conversa que Matteo teve com o Douglas, Louis apareceu embasbacado e perguntando se os amigos já tinham se inscrito... Matteo ficou curioso... Achou interessante a iniciativa da faculdade de proporcionar a peça... Queria mandar para longe o sentimentalismo da sua manhã... E a Lisa estava tão linda apoiando os cotovelos no painel para escrever seu nome que fez com que Matteo se emaranhar-se em meio aquele bocado de pessoas só para chegar mais um pouquinho perto.


Quando viu, já havia se afastado de todo e estava sentado sozinho nas mesas prateadas da lanchonete assistindo bem de longe as recomendações de Luigi sobre como se portar nos dias das audições e demais explicações, incrivelmente seus amigos estavam assistindo com interesse. Havia desistido de apagar seu nome - não havia borracha alguma naquele painel e nem nos lápis presos às laterais da papeladas e de qualquer modo, Luigi já havia arrancado os papéis de lá. Seus dedos já estavam cansados de tanto que Matteo os judiava.


Sua atenção havia sido roubada pelo som da cadeira metálica arrastando-se sob o chão linóleo do lugar e ele viu que era Devone sentando-se ao seu lado.


– Olá, Matteo. - Ela cumprimentou com um sorriso tímido enquanto colocava sua bolsa na mesa.


– Hey, Devone. Como está? - Falou escondendo os dedos na mão - péssimo modo de distração que Matteo arranjara.


– Ah... Tudo... de boa. - Contou nos dedos alguns números e anotou no caderno de ursinhos com sua lapiseira rosa o resultado.


Matteo sorriu em concordância, resolveu aquietar-se, ela estava ocupada. E talvez ela tenha sentando-se na mesma mesa que ele só para não sentir-se muito solitária... Talvez ele que quisesse que ela largasse estas contas estúpidas e conversasse com ele, ora, era ele com quem ela dividia aquela mesa.


Deram alguns segundos e Matteo já contava seus dedos do pé, tudo pelos movimentos sensíveis do toque deles em seus tênis vermelhos.


– Bem, e seu amigo? Ainda assustado comigo? - Devone perguntou de repente, assustando Matteo.


– Oh... - Deveria pensar um tantinho, ele não queria magoar Devone. - Ele... Ele... Ficou bem assustado, Dev...


– Isso que eu queria. - Riu um pouquinho. - Sem querer ofender, Matteo... Mas seu amigo... Seu amigo é um idiota.


Matteo riu com a afirmação da garota. Não que ele discordasse.


– É, talvez. Mas se você me permite perguntar...


– Eu não cultuo ninguém, cara. Beleza que eu gosto de poemas celtas, mas você acha realmente que eu vou vangloriar um astro intergalático que eu mesma inventei?! Só queria despistar seu amigo.


Curta, direta e fatal. Como Devone sempre foi.


Matteo não conseguiu falar nada. E... Isso era lógico. Por que diabos ele havia aceitado aquela história? Devone fazia física por pura e completa diversão. O máximo que havia conseguido fazer foi concordar com os ombros.


– Você está meio para baixo. - Devone falou com os ombros baixos, mas com os olhos atentos. - É a enfermeira?


Matteo não conseguiu responder. Apenas supriu um sorriso pelo modo que ela se referiu a Lisa."Não somente isso", quis dizer. E Devone que não se deu ao trabalho de continuar a conversa, voltou a sua mente para aquela, aparentemente, divertida atividade de equações.


–Eu só tô cansando... Eu acho. - Matteo tentou começar a falar algo. Bom primeiro passo, Devone tirou a cabeça daqueles números. - Hum... Eu... Hum. - Não conseguiu mais.


Isso foi o suficiente, Devone deixou a lapiseira em cima do caderno e os deixou de lado.


–Eu também me canso bastante, Matteo... As vezes parece que nem uma noite e uma madrugada parecem ser o suficiente...


– Não. - Ele a interrompeu. - Não é somente o cansaço físico que eu digo... É mental, eu acho.


Ela não prosseguiu sua fala e muito menos questionou. Pelo que parece, Devone estava ouvindo Matteo. Isso talvez fosse um pretexto para que ele pudesse continuar.


– Devone, eu ando tão... mas tão cansado, que as vezes eu não aguento olhar para o Douglas ou até mesmo olhar para uma apostila. Eu venho me irritando até mesmo se eu não consigo tirar o lacre da caixa do suco.


– Bem, essas coisas mesmo podem irritar pra caramba... - Devone tentou falar, mas Matteo repreendeu.


– Não, Devone. É como se isto fosse um caminho para eu me irritar, como se isto fosse uma desculpa.


Devone cerrou seus olhos e ficou pensando por um brevíssimo tempo com o olhar baixo. - Você mora por aqui há quanto tempo? - Fez um giro com o dedo indicador.


– Cinco anos, mais ou menos.


– Sozinho? - Falou pausadamente.


–Sempre... Sozinho. - Matteo respondeu com um olhar vazio para o chão.


– Está aí o problema. o seu problema: solidão. - Matteo tentava absorver o assunto. - Não está entendendo? Podemos até não gostar de algumas companhias ou por mais que sejamos misantropos, mas não devemos e nem podemos ser solitários. Temos que ter pelo menos alguém... Alguém para limpar nossa vista todo dia. Não necessariamente um parceiro copulador, se é você me entende - Devone deu-lhe um sorriso malicioso -, mas alguém que nos faça bem. - Ele não sabia como, mas ela já havia guardado seus objetos e seu caderno já estava fechado.


–Solidão mata, desestimula, tortura. Pensa nisso. - Devone levantou-se e saiu rebolando em direção ao prédio de física.


Mais sentido, impossível. Seu acúmulo de estresse tinha raízes dessa sua solidão. Como foi estúpido o bastante para achar que ele poderia ser companhia o suficiente para si, não era e provavelmente nunca será. Matteo sempre se achou um chato nato. E sobre ter alguém para limpar a vista, era meio que verdade (riu tímido por pensar nisto), Lisa. A última semana só fora suportável por causa de Lisa, do riso de Lisa, do beijo de Lisa - não é por nada não, mas Matteo estava praticamente há cinco anos sem beijar na boca. E seu mau humor de início de semana era culpa de Lisa - ou de Matteo, era ele que não conseguia falar com ela, era ele que se escondia! - e por saudades imensuráveis de sua mãe.


Ele pensou como estava entusiasmado quando chegou a Universidade há cinco anos, caramba, a faculdade era o que Matteo mais desejava no mundo. E hoje, frente-a-frente em seu ultimo período universitário, vê que até agora, a única coisa que tem em mãos, é seu amor por barcos e todo o conhecimento adquirido nesses anos de muito empenho. Tirando isso, ele não era nada - e mesmo com isso, ainda era um nada.


– Matteo, porra! - Douglas gritou ao pé do ouvido de Matteo fazendo com que ele deixasse cair a caneta e o tirou abruptamente de seus pensamentos.

– O que foi?!

– Estamos falando contigo e você não ouve.


– Desculpa... Tava viajando - "É óbvio isso", sussurram. - O que foi? - Perguntou emburrando o rosto depois do sussurro dos amigos.


– Você está bem?


Essa pergunta era pesada, pensando bem. Ele estava bem? Uma resposta poderia definir muitas coisas. Caso respondesse não, iriam questionar-lhe o porquê (curiosidade ou preocupação, pouco importava ao Matteo), iriam provavelmente propor modos para que ele pudesse melhorar um pouco e apresentá-lo situações em que eles estiveram mal anteriormente - isso caso Matteo aprofundasse o motivo de não estar bem. Caso falasse que sim, ele estava bem, não haveriam questionamentos, nem compartilhamento de vivências e muito menos métodos de melhora. E supondo que ele estivesse, digamos, não tão bem ao ponto de responder que sim e não tão mal ao ponto de responder que não, que era mais ou menos assim que se sentia, o que ocorreria? Ele estava bem, mas não tão bem. Explicar sua atual condição, isso sim seria cansativo.


– Eu tô bem. - Respondeu por fim, não queria se cansar mais ainda. E ele não estava tão ruim assim.


***


Caóticas. Infernais. Terríveis. Três palavras que descreveram perfeitamente as aulas de hoje. Pareciam que a mente de Matteo fora invadida por um moleque de treze anos espinhento que acabou de ganhar uma bateria de trinta milhões de pedais e pratos. Ele bem que preferia a Orquestra sinfônica de Israel tocando, mas o espinhento metido a baterista queria estrear. Cada. Maldita. Peça. Da. Bateria. E seus olhos não paravam de codificar números, letras, equações, problemas, conceitos e tudo que ele achasse grotescamente dolorido a sua frente.


Matteo direcionou-se para o Lanche do Pete praticamente correndo. Ele tacou sua mochila no piso da lanchonete e jogou-se sobre uma das cadeiras prateadas, seus braços moldaram uma pirâmide e ele descansou o rosto nas mãos juntas, com os polegares massageou as têmporas.


Pete magrelo e sarnento como sempre chegou tímido à mesa de Matteo com o cardápio envelhecido. Cutucou-o delicadamente no ombro e Matteo estremeceu ao toque, parecia que o dedo ossudo havia arranhando alguma ferida no cérebro dele, aquilo tinha sido um choque e repercutiu até suas entranhas mortas de... Fome?


– Está com o cardápio aí, Pete Filho? - Perguntou Matteo com um olhar enlouquecido para o herdeiro do lanche.


O magrelo não havia conseguido pensar em nada mais para dizer e de algum modo, os poucos neurônios que aparentavam funcionar de Pete fizeram com que ele empurrasse o caderno de opções e preços. Matteo agarrou-o e folhou e leu cada página com muita agilidade e se contentava com os preços acessíveis à sua renda. Infelizmente, aquele sanduíche que havia comido sexta passada não fazia parte do menu e Matteo contentou-se com batatas doce fritas, uma tortinha de arroz doce com um suco de acerola e laranja acompanhando - e por algumas informações contidas no papel, ele ganharia um chocolate! Pete anotou tudo de forma bem organizadinha e retirou-se, com o cardápio preso na axila.


Matteo voltou a fechar os olhos massageando sua cabeça, esfregando a ponta dos dedos na testa, sentindo-se um pouco mais relaxado. Estava tudo muito abafado e a sala de aula estava tão frio que isto ajudou a dor de cabeça de Matteo intensificar-se. Sua testa estava grudenta de suor, estava tão suado que a pele brilhava, mas de repente, sentiu a brisa extraordinária rotineira da floresta ao redor da faculdade, foi tão refrescante que fez com que Matteo deitasse sua cabeça nos braços e fechasse os olhos para descansar. Mesmo seu cochilo não sendo muito pesado, ele sentia como se tudo estivesse muito leve e distante, do mesmo modo que ficamos quando estamos prestes a dormir. Estava tudo muito gostoso... O calor infernal estava se dissipando por conta da ventilação natural da floresta, até que alguns sons fortes vieram perturbando-o.


Até que um estrondo pesou tremendo a mesa em que Matteo estava debruçado, fazendo com que ele pulasse em sua cadeira, com os olhos avermelhados e assustado. Sua mente estava enevoada e mal conseguia raciocinar, mas conseguiu distinguir a mochila de Douglas pendurada pela alça voando por cima de seu ombro e Louis amontoando seus dedos nas recéns chegadas batatas de Matteo na mesa, não se importando o quanto quente elas estavam.


– Nossa, cara, essas batatas estão muito boas! - Falou com uma tira de batata escapando-lhe pela boca.


Matteo ainda meio zonzo quis jogar sua mochila na cabeça dos dois que se amontoaram ao redor da mesa dele, Douglas e Louis puxaram mais duas cadeiras para se sentarem enquanto esta mesa Matteo havia escolhido com uma estrategia: era mesa para uma pessoa.


– Matteo, irmão, no seu roteiro tem que papel pelo qual você irá concorrer? No meu e de Louis, aparece que iremos fazer o teste para os Figurantes zero ponto um e zero ponto dois. Me recuso a fazer um bom teste - como se eu fosse fazer isto com seriedade–, farei sem nem ler esta droga e uou, que olhar é este, querido Matteo? - Matteo lançava-lhes um olhar emburrado, olhar que Douglas ignorou e prosseguiu: - Você fará quem?


– Eu farei para o tal de Orlando. - Matteo jogou o seu roteiro na mesa para os amigos verem os nomes destacados em neon.


– Eu não acredito - Douglas disse. - Você não vai ganhar esse papel.


– Isso mesmo. - Concordou Louis sugando o suco pelo canudo. Pete estranhou a intimidade do rapaz.


– Mas eu não quero. - Matteo respondeu indiferente.


– É sério, cara. O Orlando é bonitão.


– Eu não quero esse papel e... Ei! - Matteo olhou para Louis encarrancado.


– Não é, Louis? E mais, essa voz do Matteo. Me diz! Onde que vai servir para cantar alguma coisa? Nem para meninas ela serve!


–Ei...


– Claro. - Louis concordou gargalhando pelo nariz. - E, Matteo, você não sabe nem escolher um lanche, esse pudim é ridículo de ruim.


Matteo olhou perplexo, a única coisa que sobrara de suas batatas foi o papel-toalha sujo de óleo, seu suco só tinha os dois cubos de gelo derretendo no fundo da taça com o canudo pendendo sobre a borda da taça e a tortinha de arroz doce que estava toda cutucada. O chocolate que ganharam estava ao lado da conta, Matte pegou-o e guardou em seu bolso da calça.


Ele não estava com paciência para essas piadinhas estúpidas de seus amigos. Levantou-se deixando algumas notas em cima da mesa para pagar, assobiou para Pete avisando-o sobre o pagamento. Sem se despedir, saiu da lanchonete.


Matteo não sabia exatamente para aonde ir, então pensou que seria uma boa ideia ir à biblioteca ler seu roteiro, já que aquela zoação de seus amigos sobre sua voz além de tirar-lhe completa dor de cabeça, ele sentiu-se inspirado a pelo menos fazer uma boa apresentação no dia das audições.


Quando chegou a sala que cheirava a livros, sentiu uma vontade instantânea de ir dormir, afinal lá era escurinho e geladinho. Sentou-se em sua mesinha afastada de todas e começou a ler seu roteiro. Apesar daquilo não fazer o gosto de Matteo - ele sempre preferiu equações à orações - até que a história era interessante. Uma parte bem pequena e escondida de Matteo fez ele ter vontade de fazer aquela audição ser ótima e mesmo com que a voz de Matteo não fosse realmente aquelas coisas e provavelmente por conta dela que o papel não seria dele, mas ele desejava driblar isso e dedicaria-se para tal.


A história tinha início com Keira correndo por uma avenida, ela estava atrasada para o ensaio e ela entra no teatro, e Orlando, que é perdidamente apaixonado por ela, cala-se no meio da frase que treinava e a seguiu com o olhar até ela entrar nos bastidores para se preparar e maquiar.


Matteo lembrou de uma situação parecida com essa, logo quando ele era um garotinho que estava no 8º ano, ele faltara um dia de prova e teve que fazê-la em outra sala, que era a classe do 2º ano do Ensino Médio, mas ele não conseguiu. Ele ficara encantado por uma das alunas. Como Matteo era tímido, nunca tinha se encantado por alguma garota, mesmo ele sendo um dos rapazes mais bonitos de seu colégio. Até hoje ele se lembra do rosto da Ana-Drew e ainda sente um friozinho na barriga quando lembra. A Ana-Drew tinha traços do rosto bastante definidos, seu nariz era bem fino e as clavículas eram muito aparentes, seus cabelos eram muito longos e eram mechas finas e muito loiras, o corpo dela, algo que o jovem Matteo era muito novo para fazer uma análise detalhada, era longo e tinha certas protuberâncias, no melhor sentido possível da palavra. E ela era tão linda, que ele mesmo lembrando disso, o fez ficar vermelho e notar que ele continua tão tímido quanto o Matteo de 14 anos. Ah, ele reprovou, tirou a pior nota da classe, porquê a cada passo que Ana dava, Matteo seguia, assim como Orlando seguiu os passos de Keira, fazendo com que o aluno penetra de sala perdesse os dois tempos de prova e chutasse todas as questões no último segundo do tempo estipulado para fazer sua prova.


Matteo riu baixinho e ouviu:


–Ora, ora. - Era Lisa sorrindo para ele. - Olha quem está rindo sozinho. Isso é sinal de loucura, sabia? - Disse, puxando uma cadeira para sentar-se junto de Matteo.


–Ah, estou só lendo o meu roteiro. Achei ele bem engraçadinho. - Levantou seu bloco para mostrar a Lisa, tentando disfarçar sua surpresa por está falando com ela de forma tão abrupta. - Irá participar?


Ela olhou para o roteiro antes de responder.


– Sim, parece que serei a Keira nas audições. - Encarou a mesa por um segundo até olhar de volta para o roteiro e depois para Matteo. - E ti? Fará quem?


Seu par romântico. - Matteo respondeu, testando como seu tom de voz sairia com essa frase ridícula e torcendo para que ela não tremesse tanto quanto seu peito.


– Pensei que já fosse. - Lisa rebateu, seu sorriso fazia dupla com o de Matteo. - Olá, sou a Keira. - Ela estendeu a mão para Matteo, pelo que ele se recorda, essa era um dos diálogos da peça.


– E eu sou Orlando. - Ele estendeu também e apertou sua mão, respondendo a com a fala seguinte do roteiro. - Seu Orlando, se preferir. - Matteo arriscou mais uma frase, desta vez, seguro e improvisando.


– Não sei se você já leu o final da história, mas ela o rejeita.


Matteo ficou sem reação e seu coração se desmanchou após ouvir a gargalhada de Lisa, ele soube que ela estava brincando. Engraçado que Lisa tinha o mesmo efeito que Ana-Drew tinha com o estômago de Matteo, ambas tinham o poder de fazê-lo dá milhares de cambalhotas dentro da barriga dele.


Dona Bergstrom chamou a atenção de Lisa com um "Psiu!" e um olhar feio que a fez se conter, e ela acabou dando um olhar que podia fazer Matteo ficar olhando para ele o dia inteiro que o rapaz não se cansaria.


– Sabe, Orlando - Lisa voltou com seu ensaio improvisado -, fiquei sabendo que você beija as meninas, depois pega seus números e as convida para uma festa na praia, mas não envia nem um sms sequer... - Lisa levantara seu dedo indicador para indicar o um e levantou o rosto, mostrando outro sorriso digno de dezenas de horas de observação.


– Ah, Keira e eu fiquei sabendo que você beija rapazes e depois foge deles. - Matteo conseguiu conter sua surpresa e lidou com o restante da conversa indireta sobre o beijo deles.


– E você foge das meninas. - Lisa brincou com sua sobrancelha.


– Ei! Só foram algumas vezes... - Matteo havia saído do personagem e entrado na defensiva.


Matteo permaneceu retraído olhando para Lisa, mas notara que Douglas e Louis haviam seguido ele até a biblioteca e estavam, aparentemente, orgulhosos do amigo, já que estavam apontando e sorrindo para eles. E ele não ligou para isso. Ele também não ligou por estar nervoso por está conversando com ela. Não ligou por sua certa e estranha obsessão por ela, depois de pensar muito nessa tarde, viu que merecia, por muito tempo foi solitário, ele não ligava por Lisa ser, inacreditavelmente, a terceira mulher presente em sua vida, contando com sua mãe.


E ele com certeza não ligou de seu dia ter melhorado completamente e absurdamente por eles estarem conversando.


***


Lisa não o respondeu, mas mantéu um contato visual profundo com Matteo, eles aparentemente estariam conversando por olhares. E Lisa notou o quão lindo são os olhos de Matteo.


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Notas finais do capítulo

Gente, cheguei a conclusão que "Presos" só terá maior movimento quando a Lisa tiver papel efetivo e completo na história - quando for inserido a família dela e o namoro deles for concretizado, que irá demorar um pouquinho. Até lá, os capítulos tenderão a ser parados mesmo, mas, sabe, eu gosto deles assim, mas preciso ouvir suas opiniões. Deixem, ok?

Eu não sei o que aconteceu, mas não conseguir por a margem nem alinhar. :x

Ah, notem que o Matteo é bem gente como a gente, ele é bem parecido comigo, eu acho. Ele chegou pra baixo na faculdade, porém, com os amigos, melhorou um pouco, mesmo se irritando muito com eles.

Falem o que vocês acharam! Critiquem, elogiem, opinem, deem dicas, divulguem!

Eu juro que não irá demorar tanto para o novo capítulo, mas também não depende de mim, preciso de suporte e de apoio (sou uma escritora carente, me desculpem).

Ah, já viram a nova capa? A lindona da Anna Clara A. que editou!

Fiquem com Deus, abraços,
Kethy.