Tiago e Sirius acreditavam que a Capa seria a tão esperada maneira de descobrirem o segredo de Remo. Decidiram escrever à Lílian e Pedro informando sobre o tão esperado presente. Lily havia respondido-lhes que talvez a solução ao mistério estivesse mais perto que nunca. Ela escreveu também que andara pesquisando sobre as diversas espécies residentes na Floresta Proibida, para tentar entender o motivo de Remo ir tanto ao local, entretanto ainda não chegara a nenhuma conclusão satisfatória. Entre mandar cartas e brincar na neve, o breve período de recesso das aulas passou num piscar de olhos. Quando deram por si, estavam sentados em uma das cabines do Expresso voltando à Hogwarts. Os primeiros dias após a volta as aulas foram atribulados. Dezenas de deveres e trabalhos para concluir faziam com que os quatro amigos não tivessem tempo de conversar e aprontar travessuras. Mais limitado ainda era o tempo que tinham para planejar, junto a Lílian, uma nova ida a Floresta, dessa vez com a certeza de que seria bem sucedida. Decidiram, então, pôr a investigação de lado por alguns momentos e se concentrarem inteiramente nos estudos.

Apesar de todos passarem o tempo livre estudando e ele nunca deixar a compainha de seus amigos, Remo percebeu algo estranho entre os outros três. Pareciam guardar algum segredo, sempre tentando ficarem a sós. Franziu o cenho, pensando no que poderia ser. Provavelmente querem pregar alguma peça em Snape, tentava se convencer. Em seu íntimo, de algum modo, já sabia do que se tratava só não compreendera ainda. Lílian também sentia algo se inquietando em seu interior desde a última aula de transfiguração. A Professora Minerva, visando estimular os alunos a estudarem mais, passou a falar da transformação de objetos animados que estudariam nos próximos anos. Um assunto extremamente difícil, que exigia muita compenetração para aprender. A demonstração da Professora foi de um tipo de transfiguração que só aprenderiam a partir do 3° ano - na parte teórica; a parte prática viria depois, no último ano. McGonagall, diante de sua numerosa turma do primeiro ano, transformou-se em um gato, com quadradinhos ao redor dos olhos. Estupefatos e convencidos que Magia era uma coisa séria e difícil, os alunos a aplaudiram. Lily olhou de relance para Tiago, Sirius e Pedro, porém, se perceberam algo, não demonstraram. Ela tentou tirar o assunto da cabeça, estudando. Sabia que se contasse a Severo ele saberia a resposta, mas ela havia prometido guardar segredo sobre as saídas noturnas e tudo o mais. Continuou desse modo, com algo a incomodando. Só foi descobrir o que era na primeira noite de lua cheia do mês de fevereiro. Era a primeira noite que eles não tinham nenhum trabalho a terminar para o dia seguinte e mesmo assim Remo saiu dizendo ir a biblioteca. Sirius e Tiago se entreolharam.

– Não acha que ele vai... – a pergunta de Pedro ficou suspensa no ar, a resposta era evidente.

– Já volto – dizia Tiago, enquanto subia correndo as escadas que levavam ao dormitório masculino.

Voltou trazendo uma capa prateada. A Capa da Invisibilidade. Lílian só acreditou na palavra do garoto quando a viu pela primeira vez, jamais imaginou que pudesse existir tal artefato mágico. Mas, se olhar por um lado, nunca pensou que magia existisse até o Sev lhe dizer, quando tinham noves anos.

– O que acha Lílian? – Sirius a chamava.

– O que acho de quê?

– De sairmos hoje com a Capa. Seria a estreia dela... – Pedro respondeu aborrecido.

Para falar a verdade, não seria a estreia da Capa. Tiago e Sirius já haviam usado-a antes, porém nunca seriam capazes de contar o acontecido aos outros. Não queriam deixá-los chateados.

– Tudo bem - ela ia saindo da sala comunal, quando se lembrou de algo, franzindo o cenho, voltou-se para Tiago – Que dia é hoje?

– Quarta-feira. Por quê? – o menino alarmou-se de imediato – Tem algum trabalho para amanhã que eu não estou me lembrando?

– Não... Não é isso. – murmurou, mais para si que para outros, antes de completar a pergunta anterior – E qual a data?

– Dia quinze. Lílian... – dessa vez o estranhamento veio da parte de Sirius -... O que está acontecendo?

– Espere – ela levantou a mão, precisava de silêncio para pensar. Uma ideia do que estava acontecendo a Lupin surgiu em sua cabeça, entretanto era só um esboço, precisaria de muita pesquisa e leitura antes de chegar à conclusão definitiva. Seria mais fácil embrenharem-se na Floresta e descobrirem com os próprios olhos, todavia não poderia pôr os amigos em perigo caso fosse algo demasiado perigoso. Finalmente tomou uma decisão:

– Essa será a estreia da sua querida capa Potter, mas não a usaremos para seguir o Remo. Precisamos ir à biblioteca urgentemente.

– Mas... – Tiago ia protestar, contudo algo no olhar de Lily o fez parar. Era algo urgente, como se fosse uma necessidade real e improrrogável, que carecia de ser cumprida naquele momento. De cara amarrada, guardou a capa nas vestes e saiu pelo retrato seguido de Sirius, Pedro e Lílian.

Caminharam silenciosamente até o local que Lily havia praticamente ordenado que fossem. Sirius, perdido em pensamentos, questionava-se o que fora aquilo na sala comunal. Tiago jamais cedera a vontade de sua amiga antes, pelo menos não sem protestar. Ponderava se os dois não estariam ficando muito próximos. Impossível– deduziu, por fim, o jovem Black.

– Pronto o que você quer ver primeiro, querida Lils? – Sirius indagou, com gentileza, a garota ao entrarem no cômodo.

– Procurem livros de Defesa Contra as Artes das Trevas dos terceiro e último, e livros de Transfiguração dessas mesmas séries. - entretanto os garotos continuaram parados ao seu lado, boquiabertos, sem saber o que fariam com aquele tipo de livro. – Rápido! – ordenou novamente, ao perceber que nenhum deles iria se mexer.

– Hã... Claro. – Tiago remexeu na Capa guardada em suas vestes, certificando de que ainda estava lá, puxou o melhor amigo e foi à seção de DCAT.

– O que acha que ela está armando? – Sirius inquiriu o outro, para saber se este detinha alguma informação.

– Não sei... – deu de ombros – Ela está estranha desde segunda. Fica pensando, pensando, pensando... E agora vem com essa história de datas e pesquisas quando podíamos ir atrás do Remo!

– Parece o Ranhoso, não é? – Pedro chegou por trás, dando um susto nos meninos – Quero dizer, quem viria à biblioteca enquanto poderia estar comendo? Só o Ranhoso, que não tem amigos.

– Está falando da Evans ou de nós?

– Da Lílian. – Pettigrew revirou os olhos como se a resposta fosse óbvia – E agora ela deu para murmurar coisas enquanto pega os livros, e foi até a seção de Astronomia... Acho que andar com o Ranhoso acabou pirando o cérebro dela.

– Fazer o que lá?

– Eu que sei?! Só sei que vim atrás de vocês, não quero ficar sozinho com ela não. – O menino parecia realmente assustado, era um covarde completo. Como entrou para a Grifinória era um mistério indecifrável.

– Hum... Acho que esses irão bastar. – Potter pegou cinco livros da estante e foi, em disparada para a seção de Transfiguração, não sabia o que a Lily queria, mas só havia um jeito de descobrir... – Vocês não vêm? – acrescentou para os amigos, boquiabertos com a atitude do garoto.

– Claro...

Meia hora depois os três sentavam-se nas mesinhas olhando a garota de olhos verdes vivos à frente abrindo cada um dos livros e observando cuidadosamente o índice deles. De tempos em tempos descartava algum. Os três meninos questionavam-lhe o motivo de tudo aquilo, todavia ela os mandava calar a boca e voltava para seu tedioso trabalho. Finalmente decidiram que não obteriam nenhuma informação e calaram-se, questionando vez ou outra se poderiam ir ao Salão Comunal comer algo. A resposta era sempre negativa e até mesmo essas perguntas extinguiram com o tempo. O período que passaram olhando um para o rosto do outro foi interminável e, apenas horas depois, os estômagos roncando tamanha era a fome, Lílian decidiu que o trabalho estava terminado.

– Droga! Acho que perdemos o jantar...

– Ah, você acha? – Sirius ironizou irritado e com fome.

– Desculpe – ela parecia realmente envergonhada.

– Sorte sua Lils que eu e o Tiago sabemos onde fica a cozinha de Hogwarts... – um sorriso apareceu nos lábios do mais estranho dos Black.

– Sabem? – a primeira reação da garota foi de surpresa, depois de desconfiança – Como vocês sabem?

– Digamos que gostamos de explorar o terreno – Tiago abriu um sorriso, jogando a Capa por cima dos quatro e tomando a frente como guia.

O quarteto foi recebido pelos elfos, que trataram de alimentá-los devidamente. As barrigas cheias, voltaram à sala comunal. Sentada em uma das poltronas vermelhas a bruxinha começou a abrir os livros, um por um. Primeiro o de Astronomia, depois Defesa Contra as Artes das Trevas e por último, Transfiguração. Todos os capítulos abordavam assuntos sobre lobisomens, animagos e fases da lua. Os meninos franziam o cenho a cada livro que a amiga pegava. Era impossível imaginar o que ela planejava. Nada ali, supostamente, poderiam ajudá-los. Sirius tentou, em vão, convencer Lily a falar sobre o que se tratava tudo aquilo. Mais uma vez, foram deixados no escuro. Muito depois dos alunos irem para cama, Lílian resolveu revelar o mistério.

– Finalmente – resmungou Pedro, com os olhos já vermelhos de sono, ao perceber que iria receber explicações.

– Quando a professora Minerva se transformou em gato no inicio da semana algo passou a me incomodar. Eu não sabia o que era até me lembrar, hoje à noite, que era o mesmo gato com quem o Remo e o Hagrid saem todo mês.

– Você está dizendo que a McGonagall está metida nisso? – os olhos negros do grifinório eram pura incredulidade.

– Sem chances – concordou Tiago.

– Eu sei. Também pensei a mesma coisa, por isso decidi ir à biblioteca.

– E nos fazer trazer pilhas de livros. – Pettigrew deu um leve bocejo.

– Exatamente! – guinchou a menina – Eu procurei o nome da transformação da McGonagall, e não é uma transformação comum. Ela é uma animaga.

– O que é uma animaga? - Pedro não parecia acompanhar o raciocínio rápido da colega.

– Um bruxo ou bruxa com a capacidade de se transformar em animal.

– Uau – Sirius e Tiago sussurraram em uníssono.

– Eu sei. Mas eu não imaginava o que uma professora do nível dela precisaria fazer que tivesse, obrigatoriamente, de ser na forma animaga. A única opção era algo ligado as Artes das Trevas, ou a sua defesa. – parou, fazendo uma pausa dramática antes de continuar - Tanto no livro de DCAT quanto no de Transfiguração, dizia que animagos não podem ser feridos por lobisomens.

– Hagrid não é um lobisomem! É? – o garoto parecia menor que realmente era ao chegar à errônea conclusão.

– Claro que não. Não lembra que o Remo nos disse que ele era um meio gigante? – os olhos de Tiago, cobertos pelo seu cabelo desgrenhado, reviraram nas órbitas.

– Então – apressou o pequeno Black – O que isso tem a ver com nosso amigo Lupin?

– Bom, a principio... Nada – novamente uma pequena pausa foi feita – Entretanto, eu suspeitava que alguém ali fosse um lobisomem. Tenho, agora, a certeza de que não era o Rúbeo.

– Está dizendo que o Remo é um lobisomem?

– Impossível!

– Ele teria nos contado.

– Pelo que se sabe é possível sim! Basta ver as datas que ele saiu. Todas foram em lua cheia. O uivo que ouvimos tem grande probabilidade de ser de um lobisomem. A McGonagall na forma animaga. Tudo se encaixa! – a pausa que a garota fez para respirar sugeriu que ela ensaiou lhes dizer aquilo boa parte da noite, tentando minimizar o impacto que aquelas palavras causariam na bela amizade dos três garotos. Ela definitivamente não queria ser a responsável por contar-lhes a verdade, tampouco poderia esconder tal fato. Como desejava que o próprio Remo estivesse ali discorrendo a veracidade da temível injustiça do destino ao condenar o pobre garoto para sempre. Seria mais fácil.

Partiu-lhe o coração ter de observar calada, as feições de descrença transformar-se em raiva e logo após tomarem o rumo da dor. Sabia que nada podia fazer e isso doía-lhe mais que qualquer outra coisa. Ao longo dos últimos meses Sirius acabou por ser o irmão mais velho que não tivera; Pedro era um garotinho assustado que se alegrava em poder tranquilizar e proteger; até sua opinião havia mudado sobre Tiago. Ele podia ser irritante, todavia parecia possuir um bom coração por baixo de toda aquela arrogância. Mesmo Remo, com quem pouco convivera, tornara-se um amigo. Sentia que no futuro poderia ainda ser um confidente. A angustia acumulada em seu peito, minutos antes de soltar toda a dura realidade aos garotos metamorfoseou-se em lancinante dor, que eram igualmente vistas nos olhos de Sirius, Pedro e Tiago. Posterior a revelação, ao que pareceu uma eternidade, um a um, levantaram-se e foram viajar nos turbulentos sonhos que teriam naquela noite, antônima de calma.

Era de se esperar uma manhã cinzenta e chuvosa, contudo, por ironia ou não do destino, ao acordar o trio deparou-se com um dia alegre e ensolarado, muito diferente do humor prevalecente do interior deles. A mesa do café tinha as mais deliciosas iguarias e um Remo alegre que de nada desconfiava. Talvez por hábito ou pela amizade ser verdadeira, tentaram agir como se a noite anterior tivesse sido um pesadelo. E o dia se passou, as amenas conversas brotaram mais fáceis que antes. Quem sabe como forma da pesarosa sina de satirizar a situação? Fosse ou não assim, a consciência de Lílian pôde descansar. Entretanto não poderia ser dito o mesmo da insistência dos meninos. Instinto masculino ou não, tudo era incerto agora, uma silenciosa decisão passou pela cabeça de todos. A noite seria a hora de confrontar Remo. Queriam ouvir as palavras vindas do amigo transformando o fato em verídico ou insultando-o como a mais ridícula das ideias. Poderiam viver o resto da vida acreditando em uma mentira, mas jamais com a leve dúvida de uma verdade incerta por trás da intrujice.