Jogos Vorazes - O Garoto Do Tridente escrita por Matheus Cruz


Capítulo 2
Minha Primeira Inimiga




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Olho para a multidão, os habitantes do Distrito 4 me observam admirados, Claire aperta minha mão, eu retribuo o ato, trêmulo, meio inseguro, mas respiro fundo e volto à encarar os olhares atentos.

–- Distrito 4... – a voz de Claire soa alto, ecoando na praça – Finnick Odair e Dakota Marshall são seus novos tributos nos Jogos Vorazes!

Me assusto quando os aplausos irrompem, a mão gélida de Dakota agarra a minha e levanta o meu braço direito. Há assobios, gritos de empolgação, o hino de Panem recomeçando, tudo girando na minha cabeça.

No meu distrito, ser um tributo é considerado uma honra, nós treinamos na escola desde muito pequenos, o que nos torna mais habilidosos e sagazes. Há uma certa expectativa todos os anos em relação à Colheita, muitos jovens querem ter a chance de mostrar para toda Panem seu talento, ver tudo o que existe fora do Distrito 4, ganhar uma fortuna se vencer os Jogos.

Eu era um deles. Até conhecer Annie Cresta.

Sempre me dediquei muito aos treinamentos. Sou um dos alunos mais preparados, sou forte e astuto o bastante para abater meus inimigos. Assisti à todas as edições dos Jogos Vorazes (apesar de sermos obrigados mesmo), e me via lá, sonhando com o dia em que entraria em uma daquelas cápsulas de vidro e encararia a Cornucópia.

Mas tudo se dissolveu.

No início era apenas mais um caso sem importância, já tive muitas namoradas, sou bonito e sedutor, as garotas me amam, mas com a Annie foi diferente.

Agora realizei o meu maior sonho (que eu não queria mais que se realizasse), e terei que abandonar, sem saber se verei novamente, o amor da minha vida.

Encontro a expressão de Annie na multidão me observando, aterrorizada. Não há mais cor em sua face, os olhos arregalados tremem, rasos d’água. Isso foi uma facada no meu coração, minha vontade é descer correndo as escadarias e ir abraçá-la, beijar sua boca. Não quero deixá-la!!!

Os Pacificadores agarram meu ombro esquerdo e me conduz para dentro do Edifício. Fotógrafos e repórteres nos perseguem, há flashes para todos os lados, Dakota Marshall vai ao meu lado, sorridente, plena com a vitória.

O cabelo longo e louro de Dakota chega até sua cintura, cheio de ondas, sedoso e brilhante. Ela é magra, principalmente naquele vestido de algodão azul apertado, delineando as suas curvas. Seu rosto é cheio de sardas, os olhos castanhos, o nariz pontudo e arrebitado, o sorriso constante.

Os Pacificadores me empurram para dentro de uma sala vazia, e saem, fechando a porta. Assustado, olho em volta, sem acreditar no que está acontecendo.

Os primeiros à entrar são os meus pais.

–- Filho! – minha mãe corre para me abraçar. – Ah, meu Deus, você vai para os Jogos.

Ela é uma mulher muito bonita. Tem o corpo esbelto, cabelo sedoso e cinzento, rosto com traços marcantes perfeitos e olhos verdes claro como os meus.

–- Calma mãe, eu vou vencer, te prometo. – eu lhe abraço e ela recosta a cabeça em meu ombro, soluçando, deixando escapar as lágrimas. – Quando a senhora assistir à minha vitória, sentirá um orgulho imenso, seu filho será um vitorioso.

–- Finnick, são vinte e quatro contra um, tenho medo de te perder, meu único filho... – minha mãe me aperta entre seus braços.

–- Um de nós tem que vencer, não é mesmo? – tento passar um pouco de segurança para ela, mas percebi que isso é impossível quando você mesmo está à beira de um ataque de nervos.

–- Finnick, me promete uma coisa ? – papai pergunta, é a primeira vez que ele fala desde que chegou. Acho que ele está tão traumatizado quanto a mamãe, mas prefere não demonstrar seus sentimentos.

Concordo.

–- Finnick, promete que vai lutar até o último momento? Que fará de tudo para sobreviver? – papai pousa a mão no meu ombro, me olhando nos olhos. – Promete?

–- Papai... eu não tenho...

–- Filho, por favor! – pede, a voz embargada, me sacudindo.

–- Mas...

–- Por mim...

–- Tudo bem – respiro fundo – Eu prometo.

Recebo um abraço duplo, retribuo para os dois com fervor, o coração doendo, pensando que talvez essa seja a última vez que os vejo.

Os Pacificadores chegam para levá-los embora, ao abrirem a porta há uma confusão de flashes novamente, repórteres estendendo os microfones, cheios de perguntas, com expressões sorridentes.

Meus pais beijam minhas bochechas antes de sair. Enxugo os olhos com as costas das mãos e engulo em seco, tentando controlar a emoção. Na frente das câmeras preciso parecer um Tributo, um verdadeiro tributo.


Annie me beija desesperadamente, não quer que eu desgrude de seu corpo, empurra violentamente minha cabeça contra seu rosto. Ela nunca fez isso, Annie nunca me agarrou desse jeito.


–- Calma... – tento freia-la - ... Annie, espere um pouco...

Annie chora descontroladamente.

–- Annie! – limpo suas lágrimas, beijo sua face, afago seu cabelo – Meu amor... eu vou voltar! – ela não me escuta, balança a cabeça negativamente, me puxa para si – Eu treinei a vida inteira para os Jogos Vorazes, vou conseguir, te prometo.

–- Finnick... eu te amo! – as palavras saem em meio aos soluços e me beija de novo – Sei que vai conseguir... por mim.

–- Por você... – concordo.


Na estação, os habitantes do Distrito 4, repórteres, Pacificadores, empregados da Capital, todos amontoados, na ponta dos pés, para tentar dar uma olhada nos Tributos que partem para a Capital, e talvez nenhum, ou apenas um deles voltará.


Vejo tudo por uma das janelas do trem. Meus pais acenam para mim, as pessoas apontam e fazem sinal, tentando chamar minha atenção. Algumas horas atrás eu era apenas um dos garotos que trabalham no cais, agora me tornei uma celebridade, um Tributo, Panem inteira saberá quem é Finnick Odair.

E pensar que tenho apenas 14 anos...

Sonhei a vida inteira com isso, em me tornar um ídolo, ir para a Capital, ver a riqueza de perto, mostrar para os outros Tributos como é que se faz Jogos Vorazes de verdade. Agora sinto na pele o que eles sentem, é mesmo matar ou morrer, ou mato ou...

–- Finnick, não é esse o seu nome? – me sobressalto, olho para trás e vejo Dakota sentada numa das poltronas, me observando.

–- Bem... sim meu nome é Finnick. – finjo ser frio, tentando enterrar meus sentimentos. Ela é um adversário, não posso demonstrar fraqueza, preciso ser forte.

–- Você é lindo. – suas palavras me assombram, percebo que ela faz jogo sujo.

–- Muito obrigado. Infelizmente não posso dizer o mesmo de você. – meu intestino embrulha, estou gargalhando por dentro, nunca pensei que tivesse coragem de falar isso.

Dakota range os dentes, levanta da poltrona e segue na minha direção.

O vagão é extenso, Dakota estava num dos últimos assentos, e vem caminhando lentamente até à mim.

–- Olha aqui, garoto! – ela para na minha frente, seu rosto à poucos centímetros do meu, o olhar me fuzilando, o ódio visível em sua face. – Nunca mais brinque comigo dessa maneira – Ah! Meu coração quase sai pela boca quando a lâmina gélida do canivete encosta no meu pescoço – Se pudesse, te mataria agora mesmo, mas prefiro esperar, quero que seja um espetáculo para o público, Panem inteira e sua família vai ver você...

O chute na barriga dela é certeiro, Dakota se enverga de dor, eu agarro seu braço e tiro o canivete de suas mãos, depois lhe pego por trás e ponho o braço em volta do seu pescoço.

–- Vamos ver quem morre primeiro. Dakota Marshall. – guardo o canivete no bolso e a largo. Dakota cambaleia, mas avança de novo. Sou surpreendido por sua força, ela me derruba numa das poltronas e senta em cima de mim. Fico excitado, com vontade de matar.

–- Que pena, a humanidade vai perder um presente da natureza. Você é tão gostoso. – dá dois tapinhas de leve no meu rosto e sai de cima de mim.

Me ajeito na poltrona e respiro fundo, afago meus bolsos e percebo.

–- Perdeu lindinho. – Dakota brinca com o canivete entre os dedos, sorridente.

–- Bom dia, meus tributos – alguém entra no vagão, e logo a reconheço.

Nossa mentora, alguém que já ganhou os Jogos antes, e vai tentar nos mostrar como se faz isso. Sorrio e ela retribui simpática.

–- Meu nome é Mags, e serei a mentora de vocês nos Jogos Vorazes.



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