O que fazer num dia de chuva
- Que tédio... – Trunks disse. – Logo hoje, que a gente podia voltar a treinar...
- É... Logo hoje... – Gohan concordou igualmente entediado.
Os dois estavam à beira da janela, olhando a chuva forte cair. Gohan estava com planos de poder treinar Trunks, depois de se recuperar por completo da última luta, na qual perdera o braço esquerdo. Depois do reencontro com Goku, seu humor havia melhorado muito. Chegava até a fazer piadinhas sobre a falta de um braço.
- Gohan, o que dá pra se fazer num dia em que cai um toró desses?
- Sei lá, Trunks... Você tem alguma ideia?
- Se eu soubesse, não te perguntaria...
- Ah, é...
A chuva se acalmou e, nisso, Gohan se animou e foi trocar de roupa. Já tinha habilidade para se vestir com uma mão só – quando não precisava de uma ajudinha dos dentes. Saiu correndo do quarto.
- Vamos lá, Trunks! Quero ver se consegue me acompanhar!
- Claro que consigo!
- Ei, garotos! – Bulma disse. – Esperem aí, acho que vai...
Os dois nem deram atenção a Bulma e saíram correndo como duas criancinhas. Mas um trovão ecoou e, em seguida, desabou o maior toró. Nisso Gohan e Trunks voltaram desanimados e totalmente encharcados.
-... Voltar a chover... – Bulma completou ao vê-los.
- Isso não é justo... – Trunks disse.
- Eu tentei avisar... – Bulma disse, se segurando para não rir.
- Ô mãe, não tem graça...
Quem manda não acreditar num gênio e na sua invenção? Viu como o meu computador meteorológico funciona? Noventa e cinco por cento de acerto...
- Essa é a velha Bulma... – Gohan disse.
- Velha, eu?
- Calma, Bulma... É só um modo de dizer...
- Bom mesmo que seja... – ela disse cruzando os braços e empinando o nariz.
Se tinha uma coisa que Bulma ainda não havia perdido com os anos, era a vaidade. Sempre fazia o tipo “eu sou um gênio”, e jamais admitia ser chamada de “velha”.
- É melhor vocês dois se trocarem, ou vão se resfriar...
- Ah, mãe... Nós somos saiyajins... Não é qualquer resfriado que pode derrubar a gente...
Ela revirou os olhos azuis:
- Ah, Trunks... Às vezes você é teimoso como o seu pai...
- Vamos lá, Trunks... – Gohan disse. – Você não quer ver a sua mãe nervosa, não é? Até seu pai, que era mais teimoso, teve que entrar na linha...
*
- Nossa...! – Gohan disse. – Definitivamente, esse lugar precisa mesmo de uma reforma...
Os três estavam dentro do laboratório. Gohan estava surpreso com o estado do local. Dava pra dizer que chovia – quase que literalmente – dentro do laboratório.
- Pois é, Gohan... – Trunks disse. – Esse lugar tá mesmo implorando por socorro...
- Alguém tem um guarda-chuva aí?
- Vamos logo ao que interessa, rapazes... – Bulma disse. – Vamos tirar as coisas daí e colocar lá onde era a garagem...
- Foi pra isso que você chamou a gente pra cá? – Trunks perguntou.
- É claro! – Bulma respondeu. – Essa chuva até que veio bem a calhar. Eu só estava esperando a oportunidade de contar com a ajuda de vocês dois. Vocês sabem o quanto esses equipamentos são pesados? Só alguém com força de saiyajin poderia mudá-los do jeito que eu quero...
Mestre e aluno se entreolharam e assentiram. Acharam que poderiam tirar de letra essa arrumação...
*
- Caramba! Isso é cansativo! Dá um desconto, mãe...
Trunks estava estirado no piso da garagem, que passava a ser o novo laboratório. Gohan estava sentado, encostado à parede, igualmente cansado. Tinham levado tudo o que tinha para levar para lá. Faltava organizar.
- Tá certo, Trunks. – Bulma disse. – Gohan, me dá uma mãozinha aqui...
- Peraí, Bulma... Se eu te der a mão, vou ficar sem nenhuma...
- Deixa de piadas e levanta o armário pra mim. Caiu um tubo de ensaio lá embaixo...
Gohan levantou o armário e Bulma pegou o tal tubo de ensaio. Mas ao colocar o armário no lugar, este balançou e derrubou algo que acertou em cheio a cabeça do jovem guerreiro e o fez cair sentado no chão.
- Ai... Que troço foi esse que caiu na minha cabeça?! Ô coisa pesada, hein...
Recuperando-se da pancada inesperada, olhou para trás e viu Bulma pegar algo parecido com um grande livro.
- Mamãe, o que é isso? – Trunks perguntou ao se aproximar de Bulma.
- Nossa, eu não lembrava que este álbum estivesse por aqui... – ela disse.
-Puxa – Gohan disse. – Quem disse que as lembranças voltam com força não estava brincando... Esse álbum é superpesado...
- Se você pensasse em ganhar a vida como comediante, com certeza morreria de fome... – Trunks disse com uma ponta de ironia.
- Nossa... Como esse álbum está empoeirado... – Bulma disse e o soprou.
Com o sopro de Bulma, a poeira acumulada há anos no álbum virou uma grossa nuvem em volta do trio, que começou a tossir.
- Ô mãe... Fazia quanto tempo que você não achava esse álbum...?
- Deixe-me ver... Uns treze anos, eu acho...
- TREZE ANOS?!? Eu ainda era um bebê na época...!
Bulma já estava concentrada, começando a folhear o pesado álbum de fotografias. Trunks olhava curioso para a mãe. Gohan também se aproximou, a fim de ver o conteúdo do tal álbum.
- Essa aí é você? – Trunks perguntou a Bulma.
Bulma olhava a primeira foto do álbum. Na época, era adolescente e já havia iniciado a sua busca pelas esferas. Posava com uma das esferas do dragão com um garoto, que Gohan logo reconheceu:
- Esse garoto aí é o meu pai? – ele perguntou.
Foi quando Bulma acordou de uma espécie de transe. Estava tão mergulhada nas suas memórias, que mal havia prestado atenção nas perguntas dos dois.
- Ahh... Essa aí da foto sou eu, Trunks... E o garoto ao meu lado é o Goku...
- Ele é o pai do Gohan? Parece tanto...
- É... É sim... – Gohan afirmou. – Esse aí é o meu pai...
- E o que é isso na sua mão, mamãe? – Trunks apontou para algo na foto.
- Ah... Era uma das esferas do dragão...
- Esferas do dragão? Me explica!
Bulma ficou pensativa por alguns instantes. Depois, deu uma breve explicação:
- As esferas do dragão eram sete, que, quando eram reunidas, faziam surgir um dragão que realizava um desejo pra quem conseguia juntá-las.
Os olhos azuis do garoto brilharam.
- E por que a gente não procura essas tais esferas do dragão? Aí dava pra pedir ao dragão fazer os androides desaparecerem!
- Bem, Trunks... – Gohan disse. – Tem um problema bem grande pra conseguir isso... As esferas do dragão deixaram de existir há muitos anos...
- Como é que é?
- Gohan tem razão, Trunks. – Bulma disse. – Essas esferas dependiam da vida do criador delas, o Kami Sama. E o Kami Sama estava ligado ao Piccolo. Quando Piccolo morreu contra os androides, Kami Sama desapareceu também, e as esferas do dragão deixaram de existir.
- Se as esferas do dragão ainda existissem, não existiriam vítimas dos androides... E nem mesmo seu pai estaria morto.
- Que pena...
Bulma foi folheando uma a uma as páginas do álbum, todas repletas de recordações e histórias fantásticas. Mas ao chegar em uma determinada fotografia, Trunks começou a gargalhar.
- Ô Trunks, qual é a graça? – Gohan perguntou.
-É esse garotinho vestido de amarelo e com um chapelão vermelho na cabeça...!
- Esse sou eu, quando tinha quatro anos... – Gohan respondeu vermelho e todo sem graça.
- Ai, que fofinho...! – Trunks debochou.
- Sem graça... – o guerreiro resmungou com uma gota enorme na cabeça.
Foto a foto, Bulma e Gohan relembravam o passado, enquanto Trunks conhecia cada integrante da antiga equipe Z. Até que, de repente, ouviu-se uma sonora gargalhada, que fez o garoto de cabelo lilás pular pra trás.
- Ei, Gohan, o que você tá sentindo? – Trunks perguntou.
- Olha pra foto que você descobre... – o jovem guerreiro disse, já com a barriga doendo de tanto rir.
- Ô Gohan, esse sou eu!
- Eu sei... Te conheço bem o bastante... Você tinha um ano de idade quando tirou essa foto!
Trunks não respondeu. Seu olhar acompanhou o da mãe. Bulma fitava a fotografia com um ar ainda maior de nostalgia. Os olhos azuis pousaram sobre o terceiro componente daquela foto, com uniforme azul, armadura, luvas e botas brancas, cabelos e olhos negros e expressão emburrada. Ela deixou escapar um pequeno suspiro.
- Mamãe...
- Hã? – Bulma perguntou, saindo do transe.
- Esse aí... – apontou para a foto. – É o meu pai...?
- É sim, Trunks... A cada dia que passa você se parece mais com ele.
- Ele era forte?
- Ele era muito forte. – Gohan disse. – Um guerreiro muito poderoso... E muito orgulhoso.
- Eu gostaria de ter conhecido ele.
Um pesado silêncio se fez diante dessa declaração de Trunks. Mal sabia ele as razões desse silêncio.
Gohan olhou para uma janela. A chuva havia acabado. Mas o dia também. Já estava escuro, os três não haviam percebido o tempo passar.
- Ora essa... – Gohan disse. – Já tá bem tarde.
- Que droga... – Trunks lamentou. – O nosso treinamento foi pro beleléu...
- Bom... – Gohan sorriu. – Fazer o quê? O jeito é treinar amanhã...
- Olha pro lado bom, Trunks... – Bulma disse. – Você descobriu como era o pai do Gohan, os amigos dele...
-... E como era o meu pai... – o garoto completou. – Você tem razão, mamãe. Até que não foi um dia perdido, afinal de contas...
*
Em meio a uma tempestade, Gohan lutava contra Nº 17 e Nº 18, em uma cidade já bastante destruída. Mas, de repente, foi atingido por um clarão, do qual não conseguiu escapar. Quando acordou, o rosto estava banhado de suor. O coração disparou, a respiração ficou ofegante. O susto foi demais. Depois de alguns instantes, conseguiu se acalmar.
- Que... Que pesadelo...! Espero que isso não vire realidade...!
Sentou-se na cama, para terminar de se recuperar do susto. Passou a mão pela testa e tirou o suor, dando um suspiro de alívio. Levantou-se e foi até a porta. Abriu-a e olhou para os dois lados do corredor, para ver se alguém havia escutado o grito que ele dera antes de acordar. Observou por alguns instantes o corredor, para se certificar de que ninguém havia acordado. Como não viu nenhuma movimentação no corredor, fechou a porta e voltou à cama.
Começava a ter um mau pressentimento... Principalmente acerca de seu destino.
Será que o pesadelo teria algo a ver com esse mau pressentimento? Agora sentia necessidade de contrariar esse mau pressentimento e evitar que esse pesadelo se torne realidade. Tinha que vencer os androides a qualquer custo.