Fora de si. Esse era o termo mais adequado e civilizado para Percy – cujo significado da palavra civilização lhe faltava. Ele e mais algumas sete pessoas estavam jogados na sala, no meio da bagunça. Almofadas no chão, batatinhas espalhadas pelo tapete e o cheiro do álcool se destacavam na sala. Quase todos foram embora quando o primeiro carro da polícia apontou no final da rua. Desligaram o som, desligaram a música e saíram pelos fundos.

Os mais alterados pela bebida ficaram ali mesmo, e não parecia que iriam acordar tão cedo. Percy ainda conseguia sentir a batida das músicas ecoando por seus ouvidos, mesmo que o único barulho na sala fosse os roncos de Lee Fletcher. Percy riu sozinho sem motivos e ficou sentado. Viu que um de seus pés estava sem sapato, mas logo desviou sua atenção para outro lugar. Na sua frente, pelo corredor, Annabeth saia cambaleando do banheiro.

No caso da mesma, fora de si não era o termo certo. Annabeth não era considerada ‘forte’ na categoria bebida. Ela não podia passar de seus limites ou acabava vomitando – e foi o que aconteceu nessa noite. Ela sentiu sua cabeça rodar um pouco por causa da força que fez para empurrar tudo para fora e foi para o quarto.

Annabeth foi para o quarto, acendeu a luz e viu Thalia deitada em sua cama, cantando, e mais duas pessoas esparramadas no chão. Reconheceu Luke e duvidava que a outra pessoa pudesse ser aquele amigo de Percy se não Nico. Ele roncava alto e Luke murmurava algumas coisas. Annabeth se sentou na cadeira na frente de sua escrivaninha e colocou a mão na testa. Logo Luke e Thalia começaram a discutir. Ele queria que ela se calasse e ela queria que ele... Também se calasse.

– Adoro brigas. Ainda mais quando é briga de casais – Percy apareceu na porta do quarto, cambaleando. Annabeth levantou a cabeça e bufou. Mais um peso em sua dor de cabeça, ótimo.

– Casal? Eu e seu amigo fedorento não somos um casal. – A garota punk respondeu, de cara feia, e Luke caiu no chão de novo enquanto Thalia falava sobre como ele era estúpido.

– Sabe, você poderia tirar seus amigos daqui para que eu pudesse dormir um pouco... – Annabeth sugeriu e Percy riu desfiguradamente.

– Eu não consigo nem me mover direito, não irei conseguir tirar dois merdas daqui. – Ele respondeu e caiu do lado da cadeira que Annabeth estava sentada. - Sabe, loira, ouvi muitas coisas sobre você na festa hoje.

– Que bom pra você – ela resmungou, esfregando a testa novamente com esperança que a dor fosse embora.

– Conversei até com seu ex-namorado, o tal do Dylan – Annabeth paralisou e Percy riu. – Eu sabia que isso iria chamar a sua atenção. Ele me contou em como você quebrou o coração dele em mil partes... Estava mais bêbado que um gambá e até chorou.

Annabeth sentiu o punho se fechar. Dylan era o cara que ela menos tinha ressentimentos, mas também era uma das últimas pessoas que queria ver na terra. Ambos mediram esforços para ficarem juntos, e sem exageros, ela poderia dizer que atravessaram um rio com a mais forte correnteza do mundo para ter um ao outro.

Mas quando estavam conseguindo fazer com que as coisas dessem certo, ele mudou o foco para outra coisa – como se tivesse desistido. E ela não queria continuar a fazer tudo sozinha, então ela também mudou seu foco. E quando ele se deu conta, correu atrás dela como um cachorrinho, mas ela não queria mais nada com ele.

– A culpa foi dele, ele quis assim – Annabeth respondeu, após respirar fundo para não falar algo inapropriado.

– Claro, como se um cara quisesse levar um fora – Percy deu de ombros. No fundo, ele sentia que não deveria ter tocado nesse assunto, muito menos ter ido ao quarto dela. Mas era bem no fundo mesmo, tão fundo que ele nem se importou.

– Ok, Percy, já é hora de você ir dormir – Annabeth disse ficando de pé e estendeu a mão para que o garoto pudesse se levantar. Ele a segurou e se levantou, enquanto Annabeth o arrastava para outro quarto.

– Eu não me importaria de tentar uma chance com você mesmo que tivesse que levar um fora depois. – Ele soltou. Thalia e Luke até pararam de discutir para observar melhor os amigos. Enquanto Percy soltava o que havia enterrado dentro de si, Annabeth sentia seu coração palpitar.

– Certo, você está apenas bêbado... Um garoto bêbado.

– Você me daria uma chance? – Ele perguntou, se livrando de Annabeth e ficando cara a cara com ela. Thalia arregalou os olhos e Luke sorria divertidamente. Da mesma forma que Thalia sabia da raiva que Annabeth estava sentindo de Percy, Luke sabia da paixão secreta que Percy sentia por Annabeth.

– Percy, eu realmente não... – Annabeth começou, mas foi interrompida.

– Lembra quando éramos crianças? Que eu taquei massinha no seu cabelo? Foi o jeito que encontrei de você me notar. – Agora Percy falava como se estivesse completamente sóbrio. Desde criança ele sentia o estômago revirar quando via a loira. Mas como ela nem desviava o olhar para ele, aquela era a única forma de ter sua atenção. Annabeth ficou pessoalmente surpresa com a forma que ele havia se declarado.

– Ok, já passou dos limites. Vou te levar pro seu quarto antes que acabe passando mal e eu tenha que te levar para o hospital – ela tentou desviar de assunto. Estava confusa demais com tudo o que ele havia dito e queria pensar. Talvez ela precisasse pensar um pouco; talvez ela sentisse algo bom por ele. Certo, agora ela estava achando que estava bêbada demais também. Ela, sentindo algo por Percy Jackson? Não. Não porque era orgulhosa demais, mas porque ele não era a pessoa certa.

Annabeth o puxou novamente arrastando-o para o quarto, mas ele permaneceu firme e olhou para ela.

– Você me daria uma chance? – Ele perguntou com a voz levemente embriagada agora, como se estivesse mais sóbrio. Annabeth ficou sem ter o que dizer, mas ela tinha que dizer algo.

– Olha, Percy, fico muito feliz que nós estamos nos entendendo bem por agora, mas acho que isso...

E antes que ela terminasse, Percy virou a cabeça para baixo e vomitou. Annabeth quis vomitar junto, já que Percy havia se ‘aliviado’ bem em cima de seu tapete. Logo depois, ele caiu no chão e desmaiou. Thalia olhava boquiaberta, sem saber se ria ou se ajudava. Annabeth respirou fundo e manteve a calma.

– Merda... vou dormir no quarto dele, será bem vinda lá.

– Annabeth, acho melhor você tirar... – Thalia começou, mas sua amiga já havia batido a porta do outro quarto.

(...)

Ao acordar, Percy se levantou com a maior dor de cabeça no mundo. Ouviu os roncos de Luke do outro lado da cama e viu que Nico havia ido embora. Sentiu a mão pegajosa - vômito. Levantou-se e sentiu a cabeça latejar. O cheiro de vômito vinha de todas as partes. Foi até a sala e ficou surpreso com a enorme bagunça.

Ainda havia algumas duas pessoas dormindo por ali. Percy os acordou depois de inúmeras tentativas e os expulsou, sem se dar ao trabalho de ver quem era. Se jogou no sofá sujo e coçou os olhos, morrendo de dor de cabeça. Olhou para o relógio e viu que já era quase meio-dia. Desviou os olhos para os porta-retratos que estavam no criado ao seu lado. Viu fotos de Annabeth pequena e algumas fotos de Atena e Poseidon.

De repente, um fraco flashback voou por sua mente. Percy falando coisas sem sentido para Annabeth, pedindo algo... Desejando algo. Ao lembrar disso, sentiu seu estômago revirar. Ele não havia falado para Annabeth o que ele sentia... havia? Deus, ele tinha que saber disso. Se levantou e viu a porta de seu quarto entreaberta. Annabeth estava lá, sentada na cama e semicerrando os olhos para que o sol não lhe irritasse. Abriu mais a porta e também deixou os olhos estreitos. O sol da manhã estava horrível.

– Ah, bom dia pra você. Espero que limpe o tapete que deixou sujo. Na verdade, espero que limpe a casa toda hoje – ela falou.

– Bom dia. Estou muito bem, obrigado por perguntar. – Percy rolou os olhos. – Sabe onde tem algum comprimido anti-ressaca por aqui?

– No armário do banheiro, eu acho – ela falou e se jogou na cama.

– Ok, obrigado. Annabeth, hm... Eu não te disse algo que não deveria ontem, disse? – Ele perguntou, e ela se sentou novamente. Olhou bem para ele e franziu a testa.

– Não, Percy. Você não disse nada.

– Ah, tudo bem... Vou pegar o remédio – ele falou e se virou, sem saber se o que sentia era alívio ou tensão. Quando se virou, deu de cara com Thalia com a maquiagem toda borrada. Passou por ela antes que a garota falasse algo que o provocasse e foi até o banheiro.

Já Annabeth, não sabia se tinha feito certo ou errado em não contar a ele o que havia acontecido na noite passada. Talvez tivesse sido melhor... Ou talvez não. A única coisa que viu, foi Thalia de braços cruzados na porta do quarto, com olhar de reprovação. Annabeth sabia que poderia ser pior.