2012 escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 15
Resistência massiva




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No capitulo anterior, a turma finalmente descobre o que está para acontecer com o planeta e por mais que a revelação tenha sido dolorosa, eles decidiram que o melhor era cada um contar para sua família e todos irem embora para bem longe dali.

29 DE FEVEREIRO DE 2012

Ângelo sobrevoava o bairro, ora pousando no telhado da casa de um, ora na casa de outro. Ninguém tinha percebido que ele havia presenciado a reunião do dia anterior e ouvido toda a conversa.

“Caramba, finalmente o pessoal tá sabendo! Tomara que isso adiante alguma coisa!” ele sabia que só tinha conseguido a metade do trabalho. A outra metade ia depender de como os pais dos seus amigos receberiam a notícia e era aquilo que o preocupava.

Quando ficou um pouco cansado, ele pousou no telhado da casa da Mônica e se concentrou para ver o que acontecia lá dentro. Ela estava se preparando para dar a notícia aos pais, como o resto da turma também estava fazendo. Somente a mãe dela estava em casa. Seu pai ainda não tinha chegado e ele imaginou que a conversa ia demorar um pouco, então resolveu observar a casa de outra pessoa.

Por onde passava, ele via que seus amigos estavam com dificuldades para falarem com seus pais e aquilo o preocupou um pouco.

“É... isso vai ser mais difícil do que eu pensei! Ah, olha só! A Aninha vai falar com os pais dela. Vou ficar com os dedos cruzados! Peraí... o pai da Mônica tá chegando, então ela deve falar com eles a qualquer momento! Acho que vou dar uma olhada nela primeiro.”

Quando deu meia volta para ir até a casa da Mônica, ele deparou-se com D. Morte que vinha na direção oposta.

— Ô D. Morte, você por aqui?
— É o trabalho, rapaz. Nunca termina! E você? Seus amigos já estão sabendo de tudo?
— Sim, e vão falar com os pais deles daqui a pouco.
— Bem, o jeito é aguardar então.
— Pois é. Agora eu tô indo pra casa da Mônica, ela vai falar com os pais dela e eu quero ouvir.
— Boa sorte com seus amigos.

Ângelo foi embora e D. Morte suspirou de alívio. Para sua sorte, o rapaz era inocente demais para ter estranhado sua presença justo naquele lugar.

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— Mônica, por que você está andando de um lado para outro assim?
— É que eu tenho uma coisa pra contar.
— O que?
— O pai já tá chegando, aí eu falo pros dois.
— Hã... se por acaso você e o Cebola já... você sabe... talvez fosse melhor falar comigo primeiro. Você sabe como o seu pai é.
— Quê? Ih, mãe! Não é nada disso não. É outra coisa muito grave... Daqui a pouco a senhora vai entender.

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— Filho, por acaso você está querendo falar alguma coisa?
— Estou, pai. Deixa só a Mariazinha ir para a cama que eu falo.
— Ah, já entendi. Quer dizer que você e a Mônica já...
— Quem dera (cof, cof!) quer dizer... não é isso não, é outra coisa...

Seu Cebola levantou uma sobrancelha muito intrigado. Pela expressão do seu filho, ele deduziu que devia ser algo muito grave.

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Magali estava sentada diante dos seus pais, segurando Mingau em seu colo como que para lhe dar forças.

— Magali, seja lá o que for, você pode falar sem medo.
— Eu sei, mãe... é que isso tá muito difícil...

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— Deixa eu ver... tirou zero em matemática?
— Não.
— Quebrou a bicicleta e agora quer outra?
— Também não...
— Você quer algum boneco novo do Cosmo Guerreiro?
— Hum-hum.
— Ajuda aí, né filhão?
— Pai, mãe... aff! Nem sei por onde começar!

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Carmen respirava várias vezes em frente ao espelho.

— Brr brr brr! Mah, mah, mah!
— Carminha, o que você vai fazer?
— Conversar uma coisa muito importante com a mammy e o papi, xodozinho. Tenho que me preparar muito bem!

Ela fez mais alguns dos exercícios respiratórios aprendidos no filme High School Musical e falou para si mesma.

— Muito bem, Carmen! Todo o seu treinamento lhe preparou para isso! – um longo suspiro enquanto ela posicionava as duas mãos como se estivesse meditando. – Concentração, concentração! Isso é mais do que um sapato novo! Muito mais do que uma bolsa de grife do shopping e mais importante ainda do que três dias num SPA!

Quando se sentiu preparada, ela olhou para seu primo e pediu.

— Me deseje sorte. - e assumiu seu costumeiro ar de melodrama para poder conversar com seus pais.

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Não foi fácil criar coragem para falar com seus pais e após respirar fundo e tirar forças lá do fundo das suas entranhas, Mônica contou num fôlego só tudo o que ela e seus amigos tinham descobertos nos últimos dias e sobre a tragédia que ia abater o planeta. Souza e Luiza ouviam tudo com os olhos arregalados.

— Mônica, desde quando você deu para acreditar nessas maluquices?
— Não são maluquices, mãe! Essas coisas vão mesmo acontecer! Vocês não repararam as trincas que aparecem nas casas de todo mundo? Só terremoto faz isso e a gente nunca teve terremoto aqui no bairro!
(Souza) – Mesmo que fossem terremotos, não são grande coisa. Umas trincas nas paredes causam constrangimento, mas não são assim uma tragédia.
— Agora não, mas quando julho chegar, isso aqui virá tudo abaixo. Vocês têm que acreditar em mim!

Luíza abanou a cabeça negativamente.

— Querida, não fique pensando nessas loucuras. Olha, se você buscar na internet, verá milhares de teorias malucas sobre o fim do mundo. Há séculos os profetas falam que o mundo vai acabar e veja só: estamos todos aqui!
— Sua mãe tem razão, Mônica. Essa coisa de profecia maia é só conversa mole.
— Mãe, pai...

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— E então, querida? O que você queria nos dizer?
— Eu... bem... é que... – Dorinha gaguejou no inicio, tentando encontrar as palavras certas.

Seu pai coçou o queixo e arriscou.

— Deixa eu adivinhar: você está namorando algum garoto?
— Não, isso não...
— O que é então?

Ela respirou fundo e após criar coragem, pode contar tudo para os seus pais que ouviram calados e pensativos.

— Então é isso. A gente precisa ir embora para longe daqui o quanto antes, senão vai ser tarde demais.

Ele olhou para a esposa e depois de volta para a filha.

— Dorinha, quem andou enfiando essas idéias malucas na sua cabeça?
— Ninguém, pai! A nossa turma investigou, conversamos com o Franja que tem um equipamento de alta tecnologia no seu laboratório, o prof. Licurgo publicou um vídeo do primo dele e...
— Ô, espera aí! Você disse prof. Licurgo? Não seria aquele professor pirado que vive dando aulas sem sentido?
— Ele não é louco, pai. Excêntrico talvez, mas louco não! E ele está falando a verdade!

Os dois caíram na risada.
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Antenor dava risadas enquanto Lurdinha balançava a cabeça com um sorriso no rosto.

— Ah, filho! Você quase mata a gente de susto!
— Mas mãe! É verdade! Em julho, tudo isso aqui vai ficar um caco!

Antenor enxugou as lágrimas e falou:

— Essa não! Você anda lendo muito desses gibis malucos, não é? Ou então vendo televisão demais. Cascão, você tem noção da loucura que está falando pra gente?
— Não é loucura, pai! É verdade, isso vai rolar mesmo e a gente tem que sair daqui vazado!
— E pra onde a gente iria, você pode dizer?
— Chapada dos Guimarães ou dos Veadeiros.
— Ah, tá explicado! – Antenor disse dando outra risada.
— O quê?
— Você deve ter ouvido falar dos esportes radicais que tem nesses lugares e está arrumando uma desculpa pra fazer uma viagem, né?
— Não! Acontece que...
— Cascão – ele falou agora sério – nós não temos dinheiro para fazer uma viagem dessas.
— O senhor pode vender tudo, pegar um empréstimo e a gente compra uma casa novinha lá!

Ambos olharam para o filho como se ele tivesse ficado louco.

— Pegar um empréstimo? Pra pagar de que jeito?
— Pai, quando o mundo for pras cucuia, o senhor não vai ter que pagar nada!

Lurdinha colocou a mão na testa do filho para ver se tinha algum sinal de febre.

— Cascão, eu acho que tanto tempo sem tomar banho acabou afetando seu cérebro!

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— Cebola, por favor! Não fica insistindo nessa loucura!
— Não é loucura mãe!
— Olha, seus planos infalíveis nunca funcionaram com a Mônica e não vão funcionar com a gente também.
— Pai, não é plano nenhum! A gente tem que sair daqui o quanto antes!
— Achei que você gostasse desse bairro.
— E gosto, pra caramba, mas acontece que daqui a um tempo isso aqui não vai existir mais.
— Eu acho que esses joguinhos estão afetando o seu cérebro!
— Isso não!
— Cebola, vamos parar com essa conversa maluca porque daqui a gente não sai, entendeu?
— Mãe, acredita em mim, por favor! Todo mundo já está sabendo disso!
— Tudo está tranqüilo, estável e não vejo nenhum problema nem no nosso bairro e nem no nosso país!
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— Além do mais, filho, você sabe que o Brasil está localizado em uma área estável da Placa Sul-Americana. Mesmo que haja terremotos pelo mundo, estaremos a salvo aqui.
— Olha, em uma situação normal essa placa é estável sim, mas acontece que com o aquecimento do núcleo da terra, a crosta terrestre irá se desestabilizar toda e isso inclui a nossa placa também!

Franja tentava desesperadamente convencer a seus pais e os pais de Marina, sem nenhum sucesso.

— Rapaz, você acha mesmo que se algo estivesse acontecendo, alguém não iria falar sobre o assunto?
— Seu Mauricio, os governos não irão falar nada porque estão fazendo tudo às escondidas!

Marina também tentava convencer seus pais com todos os argumentos possíveis e ambos os casais permaneciam irredutíveis. Não havia razões para acreditar naquela loucura.
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— Meninos, por favor! Vocês enlouqueceram?
— É verdade, juro!
— Nimbus, eu acho que aquela menina andou virando sua cabeça. Devia saber que mexer com essa coisa de mágica e bruxaria poderia te fazer mal.
— Mãe, a cabeça do Nimbus vai muito bem obrigado e a minha também. A gente tá falando a verdade!

Nimbão olhou confuso para os filhos. Era muito raro vê-los concordando em algo.

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— Meu docinho, você pode pedir o que quiser. Pode até pedir o shopping inteiro que eu te dou, mas isso já é absurdo!
— Mas papi, a gente tem que sair daqui!

D. Frufru protestou.

— O que? Carminha, você sabe como é difícil arrumar uma casa decente numa boa vizinhança? Nós moramos aqui há muitos anos e eu não vejo razão para nos mudar. Ainda mais para a chapada dos Guimarães! Que absurdo!
— Não é absurdo, mãe! A gente precisa fazer isso!

Seu pai discordou.

— Não, não precisamos. Eu tenho meu trabalho, meus clientes e não posso deixar tudo para ir viver em outro estado. Ainda mais lá no meio do mato!
— Por favor, papi! – ela chorava e fazia todo o drama que já tinha dado tão bons resultados no passado. Daquela vez, no entanto, seus pais estavam irredutíveis.
— Vamos fazer o seguinte, docinho. Se der, a gente pode passar as férias de julho na Disney ou em algum país na Europa.
— Isso não, eu quero a chapada dos Guimarães!
— Que seja, docinho, que seja. A gente pode passar uma semana ou duas lá se meu trabalho permitir.
— Por que o senhor não compra uma casa lá?
— Porque vai custar caro manter uma casa tão distante que só será usada poucas vezes. E ponto final!
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— Aninha, você tem trabalhado demais! Porque não descansa um pouco? Você vive arrumando um emprego atrás do outro!
— Não é isso, mãe! Eu tô falando a verdade!

A mulher balançou a cabeça, irritada com a insistência da filha naquela idéia maluca e também com o marido, que tinha mergulhado na leitura do jornal e parecia alheio a tudo o que acontecia ao seu redor.

— Na televisão eles falam que está tudo bem e esses terremotos não são problema!
— Claro, né mãe! Toda essa mídia é manipulada, então eles nunca vão dizer a verdade.
— Ah, filha! Não vai me dizer que você deu para acreditar em teorias da conspiração!
— Não são teorias da conspiração!

A mulher voltou-se para o marido, indignada com seu silêncio.

— Você vai ficar aí sem falar nada, homem? Faça alguma coisa!

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(Lili) – Você nunca foi dessas coisas, Magali! O que deu em você? Por acaso comeu alguma coisa estragada?
— Claro que não, mãe! Olha, eu não quis acreditar de jeito nenhum, mas é a pura verdade! O Franja até tem prova de tudo!
— Então era por causa disso que você estava preocupada? Por favor, filha! Não faz nenhum sentido se desgastar com essas bobagens!
(Carlito) – Sua mãe está certa, Magali! Além do mais, isso que você pede é absurdo! Vender tudo o que temos e comprar uma casa na Chapada dos Guimarães! Como ficam nossos empregos? Vamos viver do quê?
— Isso a gente vê depois, o importante é sobreviver!
(Lili) – Nossa, você fala como se todo mundo estivesse condenado!
— E está, a não ser que a gente vá embora daqui o quanto antes!
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— Mônica, você não pode ir acreditando em tudo o que te falam, querida! As pessoas fantasiam demais e sobre essa tal profecia maia, até a NASA já desmentiu!
— Claro que eles não vão falar a verdade, né? Jamais! Acontece que os governos do G8 estão fazendo tudo as escondidas sem ninguém perceber!
— Eu não pensei que você se importasse com essas teorias da conspiração.
— Não é teoria da conspiração, pai. É verdade! Vocês não perceberam que os terremotos estão aumentando em todo mundo? Até aqui no bairro está tendo terremoto!
— Terremotos? Por favor, a gente não sente nem o menor tremor!

Quanto mais ela tentava convencê-los, mais eles se mostravam resistentes e ela viu que os dois estavam perdendo a paciência.

— Mônica, se você não parar com isso vamos te colocar de castigo. Que coisa, você nunca foi desse jeito! Acho que esses seus amigos estão virando sua cabeça!
— Mas mãe, eles não estão fazendo nada!
— Se você não parar com isso agora mesmo, eu vou proibi-la de andar com seus amigos.

A conversa entre Mônica e seus pais foi encerrada ali porque ela percebeu que insistir poderia piorar as coisas. Naquela noite, cada membro da turma foi para a cama em total desânimo. Todos os seus esforços tinham sido em vão e ninguém acreditou neles.

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Ângelo voltou para o mundo astral triste e cabisbaixo. Será que todo seu trabalho tinha sido em vão? O pior era que ao ajudar os amigos a descobrirem o que estava por vir, ele poderia ter piorado a situação, deixando todo mundo angustiado e sem poder fazer nada.

— Porcaria, por que eles não percebem? Está tão claro e eles não enxergam!
— Os humanos são assim mesmo, meu jovem. Se eles ouvissem nossos conselhos, o mundo estaria muito melhor do que está agora.
— Serafim, será que não dá pra fazer mais nada?
— Você fez o que podia fazer dentro das suas limitações. Mais do que isso seria quebrar as regras e eu não vou permitir tal coisa.

Ele sentiu vontade de gritar e soltar todo o repertório de palavrões que ele tinha aprendido com D. Morte de tanto andar com ela. Como não podia fazer nada daquilo, Ângelo achou melhor ir embora e se isolar um pouco.

— Pobre rapaz. – o velho anjo pensou vendo-o se afastar.


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