Human Nightmare escrita por Leonardo Franco


Capítulo 21
Última vez que a verá


Notas iniciais do capítulo

Sei que a história está indo de um modo bem mais direto do que eu esperava, mas eu preciso terminar essa história. Ênfase em "preciso".



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LIA

Acordo com um barulho, e a primeira coisa que faço é olhar para Matt. Ele está dormindo profundamente, com a boca aberta e uma mão na minha perna. O barulho que me acordou foi seu ronco. Ao mesmo tempo em que acho aquele barulho terrivelmente incomodante, também acho que é fofo de algum modo. Na verdade, quase tudo que Matt fala ou faz eu considero fofo. Acho que é pelo fato de ele ainda ser uma criança (praticamente).

Paro de olhar para ele por um momento e fecho os olhos. Respiro profundamente e começo a pensar no que vamos fazer, daqui pra frente. Não consigo imaginar nada. E é quando algo atinge o vidro do meu lado com muita força.

O vidro por pouco não quebra, mas muitas rachaduras são visíveis. E algo as está forçando. Um zumbi, vejo com desespero. Não consigo reunir forças para gritar, e, bem lentamente, cutuco Matt no braço. Ele não acorda, então eu me viro e começo a dar tapinhas em seu rosto. Seus olhos se arregalam, assustados.

— O que foi? – Ele diz, quase gritando. Não preciso responder, pois ele ouve as batidas no vidro. E logo depois o vidro se quebra. Matt abre a porta do seu lado e me puxa junto, antes que o zumbi consiga me pegar. Estou quase chorando, mas as lágrimas simplesmente não saem.

Corremos sem rumo por apenas um segundo, e paramos abruptamente quando vemos dezenas deles caminhando em nossa direção. Viramos para trás só para encontrar mais deles. Matt está tão desesperado quanto eu, mas sua mão é firme quando ele pega na minha.

Ele me puxa com força, e corremos para o único lugar que não vemos zumbis. Matt começa a suar nas mãos, e fica cada vez mais difícil me segurar nelas. Nós não gritamos, pois sabemos que é inútil, e provavelmente só chamaria mais atenção.

Não sei por quanto tempo mais nós corremos. Só sei que eu tropecei algumas vezes, pois já não estava mais aguentando de cansaço. Depois da quinta vez que eu caí, começou a chover. Muito conveniente.

Paro de correr e olho pra trás. Não consigo ver mais nenhum zumbi, mas seria imprudente descansar aqui e agora. Olho para frente e vejo Matt correndo, com a mão na cabeça, tentando se proteger da chuva. Não sei se ele percebeu que eu parei de correr, então volto a correr atrás dele.

Ele finalmente para depois de mais alguns minutos. Quando o alcanço, ele está de joelhos, olhando para frente. Sigo seu olhar, e fico surpresa ao ver uma casa. Não muito grande, com as janelas fechadas por fora com tábuas de madeira. Uma cruz vermelha enorme está marcada em uma delas.

— O que será que significa? – Pergunto, mas Matt não ouve. O barulho da chuva está muito alto agora.

Matt se levanta e pega minha mão. Ele olha nos meus olhos, e sem falar nada começa a andar. Eu o acompanho em direção à casa. A chuva vai diminuindo gradativamente, mas está longe de parar. Minhas roupas e meu cabelo estão ensopados, e não tem nada que eu possa fazer em relação a isso.

Chegamos ao outro lado da casa, e estamos parados em frente à entrada. A porta em si está no chão, arrombada. Matt olha para mim e aperta minha mão com mais força. Retribuo o aperto, e logo depois ele solta. Ele pega um toco de madeira que está ao lado da porta, no chão, e entra na casa. Estou com o coração na mão, mas me sinto segura com ele entrando na frente.

Consigo acompanhar Matt com o olhar por apenas alguns segundos. Logo ele está em uma parte da casa que é mais escura, e eu não consigo ver mais nada. Imagino se ele consegue ver alguma coisa, e concluo que não. Ouço-o esbarrando em alguns móveis várias vezes, e xingando audivelmente. Já estou quase decidindo se devo entrar ou não, quando ouço um grito e algo caindo no chão. Sem pensar em mais nada, entro na casa, sem coragem de gritar por Matt.

No segundo que atravesso o portal, minha visão fica embaçada, e a cada passo que dou, ela vai escurecendo, até um ponto em que não consigo enxergar nada. Pisco algumas vezes no escuro, tentando fazer minha visão se acostumar, quando sinto uma mão me agarrando. E agora eu grito. A mão solta meu pulso e cobre minha boca.

— Shhh, sou eu – Matt diz, tirando a mão da minha boca quando eu relaxo. Me viro e o abraço rapidamente.

— O que foi aquele barulho?

— Tem um zumbi aqui, Lia.

— Então nós temos que sair daqui. – Digo, e começo a puxá-lo para a porta, pouco antes de alguma coisa se colidir contra nós. Solto a mão de Matt e caio no chão. Sinto algo pesado se chocando em mim no chão, sobre meu braço, e percebo que é Matt. Quando me viro, vejo que o que nos atingiu era o zumbi. Ele está em cima de Matt agora, e ele luta desesperadamente para escapar.

Fico paralisada por o que me parece uma eternidade, e depois sinto que estou retomando os sentidos. Levanto-me e pego o toco de madeira que estava com Matt, e acerto o zumbi na cabeça. Não aplico força o suficiente, e ele só cambaleia para trás, o que ao menos dá a chance de Matt empurrá-lo com força e fazê-lo cair para trás. Matt se levanta, e, sem olhar para trás, sai correndo. Ele me passa e está correndo na minha frente agora.

Ele pula por cima da porta caída e passa pelo portal. Já me sinto aliviada antes mesmo de sair também, quando ouço alguém correndo atrás de mim. Entro em desespero, grito e corro mais rápido. Matt para, já na grama, e olha para trás. Ele grita meu nome.

E a única coisa que eu quero fazer é gritar o nome dele. Avisá-lo que ele está em perigo. Falar para ele olhar para o lado e correr. Pedir a ele que sobrevivesse. Mas não há tempo. Parece que nunca há.

Matt não vê o zumbi que se aproxima por sua direita. Ele só percebe o que está acontecendo quando os dentes dele já estão cravados em seu ombro. Ele não grita. A surpresa é maior que o pânico, que o medo.

Parece que estou correndo em câmera lenta. E também parece que a raiva em mim me deu uma desconhecida força a mais em meu corpo, o que me deixa tirar o zumbi do ombro de Matt com facilidade quando o alcanço. O toco ainda está na minha mão, e eu o atinjo bem no meio na testa. Sinto o toco entrando em sua cabeça e danificando seu cérebro, e não sinto um pingo de remorso por isso.

Olho para Matt, e vejo que ele está sentado no chão, olhando para baixo. Ele vira a cabeça, olha para mim e diz:

— Corra.

E depois cai para o lado.

Ajoelho-me ao seu lado, momentaneamente ignorando todos os zumbis a apenas alguns passos de nós. Sei que ele ainda está vivo, mas sinto sua vida se esvaindo, e sinto seu sangue em minhas mãos. Um zumbi se aproxima, então me levanto e começo a puxar Matt comigo. Não o deixarei ali para ser estraçalhado por aquelas bestas.

Mas sinto a força criada pela raiva indo embora. Sinto que meu corpo está ficando mole, e cada vez mais fraco. Sei que não deixarei Matt ali sozinho. E desejo com todas as forças que me restam que tivesse alguém ali para nos salvar. Mas vejo que esse é o fim da linha.

Para nós dois. Juntos.

É romântico, até. Morrer juntos.

Sento-me no chão e coloco Matt deitado, com a cabeça no meu colo. Dou-lhe um último beijo e sorrio.

— Agora teremos um lugar para ficarmos juntos e seguros – Digo para ele. Olho para cima e meu rosto se molha mais ainda – E protegidos da chuva.

Solto uma risada, pouco antes de sentir a mordida, e uma dor aguda subir pelo meu braço.


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