V- Trégua

O tempo é algo engraçado, nós nunca conhecemos ele, quando pensamos que o estamos compreendendo, ele nos surpreende de novo.

Esses eram os pensamentos de Agatha Jeicks ao levantar numa linda manhã de segunda-feira, linda no sentido de que o céu estava ensolarado, pois climaticamente falando...bom estava realmente frio. Olhando a data que marcava no seu celular, Agatha percebeu que já estava no dia 12 de agosto, faziam mais de três meses desde que ela voltara a sua cidade natal. No serviço ela e Rafael conversavam apenas sobre o necessário, ou seja, o relacionamento que estavam mantendo era estritamente profissional.

Vestindo um sobretudo preto, uma calça social da mesma cor e um blusão verde escuro com um scarpin preto, Agatha saiu de casa pronta para enfrentar mais um dia de trabalho.

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Rafael acordou sentindo uma forte dor de cabeça, estava novamente de ressaca. Ele não sabia qual era o motivo, mas de um tempo para cá não conseguia dormir em paz sem estar com um alto nível de álcool no sangue. Na verdade ele sabia qual era o motivo, apenas não queria admitir para ninguém, nem para si mesmo.

Flexionando os braços fez um esforço enorme para manter os olhos abertos e verificar que horas eram. 07H50min. Perfeito, pensou ele, mais atrasado que o normal.

Levantou-se e nem tomou banho, não tinha tempo. Escovou os dentes e vestiu uma calça marrom social, uma camisa verde clara, calçou as meias e os sapatos marrons e pôs o sobretudo, também na cor marro, enquanto saia correndo do seu apartamento.

Para melhorar a sua dor de cabeça insuportável, o trânsito estava completamente congestionado e ele acabou chegando a empresa as 08h22min, tinha plena consciência de que se fosse um funcionário normal ele já teria sido demitido a muito tempo. Como sempre tentou passar despercebido pela sala do seu pai, mas não funcionou, ou melhor, até funcionou, mas quando entrou na sala de Agatha, que era uma espécie de ''hall'' para a sua própria, seu pai estava lá, sentado confortavelmente numa cadeira estofada e conversando alegremente com a secretária, como se fossem grandes amigos.

-Ah, Rafael, finalmente nos deu o prazer de sua companhia. - Falou irônico o senhor Suvens.

-Perdi o horário. - Foi a resposta que Rafael lhe deu.

-Ora, isso nós já percebemos. O que eu quero saber é...por que perdeu o horário? Por que tem perdido ele todos os dias? - Perguntou Ricardo Suvens, já ficando impaciente.

-Não quero falar dos meus problemas particulares na frente de uma traidora. - Respondeu Rafael, descontrolando-se e expondo sua raiva, enquanto fitava Agatha.

-O único traidor que eu vejo aqui é você Rafael, lhe dou tudo, tudo o que você quer, mas você nunca retribui não é mesmo? Portanto...se voltar a se atrasar será demitido. - Falou Ricardo, retirando-se da sala e deixando Rafael boquiaberto.

-O senhor terá uma reunião daqui a 40 minutos. - Falou Agatha depois de alguns segundos em silêncio. Ela ainda se sentia magoada pelo fato de Rafael te-la chamado de traidora, sendo que era para ser exatamente ao contrário.

-Uma reunião? - Perguntou ele, como se desconhecesse a palavra. - Eu pareço estar em condições de ir a uma reunião? - Reformulou a pergunta, um tanto ríspido.

-Na verdade não. - respondeu ela, divertindo-se e sendo sincera. - Parece que seus cabelos não foram penteados, seus olhos estão vermelhos, típicos de um alcoólatra, está com olheiras gigantescas e, provavelmente, está com um hálito horrível.

-Estou mesmo tão mal assim? - Perguntou ele, falando com ela normalmente, sem raiva ou rispidez.

-Está sim, mas acho que posso lhe ajudar a melhoras isso. - Falou ela e ele lhe deu um sorrisinho malicioso. - Mas se não desmanchar esse sorriso posso mudar de ideia. - Falou ela e ele ficou sério novamente.

-O que vai fazer para me ajudar? - Perguntou ele, com o senho franzido.

-Me espere na sua sala que eu já vou lá. - Ele apenas assentiu e foi para a sala. Queria dizer para ela que ela não mandava nele e que não iria fazer o que ela estava dizendo para ele fazer, mas Agatha era sua melhor chance de ir a reunião apresentável e se ele falhasse na reunião...com certeza acabaria sem emprego. Menos de 5 minutos depois, Agatha adentrou a sala de Rafael com uma necessiere em mãos. - Tome. - Falou ela lhe estendendo um pacote de balas de menta. - Coma o máximo delas que conseguir até a hora da reunião, vai melhorar seu hálito.

-Tudo bem. - Respondeu ele abrindo o pacote e começando a comer uma.

-Agora sente ali – Falou ela apontando para a cadeira que havia atrás da mesa dele. - e feche os olhos.

-O que vai fazer? - Perguntou ele, desconfiado, mas sentando-se mesmo assim.

-Vou passar um pouco de corretivo para disfarçar as olheiras. - Respondeu ela.

-Vai passar maquiagem em mim? - Perguntou ele, incrédulo.

-Vou, agora feche os olhos. - falou ela, olhando-o com cara de zangada e Rafael sabia que ela não estava fingindo. Achou melhor obedecer. De olhos fechados ele sentiu quando ela começou a passar o corretivo na região dos olhos, sentiu a respiração dela batendo contra sua bochecha direita e seu corpo estremecer. Resolveu começar um assuntou com ela antes que o perfume dela o enlouquecesse. Já não bastava delirar com ela a noite...pensou ele.

-Já pensou no que vai me dar de aniversário? - Perguntou ele. Era uma pergunta idiota, mas ele a fez por dois motivos: por não ter mais nada o que falar e porque queria lembrar ela que seu aniversário estava chegando.

-Não tenho costume de dar presentes para as pessoas com quem trabalho. - Respondeu ela.

-Mas por abrir um exceção para mim, não é? - Ela apenas riu e ele gostou, fazia tempos que não a ouvia rir...na verdade não ouvira ela rir desde que começaram a trabalhar juntos. - Caso não se lembre, meu aniversário é no dia vint...

-Vinte de agosto. É, eu lembro. - Rafael não pode deixar de sentir uma alegria estranha ao perceber que ela ainda se lembrava do seu aniversário. - Deu, já terminei. - falou ela e ele abriu os olhos. Ela estava sorrindo para ele e Rafael sorriu em resposta.

-E o seu é dia 10 de outubro. - Falou ele, sem entender porque fez tanta questão que ela soubesse que ele também se lembrava.

-É, vejo que a idade não lhe deixou esclerosado.- Falou ela e ambos riram. - Tome. - Disse Agatha, estendendo um pente para Rafael. - arrume seus cabelos, estão horrendos. - Continuou falando ela, sempre sorrindo. Rafael se viu admirando o sorriso dela, ele não lembrava de ela rir tão lindamente. Sorrindo para ele, Rafael pegou o pente e começou a arrumar os cabelos enquanto Agatha segurava um espelho pequeno para ele. Agatha não estava mais magoada com ele, na verdade estava feliz por ter uma conversa civilizada com Rafael.

-Está bom assim? - Perguntou ele, estendendo o pente para ela.

-Hum, só falta um detalhe... - Falou ela, pegando o pente e se aproximando ainda mais dele, seus joelhos se tocaram e ambos sentiram pequenos choques passares por seus corpo, mas continuaram agindo naturalmente. Agatha arrumou a frente do cabelo de Rafael e disse: - Pronto, agora está aceitável.

-Aceitável? - Perguntou ele. - Acho que mereço um adjetivo melhor.

-Não sonhe tanto querido. - Respondeu ela, mas acabou rindo. - A reunião será daqui a 15 minutos, não demore a ir para a sala de reuniões. - Disse ela e foi se encaminhando para a porta. - Se precisar de algo, estarei aqui na minha sala. - Ela abriu a porta e saiu, mas antes que a fechasse Rafael a chamou:

-Agatha?

-Sim? - Perguntou ela, erguendo as sobrancelhas levemente.

-Quer ir jantar comigo hoje a noite? - Perguntou ele, parecendo tão surpreso com sua pergunta quanto ela. - Gostei de conversar com você...poderíamos sair para comer algo e falar amenidades. - falou ele. Pela expressão facial dela, ele imaginou que Agatha fosse recusar, mas então ela falou:

-É claro, seria ótimo. - E sorrindo ela fechou a porta, mas em dúvida se tomara uma boa decisão.