Bella ( primeira  parte)

1.1

Passos lentos e surpreendentemente firmes  me conduziam em direção a velha picape vermelha.

 - Nenhum tropeço. – pensei surpresa.

Muito provavelmente porque naquele momento eu estivesse fora de meu corpo. Minha alma continuava deitada ao lado de Jacob, na cama velha, naquele pequeno quarto, sentindo seu perfume amadeirado, seu calor e principalmente vendo seu sorriso.

 - MEU SORRISO. -falei baixinho entrando no carro.

 Com o coração apertado pela dor, observei, talvez pela última vez, a velha casa vermelha e lágrimas angustiadas que conseguira segurar até aquele instante, finalmente caíram turvando a paisagem. Porém, não era necessário ver, as lembranças são muito claras em mim, cada parte daquele lugar, cada segundo ali vivido está gravado na minha memória sem chances de serem apagados.

 Suspirei, me movendo e, tentando evitar outras lembranças que me assaltavam sem dó. Nelas havia tardes numa garagem, refrigerante quente, risadas, passeios descontraídos, mãos enormes e quentes que seguravam gentil e firmemente nas minhas, principalmente, um garoto com sorriso de sol que se transformara em melhor amigo e o único capaz de fechar minhas feridas. Que mesmo sem que eu  percebesse,  iluminava meus dias e evoluía para se tornar um grande amor.

Por instantes  fechei os olhos e voltei a minutos atrás, durante nossa conversa em seu quarto, a despedida fora dolorida demais, emocionada demais, apaixonada demais. Trocamos as palavras mais doces e mais sofridas desde que nos conhecemos. Ao fechar aquela  porta quando saía, dei uma última olhada no garoto que se tornara meu sol, meu amigo, meu amor, meu desejo de vida real, deixei com ele metade de mim e minha alma, jamais estarei completa outra vez. Esse seria o preço a pagar pelo meu egoísmo.

- Como pude ser tão tola e egoísta? -  me perguntei socando o banco da picape e lembrando que durante todo o tempo soubera como Jake se sentia, era transparente como água, mas procurei ocultar sob o nome de amigo um outro mais profundo que não queria admitir, afinal, precisava dele. Brinquei inconsequentemente com os sentimentos dele e com os meus, fui longe demais sabendo que aquela brincadeira era perigosa, mas precisava dele, da sua presença segura e do seu sorriso. Agora, estou aqui, arrancando um pedaço de mim ao deixá-lo, abrindo um buraco sem fundo por vontade própria.

- Vou ser bonzinho... - as palavras dele ainda faziam eco em meus ouvidos, - Não vou mais dividir você ao meio. - ele completara demonstrando a grandeza e a nobreza de seu coração, tornando tudo ainda mais difícil.

- Amo você! - falei tentando fazê-lo entender o quanto queria que tudo fosse diferente.

- Eu te amo mais. -  foi o que ouvi em resposta, quase num sussurro enquanto ele  me olhava como se pudesse decifrar o que acontecia em minha alma.

Nosso trato agora era: seremos amigos.

- Só amigos? Como? - fechei os olhos e  encostei a cabeça na direção, mal conseguia respirar por causa dos soluços, era uma dor sem remédio e pior, sem volta, quando Edward me abandonou achei que morreria, mas havia Jake para me trazer de volta a vida. Agora, a única coisa que poderia por um ponto final nessa dor interminável era o próprio Edward dar fim a vida que Jacob me devolvera, porém, enquanto isso não acontecia continuaria a sofrer por mim e por ele, pois a dor dele eu sabia bem, é também a minha.

Pensar no sofrimento do meu sol particular era demais, principalmente por saber que a culpa era minha, e não havia nada a fazer, eu não voltaria atrás em minha decisão. Lembrei do seu rosto antes de sair, apesar de parecer tranqüilo enquanto conversamos, pude ver em seus olhos escuros e fundos a dor que cada palavra que trocamos lhe causava, e tomei uma decisão:

 – Preciso por um ponto final nisso, fui a causadora dessa dor, não posso alimentá-la com minha presença, tenho que fazer tudo o que puder para me manter longe, o mais longe possível, talvez assim ele sofra menos.

Girei a chave e ouvi o motor acordar, dei uma ultima olhada em tudo e acelerei tentando deixar para trás Jacob Black e tudo o que ele significava para mim.

O choro não cessou porque me afastei daquele lugar, como eu desejava que acontecesse, pelo contrário, parecia que jamais cessaria, minha blusa estava molhada pelas lágrimas e mal conseguia ver o trajeto a frente por causa da visão turva, foi uma surpresa não ter me acidentado pelo caminho.

Quando finalmente cheguei, ilesa, em casa, fiquei aliviada por felizmente Charlie ainda não ter voltado, dar explicações pelo choro e pelo rosto inchado e vermelho era a última coisa que queria nesse momento. Pude ir diretamente para meu quarto, precisava com urgência de um banho, talvez ele ajudasse a aliviar um pouco aquela sensação, aquela dor que me sufocava. Desanimada joguei as roupas pelo chão e entrei debaixo da água morna que se misturou as lágrimas. Me permiti ficar ali por um bom tempo,entretanto,  não me sentia melhor ao sair, era como se estivesse oca, completamente vazia, o que fazia sentido, afinal, Jacob ficara com minha alma.

Soltei um suspiro longo, dolorido e só então percebi a presença de Edward parado ao lado da cama, seus olhos estavam nas roupas que eu jogara e que agora estavam dobradas e empilhadas sobre a colcha. Ele me olhou sério,  mas logo seu sorriso torto e muito carinhoso apareceu.

- Oi. - falou baixinho – Tudo bem?

- Sim. - menti me aproximando e abraçando seu corpo duro e gelado que até pouco tempo atrás era meu único porto seguro. - Preciso de você. -  quis falar mas não pude.

- Verdade? - sua voz parecia levemente trêmula e depois de uma pequena pausa  afirmou: – Sua roupa está molhada.

- E com o cheiro dele. - pensei suspirando, sentindo que voltaria a chorar, e fui sincera:

- Lágrimas. - como se ele já não soubesse. -  Jake e eu conversamos, ou melhor, nos despedimos.

- Você tem certeza? – perguntou, e segurando meu rosto entre as mãos geladas e carinhosas,  me obrigou a encará-lo - Vocês se amam. - completou baixinho e notei a tristeza em sua voz.

- Nunca foi um amor como o nosso! - tentei argumentar desejando que ele acreditasse, já que eu sabia que não era verdade. - Jake e eu nos amamos como amigos. Amo você e, ele sabe, sempre soube e, agora percebeu que o que sinto é muito maior do que minha vida.

Edward sorriu, aquele sorriso torto que me desmancha, parecendo mais tranqüilo, um sorriso mais aliviado.

- Você é minha vida. - falou me aconchegando em seus braços.

- E você a minha. - encerrei e logo depois ouvi o som da voz de Charlie a me chamar.

Edward me beijou delicadamente e se foi, prometendo voltar mais tarde como sempre. Fiquei a observar a janela aberta, as árvores ao longe, o ar frio que penetrava em meu quarto provocou um arrepio e percebi que ainda estava usando somente uma toalha em volta do corpo.

- Bella! - Charlie chamou. – Posso entrar?

- Saí do banho agora, já desço para... - mas ele não me deixou terminar, após um suspiro de alívio falou:

- Nosso telefone está com problemas, não conseguia ligar para casa, fiquei preocupado.

- Ligar para que?

- Aconteceu uma coisa... - me enganei ou Charlie parece encabulado, fiquei mais atenta ao que ele falava:  - Tenho um compromisso e talvez volte tarde...

- Compromisso? - repeti e ele pareceu mais encabulado ao falar

- Sim e, não sei bem... quero dizer... acho q vou chegar tarde, não me espere.

Sorri ao notar que Charlie parecia ter arrumado uma amiga, ele tem saído com freqüência, não é com seus habituais amigos, e pelas conversas ao telefone é uma mulher, ao menos alguém está feliz nesta casa.

 Respondi tentando ser o mais natural possível:

- Tudo bem.

- Mesmo? Edward não virá hoje? – sua preocupação era sempre essa.

- Tudo bem sim e, não, ele não virá. – menti. - Estamos ocupados com as últimas provas. – o que na realidade não era uma mentira, ele pareceu mais tranqüilo, despediu-se e logo ouvi seus passos descendo os degraus e a porta da rua sendo fechada.

Meu pai com namorada! As coisas estão realmente mudadas, pensei, mas o melhor de tudo seria ter um pouco de solidão antes da chegada de Edward para colocar minhas idéias e sentimentos em ordem.

Sentei na cama ao lado das roupas dobradas, num impulso as peguei e inalei profundamente o aroma que exalava delas, aquele cheiro amadeirado só pertencia a uma pessoa:

- Jacob! – falei, sentindo meu coração disparar.