As Crônicas De Um Ninja-Mago De Fibra escrita por The Amazing Spider Green


Capítulo 2
Existe polícia egípcia?


Notas iniciais do capítulo

Bem, pelo menos eu recebi um Review. Melhor do que nada. O próximo Capítulo tá aqui.



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Meses se passaram desde que Naruto chegou naquela dimensão. Após Dr. Kane explicar a Carter tudo sobre Naruto e sua linhagem Shinobi, Carter não acreditou. Então o loiro fez o Kage Bunshin no Jutsu e ele finalmente acreditou. Ele e Carter se tornaram muito bons amigos depois disso. Naruto o considerava um irmão.

Naruto também descobriu que Dr. Kane não só era melhor amigo de seu pai como era também seu padrinho de casamento. Dizer que ele ficou supreso era um eufemismo. Ele ficou com a boca escancarada, ficou gaguejando, e desmaiou.

Os três viajaram pelo mundo. Dr. Kane é arqueólogo, por isso seu trabalho o leva a muitos lugares. Eles vão principalmente ao Egito, que é sua especialidade. Naruto descobriu que Dr. Kane é muito famoso como escritor de livros, também. Qualquer coisa que ele perguntasse, fosse como os egípcios tiravam o cérebro das múmias, ou como construíram as pirâmides ou amaldiçoaram a tumba do Rei Tut, Dr. Kane teria sempre a resposta. Mas os garotos nem faziam ideia de que há outros motivos de Dr. Kane mudar tanto de lugar.

Naruto e Carter não frequentaram a escola. Dr. Kane lhes dava aulas em casa (o que Naruto achou confuso, considerando que eles não tinham uma casa). Ele os ensinou o que considerava importante, por isso eles aprenderam muito sobre o Egito, sobre estatísticas de basquete e sobre seus músicos favoritos. Naruto ficou um pouco atrás de Carter, considerando que ele estudou aquilo desde os oito anos, mas ele conseguiu alcançá-lo, e agora sabia tanto sobre essas matérias quanto Carter.

Carter convenceu Naruto a ler muito — qualquer coisa, dos livros de história do Dr. Kane a romances de fantasia —, pois eles passam bastante tempo sentados em hotéis, aeroportos e sítios de escavação em países onde eles não conheciam ninguém. Dr. Kane sempre lhes dizia para deixar o livro de lado e ir jogar bola. Naruto e Carter não sabiam como, pois eles ficavam no Assuã, Egito.

Dr. Kane nem precisou ensinar Naruto a embalar as coisas necessárias para uma viagem, pois ele já sabia, pois ele já fez diversas missões em que ele teve que colocar apenas as coisas essenciais em uma mochila. Mas Naruto tinha o direito a uma bolsa extra, que era sua mochila azul.

Dr. Kane também fazia isso, mas ele também tinha direito a uma bolsa especial, que também era uma bolsa carteiro, para suas ferramentas arqueológicas. Regra número 1: Os meninos não estavam autorizados a espiar sua bolsa de trabalho. Naruto já tentou algumas vezes, mas nenhuma deu certo. Carter, por outro lado, nunca tentou... Até o dia da explosão.

Aconteceu na véspera de Natal. Os três estavam em Londres, para o dia de visita a Sadie, irmã de Carter.

Carter explicou a Naruto que Dr. Kane só podia passar dois dias por ano com ela — um no inverno, um no verão —, porque os avós de Carter, os Faust, o odeiam. Depois que Ruby, mãe de Carter e Sadie, morreu, os pais dela (os Faust) moveram uma grande batalha judicial contra Dr. Kane. Após seis advogados, duas brigas de socos e um ataque quase fatal com uma espátula (Naruto quis perguntar, mas Carter simplesmente disse: "Nem me pergunte!"), os Faust conquistaram o direito de manter Sadie com eles na Inglaterra. Ela só tinha seis anos, dois anos a menos que Carter, e eles não podiam ficar com os dois — ou essa foi a desculpa que deram para não ficar com Carter também. Assim, Sadie cresceu nos colégios britânicos, e Carter viajou pelo mundo com Dr. Kane. Eles só a viam duas vezes por ano, situação que, como dito por Carter, estava boa.

Naruto, Carter e Dr. Kane tinham acabado de aterrissar em Heathrow depois de alguns atrasos. Era uma tarde fria e úmida. Carter estava usando suas roupas comuns: camiseta de botões, calça-cáqui e mocassins, enquanto Naruto vestia um agasalho fino preto e por baixo uma camiseta laranja com um capuz que saía por cima do agasalho e jeans pretos com as áreas dos joelhos rasgadas. No táxi, durante todo o trajeto até a cidade, Dr. Kane parecia um pouco nervoso.

Dr. Kane era um homem bem grande. Para os meninos, era difícil imaginar algo que pudesse deixá-lo tenso. Ele tem a pele marrom-escura como a de Carter e olhos castanhos penetrantes, é careca e usa um cavanhaque, o que o deixa com jeito de "cientista do mal". Naquela tarde, ele estava de casaco e com seu melhor terno, marrom, que costumava usar para as palestras. Normalmente, ele transmite tamanha confiança que domina qualquer ambiente onde entra, mas, às vezes — como naquela tarde —, os meninos viam o outro lado dele que não conseguiam entender. Dr. Kane olhava insistentemente para trás, como se os três estivessem sendo seguidos.

— Pai? — disse Carter quando os três saíam da A-40. — Algum problema?

— É — concordou Naruto balançando a cabeça. — O senhor parece preocupado.

— Nem sinal deles — resmungou Dr. Kane. Ele deve ter percebido que tinha falado alto, porque depois olhou os garotos meio assustado. — Não é nada, meninos. Está tudo bem.

Aquilo os incomodou, porque Dr. Kane mentia muito mal. Eles sempre sabiam quando ele estava escondendo algo, mas também sabiam que poderiam insistir à vontade e nunca conseguiriam arrancar dele a verdade. Provavelmente, estava tentando protegê-los, embora eles não soubessem de quê. Certa vez, Carter disse a Naruto que se perguntava se Dr. Kane teria algum segredo sombrio em seu passado. Mas logo que disse aquilo, Carter disse que a ideia parecia ridícula. Afinal, como dito por ele, "Seu pai era só um arqueólogo." Naruto, por outro lado, tinha uma ideia diferente. Dr. Kane era um arqueólogo, mas nunca se deve julgar um livro pela capa.

Outra coisa que os incomodava: Dr. Kane estava agarrado à bolsa com o material de trabalho. Com frequência, quando ele faz isso, significa que os três estavam em perigo. Como quando atiradores invadiram o hotel no Cairo, o mesmo hotel em que Naruto conheceu Carter e Dr. Kane. Naruto e Carter ouviram disparos no saguão e desceram correndo para ver se havia acontecido algo com Dr. Kane. Quando eles chegaram lá, ele estava totalmente tranquilo, fechando o zíper da bolsa, enquanto três atiradores inconscientes balançavam no ar, pendurados pelos pés no lustre, as cabeças cobertas pelas túnicas e, à mostra, as cuecas samba-canção. Dr. Kane disse não ter visto nada, e, no fim, a polícia atribuiu a concorrência a um curto-circuito no lustre.

Em outra ocasião, um mês depois, eles foram pegos no meio de um tumulto em Paris. Dr. Kane escolheu um carro estacionado perto deles, os empurrou para dentro, para o banco traseiro, e lhes disse para que ficassem abaixados. Carter se jogou no piso do automóvel e manteve os olhos bem fechados. Naruto, por outro lado, se manteve de pé, desconfiado, mas depois de muita insistência e uma promessa por um ramén, Naruto fez o mesmo. Eles podiam ouvir Dr. Kane no assento do motorista, vasculhando sua bolsa de trabalho, resmungando algo para si mesmo enquanto a multidão gritava e destruía coisas do lado de fora. Alguns minutos mais tarde, ele lhes disse que podiam sair, que era seguro. Todos os outros carros no quarteirão haviam sido virados e incendiados. Já o carro deles estava lavado e polido, com várias notas de vinte presas sob os limpadores de para-brisa.

Ao ver aquilo, Naruto deu um assobio e comentou:

— Nossa, se isso acontece o tempo todo nesse mundo, eu já vou dizer que o amo.

De qualquer maneira, os meninos passaram a respeitar aquela bolsa. Era o amuleto da sorte deles. E quando Dr. Kane a mantinha por perto, significava que eles iriam mesmo precisar de sorte.

Eles atravessaram o centro da cidade rumo a leste, na direção da casa dos Fausts. Eles passaram pelos portões dourados do Palácio de Buckingham e pela grande coluna de pedra na Trafalgar Square. Londres é um lugar muito legal, na opinião de Naruto, mas, depois de ter viajado tanto nas Nações Elementais e com Carter e Dr. Kane pelo mundo, todas as cidades começam a ser entediantes. Quando Naruto e Carter conheciam outras crianças, elas costumam dizer: "Puxa, vocês têm sorte por viajar tanto." Mas o caso é que eles não passavam o tempo conhecendo os lugares. Cara, eles nem tinham muito dinheiro para viajar com estilo. Eles já tinham estado em locais bem ruins, e raramente eles ficavam por mais de alguns dias. Na maior parte do tempo, eles pareciam mais fugitivos do que turistas.

Naruto ama o Dr. Kane, mas havia vezes em que ele agia... Estranhamente. Ele sempre é muito cauteloso, verifica cada quarto de hotel antes de eles entrarem. Ele entra depressa em um museu, examina seus artefatos, faz as anotações e sai ainda mais rapidamente, como se tivesse medo de ser detectado pelas câmeras de segurança.

Naruto ainda se lembrava de uma história que Carter lhe contou.

— Uma vez, quando eu era mais novo, atravessamos correndo o aeroporto Charles de Gaulle para pegar um voo de última hora, e papai não relaxou até que o avião decolasse. Perguntei, objetivamente, do que ele estava fugindo, e ele me olhou como eu tivesse acabado de remover o pino de uma granada. Por um segundo, tive medo de que me dissesse a verdade. No entanto, ele respondeu: "Carter, não é nada." Como se "nada" fosse a coisa mais terrível do mundo. Depois disso, decidi que talvez fosse melhor não fazer perguntas.

A partir daquele momento, a desconfiança de Naruto sobre Dr. Kane aumentou.

Os Faust moram em um condomínio perto de Canary Whaf — Naruto estava começando realmente a odiar esses nomes complicados —, bem às margens do rio Tâmisa. O táxi parou junto ao meio-fio e Dr. Kane pediu que o motorista esperasse.

Os três estavam na metade da calçada quando Dr. Kane parou. Ele se virou e olhou para trás.

— O que é? — perguntou Carter.

Então, os meninos viram o homem com o casaco comprido. Ele estava do outro lado da rua, apoiado em uma grande árvore morta. Era gordo, com pele da cor de café torrado. O casaco e o terno de risca de giz pareciam caros. Os cabelos longos estavam presos em uma trança e ele usava um chapéu Fedora, que de tão baixo no rosto encostava nos óculos escuros redondos. Ele se parecia um daqueles músicos de jazz a que Dr. Kane sempre levava os meninos para assistir — Naruto reclamava dizendo que a música era horrível. Naruto viu que seus olhos, apesar de estarem cobertos pelos óculos escuros, estavam focados neles. Talvez fosse um velho amigo ou colega do Dr. Kane. Qualquer que fosse o destino, Dr. Kane sempre encontrava conhecidos. Mas Naruto achou estranho que o homem estava esperando ali, do lado de fora da casa dos Faust. E ele não parecia muito satisfeito. Naruto estreitou os olhos. Aquilo estava ficando esquisito.

— Carter, Naruto — disse Dr. Kane —, entrem na frente.

— Mas... — Naruto e Carter tentaram dizer.

— Vão buscar Sadie. Eu encontro vocês no táxi.

Ele atravessou a rua para ir ao encontro do homem de casaco comprido, o que deixava os garotos com duas possibilidades: segui-lo e descobrir o que estava acontecendo ou fazer o que ele tinha mandado.

— O que você vai fazer? — perguntou Naruto a Carter.

— Eu não sei você, mas eu vou pelo caminho menos perigoso: buscar minha irmã. — Foi a resposta de Carter antes de ele ir até a casa dos Faust.

Naruto riu um pouco e o seguiu.

______

Antes que Carter pudesse sequer bater, Sadie abriu a porta.

— Atrasado, como sempre.

Ao vê-la, o queixo de Naruto caiu. Claro, Carter já havia lhe contado sobre ela, mas ele não sabia que ela era tão linda. Se Carter não tivesse lhe falado que ela é irmã dele, ele nem teria pensado nela assim. Para começar, quando ela falou, seu sotaque era um pouco diferente, o que Naruto concluiu ser sotaque britânico. Ela se parecia com Ruby, como Naruto havia visto nas fotos de Dr. Kane. Ou seja, ela tinha uma pele branca muito bonita. Seus cabelos são lisos, cor de caramelo — um tom mais escuro que seus tons louros —, e ela tinha mechas vermelhas do lado esquerdo do cabelo. Carter lhe disse que ela costuma fazer mechas com cores vibrantes, portanto Naruto não achou isso esquisito. Na verdade, ele achou até adorável. Seus olhos são azuis. Azuis de verdade! Um tom de azul quase tão forte quanto o de Naruto. Olhos brilhantes. Ela estava mascando chiclete — Carter lhe disse que ela sempre faz isso —, e estava usando jeans surrados, jaqueta de couro e coturnos. Naruto a achou mais linda — adorável, mas perigosa. Os fones de ouvido iam pendurados no pescoço, que Carter lhe disse que serviriam caso ele e Dr. Kane a entediassem muito.

Ela segurava uma gata, que Naruto supôs ser Muffin, a gata de Sadie que tinha sido um presente de "despedida" de Dr. Kane seis anos antes. A gata não parecia envelhecer pois, apesar de se passar seis anos, ela continuava jovem. Seu pelo era amarelo e preto, como um leopardo em miniatura, os olhos amarelos eram atentos e as orelhas pontuas pareciam grandes demais para sua cabeça. Um pingente egípcio prateado enfeitava sua coleira. A gata não parecia muito com um muffin, mas Carter disse que Sadie era pequena quando escolheu o nome, então ele deveria relevar.

— Nosso voo atrasou — explicou Carter a ela.

Sadie estourou uma bola de chiclete, e ela finalmente pareceu notar Naruto, e lhe lançou um sorriso malicioso que fez Naruto sentir as orelhas esquentarem.

— Quem é esse? — ela perguntou a Carter.

— Esse é Naruto Uzumaki. Filho de um amigo de papai. Está viajando com a gente — Carter respondeu simplesmente, dando de ombros.

Ela pareceu confusa, e então irritada. Naruto não podia culpá-la. Ele sabia que ela deveria se sentir deixada de fora por Dr. Kane tê-la abandonado. E ela descobrir que outro garoto, que não era nem mesmo filho dele, estava viajando com eles também, só deve tê-la feito mais chateada.

Ela afagou a cabeça de Muffin e jogou a gata para dentro de casa.

— Vó, estou saindo!

De algum lugar da casa, vovó Faust disse uma frase que Naruto, com sua audição aguçada, adivinhou ser "Não os deixe entrar!"

Sadie fechou a porta e olhou Naruto e Carter como se eles fossem dois ratos mortos que sua gata levara para ela.

— Então, aqui estão vocês outra vez, com um garoto novo.

— É.

— Vamos, então — suspirou Sadie. — Vamos logo com isso.

Naruto já não gostou muito dela. Ela era muito linda e fofa por fora, mas parecia que, novamente, seu velho ditado estava se mostrando correto: "Não se deve julgar um livro pela capa." Quer dizer, claro que Carter e ela não eram muito próximos por viverem separados, mas ela pelos menos deveria cumprimentá-los. Mas Carter disse que não se incomodava com isso. De acordo com ele, quando você só vê a outra pessoa duas vezes ao ano, ela acaba parecendo mais um primo distante que uma irmã. Ele também disse que eles não tinham absolutamente nada em comum, exceto pai e mãe.

Eles desceram a escada. Naruto cheirou o ar e, com seu olfato aguçado, ele sentiu o cheiro do perfume de Sadie que parecia ser uma combinação de casa de pessoas velhas e chiclete, quando ela parou tão de repente que Carter se chocou contra ela.

— Quem é aquele? — perguntou ela.

Os meninos quase tinham esquecido o sujeito de casaco comprido. Dr. Kane e ele permaneciam em pé do outro lado da rua, ao lado da árvore grande, e pareciam estar no meio de uma discussão muito séria. Dr. Kane estava de costas para as crianças, não dava para enxergar seu rosto, mas ele gesticulava bastante, como faz quando está agitado. O outro homem fez cara feia e balançou a cabeça negativamente.

— Não sei — respondeu Carter. — Ele estava ali quando descemos do táxi.

— Parece que o conheço. — Sadie franziu a testa, como se tentasse se lembrar. — Vamos.

— Papai disse que esperássemos no táxi — avisou Carter, mas foi inútil: Sadie já estava andando.

Em vez de atravessar logo a rua, ela disparou pela calçada por meio quarteirão, abaixando-se atrás dos automóveis, depois atravessou para o outro lado e ficou encolhida atrás de um muro baixo de pedras. Então começou a se aproximar sorrateiramente. Carter não teve alternativa se não fazer o mesmo, embora se sentisse meio estúpido agindo daquela maneira.

— Seis anos na Inglaterra e ela pensa que é James Bond — resmungou Carter.

— Hum, eu não gosto muito de James Bond. Acho que eu prefiro o Neo de Matrix — disse Naruto, de repente aparecendo atrás dos irmãos Kane.

Carter e Sadie pularam de susto, mas felizmente nem Dr. Kane nem o homem de casaco comprido os ouviram.

— Como você fez isso? — perguntou Sadie, recuperando o fôlego.

— Segredos profissionais. — Foi a resposta de Naruto acompanhada por um sorrisinho maroto.

Carter sabia que era o Hiraishin no Jutsu, uma técnica que Naruto aprendeu enquanto lia os pergaminhos sobre sua linhagem e os jutsus de seus pais. O Hiraishin no Jutsu é um jutsu criado pelo pai de Naruto, que precisava de uma kunai com um selo nela para ser feito, mas Naruto o aperfeiçoou, e agora ele podia se mover sem precisar de kunais. Dr. Kane havia lhe dito que seu pai estaria orgulhoso dele, por aperfeiçoar um jutsu tão complicado em uma idade tão jovem.

Mais alguns passos e o trio estava atrás da grande árvore morta. Naruto, com sua audição aguçada, conseguiu ouvir melhor que os outros dois.

— ... é necessário, Amós. Você sabe que essa é a atitude correta.

— Não — respondeu o outro homem, que devia ser Amós. A voz era grave e firme, bastante obstinada. O sotaque era americano. — Se eu não o impedir, Julius, eles o impedirão. O Per Ankh está atrás de você.

Sadie se virou para os dois garotos e moveu os lábios formando as palavras: "Per o quê?"

Eles balançaram as cabeças, tão confusos quanto ela.

— Vamos sair daqui — cochichou Carter, pois eles poderiam ser notados a qualquer momento, e eles estariam muito encrencados.

Sadie o ignorou, é claro.

— Ela não é muito de seguir regras, é? — perguntou Naruto já sabendo a resposta. Ele gostava de rebeldia, isso é fato, mas ele havia amadurecido nos meses em que ficou com Carter e Dr. Kane. Se tornou mais responsável.

— O que você acha? — perguntou Carter revirando os olhos.

— Eles não sabem dos meus planos — disse Dr. Kane. — E quando descobrirem alguma coisa...

— E as crianças? — perguntou Amós.

Os três sentiram os pelos da nuca se arrepiarem.

— E quanto a elas? — insistiu ele.

— Já tomei providências para protegê-las — respondeu Dr. Kane. — E elas têm Naruto para protegê-las. Ele tem tanto potencial quanto o pai.

Sadie olhou confusa para Naruto, que desviou o olhar. Ele não queria contar a ela sobre ele ser um ninja. E ele não gostava de falar sobre seu pai.

— Além disso — continuou Dr. Kane —, se eu não fizer nada todos estaremos em perigo. Agora deixe-nos.

— Não posso, Julius.

— É o que você quer, me enfrentar? — O tom de voz de Dr. Kane tornou-se definitivamente sério. — Não poderia me vencer, Amós.

Naruto viu que os dois estavam prester a se confrontar, então ele se preparou para pular e parar a luta se necessário.

Mas antes que o loiro sequer pudesse se mover, Sadie se levantou e gritou:

— Papai!

Dr. Kane pareceu surpreso ao ser abraçado, mas não tanto quanto o outro homem, Amós. Ele recuou tão depressa que tropeçou no próprio casaco.

Amós tinha tirado os óculos.

— Eu... Eu preciso ir — anunciou Amós.

Ele ajeitou o chapéu na cabeça e se afastou apressadamente pela rua.

Dr. Kane observou enquanto o homem ia embora, com um braço sobre os ombros de Sadie e uma das mãos no interior de sua bolsa de trabalho, pendurada no ombro. Finalmente, quando Amós dobrou a esquina e desapareceu, Dr. Kane relaxou. Ele tirou a mão de dentro da bolsa e sorriu para Sadie.

— Oi, meu bem.

Sadie se afastou e cruzou os braços.

— Ah, agora é meu bem, não é? Você está atrasado. O DIa da Visita so Papai está quase acabando! E o que foi isso? Quem é Amós, e o que é Per Ankh?

Naruto estapeou sua testa. Que garota mais burra. Assim ele suspeitaria — ainda mais — deles.

Dr. Kane ficou tenso. Naruto sentiu seus batimentos cardíacos aumentando. Dr. Kane olhou para Naruto e Carter como se tentasse perceber quanto da conversa eles haviam escutado.

— Não é nada — respondeu ele, tentando soar animado. — Planejei uma tarde maravilhosa. O que acham de uma visita especial ao British Museum?

Eles, ao pegarem o táxi, viram que apenas três pessoas podiam se sentar. Naruto, dando de ombros, disse:

— Bom, Sadie vai ter que ficar no colo de alguém.

Sadie quase deixou o chiclete cair da boca.

— O quê? Por que eu?

— Porque você é a mais nova, e sem falar que eu não quero ficar no colo de um homem. — Naruto deu de ombros novamente. — Dr. Kane, como eu sou a causa de vocês estarem nesse problema, Sadie pode se sentar no meu colo. Eu não me importo.

Naruto nem notou um sorriso mínimo se formar no rosto de Sadie.

— Eu adoraria, Naruto. Obrigado — disse Dr. Kane feliz. Ele confiava em Naruto, e sabia que ele não é um desses caras que tentam se aproveitar de garotas, e que ele estava se oferecendo apenas para ser gentil. — Vamos.

E eles entraram no táxi.

Sadie afundou-se no colo de Naruto, que estava no banco traseiro do táxi, entre Carter e Dr. Kane.

— Não acredito nisso — resmungou ela. — Só temos algumas horas juntos e você quer fazer pesquisa.

Naruto balançou a cabeça, irritado. Sadie nem fazia ideia de como o Egito Antigo podia ser interessante.

Dr. Kane tentou sorrir.

— Meu bem, vai ser divertido. O curador da coleção egípcia nos convidou pessoalmente...

— Certo, grande surpresa. — Sadie soprou a franja de mechas vermelhas para longe dos olhos, e consequentemente, Naruto recebeu uma jorrada de cabelos no rosto, inclusive na boca. — Véspera de Natal, e vamos ver relíquias egípcias emboloradas. Você nunca pensa em outra coisa?

Dr. Kane não ficou zangado. Carter contou ao loiro que ele nunca se zanga de Sadie. Simplesmente olhou pela janela, para o céu escuro e para a chuva.

— Sim — respondeu ele em voz baixa. — Eu penso.

Naruto sabia que Dr. Kane pensava em Ruby naquele momento. Carter havia lhe falado que sempre que ele ficava quieto, olhando para o nada, é nisso em que ele pensava. Nos últimos meses isso tinha acontecido bastante. Eles entravam no quarto de hotel e o encontravam com o celular na mão, a foto de Ruby sorridente olhando-o da tela — os cabelos dela presos sob um lenço, os olhos azuis brilhando muito na paisagem do deserto. E novamente, Naruto não pôde deixar de pensar em como Sadie se parecia com Ruby.

Ou eles estavam em algum sítio de escavação e eles percebiam Dr. Kane olhando para o horizonte. Eles sabiam que ele estava lembrando como a conhecera: dois jovens cientistas no Vale dos Reis, em uma escavação cujo propósito era encontrar a tumba perdida. Dr. Kane era egiptólogo. Ruby era antropóloga e procurava DNA antigo. Naruto tinha ficado lá por apenas alguns meses, mas ele tinha ouvido aquela história tantas vezes, que ele até memorizou. E ele nem era bom em memorizar.

O táxi seguia pela margem do Tâmisa. Quando eles passaram pela ponte Waterloo — aqueles nomes idiotas estavam começando a irritar Naruto profundamente —, Dr. Kane ficou repentinamente tenso.

— Motorista — chamou ele —, pare aqui um instante.

O motorista parou na margem Victoria.

— O que é, pai? — perguntou Carter preocupado.

— O senhor está bem? — perguntou Naruto igualmente preocupado.

Ele saiu do carro como se não tivesse ouvido os meninos. Quando Sadie saiu do colo de Naruto e saiu do táxi, Naruto fez o mesmo, junto de Carter. Logo, os quatro estavam olhando para o monumento Agulha de Cleópatra.

A Agulha é um obelisco, não uma agulha, para falar a verdade, e nada tem a ver com Cleópatra, como Dr. Kane ensinou. Naruto deduziu que os britânicos simplesmente não tinham imaginação e deram qualquer nome para o monumento quando o levaram para Londres — os nomes de seus lugares e Sadie eram as provas disso. O obelisco tem cerca de vinte metros de altura, o que teria sido realmente impressionante no Egito Antigo, mas, no Tâmisa, com todos aqueles edifícios enormes em volta, parecia pequeno e triste. Era capaz de um carro passar por ele sem sequer perceber que aquilo era alguma coisa milhares de anos mais velha que a cidade de Londres.

— Meu Deus. — Sadie andava em círculos, frustrada. — Precisamos parar em todos os monumentos?

Naruto engoliu um rosnado no fundo da garganta, enquanto os olhos brilharam por um segundo um vermelho-carmesim. Como Sadie podia dizer aquilo? Se ela não estava feliz com eles ali, poderia muito bem voltar para casa. Na verdade, por que ainda existia esse Dia de Visita do Papai quando ela nem queria passar um tempo com o pai? Ele fazia todo aquele esforço para fazer o melhor dia de visita, e ela simplesmente o deixa para baixo. Ela nem sabia da sorte que tinha sobre ter um pai como ele. Ele queria um pai como Dr. Kane.

Mas Dr. Kane não fez nada. Simplesmente olhava para o topo do obelisco. Naruto invejava a capacidade de Dr. Kane de ter uma paciência do tamanho do mundo. Se ele conseguia aguentar Sadie, ele aguentaria qualquer um.

— Eu precisava vê-lo novamente — murmurou Dr. Kane. — Onde aconteceu...

Um vento gelado soprou do rio. Naruto olhou para Dr. Kane e ficou preocupado. Ele nunca o havia visto tão distraído.

— O que, pai? O que aconteceu aqui? — quis saber Carter.

— Senhor, por favor, fale — pediu Naruto.

— Foi o último lugar onde a vi.

Sadie parou de andar. Ela olhou para Naruto e Carter carrancuda, e Naruto devolveu a carranca com um brilho vermelho adicionado, fazendo Sadie olhar para Dr. Kane.

— Espere aí. Está falando da mamãe?

Dr. Kane ajeitou os cabelos de Sadie atrás de uma orelha, e ela ficou tão surpresa que nem o empurrou.

Então Naruto se lembrou das palavras de Carter, quando o loiro perguntou sobre a morte de Ruby.

— A morte da mamãe sempre foi tema proibido, Naruto. Tudo o que sei é que ela morreu em um acidente em Londres. Sei também que meus avós culpam papai. Mas ninguém jamais me contou detalhes. Eu desisti de perguntar ao papai, em parte porque esse assunto o deixa muito triste, em parte porque ele se recusa a me dizer qualquer coisa. "Quando você for mais velho", é sua resposta habitual, e a mais frustrante que eu posso ouvir.

Agora, Carter estava ali, de olhos arregalados, e perguntou:

— Está dizendo que ela morreu aqui, na Agulha de Cleópatra? O que aconteceu?

Dr. Kane abaixou a cabeça.

— Papai! — protestou Sadie. — Eu passo por aqui todo dia, e você está dizendo... esse tempo todo... e eu nem sabia?

— Você ainda tem sua gata? — perguntou Dr. Kane, o que para Naruto foi uma pergunta estúpida.

— É claro que ainda tenho minha gata! — respondeu ela. — O que isso tem a ver com o assunto?

— E seu amuleto?

Sadie levou a mão ao pescoço. Naruto ouviu do Dr. Kane que, quando seus filhos eram pequenos, pouco antes de Sadie ir morar com os Faust, ele tinha dado um amuleto egípcio para os irmãos. O de Carter era um Olho de Hórus, um símbolo de proteção popular no Egito Antigo.

Dr. Kane lhe contou que o símbolo moderno do farmacêutico, R — com um traço na perna esquerda dele —, é uma versão simplificada do Olho de Hórus, porque a medicina tem a função de proteger o homem.

Carter sempre leva seu amuleto pendurado no pescoço, sob a camisa, mas já sabendo como Sadie é, Naruto imaginou que ela havia perdido o dela, ou jogado fora. Carter pensava a mesma coisa.

Para a surpresa deles, ela balançou a cabeça em sentido afirmativo.

— É claro que sim, pai, mas não mude de assunto. A vovó está sempre falando sobre como você causou a morte da mamãe. Isso não é verdade, é?

Carter e Sadie esperaram. Pela primeira vez, os irmãos Kane queriam exatamente a mesma coisa. A verdade.

Naruto, por outro lado, se sentia um intruso. Aquilo era um assunto de família, e ele não faz parte dela. Ele simplesmente era um acompanhante de Carter e Dr. Kane. Portanto, ele ficou em silêncio, ainda observando a Agulha.

— Na noite em que sua mãe morreu — começou Dr. Kane —, aqui na Agulha...

De repente um raio iluminou a margem. Naruto se virou, com os olhos vermelhos com pupilas fendidas e as presas à mostra, e por um momento ele viu duas figuras: um homem alto e pálido com uma barba bifurcada e túnica cor de creme, e uma garota de pele acobreada em trajes azul-escuros e com um lenço na cabeça — roupas como Naruto já havia visto várias vezes no Egito. Eles estavam ali, parados, lado a lado, uns cinco metros distantes deles, observando-os. Naruto rosnou um rosnado protetor. Então, a luz desapareceu. As figuras se fundiram num borrão. Seus olhos os viram desaparecer. Então voltaram ao azul-celeste e suas presas desapareceram.

— Hum... — disse Sadie em tom nervoso. — Viu aquilo?

— Entrem no táxi — ordenou Dr. Kane, empurrando as crianças na direção do carro. — Não temos muito tempo.

Desse ponto em diante, Dr. Kane se fechou. E Sadie ficou emburrada em ter de voltar a ficar no colo de Naruto. Este também não parecia muito feliz.

— Esse não é um bom lugar para conversarmos — Dr. Kane comentou, olhando para trás. Ele prometeu ao motorista do táxi dez libras a mais se ele os levasse ao museu em cinco minutos, e o homem não media esforços. Naruto revirou os olhos. Panaca.

— Pai — tentou Carter —, aquelas pessoas no rio...

— E o outro cara, Amós — acrescentou Sadie. — São da polícia egípcia ou coisa parecida?

— Ou são apenas uns perseguidores baratos que gostam de perseguir criancinhas indefesas? — brincou Naruto, sabendo que eles não estavam indefesos, pois ele estava ali.

Sadie deu uma risadinha.

— Ouçam, crianças, vou precisar da ajuda de vocês esta noite. Sei que é difícil, mas terão de ser pacientes. Prometo que vou explicar tudo, depois que chegarmos ao museu. Farei com que tudo fique bem outra vez. Inclusive para você, Naruto.

Naruto arqueou uma das sobrancelhas.

— Como assim? — insistiu Sadie. — O que vai ficar bem?

A expressão de Dr. Kane era mais que triste. Era quase culpada. Naruto estreitou os olhos ao pensar no que Sadie dissera: sobre os Faust culparem Dr. Kane pela morte de Ruby. E a curiosidade o encheu ainda mais.

O táxi entrou na rua Great Russell — àquele ponto, Naruto nem comentou nada sobre os nomes idiotas — e parou diante da porta principal do museu com um cantar estridente dos pneus.

—Sigam minhas instruções — indicou Dr. Kane. — Quando encontrarmos o curador, ajam com naturalidade.

— Bom... Sadie, pelo que eu já vi, não se comporta de um jeito natural, Dr. Kane.

— Cale a boca, porco espinho — disse Sadie emburrada.

Eles desceram do táxi. Naruto e Carter pegaram a bagagem enquanto Dr. Kane entregava ao motorista um bolo de dinheiro. Depois, ele fez algo estranho. Jogou um punhado de pequenos objetos no banco traseiro. Pareciam pedrinhas.

— Siga em frente — disse Dr. Kane ao motorista. — Leve-nos para Chelsea.

Naruto podia não ser a pessoa mais esperta do mundo, e que ele não conhecia muito os costumes dessa dimensão, mas ele sabia que normalmente a pessoa pede para ir ao lugar quando está dentro do táxi. Mas qual não foi sua surpresa ao ver que na escuridão, um homem e três crianças estavam no banco traseiro do táxi.

Ele piscou. Era impossível que o táxi já tivesse parado para pegar outros quatro passageiros.

E pelo visto Carter também viu aquilo.

— Pai...

— Em Londres os táxis não ficam vazios por muito tempo — comentou Dr. Kane em tom despreocupado. — Venham, crianças.

Ele já se dirigia para a entrada do museu. Por um segundo, as crianças hesitaram.

— Gente, o que está acontecendo?

Eles balançaram as cabeças.

— Não sei se quero saber — disse Carter.

— Bem, fique aqui fora, no frio, se quiser, mas eu não vou sair daqui sem uma explicação. Vamos, Naruto. — Ela se virou, agarrou Naruto pelo braço e foi atrás de Dr. Kane, puxando o loiro, que gesticulava implorando para Carter ajudá-lo.

Carter deu de ombros e passou pela porta de entrada.


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Notas finais do capítulo

E aí? Se tá bom, eu mereço uns Reviews, né?



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