O Pacto escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 4
Um pouquinho de inveja




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/268551/chapter/4

- “Especialistas dizem que Xaveco é agora o Justin Bieber do Brasil e prevêem que dentro de pouco tempo, ele estará fazendo mais sucesso do que o cantor canadense.” Nossa, o Xaveco tá arrasando mesmo!

- Ah, Magali! Quer deixar essa revista boba de lado e vir ensaiar com a gente?

- Eu heim! O que deu nele, Mô?

- Sei lá, acho que o Cebola não agüenta mais ouvir falar no Xaveco.

- Nem eu agüento! – Cascão concordou - pra todo lado que eu olho só vejo a cara dele. O que aquelas garotas vêem nele afinal?

As meninas não souberam responder. Para elas, ele continuava sendo o mesmo Xaveco de sempre. Por que de repente todo mundo ficou de cabeça virada com ele? DC pareceu adivinhar a pergunta e arriscou uma resposta.

- Querem saber? Tô achando que tem cachorro nessa tumba!

(Cebola) - É gato...

- Cada um põe o bicho que quiser.

(Cebola) – Tá, tá. E por que você acha que tem... “cachorro” nessa tumba?

- Ah, fala sério! Desde quando o Xaveco tem cacife pra virar super-astro? Ele não conseguiu se destacar nem no xadrez e olhe que ele é bom nisso!

(Magali) – Ai, credo gente! Qual é o problema do Xaveco ficar famoso pelo próprio mérito?

(Cebola) – Porque ele não tem mérito pra isso, ora!

(Magali) – Querem saber? Eu acho que vocês estão é com inveja, isso sim! E agora ficam aí falando mal dele pelas costas. Parecem até Carmen e Denise!

- Ei! – todos falaram ao mesmo tempo zangados com a comparação.

(Magali) – E parecem mesmo! E sobre ele ter ou não mérito, bem... o Xaveco tá famoso, badalado, com o CD vendendo que nem picolé no deserto enquanto nós, que nos achamos tão superiores, ainda estamos ralando com uma banda de garagem.

(Mônica) – Nunca me achei superior ao Xaveco, você tá exagerando.

(Cascão) – Nem eu!

(Magali) – Se é assim, então por que vocês estão irritados com o sucesso dele?

- É...

Não houve como responder aquilo. De certa forma Magali não deixava de ter razão. Eles se esforçaram tanto para conseguir algum destaque para sua banda enquanto Xaveco, personagem secundário, conseguiu tudo de mão beijada. De certa forma, era humilhante imaginar que tinham sido superados por alguém como o Xaveco.

__________________________________________________________

Ele achou melhor sair dali antes que fosse visto. Aquela conversa tinha sido bem interessante e era óbvio que aqueles jovens não se deixaram seduzir pelo encantamento. Talvez eles pudessem ajudar no futuro, caso fosse necessário. Aquele tipo de missão costumava ser quase impossível.

“Tenho que salvar esse garoto de qualquer jeito. Não posso deixar que mais um seja destruído!”

__________________________________________________________

“Foi como pensei... devo ter engordado um pouco, é por isso que me rejeitaram! Droga, vou ter que pegar mais pesado!”

Maria Melo olhava seu reflexo atenta a cada detalhe no seu corpo. Apesar de estar abaixo do peso e a beira de uma desnutrição, ela enxergava a si mesma como uma obesa, tendo em sua mente uma imagem distorcida do seu corpo.

Seus esforços para conseguir uma vaga em uma agência de modelos estavam sendo infrutíferos. Como não sabia por que seus books fotográficos eram rejeitados, ela imaginava que o motivo era estar gorda e isso era razão para dar início a grandes períodos de jejum.

- Maria, o almoço está pronto.

- Ah, mãe! Eu estou sem fome!

- Nada disso, mocinha! Venha almoçar agora mesmo!

- Eu não quero!

Sua mãe entrou no quarto e colocou a mão na cintura.

- Você está querendo morrer de fome por acaso?

- Mas eu não estou com fome!

Um pequeno ronco se fez ouvir.

- Não? E esse barulho aí no seu estômago é o quê, lombriga?

- Mãe!

- Filha, você está mais do que magra. Se emagrecer mais do que isso, é capaz até de desaparecer.

- Você fala isso pra me fazer comer, mas eu sei muito bem o quanto eu tô gorda! Não posso ficar abusando!

Ela pegou a filha pelo braço e a arrastou até a cozinha, fazendo-a se sentar.

- Você vai comer sim senhora e não quero discussão!

- Eu não quero... – seu corpo começou a tremer e um suor gelado escorria pela sua testa a medida que sua mãe fazia seu prato. Quando ela colocou o prato na mesa, Maria teve a impressão de haver ali pelo menos uma tonelada de comida.

- Coma ao menos um pouco, está uma delícia.

- ...

Após fazer o próprio prato, ela sentou-se na mesa e começou a comer enquanto sua filha continuava olhando o prato com cara de pânico.

- Não vai sair daqui enquanto não comer tudo.

Com as mãos trêmulas, ela pegou o garfo e tentou colocar uma porção na boca. Era como se seu corpo rejeitasse totalmente aquela comida e quanto mais tentava mastigar, mais aumentava a vontade de cuspir tudo aquilo e gritar que não queria comer nada. Por que sua mãe era tão chata e não entendia que ela não precisava comer daquele jeito?

Foi com muito sacrifício que ela conseguiu engolir uma porção.

- Vamos, não é tão difícil assim! É só um prato de comida. Faz idéia de quantas pessoas morrem de fome por dia? Elas matariam para ter um prato como esse aí.

“Então por que não dá essa comida pra elas e me deixa em paz?” foi o que ela queria ter falado, mas não teve coragem. Sua mãe nunca ia entender mesmo.

Levou pelo menos quarenta minutos até que ela conseguisse engolir todo o prato. E tudo ficou ainda pior com sua mãe lhe apressando o tempo inteiro.

- Nossa, parece até que você está comendo pedra! Anda logo senão esfria e fica pior ainda!

- Acabei, mãe... – sussurrou se esforçando para não chorar de raiva por ter sido forçada a colocar todo aquele excesso no estomago.

- Você quer sobremesa? Eu fiz pudim de leite condensado!

- Não, obrigada. Eu vou para o meu quarto.

Sua mãe ainda resmungou um pouco depois que a moça saiu da cozinha. Ela tentava não entrar em pânico por causa da comida extra que tinha ingerido. Ao passar perto do banheiro, uma luz se acendeu e ela decidiu eliminar todo aquele excesso indesejável. Não era algo que ela fazia com freqüência, já que comia muito pouco, mas daquela vez ela tinha exagerado além da conta.

Após se certificar de que sua mãe estava ocupada arrumando a cozinha, Maria trancou bem a porta, levantou a tampa do vaso e tentou enfiar dois dedos na garganta. Ela não tinha muita experiência com aquilo e levou alguns minutos até que ela conseguisse expulsar toda aquela comida. A primeira golfada de vômito foi a mais difícil. Depois que saiu a primeira remessa, o restante foi mais fácil porque seu estômago embrulhava facilmente de nojo e o resto acabou saindo como conseqüência.

Quando viu que não tinha mais nada para sair, ela deu descarga e levantou-se com dificuldade, sentindo um pouco de dor no abdome e tonteira. Seus olhos lacrimejavam muito e o nariz escorria. Ela lavou o rosto da melhor forma que podia e depois correu para seu quarto antes que sua mãe a visse daquele jeito.

Apesar de ter sido doloroso, ela sentiu grande alivio ao saber que todas aquelas calorias indesejadas tinham ido embora com a descarga. Por enquanto, seu sonho estava salvo.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!