O Pacto escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 13
O doce gosto amargo da fama




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Após sugá-lo mais um pouco, ela se deu por satisfeita e foi até a janela para contemplar o céu lá fora. O céu estava parcialmente nublado e só em algumas partes era possível ver as estrelas. O vulto de alguém andando no quintal lhe chamou a atenção, fazendo com que ela saísse do quarto e fosse até aquela pessoa.

- Seu desgraçado, com ousa invadir o meu território?

- Escute muito bem, seu demônio: eu vou te capturar nem que isso custe minha vida?

Ela deu uma risada cínica.

- Você sempre me diz isso e eu sempre venço no final.

- Quase sempre – ele corrigiu. – Eu já venci algumas vezes e pretendo vencer agora.

- Humpt! Foram apenas exceções e você sabe muito bem que eu apenas desisti das minhas presas. Isso não conta como vitória.

Se pudesse, ele teria estrangulado aquela coisa. Assim tudo se acabaria ali mesmo. Como não podia, ele procurou manter a calma.

- Pode esperar. Eu não vou desistir desse garoto por nada no mundo.

Ela chegou mais perto e o encarou olhando em seus olhos.

- Eu também não e você sabe disso. Agora vai embora antes que eu dê um jeito de te colocar numa grande encrenca!

- Eu vou, mas voltarei. Pode esperar.

- Estarei esperando. Estarei sim.

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O despertador tocou por pelo menos cinco minutos antes que ele conseguisse reunir forças para poder se levantar. Seu corpo parecia feito de chumbo e ele mal conseguia manter os olhos abertos.

- Xaveco, está na hora. Minha nossa, o que houve?

Ele voltou a cair na cama, cansado demais para dar uma simples resposta.

- Céus! Você está horrível!

- Eu tô bem, mãe... só preciso de um banho bem frio...

- Você precisa é ficar na cama, isso sim! Hoje você não vai a escola e nem ao estúdio!

- O Moreira...

- Esquece esse homem! Ele está te explorando e eu não gosto nem um pouco disso! Se ele vier falar besteira no meu ouvido, vai ver só uma coisa. Agora fique na cama que eu vou trazer o café!

No fundo, era aquilo mesmo que ele queria, por isso não houve nenhum protesto por parte dele. Talvez um dia de descanso pudesse lhe fazer muito bem.

- Melina, o que tá acontecendo comigo? Cada dia que passa parece que eu tô piorando!

- Não se preocupe, sua saúde está ótima. O problema são esses seus amigos que só te dão trabalho!

- Não fale assim, eles não estão me dando trabalho nenhum!

- Desde que começou a sair com aquela garota, você tem tido problemas.

- A Maria não tem culpa de nada. A Denise é que endoidou o cabeção.

- Talvez você devesse mudar de namorada. Aquela ruiva não tem classe, faz escândalo em público e te enche de desgosto!

Pela primeira vez, ele começou a considerar aquela sugestão. Nos últimos dias Denise estava insuportável, sempre o sufocando, querendo controlar seus passos. Ela vivia tirando fotos, vídeos e ele tinha percebido que ela o exibia como se fosse um troféu. A todo instante ela insistia para que ele aceitasse convites para festas, jantares e vários eventos onde ela podia aparecer ao seu lado, sempre se exibindo para as câmeras e holofotes. Aquilo estava começando a lhe dar nos nervos.

Embora soubesse a aquilo ia acontecer, ele não imaginou que as coisas iam chegar a tais extremos.

- Depois eu vejo se falo com ela. Agora eu só quero dormir!

- Você vai terminar com aquela ruivinha?

- Tô pensando, viu? Ah, sei lá! Esse namoro tá me cansando demais!

Melina deu um largo sorriso com sua primeira vitória.

- E aquela garota magricela?

- Não fala assim da Maria. Ela é gente boa e tá passando por uma barra pesada! Porque você cismou com ela desse jeito, heim?

Aquela pergunta a pegou de surpresa.

- Porque eu quero o seu bem, querido! Aquela garota está atrapalhando sua vida, tirando seu sossego e lhe enchendo de preocupação por causa de bobagens!

- O problema dela não é bobagem.

- Como não? Ela não come porque não quer, ora! É apenas capricho de uma criança mimada. Não acho que esteja faltando comida na casa dela.

- Pára, Melina. Isso não tem nada a ver com pirraça, é uma doença de verdade.

Ele tinha pesquisado sobre anorexia e bulimia, vendo que era um problema que afetava milhares de jovens pelo mundo afora. Pelo que ele tinha pesquisado, aquilo costumava ser difícil e doloroso para as moças e para a família. Muitas até acabavam morrendo por inanição porque não conseguiam se alimentar.

- Eu só não entendo porque essas meninas fazem isso com elas mesmas.

A entidade também não entendia. Seus conhecimentos sobre as fraquezas humanas serviam apenas para explorar suas presas, não para entendê-las. Ela não sabia a razão daquelas fraquezas e também não se interessava nem um pouco em saber. Naquele momento só lhe interessava manter Xaveco sob controle.

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Moreira tomava uma xícara de café enquanto falava ao celular.

- Sim, isso será fantástico! Claro que ele pode, claro! Esse show será um sucesso, posso garantir!

Ele desligou o aparelho e finalizou seu café pensando no quanto sua conta bancária ia engordar com aquele show.

- Suzana, traga a agenda do Xaveco!

- Sim senhor.

- Deixa eu ver... uma entrevista na segunda, sessão de fotos na terça, ele vai gravar um comercial na quarta, participar de um evento beneficente na quinta...

A secretária começou a ficar preocupada ao ver como Xaveco poderia ficar sobrecarregado com tanto trabalho.

- Senhor, acho que deveríamos dar uma folga pra ele, não?

- Nem pensar! Ele é jovem, cheio de energia! É claro que meu garoto de ouro vai dar conta!

- Acontece que... er...

- O quê? Aconteceu alguma coisa?

Ela criou coragem e soltou logo a bomba.

- A mãe dele ligou agora a pouco e disse que hoje ele não virá trabalhar e...

- Como é que é? – o empresário bradou jogando a agenda no chão – Como ele não vem trabalhar hoje? Temos muita coisa marcada para hoje, ele não pode falhar!

- Ele é menor de idade, então é a mãe dele quem manda. Está no contrato!

- Porcaria! Eu devia ter dado um jeito de afastar aquela chata, ela está atrapalhando a carreira do próprio filho! Isso não vai ficar assim não! Depois do almoço eu vou buscar esse moleque nem que seja na marra! Ele vai ter que vir trabalhar de qualquer jeito!

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- Que saco, será que esse pessoal não tem mais o que fazer? Olha só que povo maluco! – ele reclamou com Melina ao ver que alguns tinham armado acampamento em frente a sua casa. Ele olhava através da cortina, tomando o maior cuidado para não ser visto. E como se aquilo não bastasse, eles também montavam vigília na rua debaixo, de forma que ele não podia sair dali pulando o muro. De qualquer jeito que fizesse, ele seria visto.

- Ora, eles fazem isso porque te amam! Você não gosta de ser amado?

- Sei lá, isso tá ficando muito estranho!

- É o preço do amor, querido! Pense em como você faz essas pessoas felizes!

- Acha mesmo que eles estão felizes?

- Claro! Estar aqui faz bem para todos eles. Afinal, é muito bom estar perto da pessoa amada, não é mesmo?

Ele coçou a cabeça, meio confuso com tudo aquilo.

- Você pode até ter razão, mas caramba! Eu não tô bem hoje! Por que eles não param de gritar um pouco? Não dá pra eu sair hoje, minha mãe mandou eu ficar em casa.

- Um exagero da parte dela. Você está ótimo, não tem nenhuma doença.

- Então porque eu tô fraco desse jeito? E não vem jogar a culpa na Maria porque não vai rolar!

Ela calou-se e resolveu não falar mais nada. E nem precisava porque o carro de Moreira parou em frente a casa e ele foi abrindo caminho entre os fãs que o deixaram passar sem nenhum problema.

- Abre aí, garoto! Eu sei que você tá em casa! – ele falou apertando a campainha freneticamente. Xaveco o atendeu a contragosto.

- Que foi, Moreira? A mãe já falou que eu vou ficar em casa hoje!

- Não vai não, rapaz. Você tem muito trabalho e se não aparecer, teremos que pagar uma tremenda multa!

- Você não devia ficar marcando um monte de coisa desse jeito, agora paciência!

- Paciência nada. Troca de roupa e vem comigo.

- Minha mãe...

- Sua mãe está te atrapalhando, não vê?

- Peraí, não fala assim da minha mãe não! Ela só quer me ajudar!

- Se quisesse te ajudar, te deixaria trabalhar sem fazer todo esse drama.

As pessoas do lado de fora começaram a gritar pelo nome do Xaveco, pedindo que ele saísse de casa.

- Está ouvindo? São seus fãs e é por causa deles que eu estou aqui! Rapaz, você tem um compromisso com essas pessoas e não pode decepcioná-las só porque sua mãe não sabe respeitar seu trabalho.

- Não exagera, tá bom? Um dia só não vai matar ninguém!

- Hoje é um dia. Amanhã serão dois, três... a gente não pode deixar assim. Seja forte, rapaz. Muita gente acredita em você, te vê como exemplo. Se você começar a fraquejar, essas pessoas ficarão decepcionadas e acharão que não vale a pena viver.

O rapaz sentiu um aperto na garganta. Deixar as pessoas desapontadas era algo que o feria muito.

- Agora você entende que tem um grande compromisso, não é mesmo?

- Eu...

- Troque de roupa, deixe um bilhete para sua mãe e vem comigo. Tudo vai ficar bem. Você é famoso agora, um grande astro e o mundo está sob seus pés. Não jogue tudo isso fora, seria um crime sem tamanho!

- Ele tem razão! – Melina sussurrou em seu ouvido – você sonhou com isso durante a vida inteira, não pode jogar fora esse sonho. Senão, de que terá valido sonhar tanto?

Mesmo exausto e com uma vontade enorme de voltar para dentro de casa, ele não conseguiu dizer não e acabou cedendo.

Quando saiu de casa, as pessoas se jogavam em cima dele, choravam, algumas desmaiavam deixando-o aflito e assustado com tanta histeria. E mesmo depois que eles entraram no carro, muitos correram atrás deles. No estúdio as coisas não melhoraram. Bajulação por todos os lados, demonstrações exageradas de afeto e muita comoção. Era choro por todos os lados, muita gritaria. Ele se sentia tão sufocado que estava até com dificuldade para respirar.

De repente, a vida não lhe pareceu tão doce assim.


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