O Pacto escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 10
Alguém precisa de você




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- Moça, você está bem? – uma senhora perguntou ao ver que Maria parecia cambalear um pouco.

- Estou sim, deve ser o sol.

Ela continuou seu caminho andando devagar, procurando evitar chamar a atenção das outras pessoas. Seu estômago roncava alto e sua boca salivava todas as vezes que ela passava em frente a uma lanchonete ou se deparava com algum carrinho de cachorro-quente, pipoca ou qualquer outra guloseima que só servia para fazer com que seu estomago roncasse mais alto ainda. Era preciso voltar para casa o mais rápido possível e se esconder em seu quarto onde podia ficar longe das tentações.

Um carrinho de churros lhe chamou a atenção. Tinha de doce de leite e chocolate e eram fritos na hora. Há quanto tempo ela não colocava um daqueles em sua boca? Fazia tanto tempo que ela nem se lembrava mais do gosto. E aqueles pareciam tão saborosos! Ela engoliu em seco, respirou fundo e saiu dali depressa para evitar a tentação.

Quando passou perto da praça do bairro, suas pernas começaram a falhar e ela resolveu se sentar em um banco para descansar um pouco. Ir e voltar andando da academia talvez não tivesse sido boa idéia, mas ela achava que aquele exercício extra poderia ajudar a queimar mais gorduras e calorias.

Sua visão começou a escurecer um pouco e sua cabeça doía muito. Seu corpo tremia e aquela fraqueza foi tomando cada vez mais conta. Uma voz distante, que parecia vir de outro mundo lhe chamava com insistência.

- Maria? Oi? Você tá bem?

- Hum?

- Anda, vem comigo. Você não pode ficar aqui nesse sol.

Ela estava tão fraca que se deixou levar sem nenhum protesto. Além do mais, era só o Xaveco, então não havia nenhum perigo. Ele a colocou dentro do carro e pediu ao chofer que os levassem até o endereço da casa da moça.

- O Moreira vai chiar.

- Deixa que eu me resolvo com ele. Primeiro a gente tem que levar ela pra casa.

- Você é quem sabe.

Não demorou muito e o carro estacionou em frente a casa de Maria, que entrou sendo apoiada pelo Xaveco. Ao sentar-se no sofá da sala, ela sentiu alívio e respirou fundo.

- Nossa, obrigada Xaveco!

- Você tava passando mal?

- Acho que foi o sol.

Ele a olhou por um tempo e logo viu que o sol não tinha nada a ver com aquele problema.

- Fala a verdade, você deve estar sem comer a um tempão, não é?

- Não, eu comi sim! Almocei muito bem!

- As meninas vivem falando que você não come direito, só água e alface.

- É exagero da parte delas.

Aquela magreza excessiva, as olheiras e a palidez diziam em alto e bom som que não tinha nada de exagero no que as outras meninas falavam.

- Sua mãe não tá em casa?

- Não. Ela está trabalhando agora.

- Se você quiser, posso preparar um sanduba da hora pra...

- Não! Eu não quero, por favor!

- Na boa, você não pode ficar passando fome. Saco vazio não para em pé!

- Mas eu não estou passando fome.

- Então imagine se estivesse! Você tá tão magra que se virar de lado, some!

- Modelos devem ser magras, ora essa!

- Então é isso? Você tá se matando de fome porque quer virar modelo?

- Sempre foi o meu sonho, desde pequena! – os olhos dela brilharam um pouco, imaginando a si mesma desfilando em uma passarela, vestindo roupas feitas pelos melhores estilistas do mundo e sendo fotografada freneticamente por todos os ângulos.

Xaveco balançou a cabeça, sentindo pena da amiga. Será que ela não percebia que estava se tornando um fiapo humano? Toda sua beleza estava sendo consumida porque ela não se alimentava direito e o organismo não recebia os nutrientes necessários para se manter saudável.

Melina acompanhava os dois pensando se era ou não boa idéia deixá-lo andar com aquela garota. Embora Maria parecesse ser inofensiva, ainda assim fazia parte do antigo círculo de amizades dele e seu objetivo era afastá-lo de todos e com isso garantir que ninguém teria condições de abrir seus olhos.

- Xaveco, querido! Você está atrasado para a gravação!

Como não podia falar em voz alta, ele não respondeu nada e procurou ignorar as recomendações dela. O estado de Maria lhe dava muita pena e ele se perguntava onde estavam as amigas dela que não viam aquilo. Pensando bem, como seus pais não eram capazes de ver que sua filha estava quase se matando por inanição?

“Claro... vai ver ela é invisível que nem eu era...” ao pensar assim, ele acabou sentindo uma empatia muito forte por ela e um desejo de ajudá-la.

- Olha, Maria. Você precisa comer. Não tem que ser que nem a Magali era quando criança, mas passar fome também não é saudável!

- Comer engorda.

- E desde quando você está gorda?

- Você fala isso para agradar, mas eu é que sei o quanto estou enorme! Você não vê? – ela se levantou e começou a apalpar o próprio corpo. – olha só essa barriga!

Por mais que ela mostrasse, ele não conseguia ver uma misera grama de gordura no abdome dela.

- E você já viu o tamanho da minha bunda? Que horror! Pareço uma tanajura! Olha só essas pernas! Pareço um lutador de sumo!

- Tá doida? Onde você tá vendo gordura aí, criatura? Você tá magra, Maria. Na verdade, você é a mais magra de todas as meninas. Mais magra até do que a Magali.

- Hã? Eu mais magra do que a Magali? Impossível! Olha, eu seria até capaz de vender a alma para ter um corpo que nem o dela!

Melina não parava de falar em seu ouvido e o som insistente da buzina do chofer fez com que ele se lembrasse de que precisava ir ao estúdio. Ainda assim ele pretendia encontrar alguma forma de ajudá-la. Mais tarde ele pensaria nisso com calma.

- Agora eu preciso ir que tô atrasado, mas vamos sair qualquer dia desses para conversar, talvez ir ao cinema.

Os olhos dela brilharam. Ela saindo ao lado de um mega-astro?

- E a Denise?

- Eu me arranjo com ela depois. Além do mais, a gente vai sair só como amigo. Não tem nada demais. De noite eu te ligo, beleza?

- Estarei esperando. E obrigada pela carona, viu?

- Sussa. E vê se tenta comer alguma coisa, tá bom? Nem que seja um pedaço de mação, sei lá. Não fica sem comer desse jeito não que vai te fazer muito mal.

Como estava muito distraído dando conselhos a Maria, ele não viu os olhos de Melina se apertando com raiva. Por que ele não a ouvia? Por que não seguia suas ordens? Até então ele a obedecia como um cão bem treinado e depois que começou a ficar de conversa com aquela garota, passou a ignorar sua presença?

Após se despedir de Maria, ele entrou no carro e um chofer aliviado o levou ao estúdio.

“Eu preciso fazer alguma coisa por ela, preciso sim. Coitada... será que ninguém percebe que ela tá com problema? Se continuar daquele jeito, ela vai é ficar doente!”

Quando eles chegaram ao estúdio, Xaveco teve que ouvir um grande sermão do seu empresário.

- Isso aqui não é brincadeira não, garoto! Nós temos prazos e contratos para cumprir.

- Ô Moreira, não enche o saco não tá legal? Eu precisei ajudar uma amiga e não me arrependo. E se você tá tão preocupado assim com o tempo, então pára de falar e vamos começar com a gravação!

Por um instante, ele pensou que seu empresário fosse explodir de raiva, brigar, xingar ou coisa parecida. Ao invés disso, o efeito foi contrário.

- Calma, rapaz! Não precisa ficar zangado, desculpe.

- Heim?

- Tome uma aguinha para relaxar e vamos começar com o trabalho, certo?

- Er... certo.

Ainda surpreso com aquela reação de Moreira, Xaveco resolveu começar o trabalho e a gravação transcorreu normalmente. Quando parou um pouco para tomar água, ele ouviu a si mesmo cantando e falou, contrariado.

- Credo, ficou meio ruim. Acho que não tô num bom dia hoje...

Um dos técnicos falou.

- Tá brincando? Isso aqui ficou ótimo, perfeito?

- Como é que é?

- Isso mesmo, você é fantástico!

- Incrível!

- Demais!

- Vai fazer o maior sucesso!

- Mas... mas... a gravação não ficou boa. Podem falar, tá tranqüilo! Se precisar, eu canto de novo!

- Não precisa, rapaz. Você foi ótimo. Alias, você é sempre ótimo!

Todos o cercara, lhe cobrindo de elogios e o rapaz acabou ficando com um pouco de medo. Para sua sorte, estava na hora de ir embora e ele saiu dali ainda sendo coberto por elogios e bajulações. O que tinha dado naquelas pessoas?

- Rapaz... esse pessoal tá ficando meio sem noção... – ele falou para si mesmo quando finalmente entrou em seu quarto e se jogou na cama.

“E isso é só o começo da sua loucura.” Melina pensou enquanto afagava seus cabelos com um sorriso perverso no rosto.


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