Pequena Travessa escrita por Arline


Capítulo 5
Capítulo 5


Notas iniciais do capítulo

Mais um cap. Se quiserem, comentem!



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CAPÍTULO 5

Cheguei cedo à empresa. Tão cedo que um dos seguranças teve que abrir uma das portas pra que eu pudesse entrar; seu olhar era curioso, mas ele desejou-me apenas um bom dia, sem fazer perguntas.

Os corredores estavam vazios e ainda escuros. Confesso que me deu um medo desgraçado de andar por ali sozinho, mas em breve as luzes seriam acesas e ainda bem que os elevadores funcionavam... Daria pra fugir caso eu topasse com alguma assombração. Que merda eu estava fazendo ali? — pensei, chegando ao meu andar. — O caminho continuava escuro, mesmo com aqueles pequenos feixes de luz que saíam das diminutas lâmpadas. Aquilo era tão pequeno, que poderia ser considerado uma mini lanterna. Daquelas bem, bem pequenas mesmo! Mais uma vez eu pensei em que merda eu estava fazendo...

Assim que passei em frente à mesa de Jasper, as luzes se acenderam e pensei que tinha ficado cego com tanta luz na minha cara. Aquilo precisava mesmo ser tão forte? Não dava pra diminuir não? Olhei em volta, constatando que tudo continuava igual, exceto por um porta-retratos. Na foto; Jasper e algumas pessoas da empresa em algo que parecia ser uma pequena comemoração. Ele parecia feliz.

E o pessoal da empresa dizia gostar muito de mim... Fizeram festinha e nem me convidaram... Na verdade, nem pra enterro eu estava sendo convidado ultimamente. As pessoas de Forks não morriam!

Em minha sala, nada estava fora do lugar. Nada mesmo. Até aquele aviãozinho maldito estava ali, rindo de mim, dizendo que eu era um idiota covarde e apaixonado que jamais conseguiria me aproximar do cara que eu amava. Isso não soava mais estranho pra mim; eu acabei gostando da ideia de ter aquele sentimento por alguém, por mais que o mesmo nunca fosse revelado ou correspondido.

Meu delicioso sofá me recebeu muito bem, acomodando minha bunda em seu assento macio. Como senti falta dele! Relaxei meu corpo completamente, jogando minha cabeça pra trás e respirando fundo. Olhei meu relógio, constatando que faltava pouco mais de duas horas para que o expediente de fato começasse. Cinco e meia da manhã.

Resolvi andar um pouco pelos corredores e tentar espantar o sono; eu ainda estava com um medo da porra de topar com alguma assombração, mas me contive. Era bem provável que ela se assustaria comigo e não o contrário. Dobrei um corredor que daria em uma enorme janela; eu achava legal olhar as pessoas na rua e pensar que eram formiguinhas e eu, o enorme sapato. Mas eu senti algo em minha cabeça e tudo se apagou antes que eu chegasse ao meu destino. Era a morte, enfim.

...

Ao abrir meus olhos, tudo o que senti foi uma grande dor de cabeça; focalizar qualquer coisa estava sendo impossível, ainda mais com aquele monte de vozes zumbindo em meus ouvidos. Tinha alguém dizendo que foi sem querer e agradecendo a um monte de nomes que eu desconhecia. A morte era confusa. Mais do que minha vida.

Gemi quando tentei me mexer e um rosto gordo e enorme entrou em meu campo de visão, me fazendo quase sorrir quando me lembrei de quem era. Dulce, a moça da limpeza. Ela tinha morrido e ninguém me avisou também? Isso eu jamais perdoaria! Eu adorava aquela baixinha gorducha e enfezada.

— O senhor está bem? Dói muito? — sua voz estava mais clara, mas ela ainda continuava quase sobre mim. Agora ela nem pesaria tanto... Éramos fantasmas! Será que eu poderia voltar e assustar ao Emmett?

— Ainda dói um pouco. O que houve?

Nem eu consegui entender direito o que falei, mas achei ser normal; talvez fosse uma fase de adaptação do meu corpo ao outro plano.

— Não se canse; o senhor logo ficará bem.

Tornei a fechar os olhos, me aproveitando daquele conselho. Agora eu estava morto e teria muito, muito tempo pra descansar... Ou não... Se me permitissem, eu passaria minha morte inteira só atormentando a vida do meu irmão. E eu estava mesmo cansado... Resquícios da minha vida na Terra! Mas isso tinha acabado; só sombra e água fresca pela eternidade...

Quando novamente abri os olhos, só consegui enxergar um belo par de seios na minha cara. Morri e deixei de ser gay... Aquela seria uma das virgens do paraíso? Aquele tipo de coisa era permitido no céu? Ou eu não estava no céu? Não, eu tinha que estar! Dulce era boa demais pra ir pro inferno...

— Onde... — balbuciei e os seios se afastaram; revelando o rosto bonito de uma jovem mulher.

— Shhh... O senhor ficará bem. Agora o senhor pode dormir, não há mais problemas quanto a isso.

Oh, não havia mesmo! Dormir! Isso seria melhor do que assustar ao Emmett... Não, não seria. Fechei meus olhos novamente, com bastante boa vontade e acho que comecei a pensar em como seria dali por diante... Já sabiam que eu havia morrido? Como meus pais estariam? E Jasper? Eu veria meu enterro? O que deixei de bom na Terra? Existia um ditado popular que dizia que a pessoa poderia morrer em paz quando tivesse plantado uma árvore, escrito um livro e tido um filho. Eu estava lascado, então... Vagaria pelo limbo eternamente... Que morte cruel a minha... Me fodi em vida e continuaria me fodendo mesmo depois de virar amigo do Gasparzinho.

Bem ao longe, ouvi a voz do meu irmão e imaginei que fosse alguma prece pedindo por minha alma. Se ele pensava que com isso se livraria de ser assombrado, estava muito enganado!

A voz foi ficando mais próxima e mais audível; eu até senti a mão dele segurando a minha... Estar morto era estranho demais; parecia que eu continuava respirando, sentindo dor e as pessoas me tocando. Também estava com frio e fome. Muita fome.

Novamente voltei a pensar em tudo aquilo. Já teriam descoberto meu assassino? Seria ele, um ladrão? Como meus pais estariam? — sim, eu já tinha pensado neles, mas pensei outra vez. Eu não podia? — Era altamente agoniante não ter aquele tipo de notícias... Eu estava começando a achar que estavam me deixando dopado ou algo assim.

Quando novamente abri os olhos, eu conseguia enxergar bem melhor e vi minha mãe ai. Ela também tinha morrido? Mas que porra estava acontecendo? Sem que eu pudesse conter, meus olhos encheram-se de lágrimas.

— O que foi? Está sentindo alguma coisa? — minha mãe perguntou, passando a mão em meus cabelos.

— A senhora... Por que está aqui?

Ela sorriu um pouco, sem se afastar.

— Porque você pode ser estranho, mas é meu filho e me preocupo. É normal.

Eu não estava entendendo bem... Tudo era muito confuso mesmo. Muito confuso.

— Mas a senhora não podia estar aqui... Tem a Alice, o Emmett, meu pai... Eles precisam de você. Mas eu... Minha morte não...

— Morte? — ela gritou — De que cacete você está falando?

— Como não sabe? Eu levei uma pancada na cabeça e morri.

Eu realmente estava explicando aquilo? E minha mãe começou a gargalhar. Aquilo não tinha graça...

— Meu filho, eu sabia que você era anormal, mas não tanto! Há dois dias, Dulce, a moça da faxina, acertou sua cabeça com um taco por pensar que você era um ladrão. Ao invés de cair pra trás, você caiu pra frente e bateu a cabeça em um vaso com plantas que estava perto da janela. — agora as coisas estavam começando a fazer sentido... — Além de dois ferimentos na cabeça, você tem um braço enfaixado. Parece que caiu por cima ou algo assim... Mas não é nada tão grave! Que história de morte é essa?

Contei tudo a ela, que ria cada vez mais. Gargalhava mesmo. A cada palavra dita, eu me sentia mais e mais idiota; só mesmo minha mente estranha pra maquinar minha morte daquele jeito... E pobre Dulce! Eu pensando que a coitada estava morta...

Bem, claro que fiquei feliz por saber que estava bem vivo, mas foi triste notar que eu não poderia assombrar Emmett... Aquela foi mesmo a parte chata de tudo.

Minha mãe me disse que fiquei um dia inteiro dopado... E o outro também! Parecia que eu estava agitado demais e os médicos precisavam fazer exames ou algo assim... Pelo menos eu entendi o motivo de sentir como se meu corpo flutuasse. Era estranho pra cacete!

— Bom, como você está bem, vou pra casa um pouco. — disse minha mãe, dando um meio sorriso — Mas você não ficará sozinho, ok? Bella se ofereceu pra lhe fazer companhia.

Arregalei meus olhos. Bella? Mas que merda era aquela? Por acaso ela estava tentando roubar o homem do próprio irmão? Sim, porque mesmo se Jasper nunca soubesse daquilo, eu era completamente dele! Eu não estava gostando nada daquela história... Mas nem tive tempo de dizer nada; minha mãe logo saiu e Bella, que parecia estar na porta, entrou em seguida, sorrindo. Confesso que eu não gostava muito do jeito dela; parecia que se jogaria sobre mim a qualquer momento e era muito animadinha pro meu gosto.

— Boa noite! Sente- se melhor? — ela perguntou, com aquela animação de me alarmava.

— Sim, obrigado por perguntar.

Minha resposta saiu sem vontade alguma, mas ela não pareceu notar e ainda abriu um largo sorriso. Sim, ela ainda conseguia essa proeza. E eu tive medo que sua boca rasgasse bem ali, na minha frente.

Ela encaminhou-se para uma poltrona e acomodou-se, retirando um livro de sua bolsa e o abrindo bem onde estava um marcador de páginas. Parecia que aquilo era habitual, normal; como se fôssemos amigos de longa data. Eu não estava nem um pouco feliz em vê-la por ali; preferia que fosse o irmão... Permaneci calado, por mais que a curiosidade me corroesse naquele momento, contudo, eu sabia que acabaria perguntando o motivo de sua boa vontade.

Longos minutos passaram sem que nada fosse dito; o som era produzido apenas pelo virar de páginas e pelas máquinas que me faziam crer que ainda havia algo parecido com vida em mim. Meu coração batia... Era alguma coisa.

Minha garganta arranhava, minha boca estava seca e eu havia notado aquilo desde que falei com minha mãe, mas preferi manter-me quieto; muitas idiotices já haviam sido ditas por mim e eu não queria que ela risse mais uma vez.

Ao me remexer, minha cabeça doeu, assim como meu braço. Isabella levantou os olhos, perguntando se eu estava com dor. Não, minha cara era feia daquele jeito mesmo...

— Quer que eu chame uma enfermeira? — ela perguntou, muito solícita.

— Na verdade, eu quero mesmo é saber o que você está fazendo aqui. — disparei — Nós não somos conhecidos, amigos e nem nada do tipo. Sinceramente? Você me incomoda.

Antes que eu pudesse pensar, já havia falado. Não que aquilo tivesse incomodado Isabella... Não, ela levantou-se, sorrindo de canto e sentou-se ao meu lado, sem desviar os olhos dos meus.

— Minha intenção não era incomodá-lo, mas não posso dizer que sinto muito por isso. — seu sorriso ficou um pouco maior — O senhor pode não gostar de mim e querer me expulsar daqui, mas eu não vou sair. Jasper pediu que eu ajudasse sua mãe, que cuidasse do senhor e não posso desapontar ao meu irmão.

Jasper... Como eu queria vê-lo! Era ele quem deveria estar ali, não aquela garota que se tornou uma enorme pedra no meu sapato; continuava sendo uma pedra linda, mas não deixava de ser incômoda.

— O senhor é o único amigo que meu irmão tem e pedir que ele não se preocupasse seria injusto.

— Ok. Só que eu ainda acho desnecessária a sua presença; pode voltar e dizer a ele que estou bem.

Mais uma vez eu me mexi e minha cabeça protestou. Isabella se inclinou em minha direção, para arrumar meu travesseiro e ficou tempo demais me olhando... Eu não estava gostando daquilo. Não mesmo.

Antes que eu pudesse virar o rosto, ela estava me beijando e fazendo uma careta. Bem feito! Meu bafo deveria estar igual ao de um leão que comeu um gambá podre bem fedorento.

— Isso não foi legal... — disse ela, se afastando e completamente sem graça.

— Não foi mesmo. Por favor, vá embora...

Mesmo relutante, ela pegou suas coisas e arrumou sua bolsa, saindo sem olhar pra trás. Melhor assim, eu não a queria ali mesmo...

O dia seguinte foi um pouco melhor pra mim; recebi alta, fui pra casa, fui zoado por pensar que tinha morrido... Mas eu estava em casa! Em poucos dias eu poderia voltar ao trabalho, sem me esforçar muito, mas não poderia dirigir, uma vez que meu braço estava imobilizado. Fora as dores de cabeça, eu estava ótimo!

Dulce ligou pra minha mãe; muito preocupada com meu estado e tive que tranquilizá-la quanto a isso. Ela estava mesmo querendo se oferecer pra cuidar de mim... Jasper também ligou, quis saber como eu estava e pedir desculpas pelo comportamento vergonhoso de sua irmã. Eu queria era vê-lo! Como eu estava com saudades daquela coisa estranha...

Meu pai notou que eu estava quieto demais em meu quarto, sem querer sair pra nada e foi atrás de mim, insistiu pra eu dissesse o que era. Se eu falasse, ele teria um ataque! O melhor seria que eu ficasse calado mesmo, mas aquilo estava me consumindo de forma avassaladora. Eu precisava contar.

Encarei a porta, quando ela se abriu abruptamente e bateu contra a parede. Meu pai novamente, com uma bandeja em mãos. Virei o rosto, sentindo meu estômago embrulhar.

— Você tem dez minutos. — disse ele, colocando a bandeja em minhas pernas — Não sairei daqui enquanto não terminar e enquanto não me disser o que está acontecendo.

Puta que pariu! Eu estava fodidamente fodido. Era agora que meu pai nunca mais olharia na minha cara... Evitei o olhar do meu pai e respirei fundo, tentando acalmar meus ânimos e pensar um pouco mais.

Comi, enrolei, fingi que ele não estava ali... Mas não adiantou muito...

— Eu até te daria espaço e esperaria que me contasse o que está acontecendo, mas te conheço muito bem e sei o quanto é teimoso. Você vai me contar e vai ser agora.

Ok. Eu estava sendo quase intimado a contar e ele que não reclamasse depois!

— As coisas não são fáceis, pai. Não são mesmo. Juro que nada foi de caso pensado... Claro que não foi... Eu jamais pensaria em algo assim acontecendo comigo... Mas o fato é que aconteceu e não sei mais o que fazer.

— E você vai falar logo o que é ou vou ter que ficar aqui e imaginar?

Meu pai poderia ser um pouquinho mais sensível... Ele não sabia como eu estava!

— Estou apaixonado, pai. Pela primeira vez na vida, eu estou apaixonado e isso não é bom. Isso não é nada bom, pra dizer a verdade.

Os olhos do meu pai quase saltaram das órbitas e sua boca abriu tanto que quase vi seu esôfago. Aquilo era desnecessário.

— Mas... Ela não te ama?  É casada?

Nem mulher é... Pensei, mas guardei pra mim.

— Não. Para todas as perguntas.

— Então? Se você parar de enrolar e contar, eu posso conseguir jantar ainda hoje.

Merda... Meu pai não ajudava em nada! Ele bem que poderia ficar quieto um pouco e guardar seus comentários sem graça pra ele.

Como minha mãe sempre dizia; o melhor era puxar o esparadrapo de uma vez... Mas eu nunca entendi bem... Doía da mesma forma... Enfim...

— Eu estou apaixonado pelo Jasper.

Mais uma vez, pensei que o globo ocular do meu pai saltaria e eu brincaria de bolinha de gude com eles. Aquilo já tinha perdido a graça.

— Mas... Mas... O Jasper? Eu não estou entendendo, Edward! Desde quando você é gay? Todos esses anos você estava tentando nos enganar? Era por isso que nunca nos apresentava uma namorada? Meu Deus...

— Eu não sei de mais nada! Nunca fui gay, pai... Só... Aconteceu... E eu não sei o que fazer! Mas é uma merda mesmo! Quando me apaixono é por um homem! É melhor eu me matar logo...

Meu pai começou a gargalhar e o olhei sem entender. Minha desgraça era piada agora? E a cada segundo, eu estava mais perto de me tornar um parricida...

— Filho... Sei que você não vai entender nada do que vou dizer, mas... Vá em frente! Fale com ele. Estou feliz por você. De verdade.

De fato eu não estava entendendo porra nenhuma... Nada de crise e xingamento? Nada dele dizer que eu seria deserdado? Nada de dizer que eu magoaria minha mãe? Aquilo era deveras estranho.

— Você aceita? Numa boa? Não vai dizer que sou a vergonha da família? Não vai me chamar de aberração?

— Claro que não, meu filho! Eu já disse; estou feliz de verdade por você. E não demore muito pra falar com o Jasper. Ele é um bom rapaz.

— Tudo bem... Eu acho. Falarei com ele.

Meu pai me abraçou, riu, disse que estava muito feliz e que minha mãe ia explodir de tanta alegria! Eu conhecia bem minha mãe e ela não ficaria tão feliz assim... E eu nem sabia como falar com ele! Como será que se passa uma “cantada” em um homem? E se eu apanhasse? Se fosse com uma mulher e ela não tivesse afim, eu seria chamado de idiota e ela gritaria comigo, mas um homem... Cara, ele ia querer me matar! No mínimo, eu sairia com um olho roxo!

Mas eu seria homem e falaria com ele! Claro que numa sexta-feira; assim daria tempo de tentar consertar o estrago que seria feito no meu lindo rostinho...

Confesso que me senti um pouco mais leve ao contar, mas aquilo estava estranho demais... Agora era esperar a reação de minha mãe e eu criar coragem pra contar ao Jasper...


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