— O que vocês pensam que estão fazendo?! - eu perguntava, tentando controlar ao máximo a minha voz para que ninguém fora dali ouvisse.

A pergunta, a propósito, não era pra ser retórica, mas eles não abriam a boca.

— Estamos falando do meu irmão. Meu irmão! - senti a necessidade de ressaltar - Que vocês ficaram brincando agora como se fosse um ioiô!

— Olha, Rin...

— Nem começa, Gakupo... - já cortei a formalidade, com a cabeça fervendo - até onde eu sei, você gostava do Kaito!

— O quê?! - exclamou o querido "beijo-nojento".

— É pra você ficar quieto também! Senão sobra pra você! - obviamente, Gakupo me olhou como se fosse me matar. IGNOREI e apontei meu dedo indicador esquerdo para ele - A questão aqui é o seguinte: você, Gakupo Kamui, acabou de roubar o primeiro beijo do meu irmão... - mudei o dedo para Kaito - porque você está iludindo ele a meses, falando que quer tentar ficar com ele!

Os dois pareciam que iam falar alguma coisa, mas eu não dei essa oportunidade. Não daria essa oportunidade pra nenhum desses dois depois do que aconteceu:

— Vocês acabaram machucar meu irmão. Muito! - as palavras saíam da minha boca de uma forma que eu não conseguia mais controlar. - Então, ou os dois vão resolver isso, ou eu mesma resolvo e acabo com os dois agora.

Por um segundo de calma, percebi como era engraçado uma nanica como eu falar que ia acabar com a raça daqueles dois. Mas, se bem que pelo rosto deles, parecia que eu tinha toneladas de músculos e dois metros de altura.

— Primeiramente, Kaito, você vai sumir da vida do meu irmão. - pude ver a expressão hipócrita que choque na cara dele. - Sem mais encontros, sem mais conversinhas, sem mais mentiras. Só vai falar com ele para pedir desc-

— Vai se ferrar! - gritou ele e saiu da cozinha sem olhar na minha cara. Ah, era só isso que me faltava, além do meu irmão ter se apaixonado pelo hétero chato da história, o cara ainda tinha a coragem de ficar bravo depois de tudo aquilo. Me contive com todas as minhas forças para não sair de lá correndo pra puxar ele por aquele cabelo azul fajuto!

— Kagamine-san, desculpa... - putz! Por essa eu não esperava... Fiquei sem sabe o que dizer com tempo suficiente pra ele continuar: - a verdade é que eu tô começando a gostar do seu irmão também e não sabia o que fazer naquela situação... Sabia que ele ia começar a chorar na frente de todo mundo e queria dar um espaço pra ele se recompor... Aí fiquei com raiva e acabei agindo por impulso... Não sabia que era o primeiro beijo dele... Desculpa... Desculpa... - ele se ajoelhou.

Fiquei atônita. Por aquela não esperava. O que iria fazer... Pelo que Kamui-kun falou era claro que fez aquilo nas boas intenções.

— Tô besta. - ele obviamente ficou espantado com minha reação. - Mas já que é assim... - fiz uma pausa dramática - É bom você tentar consertar isso também!

E saí dali. Estava torcendo para aquele ser o momento de tensão depois dos protagonistas ficarem juntos... Mas... Nossa... Agora nem sei mais o que shippar. Se o Shion-kun falou aquelas coisas na cara do Len, provavelmente só porque a Meiko-san estava por perto, ele realmente não era o homem pro meu irmão. Definitivamente! Agora, o Kamui-kun? Era muito recente, tinha que dar tempo ao tempo...

Não acredito que vou dizer isso, mas nesse momento, tô achando melhor irmão ficar sozinho mesmo... E isso parte meu coraçãozinho de irmã E de fujoshi...

♥

Não fiquei a noite toda no banheiro, se é isso que você está pensando. Escutei a óbvia discussão que Rin começou com Shion-kun e Kamui-kun. Mas só o começo também, porque depois tudo ficou um pouco mais baixo... E incrivelmente mais calmo.

Saí depois que Rin parou de insistir para que eu saísse. Ela até tentou conversar comigo, mas não deu muito certo porque – e isso eu tinha certeza – Shion-kun poderia estar ouvindo. Não foi uma surpresa encontrar ela sentada do lado da porta do banheiro dormindo quando saí de lá. Até pensei em acordar ela, mas teria toda uma conversa depois... E, bem, eu não tô pronto pra isso...

Fui andando na ponta dos pés pela casa, com receio de acordar alguém. Não sabia que horas eram, mas, como estava relativamente escuro, ninguém iria querer acordar naquele horário. Queria muito sair daquela casa e ir pra praia. Sentir o vento nos cabelos espantando minhas lágrimas, como acontece nos filmes.

Mas era perigoso. Não iria correr o perigo só pra dar uma de protagonista dos yaois que a Rin lê... Ao invés disso, me acomodei na rede, na parte dos fundos da casa. Pelo menos eu poderia ter uma dose do meu vento quando me balançasse.

Olhando para um céu estrelado que eu jamais veria se estivesse em casa, não consegui afastar meus pensamentos do Shion-kun. Claro, porque tudo isso se resumia a ele.

Ele não me amava. Ele nunca iria retribuir meus sentimentos. Essa era a verdade que eu me negava todo esse tempo. Que eu deixei me envenenar pela fantasia de ter um cara que gosto a fim de mim. Mas não! Isso nunca vai acontecer. Eu não entendo! Como ele pode escolher a Meiko-san ao invés de mim? Ela não gosta dele. Ela já abandonou ele. Eu seria muito mais tranquilo pra ele. Eu o faria feliz e ele me faria feliz. Seríamos amigos antes de tudo e consequentemente seríamos namorados. Ele teria a coragem de se abrir comigo e eu de me abrir com ele. Não é?

Ou isso é só eu me iludindo? Dando voltas na ideia de que eu realmente possa gostar de alguém que seja legal? Talvez eu seja um trouxa. Não, eu SOU um trouxa. Um idiota. Um besta que conseguiu gostar de um cara que nem consegue ver um beijo comigo como algo aceitável!

E sabe o pior disso tudo? Eu perdi meu primeiro beijo. Não foi para o garoto que eu me apaixonei. Não foi por um garoto que se apaixonou por mim. Foi por um cara que ainda nem é meu amigo direito... Tá! Eu tive algumas aulas com ele, mas nada que pudesse nos transformar em melhores amigos do nada. Ele não é um cara horrível nem nada disso. Ele é só um cara. Ponto. Nada mais. Sem sentimento, sem lógica, sem diversão...

— Eu sou mesmo um besta...

Foi só nesse momento que eu percebi que estava chorando. Derramando, talvez, litros de lágrimas. Eu não queria pensar em mais nada. Eu só queria desaparecer dali. Dormir e acordar sem ter sido trouxa e me apaixonado pelo Shion-kun...

Pelo menos a primeira parte desse desejo eu consegui realizar.

♥

Eu não conseguia dormir. Eu até podia fingir que estava conseguindo mas não ia durar por muito tempo. Revirava-me na cama a cada cinco segundos. A imagem de Len, completamente assustado, não saia da minha cabeça. Ainda mais depois do esporro que a irmã dele deu hoje mais cedo. Jurava que ela ia me comer vivo junto do Kaito-kun. E o fato dela ter me arrancado a força do armário. Como ela podia fazer isso comigo?! Estava furioso com ela. Muito. Mas depois de ouvir que era o primeiro beijo do Kagamine-kun... Foi só isso que eu consegui processar na hora.

E o que me restava para o dia de amanhã? Uma longa e séria conversa com o Kaito, depois uma longa e séria conversa com o loirinho, depois uma longa conversa com a Luka, contando tudo. Não ia aguentar essa dose de estresse num dia só... Por quê?

Saí do quarto. Não queria acordar ninguém ali pra me perguntar sobre o que estava acontecendo ou algo do tipo. Eu só queria desaparecer. Nem que fosse só por uns minutos... O pior de tudo, ainda, é saber que, com certeza, o Kagamine-kun se sentia da mesma forma... Droga!

Da saída do quarto dava pra ver a Kagamine-san dormindo na porta do banheiro... Ele já tinha saído de lá... Não estava preparado ainda pra falar com ele, então fui na ponta dos pés para a parte frente da casa, que não parecia ter mais ninguém.

Estava enganado. Kimura-kun estava escutando música nos fones de ouvido e olhando pro nada. Só pareceu me perceber depois de eu sentar numa cadeira do lado dele.

— Kamui-kun?! - disse ele. - Não está conseguindo dormir?

— Não... - senti vergonha da minha própria voz. Dava pra ver que eu estava acabado. Torcia para ele estar sonolento o suficiente pra não perceber.

— Tá tudo bem? - ele perguntou, contrariando meus pensamentos.

Eu estava cansado, arrependido, triste e de saco cheio. Falei a verdade.

— Entendo... - ele respondeu, depois de minha confusa narração do que tinha acontecido. - Mas sabe? Tudo tem um lado bom... - não acredito que ele ia vir com aquele papo. - Nesse caso, você conseguiu beijar o Kagamine-kun e se declarou para o Shion-kun - ele apenas torceu toda a situação para parecer legal, já estava começando a ficar com raiva - E claro também isso me deu certeza de uma coisa...

— Do que, Kimura-kun? - retruquei, em tom amargo.

 Kimura-kun se levantou. Ficou de pé na minha frente. Apoiou as mãos dele nos dois encostos da minha cadeira. Aproximou seu rosto do meu. Disse:

— Que você pode me chamar de Mikoto - e me beijou com tudo.