Eu já estava começando a ficar entediada enquanto esperava pelo show. Não havia nada que eu pudesse fazer só ficar sentada vendo a passagem de som e, depois, ficar sentada no camarim enquanto a banda resolvia os últimos detalhes. Jeena havia tentado me convidar para um drink enquanto os rapazes trabalhavam, mas depois da nossa conversa eu não estava nem um pouco me sentindo confortável perto dela.

A imagem de uma quarentona com síndrome de Peter Pan tentando me alertando sobre o que poderia acontecer comigo e Aaron depois daquele show simplesmente havia me afetado. Eu tentei ao máximo não ligar para uma sílaba que ela disse, mas era inevitável. Se ela estava falando tudo aquilo é porque tinha algum fundamento. Digo, eu sempre soube que a paixão de Aaron era mesmo a música, ele sempre deixou isso bem claro pra mim. Ele nunca deixou de esconder seu sonho de se tornar um astro em nenhuma ocasião, não importa quem estivesse ao nosso redor ou onde estávamos. Mas ao mesmo tempo, eu sabia que ele me amava de verdade. Ele também nunca deixou de esconder seus sentimentos por mim. Mas eu já havia percebido várias vezes que se fossemos postas à escolha, a música e eu, com certeza eu não sairia como a vitoriosa.

“Então, como estou?”- Aaron chegou por trás de mim me beijando no pescoço enquanto eu estava sentada distraída numa penteadeira do camarim, olhando para meu reflexo. “Nada mal.”- eu disse enquanto ele virava minha cadeira para si. “Nada mal? Jura? Não tem nada melhor pra dizer não?”- ele insistiu mordendo o lábio. “Ok, você está... Cheiroso. E bonitinho.”- eu disse. “Ah qual é, Eve?”- ele disse com um tom brincalhão me levantando pelo braço e agarrando minha cintura, me puxando para um daqueles beijos. “Ok, você está muito cheiroso.”- eu continuei ofegante e parando para reparar realmente nele. Ele vestia um colete preto, parecido com o que ele havia usado no show da praia só que sem nada por baixo e um jeans de lavagem clara. O cabelo, como sempre, solto e maravilhoso. No pescoço, um medalhão que era de Ramona. Ela o tinha desde que dançava e era seu amuleto. Olhei para ele dos pés a cabeça e vi como ele estava irresistível, e que eu tinha sido uma otária por dizer que ele estava apenas bonitinho. Mas aí então, as palavras de Jeena rondaram minha mente e me fizeram gelar. “Aproveite enquanto ele ainda é sóseu”. Senti então, minha expressão mudar, fazendo com que ele percebesse e mudasse também a expressão. “O que houve?”- ele perguntou me apertando mais forte. “Nada, só estou... Nada. Não foi nada.”- eu disse nervosa. “Tem certeza?”- ele insistiu. “Tenho, tenho sim.”- eu disse me aproximando de seus lábios novamente.

Em segundos, Dupree e Jeena adentraram no camarim cortando toda a calma que pairava no lugar, o que era um milagre considerando que Lee estava no recinto. “Meninos, meninos e menina.”- ele começou olhando estranho para mim. “Chegou a hora. É hora de vocês mostrarem tudo que têm a esses bêbados malucos que estão lá fora não querendo nada mais que um pouco de diversão. Então, entrem naquele palco e provoquem orgasmos musicais neles!”- ele gritava espremendo o rosto de Seth, o outro guitarrista da banda. Aaron se segurou para não rir com as palavras de Dupree, que com certeza já estava completamente bêbado. “Acho que é isso então.”- ele disse sorrindo pra mim. Eu sorri de volta nervosa e segurando suas mãos. “Vai dar tudo certo. Eu tenho certeza.”- eu disse. Ele respirou fundo e em seguida me beijou na bochecha. “Eu sei que vai.”- ele disse me soltando e pegando a guitarra em seguida. “A propósito, eu te amo. Caso não saiba ainda.”- ele disse rindo pendurando a guitarra nos ombros. “Eu sei, mas é sempre bom ouvir de novo.”- eu disse rindo. Ele sorriu de volta e me mandou outro beijo, seguindo os outros e Dupree. Nesse momento, percebi que Jeena me encarava com aquele olhar matador dela. Foi difícil, mas consegui ignorar. Andei até a penteadeira e peguei meu crachá que me dava acesso ao palco, de onde eu assistiria ao show. Coloquei a fita no pescoço e andei na mesma direção que eles. Por sorte, Jeena ficou no camarim e não tentou nem me abordar de novo.

Quando cheguei à coxia, Dupree ainda estava com os meninos, dando as últimas recomendações e desejando-lhes boa sorte. Fiquei observando-os de longe, perto dos seguranças e das caixas de equipamentos. Aaron distraído estava afinando sua guitarra e tentando encontrar a posição perfeita dela em seu ombro. De repente, seu olhar se encontrou com o meu e ele sorriu. Sorri de volta e mandei um beijo como sinal de boa sorte. Ele pegou o ar, como se estivesse pegando o beijo e depois levou uma bronca de Dupree por não estar prestando atenção nele.

Tentei chegar mais perto e consegui ver uma parte do salão do Bourbon. O lugar estava lotado. Não havia espaço para se mexer naquele mar de gente. Todos gritavam entusiasmados e erguiam seus copos de cerveja gritando pela banda. Dupree, então, subiu ao palco e pediu que todos se acalmassem. Um holofote foi em sua direção e ele começou a falar com sua voz arrastada. “Senhoras e senhores, sejam muito bem-vindos ao Bourbon Room.”- ele disse fazendo todos gritarem novamente. “Como vocês já sabem, daqui a pouco uma banda tomará esse palco e fará vocês pularem, cantarem, dançarem e, provavelmente, baterem em muitas pessoas. Mas isso é o rock’n’roll. Então, sem mais delongas, vamos começar com essa diversão.”- ele disse fazendo uma pausa. “Essa noite, então, tocando pela primeira vez no Bourbon, a primeira de muitas assim espero, a nossa querida banda virgem, Blood Stain!”- ele anunciou saindo do palco rapidamente à medida que a banda entrava no palco.

Diferente do show da praia, a banda toda entrou junta no palco. Aaron parou no microfone principal e se ajeitou mais um pouco. Em seguida, olhou para Lee que bebia os últimos goles de sua cerveja. Ele fez o sinal de sempre e Seth os acompanhou, começando a dedilhar os primeiros acordes da primeira música. Izzy em seguida, começou a tocar também, oficializando assim o início do show.

Não precisou de muito para que a multidão começasse a pular e gritar. Lee já estava louco na primeira música e a loucura ia só aumentando conforme as músicas iam sendo tocadas. Nem nas mais lentas ele escondia seu lado quase natural. Aaron, por sua vez, estava maravilhoso. Em algumas músicas ele guardava a guitarra e interagia com a plateia, na maioria das vezes com meninas. É claro que fiquei com ciúmes, mas por alguma razão não liguei muito. Algumas inclusive conseguiam subir no palco e agarrá-lo loucamente. Uma, inclusive, conseguiu rasgar seu colete, deixando-o quase sem parte de cima. Depois desse incidente, ele saiu do palco e voltou sem camisa, com apenas o violão nos ombros. Agora sim, ele estava irresistível. “Ér, eu não sou muito bom com palavras. Quer dizer, até sou, né. Mas eu detesto fazer discursos.”- ele disse nervoso. “Então, eu vou logo dizer que essa música é para uma pessoa muito especial.”- ele disse se virando discretamente para mim e piscando. Ele começou a tocar, sozinho no palco, uma música que ele havia escrito para mim. No início da música, me senti completamente especial; meus joelhos tremeram e eu não conseguia parar de olhá-lo. Mas antes mesmo do segundo refrão, eu já me sentia indiferente em relação à canção. É claro que eu estava adorando ser a musa de alguém e ter uma canção dedicada a mim. Mas eu não me sentia bem. Era como se algo estivesse errado ali. Como se eu não pertencesse aquele momento ou aquela música. Ou quem sabe, como se eu não pertencesse a ele.

O show terminou logo após algumas músicas mais animadas. Lee saiu do palco cambaleando e entrou no camarim com duas loiras penduradas no pescoço, rindo e falando besteiras. Seth e Izzy entraram em seguida, rindo com garrafas na mão e toalhas secando o rosto. Aaron foi o último. Eu já estava lá antes mesmo do show terminar. Depois da minha música, eu não fiquei para ver o resto. Ele entrou no camarim também se secando. “Ei, boiola, vamos ao bar pegar umas bebidas.”- Izzy disse tacando a toalha nas suas costas. “Não é mais fácil pedir? Afinal somos a atração aqui.”- ele disse jogando a toalha longe. “É, mas Seth quer pegar algo mais além das bebidas.”- ele disse rindo e saindo pela porta. Aaron riu e finalmente me notou no sofá do camarim. “Ei, quando você ia me contar que estava aí.”- ele disse se aproximando. “Eu preciso contar que estou aqui?”- eu provoquei me levantando. “Cadê o Lee?”- ele perguntou. “Ok, é meio estranho você perguntar do baixista bêbado da sua banda quando está a sós com a sua namorada, mas tudo bem.”- eu disse cruzando os braços. Ele riu novamente descruzando meus braços. “Sempre ciumenta.”- ele me puxou pelo braço e tentou me aproximar dele. “Você está suado.”- eu disse com uma cara de nojo. “Sinal de que o show foi excelente, não acha?”- ele disse conseguindo colar meu corpo ao dele. “Pode ser.”- eu disse parecendo  indiferente. Ele riu e moveu suas mãos para minha cintura, me dando outro daqueles beijos. “É, acho que se pode dizer que o show foi bom.”- eu disse separando o beijo rindo. Eu ia me aproximando para outro beijo quando ouvimos a porta do camarim se abrir e, logo em seguida, uma voz grossa masculina ecoar no quarto. “Sim, Eve. Concordo com você; o show foi absolutamente excelente.”