Living Dead - EM HIATUS escrita por lolita


Capítulo 2
I - My Life Is A Play


Notas iniciais do capítulo

The State of Dreaming - Marina And The Diamonds



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Deitada de costas na grama com os pés mergulhados n’água fria de um dos riachos que cercavam o palácio, Annabeth pensava em como sua vida era uma mentira.

Todos que viviam ali no castelo sabiam que o Rei Frederick odiava Annabeth. Ele quase nunca dirigia a palavra para ela, e quando assim fazia, era sempre palavras rudes de repreensão ou reclamação por ela ter nascido. Isso deixara Elizabeth infeliz, que por outro lado era mais gentil, mas nunca tinha feito muito pela garota também. Annabeth ouvira rumores de que esta família já fora melhor antes, que o castelo fora mais alegre, e que até Bridgeport – que Annabeth só via aparecer o sol no verão, em outras estações a cidade era sempre nublada e fria – fora mais ensolarada, mas desde que Annabeth nascera tudo havia piorado, que ela era uma maldição que chegara para afundar o reino em melancolia.

Talvez eu seja mesmo” Annabeth pensava. “Não pedi para nascer, mas nunca fiz nada para todos me odiarem tanto”. Frederick nunca a havia olhado com simpatia. Annabeth queria confrontá-lo e perguntar qual era o problema, mas ele era difícil de conversar, de interagir, de se relacionar. Quando ela ia deitar-se, ela observava todas as noites ele ir à cama de Rachel e lhe dar um beijo de boa noite, e depois na de Silena, e então saía sem nem ao menos olhá-la. E Annabeth não conseguia dormir se perguntando o que havia de errado com ela. Às vezes ela ignorava a dor para se sentir no controle, mas a verdade era que ela só queria pelo menos um olhar de simpatia do pai. Mas Annabeth nunca diria como ela se sentia.

“Minha vida é uma peça, e eu sou a vilã odiada por todos”.

Annabeth se lembrou de algumas festas tradicionais que a família promovia todos os anos, quando sua mãe ia ao quarto avaliar os vestidos que as garotas usavam. Elizabeth passava os dedos pelos cachos dourados de Annabeth e falava: “Lembre-se querida, sorria sempre, temos que causar boa impressão às pessoas”. Annabeth assentia, e a verdade era que ela realmente tentava, mas os olhares de repugnância que todos lhe davam eram tantos que Annabeth se desanimava, e acabava passando a festa inteira cabisbaixa. Na maior parte da festa ficava do lado de fora do salão observando as estrelas e pedindo a elas que as pessoas a tratassem melhor, mas é claro, seu pedido não era atendido. Então ela endireitava os ombros e voltava para dentro, novamente forçando sorrisos para pessoas que nem conhecia.

“Minha vida é uma peça, meu papel é forçar sorrisos e fingir felicidade para todos”.

Annabeth ficou por ali um bom tempo. Ela crescera assim, sempre solitária, e seu rosto quase sempre ficava escondido atrás de algum grosso livro. Annabeth os amava, considerava-os seus melhores amigos, pois dentro da magia da leitura ela conhecera mundos incríveis, em que a vida era bem melhor do que a dela. Às vezes ela preferia lutar contra dragões gigantes que cuspiam fogo, a viver rodeada por pessoas que a fulminavam com os olhos; Então, quando não estava lendo, ela passava seu tempo do lado de fora, cavalgando, brincando com os cães de guarda, ou então apenas deitada observando o céu acinzentado de Bridgeport.

O que todos achavam mais perturbador era que enquanto suas irmãs aprendiam a se comportarem como verdadeiras damas, Annabeth gostava de lutar e treinar como um garoto. Ela treinava arco e flecha, esgrima e quando criança gostava de soltar estilingue com um de seus poucos amigos. Por isso suas mãos nunca estavam macias e bem cuidadas como de suas irmãs; Ela também era a única que tinha coragem de se aventurar para dentro da floresta, que ficava do outro lado do riacho. Annabeth simplesmente não conseguia sentir medo ao adentrar na névoa espessa da floresta, ela sentia uma estranha afinidade com as árvores altas, mas ignorara isso, achando que era só mais um traço de sua personalidade perturbadora. Isso também contribuíra mais para ser considerada esquisita pela sociedade.

– Annabeth! – A garota ouviu lhe gritarem e levantou-se para olhar o familiar garoto alto de cabelos pretos bagunçados e jogados no rosto e olhos verdes que caminhava em sua direção. Perseu era um dos poucos que não a julgava e a olhava com desprezo. Ele e sua irmã Rachel eram seus únicos amigos, os únicos que a acolhiam e a animavam quando esta se encontrava em mais um de seus dias de melancolia.

Quando pequenos, ela, Perseu e Rachel passavam muito tempo juntos se aventurando pelas fronteiras do castelo. Escalavam árvores, nadavam nos rios, cavalgavam juntos e brincavam fingindo que eram os donos do palácio. Embora às vezes tivessem certas briguinhas entre Rachel e Annabeth para decidir qual das duas seria a rainha, no final acabavam se divertindo de qualquer forma. Mas Rachel não era como Annabeth. Ela só ousara entrar na floreta com os dois uma vez, e no primeiro ruído que escutara, levara um susto tão grande que saiu correndo e gritando. Depois descobriram que era apenas um coelho.

– Ei, o que estava fazendo? – Perseu questionou.

– Nada, apenas pensando.

– Ora, você pode pensar o tempo inteiro, não precisa ficar distante para fazer isso.

Annabeth sorriu perante a tentativa dele de deixá-la mais próxima das pessoas. Ele sempre fazia isso. Se ao menos ele passasse pelo que ela passava, entenderia porque preferia ficar longe das pessoas.

– Rachel está preparando Porkpie para dar uma volta. Quer ir junto? – Ele a convidou.

– Sim, claro! – Ela sorriu. Porkpie era o cavalo branco de Rachel. Já Annabeth era dona de uma égua, também branca, chamada Pansélina, que vinha do grego Panséli̱nos, que significava Lua Cheia. Era uma bela noite iluminada pela lua enorme e prateada e Annabeth caminhava pela parte distante dos arredores do castelo e agradecia a Ártemis pela bela noite quando ouviu um choramingo por entre as árvores. Ela adentrou nas árvores para ver de quem – ou de quê – vinha o choramingo. Encontrou Pansélina ainda filhote. Estava abandonada e machucada. Annabeth carregou-a até o estábulo e cuidou da égua ela mesma; hoje ela estava forte, bela e saudável.

Perseu e Annabeth encontraram Rachel escovando Porkpie. Seus cabelos longos, ondulados e vermelhos caindo pelas costas.

– Ei, que bom que você veio. – Rachel deu um sorriso tristonho.

– O que você tem? – Questionou Annabeth, percebendo que Rachel estava um tanto abatida. Ela apenas balançou a cabeça em negação.

– Não é nada, vamos! – Ela montou em Porkpie, depois Annabeth subiu em Pansélina e Perseu subiu em Blackjack, um belo cavalo negro que era reconhecido por ser muito veloz.

Cavalgaram por entre as árvores durante um tempo até que decidiram pararem perto de um dos riachos para os cavalos matarem a sede. Os três estavam estranhamente silenciosos.

– O que está acontecendo? – Annabeth questionou, estranhando o silêncio.

– Olhe, eu não tenho certeza de nada, tudo bem? É apenas... Uma suspeita. – Rachel tentou tranquilizar Annabeth.

– Apenas uma suspeita, e está tão triste assim? Vamos, me conte. Talvez eu possa ajudar. – Ela insistiu. Rachel olhou para Perseu, preocupada.

– Parece que arranjaram um noivo para ela. – Perseu falou. Annabeth olhou assustada para Rachel.

– E vocês só me contam agora? Por que não me contaram isso antes? – Annabeth odiava não saber das coisas.

– Não tenho certeza de nada Annabeth, não ouvi muita coisa, por isso decidi não ficar falando o que eu não sabia. – Rachel tentou argumentar.

– Mas contou a Perseu. - Replicou Annabeth.

– Sim, é só que... - Rachel soltou um suspiro frustrado e desistiu

– O que quis dizer com “não ouvi muita coisa”? – Annabeth questionou. Agora eles cavalgavam lentamente, em uma calma caminhada.

– Eu estava saindo de nosso quarto, e ouvi papai conversando com alguém. Ele estava falando alguma coisa sobre mim, sobre eu já estar na idade de me casar e sobre... Alguém, papai não mencionou o nome, mas alguma coisa sobre alguém estar ganhando muito e de ser muito competido pelas moças de nosso reino, mas que ele ainda está à procura da noiva perfeita. – Rachel explicou.

– E o que você fez? – Annabeth questionou.

– Saí correndo. – Rachel deu de ombros. – Eu não quero... Vocês sabem mais do que tudo que a última coisa que quero é ser amante de um homem pelo resto da minha vida só por ele ser rico.

– Você não vai. – Annabeth falou; Rachel e Perseu a olharam com dúvidas no olhar. – Rachel, se eu a conheço bem, sei que faria de tudo para não ser obrigada a fazer algo que não quer. Você tem um grande ego.

Um vestígio de um sorriso apareceu no canto dos lábios de Rachel. – Todos nós temos irmã, todos nós. E sim, você me conhece bem. Mas a verdade é que não sei o que fazer. Se meu pai já tem em mente um pretendente para mim que o agrade, então isto significa que o dia em que serei pedida em casamento não tardará a chegar, e não consigo pensar em nada para fazer em tão pouco tempo. – Rachel falou frustrada.

– Quanto tempo? – Perseu questionou

– Se meu pai já se decidiu, menos de uma semana talvez. – Rachel respondeu.

Tudo o que Annabeth podia pensar era em como odiava toda essa história de casamento arranjado, em que duas pessoas eram obrigadas a ser amantes pelo resto da vida sem nem ao menos conhecerem bem uma a outra. Era tudo tão injusto! As pessoas deveriam ser livres para escolherem quem elas amavam e quem realmente gostariam de viver junto. Sua irmã tinha apenas 18 anos, ainda o resto de sua juventude para aproveitar, e de repente, sua liberdade seria arrancada por motivos fúteis!

Annabeth soltou um suspiro frustrado e olhou para Perseu, percebendo de repente como ele havia crescido e mudado. Ele era três anos mais velho que ela; alto e esguio, mas podia-se ver levemente seus músculos por baixo de seu casaco negro puxado até os cotovelos. Os cabelos negros sempre foram um tanto compridos, e com o entrar na adolescência, ele deixara de arruma-los, de modo que seus cabelos ficavam na maior parte do tempo uma confusão, mas mesmo assim bonitos; sua pele era levemente bronzeada – ela não sabia como ele conseguira isso, vivendo sempre embaixo da camada de nuvens de Bridgeport – fazendo um contraste com seus olhos verde-mar que fitavam o horizonte. Se ela não o conhecesse bem, poderia dizer que estava bem bonito.

Ela estranhou um leve sorriso nos lábios finos do garoto.

– Do que sorri Perseu? – Ela questionou.

– Hã? – Ele deu a impressão de que tinha sido arrancado de uma sequência de pensamentos.

– Algo em nossa conversa o agradou? – Rachel perguntou, também estranhando a expressão sonhadora dele.

– Não eu só estava, hum, pensando.

– Ora, você pode pensar o tempo inteiro, não precisa ficar distante para fazer isso. - Annabeth repetiu a frase que Perseu havia lhe dito.

– Haha, espertinha você não? - Perseu respondeu, sarcástico. Ela apenas riu e disse:

– Vamos, diga-nos no que estava pensando.

– No casamento arranjado de Rachel. – Ele respondeu.

– E isso o agrada? – Annabeth percebeu um leve tom de irritação na voz de sua irmã.

– Não! É só que... Quer saber? Por que a gente não volta? Minhas pernas já estão doloridas! – Perseu falou ansioso para mudar de assunto.

Concordaram em voltar caminhando enquanto puxavam os cavalos juntos a si. Enquanto voltavam, Rachel comentou:

– Deuses, como odeio tudo isso de ter que se casar!

– A vida é uma peça, na qual você é submetido a um casamento arranjado, na qual sua liberdade e escolhas são arrancadas de si próprio. - Annabeth respondeu, provocando um silêncio desconfortável ao trio.



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