Piper não queria que Leo tivesse ido embora. Estava gostando de conversar com ele. Parecia que ele sabia dizer a coisa certa na hora certa. Queria que todos a vissem logo de uma vez para poder ficar conversando novamente com o Garoto de Reparos. Uma coisa que a estava incomodando era o fato de ter lembrado o apelido. Será que falar sobre sua vida fazia com que os detalhes voltassem para sua mente? Se fosse assim, logo teria sua memória inteira de volta. Era o que esperava.

Pouco tempo depois de Leo ter saído outra pessoa entrou. Era um garoto chinês com cara de bebê. Ele pulou encima de Piper, envolvendo-a em um abraço apertado. Começou a murmurar coisas que ela não entendia.

– Meus deuses, obrigado por terem protegido-a. Estou em dívida eterna com vocês. Obrigado por me darem a chance de vê-la mais uma vez.

Apesar de estar completamente confusa, retribuiu o abraço, por achar que era a coisa mais educada a se fazer. Após alguns segundos, ele se afastou e tirou um cabelo do rosto da garota.

– Você sabe quem eu sou?

– Sim. Seu nome é Frank, certo?

– Você se lembrou? - a voz do garoto transbordava felicidade.

– Na verdade, eu só sei porque aquela garota que entrou aqui disse. Qual o nome dela mesmo? - Piper começou a estalar os dedos para tentar lembrar o nome dela.

– Se refere a garota de cabelos encaracolados?

A filha de Afrodite fez que sim com a cabeça.

– O nome dela é Hazel. É a minha namorada.

– Ela é muito bonita.

– Eu sei. – ele disse sem entusiasmo – Eu queria que você tivesse se lembrado. Nós somos amigos.

Frank baixou a cabeça e Piper se arrependeu de tê-lo desapontado. Ela só queria envolvê-lo em seus braços e dizer que tudo ia ficar bem. Tinha a sensação de já ter feito aquilo outras vezes.

– Estou tentando! – ela tocou em sua mão – Juro que estou. Mas vou precisar de sua ajuda. Por que não me conta sobre... a nossa amizade? Como a gente se conheceu?

Seu rosto se iluminou com a ideia. Ele começou a contar tudo com o máximo de detalhes possíveis, isso a estava ajudando a imaginar as situações. Eles haviam passado por tanto juntos. Ela percebeu que talvez tivesse pegado em um ponto fraco quando perguntou para Leo se ele tinha uma namorada. Ele havia ficado bastante esquisito, por isso saiu correndo daquele jeito. Piper se prometeu que ia pedir desculpas quando o visse novamente.

Uma coisa a deixava incomodada também. Quíron havia contado como ela chegara ao Acampamento antes da guerra, sobre a coisa toda da manipulação da Névoa e Jason. Enquanto Frank contava sobre como se conheceram, ela percebeu uma coisa: se não fosse por esse filho de Júpiter, por quem a filha de Afrodite sofreu muito, provavelmente não teria se tornado amiga de Frank. Talvez nem mesmo de Leo, se Hera não tivesse modificado suas memórias. Piper decidiu que tinha muito que agradecer a Jason.

– Então, foi assim que aconteceu. – ele disse, terminando sua história.

– Nossa, nós passamos por um bocado de coisas mesmo.

– É... espero que logo possa recuperar suas lembranças, ai tudo vai poder voltar ao normal.

– Não sei quanto tempo isso pode demorar.

– Como eu posso ajudar?

– Hum... quero que me conte sempre um pouco mais sobre minha vida. Pelo que percebi, isso ajuda um pouco. Enquanto você falava, em minha mente tiveram alguns...flashes, digamos assim. Lembranças despedaçadas.

– Eu posso falar sobre você o quanto quiser! – ele disse animadamente

– Tudo bem – ela riu – Só não agora, por favor. Temos muito tempo ainda. Sei que ainda tem gente querendo me ver e eu quero sair daqui o mais rápido possível!

– Então eu vou sair, sua apressadinha. – Frank deu um beijo na cabeça de Piper – Até o jantar, Mclean.

– Até, Zhang.

Aquela coisa de falar sobre a vida estava funcionando, ela se lembrou do sobrenome dele.

Piper passou as próximas três horas apenas conversando com outros campistas. A maioria foi muito legal, pareciam se importar mesmo com ela. Não gravou o nome de todos, apenas alguns. Annabeth e seu namorado, Percy. Dois garotos que eram praticamente iguais e que tentaram vendê-la uma promoção de xarope para tosse e flores de lótus, Connor e Travis Stoll. Rachel Dare, o oráculo do Acampamento. Will Solace, um filho de Apolo que foi muito gentil e trocou o curativo de seu braço.

Após sua última visita, ela já estava completamente exausta. Estava entediada e cansada de falar com pessoas que esquecia o nome cinco segundos depois. A filha de Afrodite se levantou e caminhou até a janela. Perto da praia, um casal estava de mãos dadas caminhando. Um sátiro e uma ninfa que usava um vestido verde com algumas flores vermelhas. Ele parecia tão sem jeito perto dela, muito nervoso. Ela parecia completamente apaixonada. Automaticamente, sentiu uma pontada de inveja. Piper precisava de alguém com ela naquele momento. Queria que essa pessoa dissesse que tudo ia ficar bem e que a abraçasse. Mas quem?

– Não se preocupe, logo poderá sair.

– Quíron, você me assustou! – a filha de Afrodite se virou rapidamente.

– Desculpe. Não foi minha intenção. – ele estava rindo

– Tudo bem. Eu já posso sair? - ela já se levantava da cama enquanto falava.

– Calma aí, mocinha. Ainda tem um campista que quer conversar.

– Mais um? Eu já estou cansada, quero sair desse quarto! Estou me sentindo dentro que uma caixa, vou acabar claustrofóbica! As paredes estão encolhendo?

– Seu bom humor não vai te tirar daqui mais rápido. Ele é o último, depois pode ir embora.

– Será que não posso conversar com essa pessoa mais tarde?

– Ele está fazendo questão de ser agora.

A filha de Afrodite bufou.

– Tudo bem.

O centauro se retirou. Quem era que ainda queria falar com ela?Não podia esperar para depois? Afinal, todos moravam no mesmo Acampamento. Se viam todos os dias. Qual a dificuldade de fazer isso depois?

Três toques na porta.

– Pode entrar.

Um garoto com os cabelos loiros e os olhos mais azuis que ela já havia visto entrou no recinto. Mesmo com a dificuldade que tinha agora para se lembrar das coisas, o reconheceu na hora.

– Jason... – ela murmurou

– Oi! – ele estava parecia muito feliz – Ainda bem que todos disseram a verdade, você parece ótima! Todos falaram isso, exceto os Stolls. Eles apenas ficaram resmungando sobre você ser pão dura demais e não aceitar a promoção que eles te ofereceram.

– Não queria xarope para tosse e muito menos flor de lótus. Não era vantagem aceitar.

Ele riu e se sentou ao seu lado na cama.

– Realmente não era. Então, mudando de assunto, você tá bem?

– No geral, sim. Só cansada de ficar sentada no mesmo canto e ouvir todos perguntarem as mesmas coisas.

– Percebi, ouvi você demorar bastante para aceitar que eu entrasse. Já estava para desistir.

– Foi mal.

– Tudo bem. Eu tava muito preocupado, sabia?

– É o que dizem.

– É a verdade. – ele segurou sua mão – Fiquei parecendo um louco quando soube o que havia acontecido. Eu queria saber se... tá tudo bem entre a gente. Depois de... você sabe.

– Depois de você ter escolhido a Reyna?

– Bom... é. Você se lembra?

– Só sei o que Frank me disse. Mas tenho a sensação de que isso tinha acontecido. Nós estamos bem sim, Jason. Você não pode mandar no seu coração. O que eu tenho que fazer agora é me concentrar em minha recuperação.

– Precisa mesmo. Se precisar, sabe que eu estou aqui para te ajudar, não sabe?

Ela suspirou e sorriu.

– Sim, eu sei. Você é bem leal. Como um cachorrinho.

Ele riu alto com aquilo.

– Eu não usaria essa comparação, mas é mais ou menos isso mesmo. Sabe, é muito estranho. A Reyna ficava com muita raiva quando eu estava com você. Mas quando soubemos que você havia desaparecido, ela foi uma das primeiras a se mobilizar para liderar os grupos de busca.

– Sério? - Piper não conseguia acreditar naquilo.

– Sério mesmo. Foi estranho.

– Deve ter sido mesmo.

– Pois é. – ele se levantou – Não pretendo tomar mais tempo de você.

– Falar com você não foi nenhum incômodo.

– Ainda bem. Vem, eu quero um abraço.

Piper se levantou e se aconchegou nos braços do garoto. Naquele momento, um sentimento veio à tona. Mas não foi aquele amor que ela sentia antes. Foi compaixão. Ela sabia que quando precisasse, teria um amigo ali para ajudá-la a se segurar.

– Jason.

– Oi.

– Obrigada.

– Pelo que?

– Por tudo. Por estar aqui quando eu precisava. Mas acima de tudo, obrigada por me fazer sofrer e crescer. Possibilitou que muita coisa boa acontecesse.

Ele ficou em silêncio. Ela tirou a cabeça de seu peito.

– Sabe, essa é a hora que você diz “de nada”.

– Não, essa é a hora em que eu digo “obrigado”. Obrigado por ter sido muito mais forte do que eu pude ser em muitos momentos. Como está sendo agora.

Piper não responder. Eles ficaram apenas sentindo o coração um do outro bater. Palavras não eram necessárias. A filha de Afrodite tinha certeza que ele sabia o que ela sentia, agora mais do que nunca.