Recém-nascida escrita por Cambs


Capítulo 20
Dezenove




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Sabe aquele momento em que você demora a assimilar o que ouviu e fica apenas parada enquanto todas as engrenagens do cérebro funcionam, rodam tanto até fazer com que você entenda tudo o que aconteceu e trazer uma resposta para a ponta da língua ou alguma reação para o corpo? Então, eu estava passando por isso agora. Mesmo que a minha reação já tenha aparecido e se materializado em forma de uma gargalhada.

— Uma ellenség? — falei quando falei de rir, ignorando o olhar praticamente raivoso de Yulio. — Ela? Tenha piedade.

Com uma carranca do rosto, Demetri fez Sierra se levantar. Virou-a de frente para ele e de costas para nós, levantou novamente a barra de sua blusa e abaixou o cós da calça logo depois. Ali naquele pedaço de pele, na base da medula espinhal exatamente como deveria ser, havia uma tatuagem feita de tinta preta. Eu estava afastada demais para ver claramente, mas a testa enrugada de Kyara era o suficiente para me fazer acreditar que Sierra era, de fato, uma ellenség, assim como Demetri dissera.

— Vocês estavam junto de uma ellenség? — Kyara virou-se para Rodric. Ela parecia ofendida, mas não com ele. Era como se estivesse ofendida consigo mesma por não ter reconhecido nenhum traço da verdadeira natureza de Sierra.

— Ela não é mais uma ellenség — Yulio pronunciou-se. As mãos do vampiro estavam atrás de seu corpo e cerrada em punhos. — Deixou de fazer parte do grupo há muito tempo.

— Isso é verdade? — Demetri perguntou para Sierra, ainda de frente para ele, mas agora livre das mãos do vampiro.

— A única coisa pior que a opressão é o ato de deixar-se oprimir — Sierra respondeu.

— Ajudei Sierra a escapar dos ellenséges que havia na região em que morava, logo depois ela pediu para continuar comigo — Rodric disse. — E assim ficamos até que Yulio se juntou a nós.

— Você ia levar uma ex-ellenség junto no seu plano de entrar para os Amattris? — perguntei a Rodric, mesmo sem precisar de uma resposta. Meu punho foi automaticamente fechado e infelizmente segurado por Ryan. Ah, mas eu daria outro soco naquele rostinho que segurava um sorriso.

— Entrar para os Amattris? — Elliot virou-se para mim. — Que tipo de loucura é essa?

— Longa história — Ryan encurtou.

— De qualquer maneira — Demetri atraiu a atenção de todos — conseguiram o que queriam. Vocês quatro irão para Hunyad.

Quatro? Antes que eu pudesse verbalizar a pergunta, Demetri virou Sierra novamente, deixando-a agora de costas para si e levou uma das mãos até a nuca da vampira, inclinando-se para segurá-la logo depois quando seu corpo ameaçou cair pela inconsciência dela. Yulio agitou-se ao meu lado e engatilhou a arma, efetuando um disparo que foi desviado quando Elliot segurou em seu braço. Rodric tentou ajudar, mas Demetri aproximou-se e o segurou por trás. Aquilo virara um ninho de confusão que começara com Sierra.

— Chega! — alguém gritou. Com Yulio solto e desarmado, Rodric livre do aperto de Demetri e Sierra ainda desacordada no chão onde havia sido deixada, Erin apareceu na porta do castelo. — Não quero essa bagunça na frente de meu castelo!

— Deixe, Erin — Kyara parou ao seu lado com os braços cruzados.

— Está abrigando o inimigo desde quanto, Erin? — Demetri deu um passo à frente.

— Eles não são inimigos — ela respondeu. — E isso não explica essa baderna que vocês estão fazendo aqui e muito menos o ataque que nos fizeram.

— Não fale asneiras.

— Não me desafie — o tom de voz de Erin tornou-se mais alto, assim como o queixo que fora erguido.

— Onde estão Louis, Alec e Anitta? — Elliot perguntou aos murmúrios para mim.

— Alec e Louis estão lá dentro, Anitta sumiu — respondi no mesmo tom.

— De que ataque está falando? — Demetri cruzou os braços.

— Do ataque em que três de vocês estavam presentes e que me levaram dois membros — ela inclinou a cabeça.

— Nossas ordens são para levar vocês até Hunyad. Vivos, de preferência.

— Tenho motivos suficientes para desconfiar que isto seja uma mentira — Erin caminhou com passos lentos até a frente do vampiro. — Nós nos conhecemos há muito tempo, Demetri, e você sempre foi confiável. Não venha me dizer que não sei das coisas, porque eu sei até mais que você. Se não foram vocês que nos atacaram é melhor que me faça acreditar ou você sairá daqui nem que eu tenha que expulsá-lo com unhas e dentes.

— Não fomos nós — Demetri disse pausadamente.

Erin cerrou os olhos e o encarou olho no olho. Suspirou quando, aparentemente, escolheu acreditar nele e voltou até o mármore da entrada do castelo.

— Leve seus companheiros e quem mais quiser daqui. Sem alvoroço, vocês Amattris se vangloriam demais da classe para esquecê-la desta maneira — cruzou os braços para observar o que seria feito a seguir.

— Vocês estão convocados a irem até Mégara — Elliot parou ao lado de Demetri.

— Pois diga a Mégara — Carlo apareceu atrás da esposa — que nós não vamos.

O olhar dos dois fora o suficiente para silenciar qualquer palavra. Demetri caminhou até Sierra e a pegou no colo, tomando o cuidado suficiente para mostrar a Yulio que ela não estava sendo maltratada. Elliot foi ajudá-lo e abriu a porta de trás do carro para que Demetri a colocasse lá. Em seguida, os dois passaram por Erin e Carlo para entrar no castelo, certamente atrás de Alec e Louis.

— Ela está bem — ouvi Ryan falando. — Aquilo é um golpe de Kyusho. Sierra só está desacordada.

— Não deixa de ter sido desnecessário — Yulio murmurou e encaminhou-se até o carro de Demetri e Elliot.

Quando Rodric começou a seguir Yulio, mandei que Ryan ficasse onde estava e segurei o braço do outro vampiro fazendo-o parar.

— Rodric — esperei até que ele olhasse para mim. — Por que Yulio defende Sierra desse jeito?

— Pelo o que eu sei, é porque ela lembra a filha dele — ele suspirou. Soltei seu braço e balancei a cabeça, absorvendo a informação. — Não fique tão surpresa, todos têm uma história.

— É por isso que ele queria entrar para os Amattris? — perguntei. — Por vingança?

— Não sei claramente todos os motivos de Yulio para com os Amattris, mas duvido que seja. Ele é rancoroso, é verdade, mas não sei se nem a filha dele morreu por culpa do clã.

— E isso faz diferença?

— O passado é tão importante quanto o futuro. Principalmente para pessoas rancorosas como Yulio, afeta certas decisões.

— Está me contanto isso pra me fazer confiar em você? — cruzei os braços.

Resfolegando, Rodric se afastou com um meio sorriso. Puxei Ryan pelo braço e caminhei com ele até Erin, Carlo e Kyara. Erin parecia mais calma enquanto os dedos de Carlo passeavam por seu flanco, como uma massagem terapêutica. Kyara, por outro lado, estava emburrada.

— Sinto muito por isso — murmurei para Erin.

— Não foi sua culpa — ela sorriu de canto. — São muitos acontecimentos para pouco tempo, certamente existem ânimos demasiadamente exaltados.

— O fato de Sierra ser essa elle alguma coisa é tão importante assim? — Ryan perguntou.

— Sim e não — Kyara respondeu. — Se ela ainda for um deles, estará agindo como agente infiltrada e sabe-se lá o que ela vai conseguir, isso se minha irmã não jogá-la na prisão do castelo. Se o que Yulio disse for verdade, eu não sei o que pode acontecer — suspirou irritada. — É a primeira vez que vejo uma ellenség que não quer mais ser uma ellenség.




Encostou-se no batente da porta e observou o treinamento dos dois vampiros. O corpo esguio da mulher favorecia seus movimentos juntamente com o antigo conhecimento sobre o manuseio do sai, que lhe tomava ambas as mãos. Seu oponente segurava a mesma arma e nas duas mãos, assim como ela. O tilintar dos sai ecoava pelo salão vez ou outra, sempre que eles se batiam para travar golpes e defender o corpo.

— Hey — decidiu chamá-los, afinal ainda tinha outro lugar para ir.

Fora ignorado. Os dois vampiros continuavam a treinar, mirando partes do corpo e fazendo linhas de prata no ar a cada vez que o sai era jogado para o ataque. Tilintaram várias e várias vezes e continuavam a ignoram os chamados.

— Hey! — gritou, finalmente sendo ouvido. A vampira aproveitou a distração e derrubou o outro, colocando a sola de sua bota em cima do peito ofegante do outro e direcionando a ponta dos dois sai que segurava para o pescoço dele.

— Perdeu outra vez, Bill — ela sorriu.

— Essa não valeu, Cat. E você sabe — Bill riu. — O que foi, Harvey? — virou-se para o vampiro na porta.

— Já terminaram? — Harvey riu. — Aly quer falar com vocês na sala de jantar. E é importante.

— O que é dessa vez? — a vampira jogou os cabelos loiros e lisos para trás e estendeu a mão para ajudar Bill a se levantar.

— Vai ter que ir até a sala de jantar para descobrir — Harvey cruzou os braços e suspirou ao ver as sobrancelhas erguidas dos dois. — Nem eu sei o que é, Caitlin.

Trocando olhares, Bill e Caitlin suspiraram e decidiram seguir com Harvey até a sala de jantar, do outro lado do castelo. Suada e ofegante pelo treinamento, Caitlin enrolou seus fios dourados na tentativa de fazer um coque, que logo se desmanchou pela falta do que o prendesse. Os sai estavam juntos em sua mão esquerda, enquanto os de Bill haviam ficado no local onde treinavam. O vampiro estava no mesmo estado que o dela, com seus cabelos escuros grudando em sua testa e no queixo, que era mais ou menos até onde os fios se estendiam.

— Deveria passar uma tesoura nesse cabelo — comentou ao virarem o corredor.

— Deveria cuidar do seu — Bill retrucou. Harvey ia a frente e, por sorte, escondera o sorriso. Aqueles dois eram cheios de respostas atravessadas, mas trabalhavam tão perfeitamente juntos que era difícil vê-los separados quando tinham alguma ação.

Chegaram à sala de jantar e avistaram Allyson sentada em uma das cadeiras de estofado negro perto da mesa. Ela encarava o lustre moldado no preto e dourado pendurado logo acima de sua cabeça e tamborilava os dedos finos e pálidos em um pequeno quadro repousado à sua frente.

— O que foi Aly? — Bill perguntou ao sentar-se a frente dela.

— Primeiro vocês terão que me prometer que isto não sairá daqui.

— Palavra de escoteiro — Caitlin suspirou e levantou a mão direita rapidamente, antes que colocar seus sai em cima da mesa.

— Prometemos — Harvey disse ao ver que Allyson daria uma resposta a Caitlin. — Agora nos diga o que é.

— São duas coisas — suspirou e pegou o envelope que estava escondido debaixo do quadro. — Isto está endereçado a Anthony, mas ele é a última pessoa que pode saber disso.

— É crime pegar a correspondência dos outros sabia? — Caitlin cruzou os braços. Revirando os olhos, Allyson entregou o envelope para Bill, que o abriu e retirou de lá um simples pedaço de papel.

“Os lugares mais sombrios do Inferno são reservados àqueles que se mantiveram neutros em tempos de crise moral” — leu em voz alta.

— Dante Alighieri — Caitlin completou.

— Por que alguém mandaria Dante Alighieri para Anthony? — Harvey questionou.

— E por que alguém mandaria isso para Anthony? — Allyson levantou o quadro. Ali estava pintado o retrato de uma mulher, sentada em um trono. O vestido lilás era bonito, com flores bordadas a mãos pela saia rodada e longa, junto com pequenas pérolas e fios de ouro. O cabelo negro estava trançado e jogado por cima do ombro. No rosto redondo, as bochechas estavam coradas e os olhos cor de mar miravam alguma coisa que só no momento da pintura se saberia para onde estava olhando, a boca levemente cheia estava levantada em um dos lados, mostrando o sorriso que deseja sair, mas que não podia.

— Lyanna — Caitlin sussurrou.

— Anthony não pode saber disso — Bill disse. — De maneira nenhuma.

Manearam com a cabeça e quase que ao mesmo tempo se recostaram nas cadeiras. Pensando e repensando no que acabaram de ver. Lyanna se fora há muito tempo e tudo que havia dela fora guardado e escondido, inclusive aquele quadro, que antes ficava nas escadas de uma das torres. Como aquele quadro havia saído do esconderijo e voltado endereçado a Anthony... Ah, isso ninguém sabia.


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