Recém-nascida escrita por Cambs


Capítulo 13
Doze


Notas iniciais do capítulo

Quem é vivo, sempre aparece.



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— Ela não está lá — anunciou com a voz inexpressiva ao parar ao lado do outro vampiro. Com as mãos enfiadas nos bolsos da calça, deixou um suspiro decepcionado escapar pelos lábios ao tempo em que suas pernas criavam um balanço, fazendo seu corpo ir de um lado para o outro enquanto a mente trabalhava.

— Fomos descobertos? — Anitta perguntou.

— Duvido — Louis respondeu sem interromper o ritmo de seu balanço. — Fomos descobertos, Alec?

— Apenas se a Mensageira nos entregou — os olhos de safira de Alec repousaram em Louis, determinados a fuzilá-lo. — Alguma coisa aconteceu, só nos falta descobrir o que.

— Aparentemente eles já sabem que Mégara os condenou, mas tem algo mais. Não fugiriam se fosse apenas isso. — Louis voltou a dizer, interrompendo seu balanço para escorar-se no tronco da árvore. — De qualquer maneira, eles estão se dispersando e fazendo com que nós falhemos na única missão depois de um século que nos foi dada.

— Vamos nos dividir? — as sobrancelhas castanhas de Anitta juntaram-se com a testa franzida.

— Porque você apenas faz perguntas? — Louis olhou para a vampira. — Mas sim, nós vamos nos dividir — suspirou e voltou o olhar para Alec, cruzando os braços antes de continuar. — Alec, vá atrás da sua namorada. Eu e Anitta vamos conversar com os Mottris ainda restantes no castelo.

— Você não é meu chefe, Louis.

— Diga isso para Mégara — o escárnio na voz do vampiro encerrou a discussão, fazendo com que o outro saísse entre bufadas e em marcha.





31 de Outubro de 1420



— Eles ficam tão bonitos juntos — Mégara murmurou, observando Anthony e Lyanna dançando entre os camponeses. Voltou a levar a maçã que segurava à boca e a mordeu, comprimindo os lábios para que o sumo da fruta não escorresse por seu rosto. Ela viu Marco concordar com a cabeça e virar as costas para o centro da praça, ficando de frente para a grande mesa do banquete, onde ele, Mégara e diversas outras pessoas surrupiavam comida vez ou outra.

A festa de Samhain¹ estava mais alegre esse ano, talvez pela chegada dos viajantes burgueses na pequena vila ou pela abundância que tiveram na colheita passada. O vento trazia algumas das folhas alaranjadas para o centro da comemoração, mas eram ignoradas com os passos de dança e com as risadas altas. A cerveja e o vinho também ajudavam na alegria, assim como as comidas e o teatro de rua.

— Está calado, Marco — a esposa virou-se para o marido, deixando que sua mão fosse de encontro com seu braço coberto pelo algodão que formava sua camisa. Ele a encarou por um minuto e virou o corpo até ficar de frente para ela.

— São apenas lembranças — Marco suspirou, passou os dedos pela seda negra que era o cabelo de Mégara. — Não precisa se preocupar.

— Memória pode ser a ruína de uma pessoa — ela sorriu de canto e desvencilhou-se do marido, partindo para o centro da praça onde havia a dança. Bem sabia que o marido preferia o isolamento quando estava daquele jeito, e, de qualquer maneira, seria divertido dançar com Anthony e Lyanna.





Já vi e passei por várias e diversas coisas desnecessárias. Treinamento em plena lama, lycans, uma tarde com as Encantadas e até mesmo uma semana como babá de uma criança vampira e demoníaca. Mas certamente nada como um vampiro sentado ao meu lado, praticamente sem respirar, olhando fixamente para as amarras que apertavam meus pulsos. Claro, é de suma importância que eu esteja amarrada dentro do carro, já que eu posso simplesmente pular para fora e fugir. Bem meu amigo, detesto informar, mas meus dias como Evelyn Salt já terminaram. Meu único consolo encontrava-se no fato de que Rodric dirigia como um maníaco, o que faria com que a viagem acabasse mais rápido.

— Porque tão calada, Sophia? — o canto da boca de Rodric contorceu-se, mostrando o quão contente estava o vampiro por ter encontrado algo com o qual poderia me irritar.

— Uma vez disseram que se não se pode dizer algo de bom, é melhor não dizer nada.

— Bonita filosofia para alguém tão hostil — Yulio murmurou ao meu lado, deixando-me surpresa por um momento, afinal aquela fora a primeira vez que ouvi a voz do vampiro desde que saímos do estacionamento do Gresham Palace.

— Hostil? — arqueei a sobrancelha. — Ora, mil perdões. Da próxima vez, coloco flores na sua cabeça.

— Deveria engolir as flores para ver se perfuma a língua — Yulio revirou os olhos e desistiu de continuar encarando minhas amarras, jogando-se para trás e deixando as costas encostarem-se ao banco. Rodric fez uma curva demasiadamente acentuada e fez com que meu corpo fosse totalmente para a esquerda, tendo a minha cabeça indo para um encontro certeiro contra a janela e minhas pernas ganhando posição em cima do banco. E, claro, tive que aguentar o corpo de Yulio caindo sobre o meu por cinco segundos. — O Venerem não vai mudar de lugar, Rodric — ele reclamou enquanto me puxava pelo cotovelo, fazendo com que eu me sentasse novamente.

— Vocês estão me levando para um Venerem? — ouvi minha voz subir algumas oitavas. Sinceramente, um Venerem era um dos últimos lugares em que eu esperava terminar a noite e encontrar Ryan.

— Temos os subterrâneos dos Venerem, você não vai ter que se preocupar em ficar no andar de cima — Rodric ergueu uma das sobrancelhas. — O que é uma pena.

Suspirei frustrada e recostei-me no banco. Venerem Stimulat, um dos lugares que eu mais detestava. O local era alguma espécie de casa noturna vampiresca, onde certamente nasceu grande parte das lendas de luxúrias que envolviam os vampiros. Não era de se surpreender, na verdade. O Venerem podia ser classificado como um “antro de perdição” e “centro de luxúria”, tão antigo quanto os Quatro Grandes e imortal como os vampiros. Sexo, música e sangue, junto com a submissão, o poder e a violação de regras. Estavam espalhados pelo mundo, com a maior concentração na Europa.

Com mais uma curva e alguns metros, Rodric estacionou o carro na frente de um prédio antigo. Yulio desceu e logo em seguida me puxou para fora, batendo a porta ao meu lado.

— Não tente fugir — ele praticamente cuspiu as palavras enquanto seus dedos retiravam as amarras de meus pulsos, agora com a pele totalmente avermelhada.

— Pelo menos não agora — murmurei, esperando que ele não ouvisse. O que certamente não aconteceu já que o vi sorrir de canto antes de virar as costas e encaminhar-se para as grandes portas de madeira do prédio. Rodric parou ao meu lado e passou o braço por minha cintura. Antes que eu tivesse tempo de reagir, o vampiro cabeludo já estava me levando para dentro, com Yulio na frente da caminhada. — Faça o favor de me soltar.

— Vai ser melhor se ficar por perto — Rodric respondeu, empurrando-me para o lado quando um humano brutamonte e bêbado passou.

Dentro do Venerem, meus ouvidos foram pegos de surpresa pela música eletrogótica absurdamente alta que reverberava pelas paredes amplas e totalmente decoradas da “casa noturna”. O teto de abóbada era enfeitado por imagens e por um castiçal gigante de cristal, erguido com uma corrente grossa e enferrujada. Havia lampiões a gás pregados nas paredes e dispostos por todo o perímetro. Passamos pela multidão de vampiros e humanos dançantes até uma porta de madeira avermelhada e de topo arredondado. Rodric colocou-me atrás de si e junto de Yulio entrou pela passagem e desceu as escadas ali escondidas, fazendo um sinal indicando que eu deveria descer também.

O subterrâneo era bem diferente do andar de cima, mesmo que a música ainda pudesse ser ouvida. As paredes eram frias e próximas uma da outra, eu poderia livremente encostas as mãos em ambas. Mais a frente havia um corredor aparentemente sem fim, com algumas portas espalhadas por sua extensão.

— Esperem — Yulio parou de modo brusco, quase fazendo com que Rodric quase batesse nele. Ele desceu os degraus restantes devagar e pegou alguma coisa do bolso intero na jaqueta, parecia uma arma. Sinalizou para Rodric prestar atenção nos sons e encaminhou-se até a primeira porta no corredor. Rodric mandou-me ficar onde estava e seguiu Yulio, com tanto cuidado quanto o outro. Pararam por um minuto em frente à porta e logo em seguida entraram no cômodo, desaparecendo completamente do meu campo de visão.

Ficar parada ali. Claro, com toda certeza. Desci os degraus que faltavam, e, antes que eu pudesse chegar até a porta, meus cabelos foram puxados com força para trás, fazendo-me cair.

Levantei tão rápido quanto caí e fui jogada contra a parede, batendo a cabeça e voltando para o chão frio. Com pontos de luz em minha visão, descobri quem era o meu agressor no momento em que ele me levantou pelo pescoço. O vampiro usava roupas negras e tinha corte militar nos cabelos que aparentavam ser loiros, seus braços eram o triplo do tamanho dos meus, amontoados de veias saltadas, e seus olhos de safira não demonstravam qualquer emoção. Seus dedos começaram a apertar meu pescoço, cortando meu ar. Eu balançava as pernas e por duas vezes tentei chutá-lo, mas era previsível demais e o vampiro conseguiu desviar de ambas tentativas. Minha visão passou a escurecer e eu ainda não tinha conseguido pensar em nada para me tirar daquela situação, nada além de chutes fracos e unhas cravadas no braço do agressor.

— Quem? — consegui falar entre um ofego e outro. Já que tudo indicava a minha morte iminente, acredito que eu merecia, ao menos, saber quem havia mandado aquele vampiro atrás de mim. Porque era claro que alguém estava pagando-o por isso, eu só não sabia se o vampiro a minha frente era um ellenség, um caçador de sangue ou um contratado qualquer.

Antes que o vampiro pudesse me responder, se é que ele ia me responder, Yulio apareceu por trás e o afastou, fazendo com que o vampiro soltasse meu pescoço e eu fosse mais uma vez para o chão. Entre minhas tosses e o desespero para recuperar o ar, consegui ouvir os três tiros que Yulio disparou, acertando o peito do vampiro.

— Ande — ele me ajudou a levantar e começou a me levar para o cômodo que ele e Rodric haviam entrado anteriormente. Não era um local amplo e parecia ainda menor com o número demasiado de pessoas. — Tem alguma arma? — em resposta, eu levei a mão até a bota, tateando o couro até conseguir puxar a adaga que havia conseguido trazer. — Que antiquado.

Ele me encarou por alguns segundos e depois saiu, partindo para cima de outro vampiro e disparando balas no corpo do inimigo. Olhei ao redor e vi Rodric na mesma situação que Yulio. Mais atrás de Rodric, perto de uma vampira de cabelos escuros, estava a pessoa que eu queria ver, mesmo que não naquela situação. Ryan estava deitado no chão, junto com uma poça de sangue. Corri até ele e me abaixei ao seu lado, tentando descobrir de onde vinha tanto sangue.

— Ryan! — chamei, levando minhas mãos até seu rosto, balançando-o na tentativa de fazê-lo abrir os olhos. — Vamos cara, vamos — abaixei a cabeça até seu peito, onde consegui ficar menos agitada ao constatar que seu coração ainda batia. Sacudi seus ombros e encontrei a ferida que causara a perda de sangue, a região do colo estava completamente coberta pelo líquido escarlate e ali, escondida pelo sangue, havia a marca de uma mordida. — Não. Por favor, não.

Durante o meu lamento e negação dos fatos, meus cabelos foram puxados novamente, levando-me para longe de Ryan e me puxando para cima, obrigando-me a ficar em pé. Com um único empurrão, o novo agressor deixou-me contra a parede. Este era quase idêntico ao anterior, sendo que a única diferença era a linha de sangue que havia perto de seu olho e uma cicatriz pequena no centro do queixo. Sem a vontade de ser estrangulada mais uma vez, chutei a coxa do vampiro e consegui afastá-lo o suficiente para pegar seu braço e virá-lo para trás, quebrando o membro e fazendo-o urrar de dor. Aproveitando a distração, pulei nas costas do vampiro e posicionei minhas mãos em seu pescoço, determinada a quebrá-lo. Defendendo-se, o vampiro começou a se debater, tentando me derrubar e, quando viu que isso não funcionaria, ele foi cambaleando para trás, até conseguir me espremer contra uma parede. Meu maior azar foi o lampião a gás que quebrou com o baque, deixando estilhaços de vidro em minhas costas.

— Saia daí — o vampiro urrava com raiva, enquanto ia para frente e para trás, fazendo com que os pedaços de vidro penetrassem cada vez mais em minha pele devido as batidas contra a parede. Eu começaria a forçar meus braços para virar o pescoço do vampiro, mas seu corpo tremeu e caiu sem vida antes que eu pudesse atacar, levando-me junto para o chão, mais uma vez. Vi Rodric parado a minha frente, segurando minha adaga e com uma das mãos estendida em minha direção. Depois que levantei, Rodric levou os dedos até as minhas costas, retirando de lá um pedaço de vidro fosco e um grito abafado de minha parte.

Ignorando meus machucados, procurei por Ryan e o encontrei novamente em uma situação que eu desejaria que não estivesse acontecendo. Com a cabeça no colo de uma vampira, Ryan parecia não estar respirando e continuava inconsciente, a diferença agora é que o pulso da vampira estava encostando em sua boca.

— É isso ou ele morre — Rodric me segurou quando fiz menção de me mexer. — Mas você ainda pode escolher o que vai fazer, Sierra não lhe deu sangue o suficiente.

E então era isso. Agora eu tinha que escolher se deixaria Ryan morrer ou se deixaria a transformação continuar, fazendo com que ele virasse um monstro. Odeio escolhas. De verdade. Na verdade, não há saída. E nem escolha. Não preciso de outra Lena em minha memória, e eu sabia que com Ryan seria pior do que com Lena. Como eu disse antes, é isso então.

— Faça — minha voz não passava de um sussurrou e eu me permiti sangrar, por dentro e por fora, enquanto eu observava um anjo tornar-se um demônio.


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Notas finais do capítulo

Demorei, sim, e vocês podem me bater por isso. Mas devo avisar também que o próximo capítulo também vai demorar porque dia 10.06 começa a minha semana de provas e ç__ç

¹Samhain = neste caso, é o mesmo que halloween. (O festival de Samhain em si é a passagem de ano para os celtas)

Preciso falar alguma outra coisa? Acho que não x__x
Well, that's all folks :3

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