Absinthe escrita por Moira Kingsley


Capítulo 14
Capítulo 14


Notas iniciais do capítulo

Um capítulo mais curto, porém, necessário. Febe, eu só gostaria de agradecer novamente pela sublime recomendação. E quero dizer que vocês, leitores, são a minha base e o meu apoio. Muito obrigada!



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Ártemis nunca notou como a noite poderia ser tão lúgubre e acolhedora. Ela foi envolvida e engolida pelas sombras pela primeira vez. Pois, nada a confortava e se somente o frio do sombrio céu do mundo despertasse o mínimo de alento que as palavras escondidas em sua boca proibiam de dividir com qualquer um, ela não ligava e deixava ser levada pelas sombras durante os primeiros dias que voltara ao Olimpo.

Quando Ártemis pisou em seu castelo, era como se lá não existisse chão. Ela parecia um fantasma, quase levitando sem vida. Foi difícil de reajustar a sua vida. Era como se, ela não pudesse ser a Ártemis de antes. Como se sua força tivesse desvaído.

Enquanto a Apolo, ela não tinha notícias desde... Bem, ela nem queria pensar no que tinha acontecido. Só a menção causava uma angústia detestável. Entretanto, algo dentro dela sentia alívio, pois, ela pedira um tempo e era isso que estava recebendo agora.

No momento em que Afrodite apareceu a sua porta, depois de ouvir os cochichos de ninfas sobre a volta de Ártemis acontecer tão repentinamente e a ausência de qualquer fervor que antes enchia o seu castelo ser apavorante, Afrodite deu um sobressalto e sofreu em antecipação. Porque, qualquer que fosse o motivo para Ártemis voltar tão rápido e tão silenciosamente não poderia ser bom.

– Eu não quero falar sobre isso. – Proibiu afadigada quando a deusa do amor a questionou sobre o assunto.

Não adiantava. Por mais que Afrodite quisesse tirar alguma coisa sobre o ocorrido da deusa da caça ela desconversava, respondia com outras perguntas, mudava de assunto ou sorria tentando aparentar seguridade, todavia, seus sorrisos eram sempre infelizes.

– E as suas caçadoras? Você voltou há três dias e ainda nem deu sinal de vida ás garotas. – Afrodite perguntou vencida pelas evasivas em resposta.

Á isso, Ártemis prendeu a respiração. Ela não podia se mostrar desse jeito ás suas estrelas. Absolutamente não. Como ela iria comandá-las e aconselhá-las? Como ela iria ostentar a força que não tinha? Ártemis se sentia uma piada.

– Em algum momento, você terá que combater essa auto piedade. Eu não sei o que aconteceu durante aqueles dias com Apolo. Mas, qualquer coisa que seja, está te corroendo e o pior de tudo: você está deixando, Ártemis! – A ruiva não a reconhecia. Quem era aquele esboço mal feito da destemida Senhora da Caça?

Afrodite a deixou sem dizer mais nada e Ártemis sentiu o buraco no peito a machucar novamente.

Quando todos já sabiam da volta de Ártemis para o Olimpo – já que Afrodite não era nenhum monge com voto de silêncio – houve algumas perguntas, naturalmente. Todas desviadas e evitadas pela deusa. Ártemis também se esquivava de notícias do paradeiro de Apolo.



***


– Olá, Atena. – Ártemis acenou para a meia-irmã com um sorriso leve. Tinha sentido falta dela. Estava no castelo de Atena. Mais precisamente em sua varanda. As cortinas eram brancas como flocos de neve e a deusa da sabedoria estava sentada perto de uma pequena mesa redonda, com gravuras artesanais de dragões orientais.

– Ártemis! – Ela exclamou, fechando um livro de tecido Borgonha. – Quem bom que venho me visitar. Aceita um chá? - Ártemis assentiu. Atena era afeiçoada a chás no final da tarde. Um hábito britânico que ela contraiu há décadas.

– Chá preto. Meu preferido. – Ela comentou derramando o conteúdo de um delicado bule na xícara de Ártemis e logo depois, reenchendo a própria. – A cafeína desse chá faz o corpo revigorar e afia a mente. – Atena acrescentou mexendo a cabeça e se sentando.

Foi bom, gastar o tempo conversando com Atena. Ártemis diria que fora... Estimulante aos seus neurônios. Ela ainda não conseguia falar normalmente. Poupando muito a lábia. Não porque gostaria e sim por não ter o que dizer sem transparecer tristeza. O que geraria pena e isso, ela já estava cheia.

Entretanto, fora explícito de observar as olheiras em baixo dos olhos não tão calorosos de Ártemis e a expressão de devaneio, para Atena. O que o Olimpo murmurava sobre a viagem de Ártemis e Apolo acendia várias teorias. Mas, Ártemis parecia desconhecedora dos cicios.

Atena pôs uma mão abaixo do queixo para apoiar a cabeça e fitou Ártemis. A outra deusa cruzou os braços e disse:

– Pergunte. Vamos, eu sei que quer perguntar sobre a ida à Nova Iorque. – Ártemis parecia cansada de tantos questionamentos. Mas ela não iria expor mais do que tinha exposto aos outros. Nem mesmo para Atena. Era humilhante e íntimo demais. Ela não conseguia imaginar com quem dividir esses acontecimentos a não ser... Bem, a não ser com Apolo.

– Eu não quero. – Ela replicou calmamente. O que fez Ártemis franzir um pouco o cenho. – Você deixou muito claro que não deseja tocar no assunto e eu respeito isso. – Ela disse recostando-se na cadeira.

– Eu sei onde ele está. – Atena falou olhando Ártemis nos olhos. A deusa da sabedoria tinha ciência que Ártemis não sabia do paradeiro do deus do sol.

Ártemis engoliu em seco. E nem ao menos notou quando perguntou, a voz consistindo em algo entre desespero e curiosidade:

– Ele está bem?

– Eu creio que sim. – Atena respondeu levantando e abaixando os ombros. – Apolo ficou no hotel. Ele ainda tem mais uns dias pagos, então... – Ártemis levantou as sobrancelhas a isso.

Ela tinha começado a imaginar. Imaginar como seria a vida dela do lado dele. Era bobo de se fazer, porque, sempre terminava nela molhando um travesseiro de lágrimas. Às vezes ela se pegava, fantasiando de olhos abertos. Sonhando com abraços, beijos. Ela ainda podia sentir as mãos dele no seu corpo. Ainda sentia arder.

Ártemis não soube ao certo o porquê, havia algo na sua cabeça que ainda não se encaixava, então ela olhou Atena e perguntou mudando drasticamente o assunto:

– Atena, você se lembra de Ananque?

Atena tomou um gole de seu chá e estreitou os olhos para Ártemis pelo desvio da conversa, mas depois somente assentiu:

– É claro que sim. A antiga deusa do destino.

– Sim... Você sabe dela?

– Ártemis por onde você andou esses trezentos anos? – Ela perguntou rindo em descrença. – Papai a exilou, não lembra? De fato, ela é uma falsária. Contava mentiras. Papai sempre me disse para ficar longe dela. Por mais que ela me parecesse culta e refinada, eu nunca troquei uma palavra com ela. – Atena pôs um cacho atrás da orelha e acrescentou:

– Papai não gostaria.

– Sim, sim. Eu me lembro... – Ártemis falou um pouco atordoada.

– Mas por que a pergunta? – Atena questionou com visível curiosidade. Porém, Ártemis ignorou a indagação com outra:

– Você sabe onde ela está? – A deusa podia apostar que Atena sabia. Afinal, ela sabia de tudo. A outra deusa hesitou, decidindo se deveria dizer ou não. Entretanto, não era como se Ananque fosse um Titã e devesse ser mantida a sete chaves, certo?

– Sim, Zeus me falou. Ela fica em uma torre antiga perto do rio Estige. Na floresta mais próxima. A Tortuosa.

– A Floresta Tortuosa?! – Ártemis se remexeu na cadeira, deixando suas mãos deslizarem no tecido da calça. – Deuses, o que essa mulher fez de tão grave para estar lá?

– Eu também achei um tanto exagerado. Mas, ela está segura na torre. Existe um guarda. Ele é surdo, pois, papai não queria que ninguém ouvisse as mentiras dela, com receio que Ananque pudesse fazer a cabeça de alguém. Porém, é bem forte. Um guerreiro que perdeu as orelhas em uma guerra há éons atrás. – Ela adicionou. – Ele deixa néctar quando é necessário. Bem, é tudo o que eu sei.



***

Ninguém nunca falou muito sobre Ananque. Até mesmo nos escritos mais antigos sobre os deuses gregos tudo era minimalista e simples sobre ela. Ártemis, as poucas vezes que a viu, percebera que era uma mulher reservada. Porém, a única vez que ouviu a sua voz fora na noite do seu primeiro Solstício de Inverno. E logo depois ela foi exilada e ao passar do tempo, esquecida.

Mas, sabe quando existe aquela sensação, aquele embrulho no estômago? Um que te impede de pensar em nada a não ser aquela coisa? Todo mundo já presenciou ou vai presenciar isso na vida.

E Ártemis tinha um impulso que a ligava à deusa. Ela queria entender as estranhas místicas palavras que saíram dos lábios de Ananque. Porque Ártemis ansiava se manter, segurar-se a uma esperança. Qualquer uma. Era custoso de interpretar.

Ela ficou com isso martelando na cabeça. E manter-se enclausurada em casa somente a fazia piorar com as lembranças de Apolo. E logo ele voltaria. Ártemis queria vê-lo. Ver o seu rosto. Ver se estava tão abatido quanto o dela.

Aquela noite, Ártemis destruiu o seu quarto. Ela estava em pânico. Pois, tudo era muito pesado. Ela sempre foi tão autossuficiente, cheia de si e agora, sentia-se um maltrapilho. Algo que foi usado, mastigado e cuspido.

E como ela queria odiar.

Mas, seu coração era teimoso, irrefletido.

Então, cansada de jogar objetos na parede, ela se sentou na cama cheia de penas vindas de travesseiros esfolados. Suas juntas doíam. Ela flexionou os dedos, sentido as batidas do coração amornarem.

A deusa levantou de supetão, decidida. Chega de sombras. Chega de se esconder. Ela precisava das últimas respostas para sossegar e poder seguir em frente. Ártemis abriu a porta e apesar de dar de cara com algumas ninfas que a serviam, – elas estavam todas muito apreensivas com o barulho e os gritos que Ártemis tinha dado, trancada em seu quarto – ela desconsiderou as perguntas “está tudo bem, senhora?”, “precisa de alguma coisa?”. As ninfas só queriam ajudar, ela sabia. Todavia, Ártemis se preocupou mais em chegar ao seu arsenal.

Era uma sala com luzes fluorescentes e tinha cheiro de metal. Ártemis pescou algumas adagas e vestiu um cinto, pondo-as lá. Pegou sua aljava e alisou seu arco prateado, fechando os olhos.

Se iria para Floresta Tortuosa, precisava estar preparada.


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Notas finais do capítulo

Eu realmente não entendo: São tantos deuses com "A" no nome! Ai, Atena, amo-a tanto. Tava com saudades dela u_u Pena que não sou sua filha... *chorei um pouco aqui, mas já tô bem* Floresta Tortuosa... Nome engraçado, né? Bem, ela não existe como vocês já devem saber rsrs Reviews? O que vocês acham que vai acontecer?