Absinthe escrita por Moira Kingsley


Capítulo 12
Capítulo 12


Notas iniciais do capítulo

How you doin'? Eiii, esqueci de dizer: vê, para quem não sabe, ou não pesquisou no google, quem é a Ananque (que apareceu no capítulo anterior, lembra?), ela é uma antiga deusa responsável pelo destino.



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Apesar de todo alvoroço causando sua cabeça pesar sobre seus ombros, Ártemis, ao se afastar, deu um pequeno sorriso forçado. E o fitou.

Suas órbitas continham um calor intenso, que quase machucava. Porém, Ártemis continuou a olhá-lo nos olhos, porque havia algo neles, de um teor magnético e por mais que ela quisesse negar – e como ela queria –, Ártemis se sentia desejando por isso. Pois todas as vezes que ele a observava com aquele olhar (um olhar desesperado, ansioso e desejoso), ela se sentia, de alguma forma, em controle. Mas lá no fundo, ela se sentia querida e algumas vezes um arrepio involuntário corria por sua espinha.

E depois de tudo que ela tinha provado da vida, os dissabores e as alegrias de uma longa existência. Mesmo que fosse incumbida de uma jornada pura, Ártemis conhecia o desejo por nome, e sabia da destruição que essa súbita emoção causava.

E então ela suspeitou.

Talvez essa suspeição sempre estivesse lá, no seu subconsciente, rachando as bordas da sua mente. Ao perceber um tipo de tensão entre ela e Apolo que estremecia todo seu corpo, até os ossos. Entretanto, o orgulho a blindava.

Mas agora não. A lembrança daquele dia na floresta quebrou seus escudos. Os escudos que com tanto empenho ela construiu. E ela estava com medo.

Porque não, Ártemis nunca ansiou pela reconciliação dos irmãos. E naquele momento, olhando frente a frente Apolo, seu coração clamava por algo proibido. E isso era sacrilégio. Uma traição aos seus ideais, aos seus juramentos e a sua concepção. Só que ela sabia que sempre esteve lá.

Mas ela ainda estava sorrindo. Um sorriso que não chegava aos olhos, Apolo notou. Ele a enxergou. Como se pudesse ver a sua alma, o tumulto dentro dela. E nesse pequeno espaço de tempo em que se encaravam, ele percebeu que ela sabia.

Porém, para quê?

Era a primeira vez em muito tempo que eles se liam como por uma conexão que há muito tinha se rompido. Mas, ele estava errado. O que Ártemis entendia era desejo e o que ele sentia em suas veias era maior.

Então, foi a vez dele de fugir.

Apolo sabia o quanto essa vontade de tê-la seria devastadora. Não, vontade não. Necessidade.

– Esqueça. – Ele disse em voz baixa, quebrando o olhar. – Você está correta. Eu me precipitei. – Apolo passou as mãos pelos cabelos negros e suspirou, fitando o chão.

Quem eram eles para admitir qualquer coisa? A teimosia era um fardo que os dois carregavam. E talvez, não dizer em voz alta o que foi percebido, fosse mais fácil. Não estariam quebrando nenhuma regra, certo?

O sorriso fino nos lábios de Ártemis desapareceu em um instante. Mas que droga era aquela que ela sentia na barriga? Algo na sua dimensão emocional se precipitava. Um frio inexplicavelmente receptível.

– Não. – Para sua total surpresa, sua voz estava controlada, apesar dos lábios secos. – Você cumpriu com a sua parte mais cedo e não é do meu feitio desonrar acordos. – Ártemis viu os músculos de Apolo tencionarem por um momento. - É claro que eu não farei nada que eu não queira, tenha isso em mente. – Ela acrescentou determinada, buscando o olhar do deus.

Ele assentiu olhando para ela. Ártemis viu um lampejo de dor e melancolia no rosto dele. Ela não sabia bem porque estava concordando. Provavelmente tinha sido uma ideia estúpida. Todavia, ela escolheu não pensar, pois assim a dormência dos pensamentos afastaria qualquer suposta agonia.

Os dois se despediram rapidamente, com um aceno de cabeça e a noite inteira eles, em seus determinados quartos, entorpeceram-se por sentimentos velhos, novos e estritamente perigosos.

Ártemis sempre foi uma pequena rebelde. Selvageria corria pelo seu sangue, mas, ao mesmo tempo, havia aquele senso adequado. Porque ela era tanto terra, quanto céu. Selvagem e civilizada. E essa mescla de características nunca foi tão complexa e difícil de equilibrar do que naquele momento.

Apolo nunca negou o que sentia por Ártemis, no sentido de não mentir para si mesmo. Nunca teve tanta esperança quanto agora. Porém, ao perceber o fulgor no expressivo rosto da deusa, ele sabia que estavam perdidos. Aquele maldito dia fatídico na Ilha de Delos o fazia querer esmurrar a parede. E o juramento dela para o Estige... Ele xingou por baixo de suspiros ríspidos e tentou dormir.

***

Na manhã seguinte eles se encontraram no restaurante do hotel e a estranheza os atingiu. Depois de se cumprimentarem rapidamente, fizeram o pedido e evitaram, ao máximo, que seus olhos se encontrassem. Todavia, aquilo parecia ridículo demais, visto que estavam sentados de frente um para o outro. Ártemis flexionava as mãos repousadas em seu colo e Apolo brincava com os talheres prateados e adornados do Plaza.

Ártemis mordeu o interior de sua bochecha e finalmente se pronunciou:

– Então... – Suas sobrancelhas se erguendo. – Não vai me dizer para onde você planeja me levar?

– Claro. – Ele disse meio inquieto. – É um festival que fica um pouco afastado da cidade. Um pequeno “carnival”. – Um quase sorriso brotando em sua face jovial.

Ártemis deu uma risadinha:

– Parece divertido.

Uma luz passou pelos seus olhos de céu. Não seja agradável comigo, Ártemis. Não agora. Apolo suplicou mentalmente. Mas, ele não podia impedir seu coração de acelerar diante de tal doçura repentina.

Ártemis sentia tanta insegurança diante disso. E a sua cabeça não parava de maquinar sobre como seria o dia. A deusa se punia pelos pensamentos constrangidos e automáticos. Entretanto, no seu íntimo, ela sabia que a comoção de emoções não tinha mudado repentinamente. Veja, elas sempre estiveram lá. Embaixo de todo o ódio e da negação, do sofrimento. Porque aquilo que ela sentia tinha sido primordial.

E por mais que Ártemis ainda quisesse arrancar o coração de Apolo por tudo que ele fez, ela lutava com algo inserido no órgão pulsante em seu peito. Algo que ela meramente supôs ser atração. Oh, como a deusa abominava esse sentimento lascivo, sempre mal quisto por ela.

Era mesquinho, sujo e prejudicial. Principalmente para ela.

Entretanto, lá estava Ártemis: com suas mãos amparadas em seu colo e uma expressão compassiva. Enquanto uma guerra eclodia dentro dela. E isso era justamente tudo, menos ela.

Ela odiou isso.

Ártemis seguiu assim mesmo. Pois, além de detestar tudo aquilo, havia a teimosa sensação na barriga. Aquela que ela não sabia identificar. Era tão boa de sentir, que de repente, Ártemis esquecia as consequências.

***

A cor do ambiente era carmesim. E havia bandeiras coloridas enfeitando as transversais, além de algumas fitas que reluziam e cintilavam. Existia uma batida ao fundo com músicas modernas de bandas de garagem que tornava tudo mais acolhedor.

E tinham as risadas. Gargalhadas de crianças a correr com os pais em seu encalço, segurando lanches, brindes e bolas de bexiga exuberantes. Era como uma avenida ensolarada. Ninguém parecia triste ali.

Apolo a puxou pelo braço, com um grande sorriso no rosto. Ele tinha decidido que aquele dia esqueceria todos os problemas que perfuravam sua mente como agulhas envenenadas. Poderia ser imprudente, mas ele não estava ligando a mínima por enquanto.

Ártemis se deixou ser levada pela aura do lugar e caminhou a passos rápidos até uma pequena barraca de tiro ao alvo. Espingardas cheias de balas de borracha em cima de um alguns pequenos metros de mesa. A sua frente, seis latas verdes pendendo uma em cima da outra.

Apolo deu um aceno com a cabeça para um velho senhor de boina italiana e lhe entregou uns trocados. Ela ouviu o dono da tenta dizer: “Três chances, um urso”.

Ela deu um meio sorriso em antecipação e Apolo zombou ao vislumbra-la. Apolo pegou seu rifle de brinquedo e posicionou-se, não antes de pergunta-la se podia atirar primeiro.

–Ponderando a vista? – Ártemis perguntou em escárnio. Se fosse ela, já teria atirado em um segundo.

– Eu nunca fui de hesitar. – Apolo comentou. – Mas eu tenho que manter o disfarce. – Piscou para ela com um sussurro. Ártemis revirou os olhos.

Apolo foi humilde. Das três tentativas, ele usou duas, e todas as latas foram ao chão. O homem de boina entregou a ele um ursinho amarelo com um laço branco amarrado no pescoço.

– Oh, que gentileza! – Ártemis pôs uma das mãos na bochecha, inclinando a cabeça, com um tom de voz infantil quando o deus a entregou o brinde. O que fez Apolo responder com um estreitar de olhos. Mas, ele estava se divertindo ao observá-la.

Ártemis pescou sua arma de brinquedo e fez questão de virar o rosto em direção ao deus e ergueu as sobrancelhas louras. Ele a olhou, entendendo e antes que Apolo pudesse protestar, a garota atirou em cheio derrubando todas as latas, ocasionando em um tumulto contido aos limites das barracas próximas. Porque as pessoas que passavam por ali no momento não sabiam como, mas uma mulher tinha conseguido tirar todas as latas verdes apenas com um tiro.

O velho senhor tirou seu chapéu e com a mesma mão, coçou a careca fitando Ártemis.

– Aposto que tem uma coisa maior do que esse ursinho para mim, não é? – Ela questionou orgulhosa pela atenção.

Um grande e gordo panda estava, agora, abraçado ao deus do sol enquanto o casal passeava.

Ártemis deu uma olhada em Apolo e se permitiu rir em compaixão:

– Com sua licença, senhor. –Ela murmurou, pegando o grande animal de pelúcia e foi na direção de um pequeno grupo de crianças que brincavam em uma área de playground. Ela parou por um momento, vistoriando o parque até parar a vista em uma criança chorando na areia. Marchou decidida até ela:

– Aqui. – Ela disse pondo o enorme brinquedo na frente dela e desarrumando o cabelo da criança com as mãos. Virou-se, mas ainda pode ouvir:

– Mamãe, mamãe, a Supergirl me deu um brinquedo! Olha só como é grandão. Nem vai caber no nosso carro.

– Quem disse que você podia dar o meu panda? – Apolo cruzou os braços com um falso tom de ofensa.

– Não se preocupe, não vai ser difícil eu te arranjar outro. – Ela respondeu, dando de ombros.

***

A tarde passou depressa. Não que tempo fosse algum problema para os dois deuses, porém o fato é: eles nem repararam nas horas passando. A felicidade é algo que acontece imprecisamente. Você deve esquecer que a quer, para ela chegar.

E talvez fosse precipitado de dizer ou até pensar, mas Apolo sentiu que aquilo era felicidade. Por um breve momento, ele teve a grande vontade de abraçar a deusa. Abraça-la tão forte e perto - para ter certeza se tudo não passava de uma ilusão.

Eles estavam sentados em um dos bancos de praça nos arredores de um campo, com algumas árvores e o chão era coberto por um tapete verde de grama, quando as luzes dos postes começaram a ascender. Estava escurecendo.

E apesar de uma brisa gélida começar a assobiar, os deuses não prestaram atenção. Estavam mais entusiasmados com os próprios debates. E era algo magnético o jeito como estavam se deixando agir. Com a intensão, o anseio de se tocarem. Porque eles estavam tão perto, mas ao mesmo tempo, tão longe.

Foi após Ártemis rir para ele de um jeito tão adorável, que em seus ouvidos o riso soou como sinos, que ele a beijou. Apolo não pensou. Ele só se inclinou para ela, botando sua mão em seu rosto e a beijou.

Foi como se seus lábios nunca tivessem tocado outros tão macios. Ele a sentiu o empurrar com os punhos fechados em seu peito. Mas, a partir do primeiro toque nos lábios da deusa, algo o possuiu e ele não largaria dela tão facilmente. Os protestos de Ártemis, contudo, cessaram e ele a sentiu derreter sob o seu contato, fazendo-o enlouquecer. Não aguentando mais, Apolo aprofundou o beijo, pondo a outra mão na cintura da garota. Ele a ouviu gemer e constatou que seus finos dedos estavam enlaçados em sua camisa, puxando-os e o aproximando ainda mais.

– Ora, ora, ora. Mas o que temos aqui?


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Notas finais do capítulo

Não estou contente com o capítulo.... Reviews?