Fênix nas Cinzas, Fênix Renascendo escrita por Viviane Oliveira


Capítulo 3
Capítulo 3




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Yuri só podia ter ficado louco. Quem ele pensava que era para deduzir o que eu deveria ou não fazer?! Parecia um psicólogo que tive há muito tempo atrás, tentando adivinhar meus pensamentos e resolver meus problemas! Ora essa...

Pensamentos oscilavam entre um formigueiro e um vácuo. Às vezes, os pensamentos eram de revolta, às vezes de reflexão própria... Mas, por mais problemas que eu tivesse aquela hora, os pensamentos sempre terminavam em Yuri. Yuri... Sempre tentou adivinhar meus pensamentos, na verdade, mesmo não sendo meu psicólogo... Às vezes conseguiu, não direi que não. Mas por que insiste tanto? Não tem como me ajudar, especialmente agora. E a última coisa que quero é vê-lo com problemas... Mas por que mantenho distância ao invés de dizer isso a ele? Será que é isso que faço sempre quando alguém tenta se aproximar de mim? Eu me esquivo...? Todas as pessoas à minha volta chegaram comigo a certo grau limitado de amizade, nunca conseguiram ultrapassá-lo ou nem ao menos chegar nele... Nem mesmo Sora, alguém com quem compartilhei sonhos, meu passado, meus ideais... Ou Macquarie, alguém que cresceu comigo e nunca descobriu muitas coisas sobre mim, mesmo eu sendo um bebê chorão naquela época... E mesmo Cathy, minha colega de palco na Broadway, a qual, de certa forma, entende minha personalidade forte, mas não sabe meus fracos... Ninguém.

Não quis compartilhar a minha dor ou os meus problemas com ninguém, não depois do que fiz à minha mãe... Por mais que pensassem que ela morrera de uma doença degenerativa e incurável, os reais motivos, os quais jamais saíram da minha cabeça, foram simplesmente minhas palavras de ódio e de raiva que demonstrei a ela antes que morresse, puro egoísmo e egocentrismo... Por isso, eu não queria mais descontar o meu sofrimento em qualquer outra pessoa, que fosse meu parceiro. Ele é o que menos merece, mas provavelmente é o que mais está preocupado comigo... Toda essa tentativa de proteção provoca um efeito contrário... Mas que sina. E os pensamentos ferveram o dia inteiro na minha cabeça.

Voltei para casa apenas de madrugada, graças ao atraso de Yuri, ao atraso dos vôos e ao sermão de Cathy por eu ter chego atrasada. Mas a pior parte do dia ainda estaria por vir, quando eu pensava que ele (o dia) já teria terminado. Para a minha surpresa - e por falta de sorte com o destino - alguém me esperava aquela noite, sentado em um dos sofás da sala, com a pior expressão de raiva e inconformismo do mundo que se poderia imaginar. A última pessoa quem eu queria ver... A única pela qual eu fugi durante os últimos dias.

- Layla - uma voz fria e rude ressoou na sala. Minha reação não foi outra, senão hesitar e gelar. Parei na porta da sala e ali fiquei, olhando-o se levantar cautelosamente. - Como vai?

Seu cinismo e sua falsidade estavam tão fortes que mal parecia meu pai ali. Nunca o vira assim e aquilo me assustava. Para ajudar, a sala estava iluminada apenas por um abajur de baixo volt, o que ressaltava ainda mais o jeito amedrontador dele. Tentei ser a mais breve possível na resposta, mas tudo o que consegui foi gaguejar um pouco.

- E-estou bem.

- Pelo modo como me respondeu, suponho que saiba exatamente por que estou aqui, não é mesmo? Então, faça o favor de se lembrar do que eu a mandei fazer nas últimas semanas.

O modo rude dele me controlava. Quando era cauteloso, paralisava. Quando utilizava desse meio para me dar uma ordem, eu respondia o que ele me mandava, não importando o tom de voz que eu impunha. Apenas falava. O medo estava tão grande que procurei sussurrar, por mais que eu não entendesse o porquê dos meus temores aquela hora.

- V-você... Disse para eu representar nos dois filmes e acertar os últimos ajustes ao longo dos dias com os diretores... E também disse para eu desistir do Kaleido e da Broadway...

- E o que foi que você fez?

-... O contrário... - respondi mais baixo ainda. Não consegui mais encará-lo diretamente. Apesar disso, aproximei-me dele, a fim de querer uma conversa menos assustadora. Mas o efeito foi contrário ao que eu imaginei.

- Eu deveria estar em Londres há 4 horas atrás. Deveria estar em uma reunião importantíssima no momento, mas você resolveu não obedecer às minhas ordens! E o que eu tenho de fazer? Laçá-la pelas pernas!

Eu estava no sofá adjacente ao dele, mas podia senti-lo à minha frente, como se aquelas palavras fossem me engolir a qualquer instante. Estava muda, não conseguia dizer o que pensava. Por que as palavras não saíam? Eu queria, mais do que tudo, dizer que jamais desistiria do Kaleido Star, por exemplo, e que aqueles filmes não me importavam, mas... Não saiu.

- Esses filmes eram importantes para a Hamilton Foundation, Layla! Você só me causou problemas com esses caprichos ridículos!

Ele não parava de falar. Aquela tristeza imensa apoderava-se de mim. Mas a raiva também era presente. Como não consegue ver o meu lado? Por que sempre os lucros vêm primeiro? Por que os negócios são mais importantes que nossa relação...?

- Por ignorar os fatos, só está piorando a situação! Por que não me ouviu, Layla? Por quê?

- Porque eu nunca quis largar o Kaleido Star para fazer dois filmes quaisquer sem motivo!

Saiu. Apenas vomitei aquelas palavras e o encarei. Ele ficou estático por alguns segundos, mas a raiva logo tomou seus olhos novamente. Aquele olhar simplesmente me deu mais desespero ainda, mas eu não parei.

- Nunca entendeu os meus motivos, os meus ideais, por isso os chama de caprichos! Mas o que eu posso dizer é que jamais esqueceria o Kaleido para fazer algo menor do que ele! Jamais!

- Não ouse levantar sua voz para mim! Olhe o tom que está usando, Layla Hamilton!

Hesitei. Não havia percebido, mas estava gritando. A raiva transformou-se em ódio e eu não medi a altura da minha voz. Macquarie estava no pé da escada, ouvindo tudo, assustada, não pensando em interferir. Ambos nos fitávamos de um jeito estranho. Parecíamos ter o mesmo olhar: raiva, porém, tristeza. Ele prosseguiu, depois daqueles segundos de silêncio.

- Tem idéia do quão foi egoísta nas suas últimas palavras? Nunca negou uma ordem minha, muito menos mentiu para mim. E ainda por cima, gritou comigo. Diga-me agora: onde está a minha filha?

Minhas lágrimas forçavam para sair, mas eu as impedia. A raiva estava maior e o desespero para berrar, maior ainda. Mas me controlei. Disse as próximas palavras em forma de sussurros.

- Ela está bem na sua frente, pai. A diferença é que, agora, ela já sabe falar... - ele ficou mudo, fitando-me. Eu continuei, sem me importar com mais nada - E ela está dizendo que jamais largará o Kaleido Star por qualquer outra coisa que não possua o mesmo brilho que ele!

- Você acabou com metade das ações da minha empresa! Acabou com um contrato que eu deveria estar assinando agora! Está colocando a empresa que irá para o seu nome abaixo!

- Não me interessa a sua "querida" empresa! Não importa quantas empresas eu tiver de derrubar, se assim eu conseguir realizar meus sonhos! - O interrompi, outro fato que jamais acontecera na minha vida. Ele não podia acreditar no que eu estava falando. Foi a sua vez de paralisar. A tristeza aflorava sobre seus olhos, mas assim como eu, não a deixava cair. Jurei tê-lo visto tremendo por uma fração de segundo, mas foi só. Quando voltou a falar, sua voz estava amargurada e rouca. Pensei que assim seria melhor, mas só piorou o que veio a seguir.

- Eu sempre dei o melhor para você... E tudo o que você faz é desonrar seu nome e seu sangue com esses caprichos! ... Se fosse viva, sua mãe estaria envergonhada.

Ao ouvir aquele nome, arregalei os olhos e não voltei mais a ficar com raiva. "O que foi que ele acabou de dizer...?", pensei. Até Macquarie paralisou. Garanto que também não acreditava no que acabara de ouvir. Ele disse as piores palavras que eu poderia ouvir em toda a minha vida em apenas alguns segundos. Como ele pôde dizer aquilo? Como...?

Todos meus pensamentos sumiram em questão de milésimos, e tudo o que restou foram aquelas suas últimas palavras. E ele não havia acabado.

- Não se preocupe... Jamais voltarei a pedir ou mandá-la fazer algo para o nosso bem. Já me decepcionou o suficiente para uma vida inteira. Até outro dia... Layla - e saiu de casa.

Assim que ele saiu da sala, tudo o que fiz foi despencar no sofá como nunca havia feito antes e desabar rios de lágrimas de meus olhos. Foi involuntário, não foi preciso nem chorar para isso. Elas apenas caíam e eu as sentia arder mais do que o próprio fogo. Macquarie veio logo em seguida ao meu encontro. Tentou me animar, mas eu não me mexia. O máximo que fiz foi me encostar no sofá e me largar ali. Ela não teve outra escolha, a não ser chamar o primeiro número que viu quando pegou meu celular: Yuri.

Tudo o que pude ver - mas mal raciocinei - foi Macquarie ligando para alguém que eu conhecia muito bem, mas não me importei naquela hora. Tudo o que eu queria era que aquela dor passasse, e mais uma vez, chorar não adiantava. "Sua mãe estaria envergonhada" era o que ecoava na minha cabeça, sem parar. A última coisa que me lembro daquele momento foi a voz de Macquarie dizendo que alguém estava vindo às pressas. Depois disso, apenas silêncio. Um vazio na minha mente; um vácuo.

Não apaguei. Apenas fiquei ali, esperando que qualquer coisa acontecesse e me acordasse daquele pesadelo. Não aconteceu.

Esqueci-me do banho que estava prestes a tomar. Quase me esqueci de recolocar a camisa que havia tirado. Depois de atender aquela ligação e ouvir Macquarie falar desesperadamente que Layla estava com problemas, a única coisa que pensei foi em qual seria o caminho mais curto para chegar à mansão dos Hamilton. Que eu me lembre, meu carro nunca havia chegado a uma velocidade tão impressionante quanto aquela, exceto por aquela vez... Ah sim... Aquela vez em que discutimos, na qual ela me disse que eu não acreditava no meu futuro... Minha raiva fora descomunal... E agora, o motivo é totalmente o contrário. Amor... Será que mais uma vez eu cairia naquelas famosas perguntas retóricas?

Soltei uma risada completamente forçada e me concentrei em desviar dos carros. Cheguei pouco mais de 5 minutos depois ao meu destino. Bati na porta às pressas e uma Macquarie totalmente perdida me atendeu. Mal falei com ela; apenas entrei na casa e fui em direção de onde a empregada apontara.

O coração acelerou quando a vi, sentada em um dos sofás, em silêncio. O que poderia estar errado, se apenas estava sentada no sofá? Ao me aproximar, no entanto, notei o rio de lágrimas que escorria do seu rosto e o coração acelerou mais. Sentei-me ao lado dela e tentei fazê-la reagir.

- Layla? Está me ouvindo? Layla? - nada acontecia. A alma dela parecia não estar ali, muito menos sua voz. Minha preocupação aumentava a cada segundo, mas eu não sabia o que fazer. A única coisa que me veio em mente foi ajudá-la a subir até o quarto e a se deitar na cama. Naquele estado, era impossível ajudar mais do que isso. O jeito era esperá-la pegar no sono e falar com ela quando estivesse melhor. A idéia era também esperá-la acordar, mas preferi ir embora. Por algum motivo (ou instinto) achei melhor ir, caso contrário, ela poderia acordar em um grande susto, e aí sim não me diria nada. Beijei sua testa de leve e saí de seu quarto em silêncio, na esperança de que amanhã seria um melhor dia.

- Ligue-me se acontecer algo e avise-a para ir ao Kaleido Star quando acordar, por favor. - pedi esse favor à Macquarie antes de sair de lá. Ela também parecia estar aos prantos há alguns minutos atrás, mas resolvi não comentar nada. Ela apenas confirmou o pedido com a cabeça e eu parti. "Layla, por favor, esteja boa amanhã... Ou pelo menos... esteja", pensei enquanto dirigia até minha casa. Deveria ter ficado lá para quando acordasse... Teria sido um ato de covardia ir embora...?

Será que errei de novo...?


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