A Hospedeira - Antes e Depois da Chuva escrita por Rain


Capítulo 7
Capítulo 7 - Esclarecendo as Coisas


Notas iniciais do capítulo

Este capítulo também não se baseia em nenhum do livro. É a minha ideia do que pode ter feito Kyle mudar de ideia em relação a Sunny. O pai de Ian e Kyle, referido aqui, assim como a mãe, mencionada de passagem, são personagens criados por mim. Você pode entender melhor a história deles na fic Depois da Chuva.



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— Ei, Ian, você está acordado? – perguntou Kyle em sua voz impossivelmente alta para um sussurro.

— Não, não estou.

— Ah, incrível como até nesta situação em que estamos você sabe ser otário!

— Você me acordou para me agredir, é?

— Não. É que eu tive uma ideia e não consigo dormir.

— Acontece, Kyle. Sei que você não está acostumado a pensar, mas não precisa ficar preocupado, cedo ou tarde seu cérebro fica vazio de novo. Agora vá dormir e me deixe em paz!

— Você quer deixar de ser idiota e me ouvir? Tem a ver com nosso pai.

Eu me levantei num pulo. Doc ressonava baixinho num canto mais distante do hospital e Kyle veio para mais perto de mim, para evitar que ele acordasse e nos ouvisse.

— Quando Jodi acordar e estiver tudo bem com Peg, nós vamos até Portland, buscar o pai.

Ai, caramba!

Havia tantas implicações naquela frase, tantas coisas que eu precisava dizer para Kyle e que seriam extremamente duras de dizer e de ouvir... Sabia que tinha ser eu a dizê-las, mas simplesmente não estava pronto para fazer isso no meio da madrugada. Kyle estava se equilibrando no limiar da loucura e da normalidade ultimamente. Qualquer empurrão o faria cair de um lado ou de outro. Se a normalidade de Kyle já era de assustar, imagina só se ele endoidasse!

Eu mesmo, diante de meu próprio precipício emocional, não tinha condições de mergulhar na turbulência que eram as emoções de meu irmão. Por outro lado, eu já não aguentava mais ouvir Doc e Candy sussurrando pelos cantos, sem coragem de dizer certas coisas urgentes para Kyle. Eu sabia que Doc ia acabar chamando Jeb para resolver o assunto e isso tinha tudo para ser uma verdadeira hecatombe. Então não tinha outro jeito. Tinha que ser eu mesmo a conduzir o cabeça dura para a luz. No escuro. Aos sussurros. No meio da madrugada. Quem mandou ficar com preguiça de ir para o quarto? Ultimamente, as coisas tinham o estranho hábito de acontecer quando eu não estava nem um pouco preparado para elas.

— Kyle, como você achou Sunny em Las Vegas? Por que decidiu procurar a Jodi lá?

— Ora, porque a mãe e o padrasto da Jodi moravam lá!

— Mas Sunny não tem nenhuma... familiaridade, por assim dizer, com as Almas que estão no corpo dos pais de Jodi, não é?

— Ah, Ian. Por que você está fazendo essas perguntas idiotas? Isso tudo não tem nada a ver com o que eu te falei.

— Responda as minhas perguntas que eu vou te mostrar que tem a ver, sim.

Kyle bufou. Um som tão alto que Doc deu um ronco alto lá do seu canto. Nós ficamos em silêncio por uns minutos, até que voltamos a ouvir o som mais baixo e ritmado do ressonar tranquilo de antes.

— Tá bom, eu vou morder essa isca. Sunny foi para Las Vegas porque Jodi era muito ligada à mãe. Eu sabia disso porque Peg veio atrás de Jared e Jamie.

— Certo. E qual era a razão para o pai voltar para casa todos os dias quando era humano?

— Como assim, Ian? Que espécie de pergunta estúpida é essa?

— Vai acompanhando o raciocínio, Kyle. Mesmo a sua cabeça dura vai entender o que eu estou dizendo.

— O pai voltava para casa porque era lá ele morava com a gente, pô!

— E nós saímos de lá há mais de seis anos. Por que ele permaneceria naquele lugar sem a gente?

— Bom...

— Não temos garantias de que ele esteja lá. Esta pode ser uma aventura arriscada e complemente em vão. Você já deixou todo mundo possesso com essa sua fuga para buscar a Jodi... Imagina se todo mundo resolver fazer isso?

— Eles não fazem porque não têm coragem. Eu tenho! O que há de errado com você, afinal, hein, seu idiota? Não quer ter nosso pai de volta?

— Quem está sendo idiota é você. Você acha que eu já não pensei nisso? Mas temos que ser racionais, Kyle. E priorizar a sobrevivência de todo mundo. Vamos supor que a gente o encontre, que depois de todos esses anos ele ainda esteja na nossa casa. Aí o trazemos para cá só pra descobrir que a Alma que está no lugar dele o suprimiu por completo...

— Bobagem. Melanie, Lacey, Candy, todas elas acordaram.

Bom, agora era a parte mais difícil!

— Pois é. Melanie e Lacey acordaram na hora. Candy já levou várias horas. Com ela foi um tiro no escuro. Se ela não tivesse acordado, provavelmente seu corpo teria morrido logo. Você teria coragem de deixar o corpo de nosso pai morrer?

— Não, é claro que não! Talvez eu pedisse para Doc colocar a Alma de volta até encontrarmos uma maneira.

— E quem foi que disse que ele iria querer ficar aqui? Quem poderia garantir se essa Alma seria amistosa como Peg e Sunny, ou se seria nossa ruína?

— É duro admitir, mas você tem um pouco de razão nessa parte.

Um pouco? Só nessa parte?

— O corpo dele foi tomado há muito tempo, Kyle. Seis anos, o mesmo tempo de Jodi. É tempo demais para sobreviver, principalmente sem ter nada a que se apegar.

— Onde é que você está querendo chegar com isso?

Agora é que viria a parte realmente difícil!

— Já faz dez dias que você está tentando acordar a Jodi...

Kyle não entendeu imediatamente o que eu queria dizer. Por alguns segundos, ele me lançou um olhar vazio. Depois, como eu não achei que fosse possível, seu rosto pareceu ainda mais triste e eu quase pude ouvir algo dentro dele se partir. Pude ver sua expressão de desamparo se transformar lentamente na de uma fera. Naquele momento, era mais fácil “matar o mensageiro” do que encarar a verdade, e os punhos fechados que vinham em minha direção me deixaram saber que era exatamente esta a missão deles: aliviar a dor. Dele, não a minha.

Só houve tempo para um movimento instintivo que foi o de abraçar o tanque de Peg e me fechar sobre ele como um casulo. Meus olhos se fecharam esperando pela pancada, mas ela não veio. O que veio em seu lugar foi o som metálico de algo contra o chão.

Eu apertei Peg mais forte contra o peito, certificando-me de que o tanque dela ainda estava lá. Antes mesmo que abrisse os olhos, ouvi o grito de meu irmão:

— Sunny! Oh, merda!

No instante em que Kyle partiu para cima de mim, ele esbarrou no catre onde tinha depositado Sunny por apenas um minuto enquanto conversávamos. Mais uma vez, ela tinha sofrido por ele; mais uma vez, ela o tinha trazido à razão.

— Mas que droga, Kyle! O que foi que você fez? – gritou Doc, acordando e vindo em nossa direção.

— Ah, meu Deus, me desculpa, Sunny! Ah, Doc, eu não sei onde estava com a cabeça. Me ajuda aqui, por favor!

Doc veio com uma lanterna. A luz bateu primeiro no rosto de Kyle e ele era o retrato do pavor. Em seguida, a lanterna focalizou o tanque e nós três seguramos o fôlego.

— Parece que não abriu. Não, não abriu. Está tudo bem com ela. Eu acho – disse Doc, desencadeando uma corrente de alívio entre nós. Pude sentir meus músculos relaxarem um pouco do retesamento impossível em que estavam.

Kyle se atirou ao chão e recolheu com todo o cuidado o tanque de Sunny. Doc observou tudo aquilo com uma expressão realmente furiosa no rosto, enquanto estendia os braços para Sunny.

— Eu não acho que devo continuar permitindo que você segure esse tanque, Kyle.

Os braços de Kyle se fecharam em torno do metal. Seus olhos implorando clemência, mas não para Doc, para Sunny.

— Foi só um acidente, Doc. Não vai se repetir. Eu prometi a ela que ela ficaria bem.

— Sim, mas você quase a matou! O que foi que houve, afinal? Por que Ian está encolhido em torno de Peg? E por que nós dois estamos, no meio da madrugada, brigando pelo tanque de Sunny?

— Doc, tem umas coisas que eu queria que você me explicasse...


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler. Reviews são bem-vindas!
Se você quiser acompanhar melhor os acontecimentos do próximo capítulo, seria legal ler também Luz do Sol Através do Gelo. Não é realmente necessário, mas as duas se entrelaçam nesse ponto. Então seria bacana.