A Hospedeira - Antes e Depois da Chuva escrita por Rain


Capítulo 10
Capítulo 10 - Sombras




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Por seis dias meu pequeno sol não pôde me iluminar.

Alguns minutos depois da chegada de Pet às cavernas, eu já estava sorrindo de orelha a orelha com a perspectiva de que em pouco tempo veria Peg novamente. Eu ainda estava sozinho com ela no hospital quando Mel voltou, espelhando imediatamente meu sorriso, e trazendo atrás de si Doc e Jeb, que conversavam animadamente sobre a recém-chegada.

- Então esse vai ser o rosto novo de nossa amiga? – perguntou Jeb entusiasmado – Olha, Mel, tenho que admitir que vocês fizeram um ótimo trabalho. Quando Peg acordar com essa carinha, nada mais vai ser impossível para ela!

- É cedo para pensar em incursões, Jeb. Estamos bem abastecidos e Peg precisa de tempo para se readaptar. – disse eu, tentando adiar ao máximo o momento de romper a bolha que eu já estava criando em torno dela.

- Sim, sim, claro. Falando nisso... Doc, quanto tempo você recomenda esperar?

Eu estava rezando para que Doc dissesse alguma coisa como: “Depois de voltar, Peg precisará de uns seis meses de descanso...”, quando veio essa resposta:

- Dado ao que aconteceu com Jodi, não devemos esperar demais. Alguns poucos dias serão suficientes...

- Esperar? Alguns dias? Para quê? – perguntei já desconfiado de que odiaria a resposta.

O sorriso desapareceu do rosto de Mel com a mesma facilidade com que nasceu. Parecia até uma cena vista em reverso.

- Ai, droga! – ela se queixou.

- Mel? Que história é essa?

- Oh, Ian, me desculpe. Eu pensei que tivesse deixado claro essa parte para você. Peg não quer ser uma parasita. Precisamos dar um tempo para a hospedeira de Pet acordar, caso ela ainda esteja aqui.

- Ok. E se ela acordar? E depois, o que faremos? Vamos atrás de outro corpo?

- Se for preciso. Até conseguirmos um corpo que seja exclusivamente de Peg.

- Sinceramente, eu estou vendo sua boca mexer e tudo que estou escutando é “bla, bla, bla ... vamos jogar mais uma bomba na cabeça do Ian... bla, bla, bla... vamos trocar o corpo da namorada dele como quem troca de roupa!”

- Ora, Ian... Você está agindo como criança! Parece até que estou falando com o Jamie. Não, espera aí. Jamie não seria tão imaturo assim! Você sabe muito bem que a Peg não suportaria sentir que suprimiu outra hospedeira. Era por isso que ela não queria continuar aqui! Acho que podemos esperar um pouco para garantir que isso não aconteça.

- Não me venha com essa, Mel. O corpo de Jodi quase morreu!

- É exatamente isso que estou dizendo, Ian. – interrompeu Doc – Por isso esperaremos menos tempo. Não vamos nos ariscar como fizemos com Jodi. Aquilo foi irresponsabilidade minha!

- Pode apostar que foi, Doc! E eu não vou deixar você fazer isso de novo!

- Eu já faltei com minha palavra com Peg uma vez. Não vou deixar vocês me impedirem de zelar pela vontade de minha amiga de novo, tudo por causa de suas intempéries românticas!

Até Melanie que, nesse momento, estava prestes a entregar o cargo de presidente do meu fã-clube a qualquer um que se importasse mais comigo do que com uma casca de banana, arregalou os olhos indignada. Ela segurou meu pulso como se me pedisse para me acalmar e deu uma bronca em Doc:

- Intempéries românticas? Doc! Mas que falta de consideração!

- Consideração por todos vocês foi o que me trouxe para essa encruzilhada, pra começo de conversa!

Jeb observava tudo com sua costumeira cara de pôquer, mas quando viu que as coisas estavam realmente esquentando, teve que sair de sua cômoda posição de voyeur para intervir.

- Calma, calma, vocês três! Comportem-se! Vocês estão com os nervos à flor da pele, e com razão. Mas estamos todos do mesmo lado aqui. Todos nós queremos o bem de Peg e não podemos deixar as nossas razões e a nossas vontades se sobressaírem às dela. É isso o que você está fazendo, Ian!

- Mas, Jeb!

- Mas nada! Nós cuidaremos bem do corpo. E se Doc, ou qualquer um de nós, achar que ela está ficando fraca demais, colocamos a Peg aí na mesma hora. Mas precisamos dar uma chance para essa garotinha. Pense bem, Ian. As chances dela são mínimas. Não podemos tirar as poucas que ela tem!

- Sunny estava muito fraca quando acordou – disse eu, num último esforço fraco de não dar o braço a torcer. Mas, nessas alturas, eu já sabia que era a minha ansiedade falando. No fundo, eu já tinha entendido que eles tinham razão.

- Acordou fraca, mas em poucas horas já estava andando por aí como a nova rainha alienígena do pedaço! Ela está bem, Ian. E essa aqui também ficará. Nós vamos vigiá-la de perto. Você já está praticamente morando aqui no hospital mesmo. Que diferença faz mais uns dias? – perguntou Jeb de um jeito que parecia que a resposta já estava pronta na pergunta.

Eu não respondi, mas Mel, cuja irritação já tinha passado, manteve a mão no meu braço e pôs a outra no meu ombro. Ela me olhou de frente, aquele contato mais íntimo ainda desconfortavelmente familiar entre nós, e fez um movimento com a cabeça que era como uma pergunta. Eu expirei forte, soltando todo o ar que nem sabia que estivera segurando, olhei para ela e abaixei minha cabeça derrotado.

- Está certo, então. Doc, prepare a moça. Essa eu vou querer assistir. E quem quiser ficar aqui também vai ter que se comportar. Você precisa que a gente chame alguém para ajudar?

- Não. Acho que Mel sabe o que fazer, não sabe?

- Sei. E Ian também pode ajudar, não pode? – perguntou Mel me dando uma cotovelada fraca nas costelas e tentando fazer com que eu mudasse minha cara de derrota.

- Posso ajudar, sim. Com essa parte eu sempre concordei – respondi ainda insistindo no mau - humor.

Quando retiramos Pet, Mel a segurou cuidadosamente nas mãos enquanto eu segurava o tanque onde ela seria colocada. Nós dois olhamos para ela com carinho.

- Obrigada – disse Mel.

- É. Você não sabe o que está fazendo por nós, mas seremos sempre gratos mesmo assim. Que você viva muitas vidas longas e em paz!

Nós fechamos o tanque e o posicionamos cuidadosamente separado dos outros. Peg iria querer vê-la assim que acordasse, tínhamos certeza.

Doc fechou o corte e deitou o corpo novamente numa posição em que víssemos o rosto dela. Embora antes ela estivesse adormecida, havia vida naquele rosto. Agora era como se nuvens tivessem escurecido o pequeno sol. Seu rosto bonito estava totalmente inanimado e o corpo delicado jazia desajeitado sobre o catre.

- Agora tudo o que podemos fazer é cuidar dela e esperar – disse Doc.

E eu me preparei para os próximos dias de sombras.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler. Reviews são bem-vindas.
Essa fic está caminhando para o final. Aceito sugestões para outras!