Parte II

Havíamos partido logo após termos recebido as ordens de Tsunade. Quando cheguei à entrada de Konoha havia três Anbus, um Naruto pulando igual um idiota e uma Sakura com os braços cruzados demonstrado sua infelicidade por ter que ir em uma missão comigo. Ou seria pelo fato de que eu estaria sem a tornozeleira e não seria um inútil?

Eles retiraram minha tornozeleira. Minha coleira. Senti todo meu chakra fluindo pelo meu corpo e me permiti suspirar aliviado. Pediram para eu ir devagar na utilização do chakra, o que eu irei ignorar completamente. Tanto tempo se ter força total... Chega de privação. Olhei novamente para Sakura na esperança de ter seus orbes esverdeados me encarando com fúria, mas apenas vi o movimento do seu cabelo enquanto ela andava para fora da aldeia em direção a nossa missão. Os Anbus continuavam discutindo sobre os cuidados que eu deveria tomar, o que eu ignorava completamente. Dei as costas aquele falatório e segui a líder da equipe. Estava finalmente livre.

O clima sombrio envolvia-nos durante a caminhada. Os pássaros sobrevoavam nossas cabeças esperando um momento para atacarem qualquer animal pequeno que fugisse de nós. Já estávamos andando por horas e nenhuma palavra havia sido dita por nós três. O que me irritava.

Depois de tantas missões que havia feito com o time 7 essa está sendo a mais complicada de suportar. Sakura me odiava e Naruto temia falar alguma coisa que complicasse ainda mais o clima entre nós, portanto ele se mantinha calado. O que é um grande desafio para ele.

Respirei o ar com intensidade e direcionei meus olhos para o céu. O azul estava coberto por grossas nuvens negras, o ar quente queimava minhas narinas a cada aspirada. Irá cair uma tempestade sobre nós.

Voltei meus olhos para meus companheiros que estavam andando sem preocupações a minha frente. Bufei incomodado. Antigamente eu me irritava pelas idiotices que os dois conversavam nas missões, hoje, fico irritado por eles não conversarem. Nem uma troca de palavras, insultos ou qualquer outra coisa.

Um relâmpago cruzou o céu e logo após o trovão soou bruscamente em nossos ouvidos e finalmente Naruto falou alguma coisa.

– Acho melhor montarmos o acampamento antes que a chuva no pegue despreparados.

– Vamos andar por mais algumas horas. – Sakura olhou para o céu e continuou – Não iremos pegar chuva.

– Sakura-chan, não quero ser chato, mas você não pode ter certeza. Voto para que montemos acampamento agora. Está comigo Teme?

– Naruto está certo Sakura. O tempo só está piorando.

– Eu estou no comando. – ela esbravejou irritada – Estão com medo de ficarem gripados? Sou médica esqueceram? Vamos continuar.

– O poder está lhe subindo a cabeça.

Arqueei minha sobrancelha para ela e Sakura não ficou nada feliz. Vi suas mãos tomarem a forma de punhos e senti a canalização de chakra. Ela iria avançar.

– Sakura-chan...

– Essa missão está sendo uma droga!

Não percebi quando ela avançou rapidamente em minha direção com o punho direito levantado. Consegui desviar antes de ser atingido e uma cratera se abriu no lugar em que eu estava.

Sakura me olhou com raiva. A fúria contida por anos estava finalmente saindo e minha cabeça estava a prêmio. Cruzei os braços e esperei seu próximo movimento.

– Ei vocês dois. Sakura-chan não ligue para o Teme.

– Não se meta Naruto.

– Pare Sakura. Eu não quero lutar.

– Eu quero! – ela gritou correndo e lançando o punho contra meu estômago

Agarrei seu pulso e revidando a atirei longe. Sakura atingiu o chão e sumiu em uma nuvem de fumaça. Demorei para perceber que ela havia feito uma cópia e que estava atrás de mim, preparando um chute diretamente no meu rosto.

Segurei seu tornozelo e a joguei, tentei jogá-la longe. Sakura havia canalizado seu chakra para seus pés e havia ficado pesada, sendo quase impossível movê-la. Bufei irritado. Essa luta já está na hora de acabar.

Me virei para encará-la e apenas vi um sorriso mordaz em seu rosto. Suas mãos correram por selos que eu desconhecia e quando me dei conta era um jutsu médico, certamente muito perigoso.

Me esquivei conforme vi um bisturi de chakra se aproximar perigosamente do meu rosto, rapidamente me colocando atrás dela, talvez nocauteá-la, sem feri-la. Mas ela girou sobre o calcanhar premeditando minha ação e tive que me jogar para trás para impedir que um soco me atingisse diretamente no rosto, um soco que poderia ter quebrado meu crânio.

Sakura retrocedeu por um momento avaliando a situação e logo depois estava erguendo uma rocha que poderia pesar uma tonelada e nem sequer transpirou ao fazê-lo. Já havia escutado sobre coisas que ela é capaz de fazer, mas ver com meus próprios olhos era outra coisa. Tentei evitar meu choque e meu olhar de espanto, o que foi inútil. Ela havia percebido a minha surpresa e definitivamente isso a deixou mais irritada do que já estava, havia acabado de ferir seu orgulho por apenas olhar seus atos com extrema surpresa. Sakura arremessou a rocha em minha direção e atingi bem o centro da pedra com meu Chidori, explodindo-a em milhões de pedaços.

Novamente em questões de segundos ela recomeçou a fazer jutsus médicos. Olhei sério para Sakura e ativei meu Sharingan, independente de qual jutsu ela utilizasse eu seria capaz de decorá-lo. Minhas mãos correram por selos que o Sharingan tentou memorizar, bufei. Estava sendo um tolo ao cogitar a idéia de repetir o jutsu que Sakura estava realizando, não bastava memorizar a técnica, eu precisava ser capaz de executar o jutsu também. E, francamente, poderia memorizar o repertório completo de Sakura, mas eu não tinha o nível de controle de chakra necessário pra executar sequer um único jutsu médico.

Me esquivei do caminho conforme um bisturi de chakra passou zunindo ao lado de meu braço. Ficamos frente a frente novamente, eu estava ofegante. Essa batalha estava se mostrando bastante difícil, ainda mais depois de ter passado anos com meu chakra limitado. Estava desacostumado, poderia perder essa batalha e isso eu não queria admitir.

Sem que eu percebesse um punho atravessou minhas defesas e acertou diretamente no meu estômago, fazendo-me curvar e apoiar minhas mãos em meus joelhos.

– M-mas que droga Sakura!

– Já está choramingando? – ela esboçou um sorriso zombeteiro enquanto me via esbravejar entre ofegos – E olha que foi um soco normal.

Normal? Senti minha alma sendo estraçalhada com aquele soco e ela ainda vem me dizer que foi um soco normal? Inferno. Eu é que não quero descobrir como é um soco recheado de chakra.

Voltei a ficar ereto e respirei fundo para recuperar o ar que havia perdido após o soco de Sakura. Analisei todos os movimentos que nós dois realizávamos, estávamos em pé de igualdade. Mas essa é Sakura quem estou enfrentando, e estou deliberadamente contendo meus ataques numa tentativa de não machucá-la, apesar dela estar tentando de todas as formas possíveis me ferir. Todo o rancor que estava guardado estava sendo agora descontado em mim, ótimo. Terei que lutar sério com ela caso eu tenha alguma esperança de sair sem ferimentos.

Olhei-a seriamente, seu olhar havia mudado, surpresa talvez? Meus olhos estavam com o Mangekyou ativado e iria colocá-la para dormir. Por mais que Sakura fosse talentosa contra genjustus ela não seria capaz de escapar do Mangekyou Sharingan. Ela canalizou mais chakra em seu punho e se preparou para avançar. Escutei o suspiro cansado de Naruto e o vi se intrometer no meio de nós dois.

– Saia do meio Naruto. – proferi bruscamente

– Sabem, eu não gosto de interromper grandes lutas, mas vocês estão tão focados que não perceberam que está chovendo.

– O que?! – eu e Sakura perguntamos em uníssono. Olhamos para o céu e finalmente percebemos as grossas gotas caindo sobre nós.

– Acho que já está bom não é? – ele sorriu enquanto nos encarava – Já montei o acampamento. Podemos sair logo da chuva e irmos nos abrigar?

– Montou o acampamento em questão de minutos? – Sakura perguntou

– Minutos? Hm. Acho que foram duas horas.

– Duas horas...?! – ela olhou para ele surpresa. – Como assim horas?

– Vocês estão lutando por horas. Ou melhor, se encarando por horas. Que luta chata a de vocês. Só ficam se olhando, analisando, prevendo movimentos e não chegando a lugar nenhum.

Desfiz minha posição de luta e encarei Sakura novamente. Nós dois estávamos perplexos. Havíamos ficado tão absortos no nosso combate que nem percebemos a mudança de tempo.

-xXx-

Anoiteceu. A chuva havia parado horas atrás, antes de ter nos ensopado mesmo estando dentro das barracas. Odiava quando chovia, odiava a sensação de prisão, abafamento que ela transmitia. Odiava ter que dividir a barraca com Naruto enquanto eu ainda estava agitado pela luta que tive com a Sakura.

Estávamos sobre o luar jantando e escutando as ordens da capitã. Meu estômago se revirava com isso. Resignava-me por ter que seguir ordens dela, de tê-la como capitã. Não era questão de machismo, questão de ela não ter capacidade de poder comandar. Mas sim porque os lideres sempre eram os primeiros a serem atacados.

– Vamos iniciar o turno logo após o jantar. Naruto pega o primeiro turno, eu o segundo e Sasuke o terceiro. Iremos seguir com a missão nos primeiros indícios do amanhecer, devemos ganhar tempo.

Concordamos com todas as ordens e logo me retirei para descansar. Deveria dormir e despertar para o meu turno, despertar sem sonhos. Se eu tivesse sorte.

Acordei ofegando. Meu corpo se sentou em um solavanco e pingava grossas gotas de suor. Respirei fundo várias vezes, tentei de forma inútil controlar minha respiração descompassada e tentava esquecer as imagens terríveis do meu pesadelo. Naruto havia parado de roncar, ele estava acordado.

Droga. Levantei decidido ir até um lugar distante e descontar minhas frustrações em qualquer árvore, rocha ou até em um ninja inimigo.

Saí da barraca e encontrei um par de orbes verdes me encarando preocupada. Todas aquelas cenas voltaram na minha cabeça, todas passando lentamente nos meus olhos... Vendo-a perecer em meus braços, seus olhos perdendo o brilho e se fechando lentamente. Cruel.

Torne-o realidade Sasuke...

– Sasuke?! – ela se levantou e fez menção de se aproximar – Está tudo bem?

– Sim, estou. Preciso de ar.

– Mais ar do que está tendo...

– Cale-se! – vi quando ela se sobressaltou com meu tom de voz, seus olhos ficaram surpresos, arregalados. Soltei um suspiro cansado – Olha, vou conferir o perímetro. Pode ir descansar.

– Ainda não é seu turno.

Encarei-a. Não queria discutir, não com todas as imagens me sufocando lentamente. Deixei-a para trás e sem hesitar comecei a correr. Para longe dela...

.*.*.

Sakura entrou na barraca de Sasuke alguns minutos depois dele ter sumido na floresta e se sentou distante do local onde ele havia adormecido por poucas horas. Ela observou o local encharcado e bagunçado. O local que descrevia muito bem como estavam seus sentimentos e sua mente. Aproximou-se de Naruto e o cutucou.

– Sei que está acordado Naruto e se não quiser ver estrelas é melhor olhar para mim.

Com gemidos resignados ele abriu os olhos e a encarou curiosamente. Ele sabia o porquê dela estar ali. Ele havia escutado Sasuke, havia escutado seus temores, seus fantasmas no pesadelo que tinha tido alguns minutos atrás. Sakura também havia escutado e era por isso que ela estava ali dentro da barraca olhando-o preocupada. Sim, ela havia escutado e estava preocupada com Sasuke.

– Me diga tudo o que sabe.

– Do que está falando Sakura-chan? – ele limpou os olhos para espantar a sonolência

– Sasuke. Eu ouvi tudo Naruto e se vocês se odiassem eu até entenderia a agonia por qual ele estava gritando. Ele estava tendo um pesadelo, – suspirou – e hoje não foi a primeira vez.

– Como você sabe disso?

– Quando ele saiu da barraca... Naruto, eu o vejo sempre assim. Quando saio tarde do hospital por causa de um plantão e o vejo treinando. Ele não treina para aumentar suas habilidades e sim para esquecer algo que o está afligindo.

– Sasuke anda tendo pesadelos. Não sei quando começou, mas teve uma noite que ele veio até minha casa pedindo para ajudá-lo.

– Ajudar? – olhou-o sobressaltada. Sasuke era a última pessoa que pediria ajuda a alguém.

– Ele estava sufocado e chorando Sakura-chan. Você tem ideia de como eu fiquei quando o vi assim? – se sentou e encarou suas mãos – Me senti um lixo quando ele me contou o que estava acontecendo. Não sabia como ajudá-lo e nem sei ainda. Achei que tivesse parado, mas está piorando.

– Sobre o que ele sonha?

Naruto encarou os orbes verdes que estavam sérios, receosos e preocupados. Ele tinha feito uma promessa a Sasuke, não poderia contar nada sobre o clã Uchiha e sobre seus pesadelos. Amava os dois e odiava vê-los separados, vê-la odiando Sasuke. Iria contar, precisava. Talvez fosse o único jeito de ajudá-lo...

– Sobre os fantasmas do passado e sobre você Sakura-chan. – observou-a sentar impotente na frente dele e notou os olhos de Sakura se encherem de lágrimas – O que vou te contar aqui vai mudar muita coisa, mudar o jeito que você o vê. São coisas que ele me fez prometer nunca contar a você.

– O-o q-que? Porque ele não quer que eu saiba? N-Naruto?!

– Ele quer que você o odeie, porque assim ele acha que permanecendo longe dele você continuará viva.

Eu me afastei para encarar a dor.

Eu fecho meus olhos e me afasto.

(...)

Eu não posso continuar vivendo assim

E eu não posso retornar do modo como vim

Acorrentado por este medo de nunca encontrar uma forma

De restaurar minha alma

E eu vou vagar até o fim dos tempos

Vida pela metade sem você

Evanescence – My Heart is Broken