Santuário escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 18
Tempo de reconciliação




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Mônica torcia as mãos, tentando criar coragem para fazer aquilo. Não era algo fácil para alguém com um gênio como o seu, porém ela sentia que era necessário. Ao ver a animosidade que Cebola tinha com Nina, ela não pode deixar de refletir sobre sua antipatia pela Irene. Pensando bem, o que aquela garota tinha lhe feito? Toda aquela birra começara só porque os dois foram estudar juntos. Que problema havia nisso? Afinal, ela já estudou junto com DC algumas vezes e não tinha acontecido nada.

Cebola a amava, então por que se preocupar? E por que ter tanta hostilidade contra uma pessoa que nunca lhe fez nada?

Apesar de ser domingo, a escola costumava oferecer atividades extras nos fins de semana e muitos alunos freqüentavam, inclusive Irene. Após procurá-la por toda parte, Mônica a encontrou sentada sozinha em um dos bancos do pátio da escola. Mesmo havendo tantas garotas por ali, ela ainda estava isolada e talvez temerosa de se aproximar delas.

“Ela não tem nenhuma amiga porque você tem bronca dela. E todas as meninas vão pela sua cabeça! Não acha que é hora de parar com essa birra?”

Na época ela não tinha gostado nem um pouco de ouvir aquilo. Após refletir, ela acabou chegando a conclusão de que o Cebola estava certo. Por culpa sua Irene estava ficando isolada e sem amigas e ela não gostava nem um pouco daquilo. Era muito triste uma pessoa ficar tão sozinha assim. Embora ela tivesse amigos, não era a mesma coisa que ter garotas para fofocar, passear no shopping, desabafar sobre os problemas... Irene estava sendo privada de tudo aquilo apenas por causa de uma birra injustificável.

Assim que criou coragem, Mônica chegou perto dela, que ao contrário do que ela esperava, lhe recebeu com um sorriso.

- Oi, como vai?

- Er... oi... bem... – ela engasgou algumas vezes. – eu estava pensando, sabe... tipo assim... ai, que coisa! Seguinte, Irene! Eu não sou lá muito boa com isso então vou ser bem direta. Eu só queria pedir desculpas. Pronto, falei!

- Desculpa de quê?

- Acontece que eu, hã... fiquei com ciúmes do Cebola com você, então acho que isso meio que te deixou isolada da nossa turma.

Ela ficou pensativa, lembrando-se de que certa vez Cebola tinha dito que Mônica era cismada com ela. Então era mesmo verdade...

- Ciúme do Cebola? Por quê? Nunca teve nada entre a gente! Nós somos só amigos...

- Sei disso, acontece que... sei lá! Vocês dois estudando juntos, você chamando ele de Cê...

- Achei que fosse o apelido dele...

- É que só eu chamo ele assim, sabe...

- Então é isso... olha, foi mal. Eu não sabia, juro! E ele também não falou nada, então achei que não tivesse problema!

- Se é assim, então tudo bem. Olha, você pode aproximar da gente, sair pra ir ao shopping, ir as nossas festas... não fica mais encanada comigo não, tá?

- Puxa, você tá falando sério? Eu posso fazer parte da turma?

- Por mim, pode. Fazer amigos é sempre bom.

- Ai, obrigada! Nossa, eu nem acredito que agora vou poder aproximar mais do Lucas... ops!

Ela levou um susto.

- Então você gosta do Lucas? Nem sabia!

- Er... faz um tempo que eu queria aproximar mais dele, sabe...

- Ué, então cai dentro! Quanto tiver uma chance, vai falar com ele.

- Falar o quê?

- Ele gosta de esportes e é fanzaço de Herbert Vianna e da banda Paralamas do Sucesso.

- Não sabia, que legal!

- Vamos fazer o seguinte: pelo que eu sei, o Lucas está na quadra de basquete agora, então por que a gente não vai lá ver os meninos jogarem? As outras meninas também estão lá.

- E-eu p-possso? De verdade?

- Anda, vamos logo.

Mônica fez com que Irene se levantasse e as duas foram de braços dados para a quadra de basquete, onde os garotos jogavam. Conforme ela imaginou, Lucas estava mesmo jogando e fazendo várias cestas para a alegria das garotas.

Quando ela chegou junto com Irene, o susto foi geral e por um instante todos duvidaram de que aquilo estivesse acontecendo.

- Que foi? O jogo é lá, ó! – Mônica falou fazendo com que as outras meninas voltassem a prestar atenção ao jogo.

Durante o resto do jogo, Irene foi se enturmando aos poucos e Mônica viu que ela não era má pessoa. Ela era simpática, bem educada, meiga e tinha uma boa conversa. Talvez até pudessem ser amigas no futuro, quem sabe? Embora não quisesse forçar nada, aquela era uma possibilidade.

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Quando o primeiro tempo de jogo acabou e os rapazes foram tomar água e se refrescar, Cebola ficou olhando de longe enquanto as duas conversavam. Pelos risos, ele deduziu que elas tinham se entendido. Quem diria que a Mônica fosse capaz de deixar a teimosia de lado e acabar com aquela picuinha com a Irene? Nem ele esperava por isso.

“Humpt! Aposto que ela tá fazendo isso pra jogar na minha cara depois! Agora ela vai ficar falando que eu é que estou de birra com a fada do mato!” ele pensou, irritado. E sua irritação aumentou mais ainda quando ela deixou Irene conversando com as meninas e foi falar com DC, que também descansava do jogo. A convivência dos dois estava aumentando mais do que ele gostaria.

- Ô careca, se você não ficar esperto, o DC vai acabar te passando pra trás!

- Lá vem você pensando besteira de novo!

- Se você não quer ver, problema seu. Mas que os dois estão andando juntos mais do que antes, isso não dá pra negar. Eles até tem um plano bem sinistro pra hoje a noite... – Cascão falou de forma provocativa e caiu na risada ao ver a cara que Cebola tinha feito.

- Cuméquié? Explica isso dileito! – ele falou alto, sacudindo o amigo pela camisa.

- Ô, calma aê, véi! Não é nada disso que você tá pensando, é outra coisa.

- É o que então?

Após explicar o plano da Mônica de invadir a casa do dono da construtora, Cebola não se sentiu mais tranqüilo.

- Ela tá doida! Que negocio é esse de invadir a casa daquele sujeito?

- Ué, ela tá achando que ele roubou aqueles documentos e escondeu na casa dele, é isso.

- E ela vai entrar lá pra pegar de volta?

- Ou isso, ou deixar que o Recanto do paraíso vire um (argh!) parque aquático.

- Fala sério! Aqui, ela pediu sua ajuda?

- Pediu, mas eu ainda não respondi se vou ajudar. Sei lá, isso é muito perigoso! Já pensou se pegam a gente?

- Dloga! Eu não posso deixar ela fazer isso!

- Então divirta-se convencendo a miss teimosia, porque aquela ali não vai mudar de idéia de jeito nenhum!

Cascão estava certo. Cebola gastou toda sua lábia e argumentos e mesmo assim Mônica permaneceu irredutível.

- Se você não quer ajudar, é direito seu, mas eu vou fazer alguma coisa sim!

- E aposto que o DC vai junto!

Ela entristeceu um pouco.

- Na verdade não... o Nimbus não deixou e ameaçou contar pros pais deles...

- Pelo menos o Nimbus tem algum juízo na cabeça!

- Pois eu vou nem que seja sozinha! E não tente me impedir!

Antes que ele pudesse falar mais, ela o deixou sozinho e voltou para perto das amigas. Pelo visto, nada no mundo ia convencê-la do contrário.

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“Hum... deixa eu ver... será que devo levar flores? Não, ela pode ficar triste se eu arrancar as flores das plantas... bombons ela não come, então eu não sei o que levar. Afe, o que eu faço?” enquanto voava procurando alguém para proteger, Ângelo ia pensando em como falar com Nina. Aquilo era mais fácil na teoria do que na prática. Nunca em sua vida ele teve experiência igual e não fazia a menor idéia de como falar com uma garota.

No meio do caminho, ele viu uma menina que ia cair da janela de um prédio e entrou em ação, colocando-a para dentro e fechando bem a janela. A cada pessoa que protegia, ele se sentia mais feliz e completo, sentindo que aquele era o sentido da sua vida. E saber que aquilo não o impedia de viver seu amor com Nina o deixava ainda mais feliz e bem disposto para desempenhar sua missão.

Quando fez meio dia, ele sentou-se a uma sombra para descansar um pouco. Mesmo sendo inverno, ainda tinha um pouco de sol. Ele olhou para o céu e ficou contemplando as nuvens e o azul que escondia grandes mistérios que existiam lá fora.

D. Morte estava certa, não havia injustiças. Todos tinham o direito de amar e ser felizes, não existiam excluídos.

De repente e sem pensar no que estava fazendo, ele fechou os olhos e falou em voz alta.

- A Ti, Senhor, eu gostaria de retornar neste instante. Quero louvar-te com a força da minha vontade, e não com a covardia de quem não soube escolher um caminho diferente.

Um grande sentimento de paz e bem estar invadiu seu ser e nunca em tanto tempo ele tinha se sentido tão pleno e completo quanto naquele momento. Era como se tudo estivesse em seu lugar e apesar dos problemas, ele sabia que as coisas estavam bem encaminhadas, certo de que junto com quaisquer problemas também viriam as soluções. Então sua luta contra Deus tinha acabado, pelo menos por enquanto já que algo lhe dizia que algum dia aquele combate poderia surgir de novo. Mas por algum tempo, ele teria paz e segurança para continuar seu caminho, então era tempo de reconciliar e ficar bem o Criador.

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Graças ao seu esforço e o de outras ninfas, o vazamento de óleo tinha sido contido e daquela vez a vida marinha seria poupada. Embora cansadas, elas estavam felizes por terem conseguido terminar sua missão. Seu medo agora era com o futuro. No dia seguinte as obras teriam inicio e dentro de pouco tempo seu lar estaria destruído.

Com o trabalho ali concluído, as ninfas se dispersaram procurando por novas tarefas e Nina seguiu seu caminho ainda tendo aquela preocupação em mente. Se ela ao menos tivesse Ângelo para apoiá-la... não, não era possível. Ela sabia que ficar com ela significava para ele perder sua imortalidade e não ser capaz de proteger as pessoas. Como tinha muito amor a sua missão, ela entendia muito bem as razões dele. Não era Justo fazê-lo abrir mão de tudo só para ficar ao lado dela. Ele não seria uma pessoa completa se fizesse isso e ela não se sentiria feliz sabendo que ele tinha deixado seu trabalho de lado por causa dela.

Ainda assim ela não pode deixar de pensar em como tudo seria mais fácil se eles pudessem se amar sem nenhum impedimento. Pelo menos não doeria tanto a perda da sua casa e ela teria mais forças para lutar todos os dias contra os monstros.

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- Ih, que cara mais azeda é essa?

- Ah, não me chateia não, baixinha!

- Olha que eu conto pra mamãe!

- Blé!

Ele voltou a assistir a televisão, ainda remoendo seu mal humor. A lembrança da Mônica se entendendo com Irene ainda lhe incomodava. Era estranho. Durante tanto tempo ele se esforçou para que aquilo acontecesse e quando aconteceu, ele não conseguia ficar feliz porque sabia que agora não teria mais razões para revidar quando Mônica criticasse sua birra com a Nina. E também lhe incomodava um pouco saber que Mônica tinha feito aquilo por si mesma e não porque ele lhe aconselhou.

O jornal que ele estava assistindo deu a notícia de um vazamento de óleo que tinha sido controlado, salvando a vida marinha.

“Engraçado... será que a fada do mato ajudou a arrumar isso?” aquele sim era departamento dela, embora ele achasse um desaforo alguém ter que passar a vida limpando a sujeira dos outros. E o que ela ganhava em troca? Aquilo não tinha lhe ocorrido antes. Em sua cabeça, era apenas obrigação dela, mas seria justo ser obrigado a fazer algo sem ganhar nada em retribuição?

“Poxa, deve ser difícil pra ela ficar limpando nossa sujeira. Ah, tá! Mesmo assim ela deixou minha irmã na mão quando ela precisou!”

Mariazinha sentou-se ao lado do irmão para assistir TV quando o jornal terminou e o comercial do futuro parque aquático passou, fazendo-a perguntar.

- Vocês não vão conseguir salvar a casa da Nina?

- Sei lá, nem tô ligando pra isso!

- Por quê? É a casa deles! Se ali virar um parque, onde eles vão morar?

- Não é problema meu!

- Ai, como você é egoísta e mau!

- Eu? Egoísta? Fala sério! Esqueceu que aquela fada do mato não quis te salvar quando você precisou?

A menina fechou a cara e olhou para ele com a expressão bem séria.

- E por acaso ela ia conseguir salvar meus amigos? A D. Cotinha? O gatinho e o cachorrinho dela?

- Er... – só então ele se deu conta de que Nina não teria condições de resgatar a todos. – acho que não... eu tinha pedido pra ela buscar você.

- E deixar todo mundo em perigo?

- ...

- Que coisa feia, Cebola!

- Feia nada, eu estava preocupado com sua vida!

- E a vida dos outros, também não é importante?

- Só que você é minha irmã!

- Se a Nina tivesse ido me ajudar, teria salvado só minha vida. Acabando com a enchente, ela salvou a vida de todo mundo.

Ele abaixou a cabeça, envergonhado por não ter pensado naquilo antes. Era algo tão obvio, tão simples e mesmo assim não tinha passado por sua cabeça.

- Você não entende? Ela me ajudou sim, só que de outro jeito! Ela ajudou eu e todo mundo!

- Puxa... não tinha pensado nisso, não dessa forma...

- E agora a casa dela tá em perigo e você não quer ajudar!

Depois de ouvir aquilo, ele sentiu a raiva que tinha de Nina escorrendo como areia em seus dedos. De qualquer forma, ele sabia que não ia conseguir manter aquilo por muito tempo depois de ter visto a Mônica fazendo as pazes com a Irene. Se sendo teimosa daquele jeito ela foi capaz de dar o braço a torcer, por que com ele seria diferente?

Ao pensar da Mônica, o rapaz saltou do sofá, lembrando-se de que naquela noite, ela pretendia invadir a casa daquele empresário para procurar os documentos. Ele correu para o quarto e foi ligar para o Cascão, marcando um encontro com o amigo.

Cebola chegou a conclusão de que tinha deixado Mônica sozinha por tempo de mais. Que tipo de sujeito ele era deixando-a enfrentar tudo aquilo sozinha só por causa de uma birra sua? Ele se ressentia por ela estar andando com o DC, mas aquilo só estava acontecendo porque ele a tinha deixado na mão e ela não teve outra alternativa a não ser procurar por outro que fizesse o que ele não queria fazer: lhe dar suporte e apoio. Só que aquilo era tarefa dele, não do DC, Toni, Felipe ou qualquer outro cara. Somente ele podia ficar do lado dela, protegendo e apoiando e Cebola prometeu a si mesmo que nunca mais ia deixá-la na mão de novo.


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Notas finais do capítulo

A oração do Ângelo também foi, em parte, tirada do livro "O Monte Cinco", de Paulo Coelho. É da parte onde Elias faz as pazes com Deus.



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