Me encarei no espelho do dormitório. O vestido preto caia bem em mim. Eu nunca entendi direto a razão de usarmos preto em funerais, afinal, a maioria das pessoas fica bem de preto. Se usássemos mostarda, eu entenderia. Eu nunca havia visto uma pessoa que ficasse bem usando uma roupa inteira mostarda.

Alguém bateu na porta. Abri e me deparei com Harry, todo vestido de preto, na minha frente, mais bonito que uma viúva de um filme antigo. Eu conseguia ver que ele estava machucado. Ela havia me contado para onde fora com Dumbledore, assim que voltamos para o dormitório. Me parecia loucura que eles teriam ido para uma caverna e aceitaram beber um líquido estranho para conseguir uma Horcrux. Era loucura, mas era uma loucura que precisava ser feita para que tudo isso acabasse logo e menos vidas fossem perdidas.

Eu conseguia lembrar perfeitamente dos eventos da noite passada.

A torre de astronomia.

A corrida atrás dos Comensais da Morte.

Todos levantando varinhas iluminadas em homenagem ao finado diretor.

Draco havia feito isso.

Snape também.

Dumbledore havia confiado nos dois até os últimos segundos da sua vida.

– Você está pronta? - ele perguntou, livrando-me dos meus devaneios

Assenti.

– Hermione vem com a gente? - ele perguntou tentando ver se ela estava dentro do dormitório

– Não - eu disse - Ela levantou cedo e disse que precisava fazer algumas coisas antes de ir. Ela nos encontrará no jardim.

– Certo. - ele disse

– E Rony? - perguntei

– Os Weasleys vieram. - ele disse - Rony foi se encontrar com eles.

Assenti.

Harry e eu descemos até o jardim, silenciosamente. Até os quadros dos corredores pareciam tristes e os fantasmas pareciam mais transparentes.

Vi Helena conversar com o Barão Sangrento, ao longe. Eu não consegui identificar se ela estava triste ou se estava incomodada com a conversa. Talvez os dois. O Barão Sangrento era bastante assustador.

O jardim estava lotado quando chegamos. Avistei Rony e Mione, com olhos inchados e duas cadeiras vazias ao seu lado. Puxei Harry e sentamos ao lado deles.

– Oi - sussurrei

Ambos acenaram com a cabeça.

– Eles já vão começar. - Mione disse - Eles disseram que esperariam cinco minutos, caso alguém estivesse atrasado, mas é claro que eles estavam esperando vocês dois.

– Desculpa - tentei rir

Ela deu de ombros.

– Ninguém os culpa. - ela disse - Deve ser mais difícil para vocês dois que viram acontecendo.

– Não é. - eu disse

Ela me encarou, confusa.

– Eu não poderia considerar a minha dor maior, só por ter presenciado. - eu disse - Quero dizer, cada um aqui tinha uma conexão com Dumbledore.

Ela assentiu.

Harry abriu a boca para comentar alguma coisa, mas foi interrompido. O funeral estava começando.

Várias pessoas deram depoimentos.

Ou, pelo menos, tentaram. Como foi o caso de Hagrid.

Quando estavam prestes a acabar com os depoimentos, eu me levantei. Havia uma pessoa que precisava ouvir algo confortante.Fui até a frente do caixão e encarei Dumbledore.

– Oi Diretor. - eu sussurrei

Encarei todo mundo outra vez.

– Bom, hm, eu sou a Alice. - comecei

Suspirei.

– Dumbledore gostava de dizer coisas sobre a luz. - eu disse sorrindo - E sobre como conseguiríamos vencer esses tempos escuros apenas lembrando de acendê-la. E foi isso que todos nós fizemos, ontem à noite.

Vi McGonagall limpando uma lágrima no casaco e Slughorn sorrindo, me encorajando. Levantei meus olhos e encarei Harry.

– Não pensem que está tudo mais escuro do que nunca. - eu disse - Todas as pequenas luzes que foram acesas ontem vão ajudá-los. Todas as pequenas luzes que foram acesas desde o começo dessa loucura toda já estão ajudando.

Harry assentiu.

– Você não está sozinho agora. - murmurei - Nunca esteve.

Agradeci com a cabeça e me dirigi para o meu lugar. Comecei a chorar assim que encarei Harry novamente.

Harry mal me deixou sentar e me puxou para um abraço apertado. Percebi que ele também estava chorando consideravelmente muito. Ele beijou o topo da minha cabeça e murmurou um agradecimento.

Quando levantei os olhos, o caixão de Dumbledore não estava mais lá.

Todos estavam se levantando mas nós quatro não nos movemos.

– Foi um discurso lindo, querida - disse a Sra. Weasley quando passou por nós.

– Obrigada - sorri

A maioria das pessoas que passava por nós, sorria.

Quando todos já haviam ido, nos levantamos e sentamos na grama, na beira do lago.

– Eu fico imaginando quem será colocado em seu lugar… - eu disse quebrando o silêncio - Espero que seja McGonagall.

– Não - disse Harry

– Você não quer que seja a McGonagall? - perguntei

– Não é isso… - disse Harry - A única coisa que impedia Voldemort de invadir Hogwarts está deitada naquele caixão. É só uma questão de tempo até que ele chegue.

Suspirei.

– Vocês precisam tomar cuidado ano que vem. - Harry disse - Eles irão vigiar vocês, provavelmente, para descobrirem onde eu estarei.

Eu ri.

– Você não acredita em mim? - Harry perguntou

– Eu acho que você está louco. - eu disse

– Por não voltar para Hogwarts? - Harry riu

– Por acreditar que não iremos com você. - respondi

A sua face tornou-se séria.

– Eu não vou deixar que façam isso por mim. - ele disse

– A escolha não é sua. - disse Rony

– Vai ser perigoso. - Harry protestou

– Vai ser pior se ficarmos aqui. - disse Mione - Harry, você precisa de nós. Você não tem que fazer isso sozinho.

– Eu nunca me perdoaria se alguma coisa acontecesse a algum de vocês. - Harry parecia prestes a chorar de novo

– Harry - eu disse segurando sua mão - Vamos estar todos juntos. Nós podemos nos proteger juntos. Você não precisa cuidar de nós três. Você não teria conseguido passar por tudo isso sem a nossa ajuda.

– Eu sei disso. - ele disse

– Com a ajuda de Hermione, digo. - eu ri (e Mione também, embora ela tenha tentado esconder) - Mas Rony e eu podemos assumir cargos bem legais como cozinheiros ou como apoiadores morais.

– Vou pegar algumas receitas com minha mãe. - riu Rony

– A gente pode entrar em um curso de massagem também. - eu disse a ele e vi seus olhos se iluminarem, enquanto ele assentia.

Harry sorriu para nós três e suspirou aliviado.

– Obrigado - ele sussurrou

– Vamos detonar aquelas Horcruxes - disse Rony

– Falando nisso… - disse Harry colocando a mão no bolso - Temos que destruir essa aqui.

Ele mostrou o medalhão para nós.

– Tenta abrir. - eu disse

– Ah certo. - disse Rony - Ai Você-Sabe-Quem pula daí de dentro.

Ri.

– Tomara que seja a versão adolescente dele, pelo menos.

Harry revirou os olhos e abriu o medalhão. Tinha um pedaço de papel dentro.

– Ele deixou um bilhete? - perguntei

Harry abriu e leu em voz alta.

“Para o Lorde das Trevas,

Eu sei que terei morrido muito antes de você ler isso, mas eu quero que você saiba que fui eu quem descobriu seu segredo.

Eu roubei a verdadeira Horcrux e pretendo destruí-la o mais cedo que eu puder.

Eu encaro a morte na esperança de que quando você encontrar seu oponente, você será mortal de novo.

R.A.B”

– Quem é esse? - perguntei

Harry deu de ombros.

– Viu, você não está sozinho. - Rony disse

– Valeu - Harry riu

Suspirei.

– Bom, acho que temos que achar mais um então. - eu disse - Ou pelo menos descobrir ser esse tal de R.A.B conseguiu destruí-la.

– Me faz pensar que tudo foi inútil. - disse Harry

– Harry… - Mione disse

– Você sabe que isso não tem uma relação direta com a morte de Dumbledore. - eu disse

– Mas se não tivéssemos ido, ele não estaria tão fraco ontem. - Harry disse

– Harry, ele morreu com um Avada Kedavra. - eu disse - Não existem muitas pessoas que conseguem sobreviver a isso, fracas ou fortes.

Harry assentiu.

Senti algo pressionando meu ombro e vi Fawkes sentada nele.

– O que você vai fazer agora? - perguntei

A ave olhou para mim e pareceu sorrir.

Com um impulso, ela levantou vôo e se foi.

– Acho que ela vai se juntar a ele. - disse Mione

Sorri.

...

Mais tarde, no dormitório, não pude pensar no quanto sentiria falta de tudo aquilo. Não conseguia acreditar que não iria voltar a morar naquele quarto. Hogwarts tinha sido a melhor coisa que já havia acontecido comigo. E só de pensar que havia uma pessoa específica que havia destruído aquilo, um pouco por ano, me deixou com raiva. Levantei da cama chorando e desci as escadas para o salão comunal. Respirei fundo e tentei controlar o choro.

– Lizzie? - ouvi alguém dizer

Apertei os olhos e vi Harry parado na minha frente.

– Você está bem? - ele perguntou

Assenti.

– É só que… - murmurei - Achei que fosse morar aqui por sete anos.

Ele sorriu.

– Eu também. - ele disse

– O que você está fazendo aqui? - perguntei secando as lágrimas

Ele olhou para o sofá e deu de ombros.

– Eu acho que sempre dormi melhor aqui. - ele disse sorrindo

Sorri.

– Você quer dormir nele? - ele disse - Eu consigo aturar os roncos de Neville, sem problemas. Já me acostumei.

O encarei.

– Quer? - ele perguntou

Suspirei e segurei sua mão. Fui até o sofá, puxando-o.

– Alice? - ele perguntou - O que você está fazen…

– Cala a boca - sussurrei

Deitei no sofá, logo depois de ter feito com que ele deitasse também, e me aconcheguei.

– Boa noite, Harry. - eu disse

– Boa noite, Alice. - ele respondeu