Na manhã seguinte estava tendo uma discussão acalorada com Finnick no caminho para a escola. O pirralho insistia em afirmar que Alf o Eteimoso era um seriado velho e chato. Juro vou fazer esse moleque assistir todas as temporadas até aprender o que é bom. Tenho que cuidar do gosto cultural do pentelho não é?

Meu desânimo foi às alturas quando vi Drew, Effie e seu bando de seguidoras me esperando no final da rua. Assim que me viram as garotas sorriram satisfeitas. Eu sabia que elas estavam tão felizes quanto predadores ao avistarem uma caça. Eu era a caça. Eu era o cordeirinho que iria ser abatido. Mas eu não ia deixar isso acontecer na frente de Finnick.

Eu não ia deixar meu irmão caçula, a única pessoa no mundo que me admirava, me ver fraquejar. Não ia deixar Finnick ver como eu ouvia passivamente o jeito que elas mexiam com nossa família.

–Finnick vai indo para escola, eu vou esperar uma pessoa aqui.

–Quem? Não me diga que você arranjou um namorado no primeiro dia de aula.

–Não Finnick, dá para você uma vez na vida fazer o que estou pedindo?- Já estava ficando impaciente, elas estavam muito perto, muito perto mesmo.

–Ok, então você arrumou um namorado, estou indo para escola agora, fique tranquila. Seu segredo está a salvo comigo

Ele deu as costas correndo, eu sei mania de família, eu fiz o possível para sorrir para ele. Assim que ele virou a esquina fui andando, rezando para que, pela primeira vez na vida elas não me vissem. É claro, minhas preces não foram ouvidas.

–Olá, olá- disse Effie com aquela vozinha afetada que me revirava o estômago. –Se não é a filhinha do turco.

Meu pai era libanês, ele não era nem muçulmano. Era cristão. Tinha saindo do país fugindo de uma das inúmeras guerras. Mas apenas o fato de ele ser moreno e ter os mesmos olhos cinzentos que eu, parecidíssimo com aquelas fotos estereotipadas de árabes da National Geographic, elas logo presumiram que meu pai deveria ser árabe.

No fundo de suas cabeças doentias, ele estava em casa, sentando em uma linda almofada de seda, rodeado de mulheres.

Toda vez que elas falavam desse modo sobre ele eu tinha vontade de explicar que hoje em dia só quem vivia desse jeito eram os barões do petróleo, no Afeganistão, na Arábia saudita, não na Turquia. Não no Líbano de onde meu pai havia fugido.

É claro que, Líbano, Turquia, Afeganistão, dava tudo na mesma na mente xenófoba daquelas patricinhas. Duvido que elas tenham parado para pensar que existe uma enorme diferença entre Turco e Árabe.

– Como foi seu verão? Aposto que seu pai já encontrou um noivo para você não é? Aposto que ele mal pode esperar para se livrar de você.

Meu pai não tinha me arranjado um noivo. Mas doeu. Por que a verdade é que meus pais mal podiam esperar para eu sair de casa.

–Coitado ninguém iria querer uma garota sem peito como essa ai.

Ponto para elas de novo. Nenhum garoto iria prestar atenção em mim. Como sempre, ignorei todos esses comentários, torcendo para que elas não vissem como eles me afetavam, e fui em direção à escola. Felizmente, elas continuaram onde estavam. Provavelmente esperando a próxima vitima.

Na rua em frente a escola, para completar minha felicidade, Peeta Mellark, de algum modo, conseguiu me enxergar e veio em minha direção. Impressão minha ou ele parecia envergonhado?

– Oi, é..., eu queria me desculpar por ontem.

Ok, agora eu estou confusa. Confusa e envergonhada. Ele veio me pedir desculpas? Mesmo eu tendo o ofendido também? Acho que nunca vou entender esse garoto. Decido que é melhor nem tentar.

–Oi, tudo bem. Não começamos muito bem não é? Eu não devia ter te dito aquilo também.

Ele sorri e estende a mão.

–Vamos começar com o pé direito então? Amigos? Meu nome é Peeta Mellark e o seu?

Eu rio, e aperto a sua mão. Deuses o que foi essa corrente elétrica que passou pela minha pele?

–Katniss Everdeen.

Ele pega minha mãe e me puxa em direção à escola. Penso no papel que estou fazendo de mãos dadas com ele. E por incrível que pareça quero continuar assim. Ah meu deus, eu não acredito que quero continuar de mãos dadas com Peeta Mellark.

Quando chego na escola me deparo com meus amigos. Eles estão nos olhando. Gale e Percy parecem confusos, Rachel está se segurando para não rir, Annabeth, ah eu vou matar Annabeth, está com cara de quem acaba de ver o casal do titanic em carne e osso.

Devo estar vermelha da cabeça aos pés. Solto a mão de Peeta na hora.

– Er...Preciso ir na biblioteca agora.- Digo querendo fugir de todos eles.

–Vou com você – Dizem Rachel e Annabeth juntas.

–Não -eu me controlo para não gritar- Eu vou na secretaria. Vocês vão se atrasar para aula. Tchau pessoal.

E saio antes que as duas possam me seguir. Não ia suportar papo de mulherzinha agora. Provavelmente as duas iriam querer que eu falasse algo sobre Peeta. Não. Definitivamente não. Droga, eu coro só de lembrar a cara deles.

Mas quando chego a biblioteca preferia mil vezes ter tido uma “conversa de mulherzinha” com as garotas. Não, não é possível. Será que nem aqui tenho paz?