Anjos de Cera escrita por Redbird


Capítulo 33
Dano Colateral


Notas iniciais do capítulo

Ai, ai pobre Katniss :(



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No meu sonho as duas crianças brincam no parquinho. O menino e a menina tem cerca de oito anos. Peeta e eu estamos correndo em volta de um pequeno chafariz. Reconheço a praça como sendo aquela em que nos encontramos na última vez. Peeta pega a minha mãe e nós dois caímos rindo um para o outro.

De repente o pai de Peeta se aproxima e o direciona para longe de mim. Nós dois começamos a chorar então o homem vem até mim com a mão levantada. Espero pela bofetada e fecho os olhos. Quando os abro não é mais o pai de Peeta que está ali, é Snow e o garoto estirado no chão é Gale. Suas bochechas estão vermelhas. Tento falar alguma coisa, mas ele não me ouve. Grito, mas ele continua imóvel.

Snow me pega pelo braço e me conduz para longe, enquanto me debato para voltar para Gale. Ele apenas me olha com os olhos vidrados e continua lá, observando eu me afastar. Grito mais uma vez, mas não há resposta.

Acordo suando frio e sinto um leve balanço. Percebo que estou em movimento, dentro de uma ambulância. Só consigo entender palavras entrecortadas e frases sem sentido. Um dos paramédicos percebe que estou acordada e vem falar comigo.

–Olá querida, estamos levando você de volta para casa. Você vai ficar bem não se preocupe. Seu pesadelo acabou. Durma mais um pouco.

E ele continua falando, mas não presto atenção. Acho que ele me chama umas duas vezes esperando alguma resposta. Mas a única coisa que me importa agora é Gale. Ele está morto. Eu também. Mas por que ainda estou respirando? Por que ainda sinto meu coração bater? Eu não deveria sentir nada disso.

–Ela está em estado de choque- diz o paramédico para um homem sentado do meu lado. É um policial. O policial que matou Gale. Que nos matou.

–Não se preocupe. Ela vai ficar bem assim que chegarmos em casa. O sequestro deve ter sido difícil- diz o policial.

Ele aperta minha mão. Gostaria de poder gritar, de poder fazer com que ele sentisse cada pedacinho de dor que sinto. Mas minha alma está tão longe do corpo que não consigo fazer nada disso.

Volto a dormir. Em todos os sonhos que tenho Gale está do meu lado, sorrindo, pegando minha mão.

–Vamos no cinema Catnip? Vamos entrar do nosso jeito que acha?

E no sonho eu rio.

Quando acordo novamente a presença dele é tão forte que ainda consigo ouvir sua risada. E principalmente consigo ouvir ele dizendo que eu vou ficar bem. Tenho vontade de chorar, mas não consigo. Alguém pega minha mão. Quando olho para cima percebo que é minha mãe. Ela dá um suspiro aliviado a me ver acordar.

–Katniss, como está se sentindo querida? Estávamos tão preocupados.

Não respondo. Não consigo. Ela deveria entender que mortos não falam. Ela deveria saber que assim como Gale eu não posso mais responder. Ela me olha com os olhos marejados. Além dela meu pai e Haymitch estão na sala. Haymitch a leva para algum lugar longe dali, posso ver que ela está desabando.

Meu pai simplesmente fica no quarto, apertando a minha mão. Fazia um bom tempo que eu não o via. Ele parece bem mais magro desde a última vez que eu o vi. Uma meia hora depois, uma mulher que penso ser a médica entra na sala. Minha mãe e Haymitch entram junto com ela.

–Bom, achamos que o estado físico dela está em perfeita ordem.

–O que você quer dizer?- Pergunta minha mãe.

–O que quero dizer que Katniss está bem, mas vai precisar de ajuda especializada, um psicólogo para ser mais exata. Como podem ver, a menina está em choque. Achamos que o que ela tem é depressão.

–Depressão?- A descrença na voz de meu pai é visível.

–Sim. Infelizmente essa é uma doença um pouco difícil de ser diagnosticada e muito comum para alguém que passou por um trauma como o que Katniss passou recentemente. Ele ainda está em estado de choque e acho que ela só vai conseguir se recuperar com ajuda especializada.

Escuto meus pais fazendo perguntas, escuto Haymitch contestando e consolando minha mãe. Mas já deixei de prestar atenção neles. Os vivos são tão persistentes quando se trata de consertar algo quebrado. Mas eu não tenho conserto. Meu peito também está rasgado assim como o de Gale.

Sinto que ainda estou grudada nele, como quando ele morreu. Mas dessa vez é diferente. Sua presença parece feita de um material indistinto, tão cinza como a poeira das casas depois de um furacão.

–Me conte uma história Gale- eu sussurro.

Ele apenas fica lá, sorrindo para mim, obrigando-me ao seu silêncio. Mas pega minha mão e sinto que não estou sozinha. Ele toca um ponto indistinto nas palmas da minha mão direita. Percebo que estou agarrada a duas coisas. O Anjo e o bilhete de Peeta. Nunca vou entender como ele conseguiu a proeza de ter me devolvido eles, mas o agradeço em silêncio. Ele continua sorrindo para mim.

É engraçado, mas sinto os minutos e as horas passarem voando por mim. Meus pais tentam falar comigo novamente, médicos me examinam, me mandam de volta para casa. Policiais vão lá em casa, conversam com minha mãe que chora mais um pouco. Enquanto eu os observo da escada. Às vezes acho que os vivos são tão patéticos.

Eu durmo de novo. Agora a única coisa que faço é dormir. Queria que isso fosse para sempre. Mas nem isso eu consigo. Eu odeio acordar e perceber que estou de volta em casa. Que não tenho mais Gale.

Prim vem até mim. Ela tem uma expressão triste. Sinto que ela está com pena de mim.

–Katniss, você precisa comer- ela me diz. Sua voz está fraquinha. Como se ela tivesse medo de falar comigo. Eu não respondo.

–Katniss, por favor- sua voz está cheia de urgência -Katniss, eu não odeio você, por favor, não fique assim. Fale comigo. Eu preciso de você.

Como eu não respondo ela sai depois de alguns minutos me deixando sozinha. Não sei se foi impressão minha, mas acho que ela estava chorando.

E continua assim. Todo o tempo. Os vivos me chamam, mas eu não escuto. Estou agarrada a toda minha tristeza como pedra. Não posso ouvi-los de onde estou. Alguém segura minha mão enquanto balanço a cadeira como uma alma penada. É Finnick.

–Katniss, por favor, eu sei o que disse, mas eu preciso que você me conte uma história. Não quero ver você assim. Por favor, me conte uma história.

Sinto algo molhando minha mão. Percebo que são lágrimas. Não sei se minhas ou de Finnick. A única coisa que eu entendo, no limbo em que me encontro, é que ele morreu. Ele morreu e nunca mais vai voltar.

Irene a psicóloga da escola vem ver como estou. Ela faz perguntas e eu não respondo. Ele tenta chamar minha atenção e eu ignoro. Depois de um tempo ela sai para falar com meus pais.

Percy, Annabeth e Rachel também vêm me visitar. Eles se sentam do meu lado e não falam nada. Depois de algum tempo posso ver que eles estão tentando falar comigo, mas eu simplesmente não consigo ouvir. Eles se vão e de alguma forma me dirijo para meu quarto. Como queria acordar no velho sofá da minha avó.

Quando acordo no outro dia, eu ainda estou no meu quarto. Mas há outra pessoa. Demora um tempo, mas quando vejo aqueles olhos azuis reconheço quem está no meu quarto. Peeta. Algo profundo e entranhado em mim estala e eu tenho vontade de correr e me aninhar nos braços dele. Mas não faço isso. Pela primeira vez desde que voltei consigo falar, embora seja só um sussurro.

–Peeta- minha voz sai baixa, estranha e fina.

–Oi –diz ele. Peeta se aproxima e começa a brincar com a minha mão- Você está com o bilhete e o anjinho. Me disseram que você não quis largar eles.

– Peeta- sussurro outra vez. Então sem aviso me atiro nos braços dele. Começo a chorar descontroladamente. Ele não diz nada, apenas fica lá afagando meu cabelo enquanto eu me despedaço.

Ele passa a tarde inteira comigo. Ficamos abraçados, sem fazer nada. Sinto- me quebrada e me agarro a Peeta como se ele fosse a ultima coisa viva no mundo. Ele me obriga a comer, a andar,a falar, a reagir, embora eu não queira. Mas me deixo levar.

Um pouco antes do anoitecer Snow vem até a minha casa. Sua expressão, embora seja de consternação, mostra que ele está orgulhoso do trabalho que fez. Dessa vez ao invés de falar com meus pais, ele vem falar diretamente comigo.

–Senhorita Everdeen- Diz ele de forma formal- Eu adoraria conversar com você se for possível.

–Ela não está em condições de falar agora- diz Peeta me vendo tremer.

Eu olho para Peeta. Pego sua mãe e depois de dias reajo. Há contas que eu preciso acertar com Snow.

–Está tudo bem Peeta- digo. Posso ver por sua expressão que embora ele esteja assustado, também está feliz com essa demonstração de reação.

Me retiro do quarto seguida de Snow e nos levo em direção ao escritório da minha mãe. Agora estamos sós, eu e ele.

–Ah senhora Everdeen, eu lhe disse uma vez que era melhor escolher bem os amigos. O que vocês aprontaram não é?

– Nós?- digo a dor dando lugar a raiva- O que exatamente acha que nós fizemos?

– Senhora Everdeen, eu vim aqui por que decidi perdoar o seu ataque durante nossa perseguição. Os policias já relataram que você estava sofrendo de síndrome de Estocolmo. Nós compreendemos tudo isso. É claro que você vai ter que depor,mas vamos esperar as coisas ficarem mais claras na sua mente.

–As coisas estão muito claras na minha mente senhor Snow. E sim, eu com certeza vou depor. E a policia vai ter que explicar como um policial atira num menor de idade. Não acredito que Gale fosse tão perigoso assim.

–Ah não. Ele talvez não fosse. Mas você fez um estrago e tanto. Nossos policiais ainda estão se recuperando das tijoladas. E sim, os policias vão responder por isso.

Não deveria, mas um certo orgulho cruel me invade quando escuto isso.

–Estão é?- Pergunto mordaz- Que bom que eles estão vivos. Gale não teve a mesma sorte.

– Senhorita Everdeen, a Morte de Gale foi um erro, infelizmente. Foi um dano colateral. Ele poderia ser até seu amigo, mas continua sendo um marginal.

– Dano colateral? Gale não é nenhum marginal –digo gritando- E pelo que eu saiba senhor Snow, a pena capital já foi abolida desse país há muito tempo.

– Ai, ai senhorita Everdeen pelo visto, a senhora continua defendendo seu amigo. Mesmo ele tendo a sequestrado.

–Gale não é marginal, não é ladrão. Ele não me sequestrou. Quem disse isso? Ele vale muito mais do que aqueles ricos engravatados que deixaram aquelas pessoas morrendo, esperando por um remédio ao qual tinham direito-Digo revoltada.

– Ai, ai menina. Eu já compri minha obrigação . Bom espero que consigamos resolver essa situação depois que você se recuperar e reouver o bom senso.

Ele caminha em direção à porta do escritório. Mas antes de sair ele ainda tem tempo para me dar um último conselho.

–Sabe, senhorita Everdeen, uma garota como você não deveria sair por ai se envolvendo com marginais.

Assim que ele sai, um grito escapa da minha garganta. Minha cabeça está girando. Sinto meu corpo enfraquecendo cada vez mais. Sinto alguém vir correndo. Peeta me agarra no exato momento em que estou prestes a cair no chão. Ele me leva até a cadeira mais próxima, tentando me acalmar.

–Katniss- diz ele segurando minha cabeça, fazendo com que eu olhe diretamente para ele- O que houve? Está tudo bem agora.

–Peeta-digo tentando achar minha voz- Snow,foi Snow. Naquela noite em que eu sai sozinha desesperada, o policial era Snow.



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Notas finais do capítulo

Então, espero que estejam gostando da Fic. Será que Katniss vai conseguir se recuperar da depressão? Espero que sim não é? Agora se quiserem me xingar, me torturar, dizer que me amam, ou simplesmente que eu sou um amor de pessoa e a pior escritora da face da terra, mandem um review. A doida aqui agradece :)