A Vida de Uma Garota Nada Popular escrita por Lu Carvalho


Capítulo 11
O Sotaque Loiro


Notas iniciais do capítulo

Dedicado à Alice :3 Espero que gostem!



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-O quê? – fiz, agora com a voz normal. Estranhamente normal, até que quase gritei. – Q-quer dizer... Você, hum, tem uma, er... parceira?

-Quem? Jessica? – por um momento pareceu que Matheus ficou constrangido, até um pouco desesperado, tanto que nossa apresentação foi assim: - Jessica, Mari. A garota que foi presa comigo e que salvou meu pai. Mari, Jessica. Minha, er, “parceira”.

Jessica estendeu a mão para mim junto de um sorrisinho amigável.

-Mas pode me chamar de Jessie, ou Jess. Meus amigos me chamam assim – desconfiadamente apertei a mão de Jessica, e então mandei:

-Prazer Jessica. Meus amigos me chamam de Mari, então pode me chamar de Mariana.

Jessica começou a rir, como se aquilo fosse engraçado, o que não era para ser. Estava apenas sendo sincera.

-Matheus não me disse que era tão engraçada assim! – disse com aquele sorrisinho no rosto e um pouco de sotaque na palavra “era”. – E, olha, ele sempre  fala de você.

-Ah, ele nunca me falou de você.

Jessica riu outra vez.

-Deve ser pelo fato de que cheguei à América há pouco tempo.

-Chegou? – perguntei.

-É, Jessie é da Inglaterra – explicou Matheus.

Tá, isso é legal. Tipo, muito legal mesmo. Mas, como era ela, não demonstraria nenhum tipo de entusiasmo nisso, então mandei:

-Ah. Não gosto do jeito que falam lá – o que é mentira.

Matheus forçou uma risada e disse:

-É, a Mari é bem engraçada. E teimosa.

Jessica riu um pouquinho outra vez.

-Ela é uma figura! – Jessica sotaquizou legal nessa frase.

Será que ela só sabe rir e colocar sotaque nas frases?

E, sim. Eu inventei a palavra sotaquizou.

- É – concordou Matheus. – Uma figura.

Lancei um olhar fulminante a Matheus, e esperei que ele me desse qualquer tipo de explicação.

Tá, o porquê de querer uma explicação nem eu entendi muito bem, afinal, éramos apenas amigos, e, você sabe, parceiros de sela. E também nem sabia o porquê o fato dele ter uma namorada me irritava tanto. Mas, sei lá. Alguma coisa meio que cresceu dentro de mim quando ele disse a palavra “namorada” na mesma frase em que “melhor do mundo”. E posso te garantir que essa coisa não foi muito positiva.

De qualquer jeito, Matheus apenas me deu um sorrisinho sem graça e no final de disse:

-Eu, er, vou para o banheiro e já volto.

As duas assentimos, então ele saiu do quarto. Virei a cabeça quase que imediatamente para Jessica.

Seu cabelo louro estava preso em um rabo de cavalo alto, deixando a mostra uma pequena tatuagem em sua nuca. Deveria ser alguma palavra, pelo que consegui ver durante exatamente quinze segundos a encarando intimidadoramente. De repente, Jessica olhou para mim também.

E foi como se seus olhos ficassem vermelhos por um momento.

Então, antes que seu namorado chegasse, Jessica foi bem alta e clara dizendo “É melhor que saiba que sou a única garota na vida de Matheus. Se pensa que pode ter qualquer tipo de conversa ou contato visual com meu fofucho está beeeeeeeem encrencada, ouviu não-parceira de Matheus?”.

Tá, tudo bem. Talvez ela não tenha dito isso. E talvez seus olhos não tenham ficado vermelhos. Na verdade, perguntou:

-Então, ouvi falar que gosta de arte!

-Talvez... Por que a pergunta?

-Quando morava na Inglaterra ia a muitas exposições de arte. Com obras de Lunnel Hamsed, Guercy N. Tie, ELoren...

MEU DEUS! PARE O MUNDO POR UM SEGUNDO!

-V-você... v-você... ELoren? – gaguejei.

-Se eu gosto de ELoren? – perguntou com aquele sotaque. – Admiro muito seu traba...

-AH MEU DEUS NÃO ACREDITO NO QUE ACABEI DE OUVIR! – a cortei. – UMA PESSOA A MAIS NO MUNDO QUE TEM CONTEÚDO NA CABEÇA!

Acho que eu meio que dei um berro, porque Jessica acabou se assustando um pouquinho.

-D-desculpe... É que não é todo mundo que admira muito seu trabalho e... é bem raro de encontrar.

-Não. Tudo bem. Eu também sou meio que fanática por ele, e acho muito legal que agora conheço alguém que também é!

Sabe, acho que com aquele sotaque e seu ótimo gosto para arte, talvez Jessica não seja tão nojenta como eu pensava.

Quer dizer, sei que isso pode parecer preconceito com loiras, mas, entenda, tenho péssima experiência com elas.

Com Anne, para ser mais exata.

-Sabe, talvez você seja legal – ponderei em voz alta.

-Ah... brigada – riu.

De repente, Matheus apareceu.

-Que bom que as duas já se conhecera...

-Ah, Sr. Matheus! Que coincidência você chegar agora - Jessie brincou. - Bem quando estávamos falando de sutiãs, calcinhas...

-Ahn, to indo.

Nós duas começamos a rir.

-Há-há. Muito  engraçado - disse Matheus. - Jess, seu celular ta tocando.

-Onde?

-Sala.

-Ok. Mariana, eu já volto - disse Jessica, com aquele sorriso amigável.

-Pode me chamar de Mari, Jessie.

Ela deu outro sorriso, porém desta vez foi mais à vontade. Jessie saiu, então Matheus me encarou confuso.

-O que foi? - perguntei, com um sorriso divertido no rosto.

Por um momento ele me lançou um daqueles seus sorrisos meio sedutores e alegres ao mesmo tempo, e depois veio se sentar do meu lado.

-Sua voz voltou ao normal?

-Sei lá. Vê se continua a mesma - comecei a gritar um "la-la-la" em sua orelha, o que o fez rir e tapar os ouvidos.

-Sim. Sua voz está normal.

Paramos de falar e nos olhamos por um segundo. Começamos a rir.

-Por que não me disse que tinha crises de asma? - Matheus perguntou, depois de pararmos de rir.

-É raro de acontecer. E... você... por que não me contou da Jessie?

Foi difícil, mas perguntei.

-Ah, sei lá. Faz pouco tempo que a gente se conhece. E a Jessica chegou há pouco tempo também.

-Ah - foi o que consegui dizer.

Um silêncio desconfortável se formou.

-Ela parece ser legal - comentei, depois de um tempinho.

-E é. Pensei que talvez você não fosse gostasse dela.

-Por quê?

-Ah, porque ela é legal demais.

Ficamos em silêncio um pouco.

-O que você quer dizer com isso?

-Que, ahn, você talvez não gostasse dela.

-Não. Não isso. Como assim que ela é legal demais?

O desespero ficou claro no rosto de Matheus.

-Não foi bem isso que eu quis dizer...

-Não. Tudo bem – mas não estava nada bem. – Sua namorada é legal demais comparada a mim.

-O que eu quis dizer é que ela é simpática demais, e normalmente as pessoas não gostam disso.

-Sorte a sua.

-Pelo que?

-Ter conseguido alguém tão legal que chega até ser chata para as pessoas.

Matheus deu uma risada. Só não sei por quê.

-Nossa. Como você consegue destorcer as coisas tão fácil.

-Não sei do que você está falando. Eu só disse que é muito legal que você tenha uma namorada de que goste...

-Igual a você e o seu.

De primeira, não entendi muito bem.

-Quem?

-Não se faça de desentendida. Aquele cara que saiu grudado com você depois que fomos a Bill Rocks.

Depois só de uns dois minutos que minha ficha caiu.

Ele falava de Thiago.

-Nós não somos...

-Ah, sei.

-Nem terminei a frase.

-Você iria dizer que não são namorados.

-Não. Não iria.

-Então iria falar o que?

-Nós não somos tão grudados, Matheus. Era isso o que eu iria dizer.

-Então você também tem um namorado.

Fiquei em silêncio. É lógico  que não tenho. A única pessoa que tem que ser meu namorado é Liam, mas ele ainda não entendeu isso. Mas, imaginando aqui sobre minha relação com Thiago... o beijo na frente da minha casa, os presentes e tal... éramos quase que namorados. Só que, você sabe, não namorados.

Matheus me olhava com uma sobrancelha levantada, como se minha demora para concordar dizia que não, eu não tenho. Mas se eu respondesse que não pareceria que eu impliquei com ele por bobeira, até por ciúmes. O que não era verdade! Então...

-É. Isso mesmo. Eu tenho namorado.

-Ah – foi o que ele disse. – Legal.

-É. Legal.

Um silêncio mortal se formou entre nós, até que Jessica chegou.

-Ahhhh! Vocês não vão acreditar!

-O quê, amor? – perguntou Matheus, colocando meio que uma ênfase na palavra amor.

-Ganhei quatro cupons para jantar no Espagork sexta à noite!

-Que ótimo, Jess! – Matheus se levantou até ela e deu um beijo em sua testa.

-Estava pensando se não podíamos ir – disse Jessica.

-Lógico que podemos.

-Ah, na verdade, eu estava falando com a Mari...

-Ah, beleza.

-Por que não vem com a gente, Mari? – perguntou, toda empolgada.

-Bem... eu não sei... é amanhã... muita lição...

-Deixa disso – interrompeu Matheus. – Por que não trás seu namoradinho?

“Namoradinho”. Que insensível.

-Sim. Talvez eu traga – disse um pouco irritada, então me levantei para ficar na altura de Matheus. O que não deu muito certo, já que ele é tão alto. Ou eu que sou muito baixinha.

-Beleza – Matheus disse.

-Beleza.

-Ok.

-Ok.

Trocamos olhares fulminantes.

-Ahn... eu perdi alguma coisa? – Jessica perguntou.

-Não, amor. Não perdeu nada.

-Não, amor – repeti, com uma voz cover esganiçada de Matheus. – Não perdeu nada.

-Nhé – fez Matheus.

-Nhé – repeti.

-Ugh – grunhiu. – Será que pode calar a boca?

-Vem calar!

Ele chegou próximo de mim. Tipo, bem próximo. E por um momento, ficamos iguais a mim e Thiago terça à noite em casa. Até quando...

-Ahn, eu continuo aqui! – Jessie interrompeu.

Pisquei umas duas vezes e voltei à realidade.

-Ah, é. Falando em continuar aqui... eu preciso ir.

Matheus piscou umas duas vezes também, e chacoalhou o cabelo cacheado.

-Verdade, tenho que te levar para casa.

-Não precisa. Eu vou de metro.

-Eu te trouxe para cá, eu te levo de volta.

-Não, você...

-Ou, porque eu não te levo para casa? Eu tenho que ir também – ofereceu Jessie.

Aceitei com um sorrisinho. Jessie pegou as chaves e sua bolsa, então deu um beijo na bochecha de Matheus e mandou um “Até amanhã, querido” para ele. Quando chegou minha hora de me despedir de Matheus as únicas palavras que trocamos foram:

-Peça desculpas para seu pai por mim.

-Mande um abraço para seu namorado por mim.

Trocamos sorrisinhos sem graça e então Jess e eu fomos.

***

-Quer que eu acredite mesmo que vocês dois estavam na Casa Branca, só que então você passou mal e, como a bateria do seu celular havia acabado, não ligou para sua irmã menor de idade e veio para casa? – perguntou Bruna, caminhando comigo até a escola.

-É. Foi isso mesmo o que aconteceu – concordei.

-Ah, ok. E Matheus se meteu aonde?

-Eu pedi para que ele me ajudasse, já te disse isso.

-Ainda não acredito que você me deixou sozinha em uma limusine, e depois num jatinho particular até Washington.

-Ah, por favor. Só falta me dizer que andar de limusine e jatinho foi chato – disse, parando na porta da escola.

-Não foi chato, fiquei o tempo inteiro conversando com Johnny – ponderou. – Mas, o tour pela Casa Branca que não foi muito agradável. Era só blá blá blá do presidente e, quando pensei que teria um momento para comer, o presidente finalmente percebeu que vocês não estavam lá! Então acabei não comendo, e ele me mandou para casa em um helicóptero.

-Devo imaginar como você sofreu, coitadinha.

-Há-há. Você diz isso porque não foi você quem ficou de estomago vazio. Você tem muita sorte de mamãe ter viajado à trabalho, senão...

-Tá, eu sei. Agora eu preciso ir para a aula. A gente se vê mais tard...

-Er, Mari... – cortou-me Bruna, apontando para trás de mim.

-O que foi? Tem alguma aranha gigante atrás de mim?– perguntei desesperada.

-Acho que você tem sombras. Várias  sombras.

Cautelosamente, fui virando para trás. E, ainda bem, não era uma aranha. Bruna estava certa, eu tinha pelo menos umas 50 pessoas atrás de mim, todas ou com câmeras ou microfones nas mãos. Uma repórter tomou a frente de todos os outros e, apressada, perguntou a mim:

-Então, Mariana. Diga-nos como foi salvar a vida do presidente e fugir com o gato do primeiro-filho!


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