Stay Alive. escrita por Primrose


Capítulo 30
O fim


Notas iniciais do capítulo

Então é isso gente,
Espero que gostem desse capítulo que me fez chorar muito enquanto eu escrevia.



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Apenas continue andando.

Digo mentalmente a mim mesma com firmeza. Mesmo assim, meus passos são lentos e minhas costas ainda estão latejando por causa daquele maldito ácido. Mas não é isso que me incomoda.

Tento distrair a minha mente com os mínimos detalhes: o verde da grama, o tronco ferido das árvores, os insetos, os pássaros. Tudo em vão.  Meus olhos continuam querendo chorar e eu tenho que me esforçar cada vez mais para impedi-los. Tudo porque meus pensamentos sempre voltam para o mesmo ponto: Haymitch.

Eu disse adeus e fui embora. Ele nem se quer olhou para trás. Como eu sei que ele não olhou para trás? Eu sei por que eu olhei para trás, eu olhei por um mínimo momento, na esperança inútil de que ele fosse me chamar de volta.  Inútil.  

Eu deveria ter matado ele enquanto ele dormia ou, no mínimo, desejar que ele caísse daquele penhasco. Mas tudo o que eu consigo fazer é sentir pena de mim mesma. Por que eu não posso fazer alguma coisa certa pelo menos uma vez? Talvez se...

Escuto um barulho. Meu coração começa a bater a mil por hora e no mesmo instante eu sinto vontade de vomitar. Eu conheço esse barulho e isso não é nada bom. Começo a correr.

A dor nas minhas costas é agonizante e minha mente corre em flashes: Katri assustada, Haymitch me abandonando, os pássaros horríveis, a menina gritando.  Eu tropeço. 

Caio com tanta força no chão que quase engulo um pedaço de terra.  Me levanto tão rápido quanto caí, ignorando a dor e o meu joelho sangrando.  Mas não sou rápida o suficiente. O grito que faz cada pelo do meu corpo se arrepiar está bem atrás de mim, e consigo fazer a burrice de virar para trás num reflexo e ver o que fez o barulho do que correr mais rápido.

Começo a tremer com a visão que tenho. Um grupo de pássaros, bicos enormes e afiados, olhos de demônio. Me lembro da rapidez deles e sei que correr não vai adiantar. Olho para os meus dardos automaticamente, tenho apenas quatro. Há muitos mais pássaros do que quatro. Eu me desespero, sentindo a realidade me atingir.

O primeiro pássaro avança pra cima de mim, eu me abaixo no momento certo e enfio um dardo na barriga dele com as minhas mãos. O sangue que escorre da ferida é preto e gosmento.  Não tenho tempo de fazer uma cara de nojo, outro pássaro avança por trás. Eu arranco o dardo da barriga do animal e com um giro atinjo a asa do outro. Golpeio várias vezes sem nem pensar, ele cai morto. Respiro fundo rapidamente. Menos dois. Mas os outros continuam avançando um por um, mato mais um no estilo facada e lanço o dardo já grudento de tanto sangue em outro.  Pego o segundo dardo e me viro para atingir um deles que está atrás de mim, quando sinto a dor.

Minha boca se abre em um grito alto o suficiente para acabar com a minha voz, meu corpo estremece, a dor é insuportável. Sinto o sangue escorrer pela minha pele. Olho para baixo apenas para ver um pedaço de um bico afiado e brilhante de sangue atravessado no meu peito. O bico some e reaparece várias vezes.

Dor.

Grito.

 Dor.

 A dor se espalha pelo meu corpo junto com o sangue. Mais bicos surgem, no meu peito, na minha barriga, braços, pernas, pescoço.  Mais dor, mais gritos. Meus gritos. Meu sangue escorrendo como um rio furioso. Os bicos desaparecem e tudo o que eu vejo são as folhas das árvores acima de mim e vermelho. Tudo parece manchado de sangue vermelho.

De repente sinto o chão. Os pássaros devem ter ido embora, apesar da dor ainda estar aqui. Sinto as lágrimas escorrerem no meu rosto e não tento impedi-las dessa vez, porque sei que é a última vez. Sei que minha vida é a próxima a ir embora. E choro com força. Choro por tudo o que eu fiz de errado, por tudo que eu deveria ter feito, por todas as chances que eu havia perdido, pela vida que eu deveria ter tido, pela minha família. Minha irmã. Será que ela está sentindo também? Será que ela está sentindo toda essa dor, será que ela está sentido a minha vida escorrer? Tomara que não. Não, ela não merece tanta dor assim. Não que eu mereça isso. Eu sei que não mereço isso, o que uma pessoa pode ter feito de tão ruim para merecer algo assim? Eu não sei. Só sei que eu estou aqui. Sozinha com o meu sangue, minha dor e minhas lágrimas.

- Maysilee! – ouço alguém chamando o meu nome. Será a morte? – Maysilee! – ela me chama de novo.

Então sinto algo tocar a minha mão. Algo quente no meio de todo meu frio. Algo que aquece meus dedos ensanguentados e minha mão, minha mão que está no meu peito, tentando inutilmente estancar o sangue de uma das muitas feridas. Ouço o meu nome ser sussurrado e sei que não é a morte. A voz da morte não soaria tão desesperada, assustada e triste. É, acho que esses são os adjetivos certos. Ou talvez não. Talvez nessas horas tudo pareça desesperado, assustado e triste mesmo. E o rosto que aparece em meio ao verde e vermelho definitivamente não é da morte. É o último rosto que eu esperava ver, o rosto que tinha acabado de me abandonar e agora está aqui. Haymitch está aqui. O meu Haymitch está aqui. E isso só torna tudo mais triste.  Ele só me faz pensar em todas as coisas erradas que podiam ter dado certo, ele só me faz ter vontade de viver. Mas agora não adianta mais, vontade não vai mudar nada. 

Ah, Haymitch. Há tantas coisas que eu quero falar para você. Se a dor deixasse o meu corpo me obedecer por um minuto eu poderia te dizer que sinto muito. Sinto muito por ter me apaixonado por você, mas é que era simplesmente impossível não o fazer. Você me salvou tantas vezes, eu também te salvei. E isso só fez tudo piorar, porque em circunstâncias extremas, temos reações extremas.  Acho que foi por isso eu comecei a te amar, acho que por isso tudo deu errado. Não pude evitar, me desculpe. Se eu pudesse te dizer que eu quero que você sobreviva não importa quantas vidas isso custe, soaria tão egoísta quanto eu acho que soaria? Mas eu também queria te avisar que eu fui uma fraca, acabei no caminho mais fácil. Acabei morrendo. Talvez viver depois de ter passado por tantas coisas, não seja tão confortável assim. Apesar de a morte não ter sido uma opção minha, não sei se teria sofrido mais ou menos continuando viva. Eu não quero que você morra, não, de jeito nenhum. Mas eu também não queria que você precisasse sofrer tanto para continuar vivo. Se eu te perguntasse o porquê de tanta dor, você saberia me responder? Queria poder te falar tanta coisa mais, mas sei que não posso. Nosso tempo acabou, o meu tempo acabou.  Nós dois sabemos disso.

E foi isso. Meus olhos examinavam o rosto do Haymitch com desespero, querendo dizer tudo o que eu não conseguia dizer. E eu senti uma lágrima, uma lágrima diferente. Uma lágrima que não era minha. Era dele. E eu soube naquele momento que tinha acabado. Morrer é meio assim, você simplesmente entende que, por mais triste que seja deixar todas as pessoas que você ama e toda a sua vida para trás, acabou. Não se pode fazer mais nada, acabou. Tudo o que você fez e tudo o que você deveria ter feito, todos os “e se”, tudo simplesmente terminou.  Como um pôr-do-sol, o céu está repleto de todas as cores e luz e de repente o sol desaparece no horizonte e tudo o que sobre é a noite. 

A noite e as estrelas.

Amanhã não será um dia melhor, Maysilee. Amanhã não existe mais. Acabou.

E realmente acabou. Em meio ao meu sangue e nossas lágrimas e o eco de um canhão. Tudo desapareceu, o meu sol desapareceu levando a minha vida. A noite chegou e com ela as estrelas e chamas. Sim, chamas. E havia um tordo em chamas no meio das estrelas. Ele está chegando. O tordo e as chamas, eu posso sentir, eles estão chegando.


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Notas finais do capítulo

Espero que vocês tenham gostado da fic, me desculpem por todas as minhas demoras e muito obrigado por serem os melhores leitores do mundo ♥
Não vou continuar porque esse é uma fic sobre a Maysilee e não faria muito sentido eu continuar com o Haymitch.
Então é isso gente, muito obrigada por tudo, espero ter uma nova história em breve
Stay alive.